Não é hora de escolher vacina

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  Caça aos imunizantes dificulta ainda mais livramento de pandemia da covid-19

Por Edu Carvalho, em 06/07/2021 ás 0h25. Editado Daniele Moura.

Receio de reações, desinformações iniciadas pelo Presidente da República, uma enxurrada de notícias falsas – as chamadas fake news – além de preconceito em relação a outros países. Tudo isso (o que não é pouco) sob um país que ainda figura como o segundo com maior número de vítimas mortais pela covid-19, depois dos Estados Unidos, e o terceiro com mais casos, antecedido pelos norte-americanos e pela Índia. Até o momento, o país já registrou mais de 525.229 óbitos pelo coronavírus. É como se uma cidade como Niterói, Florianópolis ou Vitórria estivesse sido exterminada, ou seja sua população inteiramente morta.

Mas se ‘’tá pior, vai piorá’’, canta Alceu Valença. Não bastasse o cenário que ainda vitima pouco mais de mil e quinhentas pessoas pelo vírus por dia no segundo ano da pandemia, a vacinação ganhou uma espécie de “sommeliers” de vacinas, aquelas pessoas que escolhem qual imunizante quer tomar. Cidadãos espalhados pelos 26 estados e o Distrito Federal que vem se colocando como aqueles profissionais especializados em vinhos, dificultando o livramento da pior crise sanitária do século.  São 77.487.380 pessoas que já receberam a primeira dose de vacina contra a covid-19, segundo dados divulgados até às 20h de ontem, (05/07). O número representa 36,59% da população brasileira. Já com a segunda dose, os imunizados correspondem a 12,92% dos brasileiros.

Sommeliers de vacinas

Como trouxe Ana Lúcia Azevedo em matéria especial na Revista Época, o início da pinimba se deu pela eficácia em estudos clínicos de fase 3, a última antes da autorização para uso da população. Esses testes mostraram eficácia de 95% para a Pfizer; 72% a 90% para a Janssen (recém incorporada ao quadro vacinal brasileiro); 76% a 82% AstraZeneca; 51%, CoronaVac.

De março a maio, integrantes do Maré de Notícias participaram de uma especialização pelo Centro Knight, em parceria com a UNESCO, PNUD e Organização Mundial da Saúde e co-financiado pela União Europeia. Em “Cobertura da vacina para COVID-19: O que os jornalistas precisam de saber“, os jornalistas puderam entender que as taxas das vacinas não podem ser comparáveis porque os estudos de fase 3 são feitos com metodologias distintas (duração, escolha do tipo de placebo e dos grupos vacinados e de controle, por exemplo) e, sobretudo, países diferentes. Logo, podem oscilar de um para o outro, mas com base nos resultados finais e com aval de órgãos de saúde reconhecidos, podem ser administrados. No resumo: não adianta comparar. Eficácia, que é medida nos estudos clínicos de fase 3 e diz respeito à estimativa de proteção individual, e efetividade, quando as vacinas já estão em adoção, parecem mas não são a mesma coisa. ‘’As vacinas vão ter diferenças em relação aos diferentes grupos. O importante é a gente compreender que todas as vacinas aprovadas pela Anvisa são seguras, eficazes, e o que conta é a gente ter uma velocidade rápida e conseguir atingir muitas pessoas, para impactar a transmissão’’, resume Ethel Maciel, professora da Universidade Federal do Espírito Santo,  epidemiologista pesquisadora do CNPq e presidente da Rede Brasileira de Pesquisa em Tuberculose.

Em junho, uma das matérias mais lidas do Maré de Notícias em contexto territorial e nacional foi sobre uma plataforma que unifica dados e análises sobre a vacinação no Brasil, além de informar, por geolocalização, os postos válidos para imunização. Com o título ‘Onde Tem Vacina?’, o intuito da reportagem era mitigar a falta de informação sobre a campanha de vacinação para covid-19 no Brasil. 

O mês também foi o que mais registrou, nas redes sociais e grupos de mensagens, uma ‘caça’ às vacinas (seja por faixa etária, comorbidade ou mulheres gestantes e puérperas). A luta era para achar postos que aplicassem, para alguns, só a Pfizer e Astrazeneca, deixando de lado a CoronaVac. 

Em grupos de Whatsapp, pessoas acumulam trocas de mensagens para saber onde tem a vacina Pfizer/BioNTech

‘’Nosso projeto não foi feito com essa intenção. Não suportamos a escolha de vacinas sem um motivo e apoiamos o Plano Nacional de Imunização, o PNI. Mas entendemos que as pessoas têm o direito a essa informação [saber quais são as vacinas disponíveis em casa posto]. Cabe a cada um decidir como usá-la’’, diz Marcos Bonfim, criador da iniciativa, que acaba de registrar mais de 400 mil acessos, grande parte nas duas últimas semanas, que tem como slogan ‘vacina boa é vacina no braço’. 

