Para os seus moradores, território vai muito além de três ruas
Maré de Notícias #148 – maio de 2023
Por Hélio Euclides
Em 1954, nasceu o Parque Rubens Vaz, localizado entre a Nova Holanda e o Parque União. Na época, a área também era conhecida como Areal (devido à areia que era trazida pela drenagem e canalização do canal da Zona Portuária) e como Caracol (uma referência à Passarela 10, que tinha formato circular e ficava na entrada da favela). A ocupação teve início ao lado do canal do Rio Ramos, atualmente poluído e não mais um córrego, e sim um valão.
Com o tempo, os moradores aterraram a área usando carvão, serragem e entulho. Na nova favela, João Araújo foi uma das primeiras lideranças do lugar, que começava a organizar as construções e abrir as ruas. Os moradores retribuíram dando seu nome à nova favela (posteriormente, João Araújo virou nome de rua no Parque Rubens Vaz).
No entanto, depois do aterramento e de erguidas as casas de madeira, a construção em alvenaria foi proibida. A polícia também combateu o crescimento da favela. O advogado Margarino Torres defendeu o direito dos moradores, consolidando a ocupação. Em agradecimento, a favela mudou de nome e virou Parque Margarino Torres. Em 1965, mais uma vez a comunidade mudaria de nome, dessa vez em definitivo: o governo resolveu homenagear um major da Força Aérea Brasileira (FAB), e surgiu o Parque Rubens Vaz .
Nordeste ali do lado
Assim como em outros lugares da Maré, no passado era necessário atravessar a variante, hoje Avenida Brasil, para buscar água em barris conhecidos como rola-rola. Com o tempo, a população cresceu e novas lideranças surgiram, incluindo João Crisóstomo, ex-presidente da Associação Pro Melhoramento do Parque Rubens Vaz, que recentemente recebeu uma homenagem com seu nome em um Espaço de Desenvolvimento Infantil.
Atualmente, o Parque Rubens Vaz possui duas creches, uma escola, um campo sintético e uma quadra coberta, além de muitas casas. A maioria dos moradores é provenientes do Nordeste, com destaque para os maranhenses, como destaca Vilmar Gomes, conhecido como Magá, presidente da Associação de Moradores de Rubens Vaz e que está na favela há 52 anos.
Magá lembra com carinho dos pioneiros de luta: “Eu me inspiro na liderança João do Leite, que foi presidente da associação e da época da Comissão da Luz. Um fato que marcou quando eu tinha 17 anos foi quando o então presidente, Índio da Maré, quis acabar com o campo de futebol para ali fazer um loteamento.”
Segundo ele, “na época, formamos uma comissão com 16 jovens, e conseguimos convencê-lo da importância do esporte e lazer. Também criamos a quadra, com esforço de trabalho em feira e engraxando sapatos”. O presidente lembra de outra liderança forte, Ricardo Ferreira, conhecido como Robô, que asfaltou as ruas, então de paralelepípedos.
Sem saneamento
Hoje, o que falta para o presidente é saneamento básico: “O que se faz é enxugar gelo. Os governantes precisam olhar com carinho para a drenagem dos valões e a limpeza das galerias de águas pluviais, algo que não é feito há séculos. No verão, com as chuvas, a água ultrapassa o joelho dos moradores que moram próximos ao valão.” Magá lembra do tempo antes da poluição, e sente saudade de quando havia ali um riacho “’limpinho”, onde se pegava tainha.
Antigamente, para chegar à Nova Holanda, era necessário passar pelo Beco do Seu Zé, que já não existe mais. Já para ir ao Parque União, era preciso percorrer a Avenida Brasil, pois não havia a Rua Principal. A abertura da rua ocorreu apenas em 1990. Para Jader Lopes, de 30 anos, cria da favela, é um privilégio morar perto da Avenida Brasil.
“Quando não tinha o conhecimento geográfico da Maré, falava com orgulho que o Rubens Vaz era o coração do bairro. O Parque é o primo queridinho das comunidades vizinhas. Uma pena que cresceu bastante a questão imobiliária, que deu fim à nossa praça”, diz. Seu amigo Douglas Oliveira, de 27 anos, acredita que a história não pode ser esquecida. “É preciso lembrar que os nossos pais lutaram por moradia, por acesso à educação, entre outras políticas públicas. Precisamos fazer o mesmo pela família e pela favela”, conclui.