Em artigo publicado pela Folha de São Paulo no último domingo (04/07), o diretor do Instituto Butantan, Dimas Covas, alerta que há um ‘Flá X Flu vacinal’, sobretudo em relação ao imunizante produzido pela entidade, vinculado ao governo paulista em parceria com o laboratório chinês SinoVac. ‘’Estamos presenciando uma ação para desconstruir a vacina que tem o brilho de ter sido a primeira no Brasil e que foi responsável por toda a fase inicial do Programa Nacional de Imunização. Na pior fase da pandemia, as pessoas mais vulneráveis e que acumulavam os piores índices de internação e óbitos foram protegidas’’.

Cabe lembrar que a CoronaVac foi a primeira vacina adotada em território brasileiro, após receber autorização emergencial da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). E recentemente a Organização Mundial da Saúde (OMS) aprovou seu uso emergencial.

Maré e Manguinhos são exemplo de imunização

De acordo com Boletim Conexão Saúde – De Olho No Corona, que apresenta dados dos casos, óbitos e vacinação na Maré e Manguinhos, a partir de fontes oficias mas também com informações de testagem , atendimentos em Telessaúde e do Programa de Isolamento Domiciliar Seguro, com o aumento da vacinação nos territórios, diminuíram as mortes pela doença. Ao mesmo tempo, o Maré e Manguinhos registraram um aumento significativo do numero de casos. 

A Maré tem no momento 26,2% da população imunizada com a primeira dose e 6,5% da população imunizada com a segunda dose ou com a dose única da vacina.

Vacinou? Os cuidados continuam!

Desde o primeiro momento, especialistas alertam: vacinar-se não é a única ação que derrota, de uma vez, a pandemia. No conjunto da obra, pesam as duas doses completas do imunizante, (com excessão da Jassen que é dose única), ritmo e plano geral de imunização em massa, além do já conhecido distanciamento social e higiene, como a lavagem das mãos.  ‘’Algumas pessoas pensam na vacina individualmente, mas a proteção depende do coletivo. Numa circulação de vírus elevadíssima como a do Brasil, todos estão em risco. Pensar no coletivo também é pensar na segurança individual’’, disse Renato Kfouri, diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), à Ana Lucia Azevedo, na Época

Já para a pesquisadora Ethel, um dos pontos chaves é a realização de testes, a ser implementado de maneira efetiva no pais. ‘’Até hoje o Brasil não tem [programa de testagem em massa]. Precisamos propiciar que a pessoa consiga fazer, por exemplo, testes num terminal rodoviário, na estação de metrô, em locais de passagem onde tem muitas pessoas, para que seja possível encontrar pessoas positivas que nem podem saber que são ou porque estão assintomáticas ou por têm poucos sintomas’’.  Outro ponto enfatizado pela epidemiologista é a continuação do Auxílio Emergencial, para que a população em vulnerabilidade possa continuar medidas de proteção, como ‘’usarem máscara, fazer distanciamento físico, evitar aglomeração, ficar em ambientes arejados, ações que estão no nível do indivíduo’’. 

Sobre o Auxílio, o Governo Federal anunciou ontem, segunda-feira (5/07), a prorrogação do benefício por mais três meses. O pagamento acabaria em julho e, com a prorrogação, também será pago em agosto, setembro e outubro. Segundo a Secretaria-Geral da Presidência, o decreto de prorrogação já foi assinado pelo presidente Jair Bolsonaro e será publicado nesta terça (6/07).

Rio de Janeiro em queda em internações a partir da vacinação acelerada 

‘’Para que as vacinas realmente funcionem em uma sociedade é necessária a adesão de todos, se estiver elegível projeta sua saúde e a saúde da sua comunidade, as vacinas funcionam, mas seus efeitos dependem da adesão de todos’’, sinaliza Daniel Soranz, secretário municipal de Saúde do Rio de Janeiro. 

A capital fluminense vem registrando queda no número de pessoas internadas em leitos de UTI Covid. Em relação aos últimos dois domingos, houve queda de 304 internações, o que pode ser visto como efeito da vacinação, que está acelerada – vacinam-se a partir desta semana até a próxima indivíduos de 42 a 37 anos. 

No último sábado (03/7), a Secretaria Municipal de Saúde do Rio informou que, após uma verificação dos dados de todos os 756 casos de vacinação com suspeita de aplicação de doses fora da validade, constatou que nenhuma de suas unidades aplicou doses vencidas.

O comunicado foi feito nas redes sociais da Secretaria, que desde a tarde de sexta-feira (02/7) vem recebendo mensagens sobre vacinas que poderiam ter passado da validade, como publicou a Folha de São Paulo, que identificou pelo menos 26 mil doses vencidas de oito lotes da vacina AstraZeneca aplicadas em diversos postos de saúde do país até 19 de junho. A campeã no uso de vacinas vencidas é Maringá, que aplicou em 3.536 pessoas uma dose da AstraZeneca fora da validade.

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