Quem amplifica as vozes da Maré?

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No dia do Jornalista: para além da função social, o olhar de quem enxerga a favela como lugar de potência 

Jessica Pires e Gracilene Firmino

O histórico de lutas por melhores condições de vida na Maré não é uma novidade, e nem um fato desconhecido. O povo mareense, desde o surgimento das primeiras palafitas e em todo o desenvolvimento das 16 favelas, criou maneiras de se mobilizar para garantir direitos. Junto ao crescimento da Maré, em seus mais de sessenta anos de história, foram criados, desenvolvidos e aprimorados muitos formatos de fazer comunicação e jornalismo. Por isso, neste 7 de abril, dia do jornalista, chamamos a atenção para o papel fundamental daqueles que constroem narrativas sobre espaços periféricos e de favela. 

Para além de informar, a função social do jornalismo em regimes democráticos é fiscalizar os poderes públicos e privados e assegurar a transparência das relações políticas, econômicas e sociais. O Relatório de Desenvolvimento Humano (RDH), elaborado pela Organização das Nações Unidas (ONU), que analisa a concentração de riquezas, coloca o Brasil em segundo lugar no ranking de má distribuição de renda entre a população. Dessa forma, quando pensamos em um país que está nos topos desses rankings de desigualdade social, e mais especificamente em territórios que a todo tempo são marginalizados e criminalizados por parte da sociedade e também parcela de veículos e profissionais do jornalismo, o desafio de um jornalista ou comunicador se torna ainda maior.

Produzir, desenvolver e distribuir pautas, matérias, reportagens e notícias sobre o Conjunto de Favelas da Maré ou qualquer outra favela do Rio de Janeiro, seja na perspectiva de visibilizar histórias e trajetórias exitosas ou ações positivas, ou com o objetivo de denunciar e cobrar soluções para demandas específicas carrega em si a responsabilidade de amplificar os processos, desejos, sonhos, desafios e questões de quem geralmente é invisibilizado pela sociedade. Estar nesse lugar é trabalhoso principalmente com a falta de recursos e necessidade de ser cada vez mais criativo na busca por espaço e na disputa das narrativas com grandes veículos de comunicação. 

O olhar de quem entende a favela como um território de direitos assim como outro qualquer, na produção jornalística é potente e fundamental para a desconstrução de estigmas que quando massificados, naturalizam a negligência do Estado, em todas as suas esferas. Em especial no dever de fazer funcionar os serviços públicos e garantir direitos básicos e universais para toda a sociedade, independente do lugar onde mora ou da raça, por exemplo. 

“Se todo território tivesse uma comunicação comunitária sólida, seria perfeito. Não é dar voz ao morador; isso ele já tem. O que precisamos fazer é potencializar, aumentar sua visibilidade. Somos nós que fazemos, muitas vezes, uma ponte com o poder público para trazer soluções’’

destacou Hélio Euclides, jornalista que integra a equipe do Maré de Notícias desde a sua criação. 
Hélio Euclides em entrevista com moradora

Amplificar, potencializar as vozes da favela. É uma missão e tanto. Mas muitos aceitaram esse compromisso. O Rio de Janeiro é bem servido de iniciativas de comunicação e de jornalismo comunitário e que são referências para todo o país. Voz das Comunidades, Fala Roça, CDD Acontece, são algumas delas. Na Maré, o Jornal O Cidadão, criado em 1999, tem como um dos seus pilares o fortalecimento da identidade local. 

Já o Maré de Notícias nasceu em 2009, com a missão de informar a fim de mobilizar a população do território. Em pouco tempo, se tornou um dos maiores jornais comunitários do Brasil com tiragem de 50 mil exemplares da versão impressa. Em 2017, lançamos o site, que atualmente é acessado em todos os cantos do país como fonte de informações sobre a região. Assim, o Maré de Notícias se consolidou como uma das principais ofertas de informação de qualidade para os 140 mil moradores das 16 favelas da Maré.

Desde então, os jornalistas que colaboram e constroem o Maré de Notícias, em sua maioria moradores da Maré, têm como premissa essa responsabilidade e olhar sensível de não apenas documentar essas histórias e fatos. Tão importante quanto visibilizar, para nós, é incluir essas pessoas no processo de construção dessas narrativas e mobilizar para que os dados e informações apuradas sirvam de instrumento para que elas melhorem a qualidade de suas vidas e acessem de forma plena direitos diversos. 

Nesse sentido, vivenciamos aqui na Maré algumas experiências positivas e que incidiram na garantia de direitos e que foram fortalecidas pela construção de narrativas do Maré de Notícias, no campo do direito à Segurança Pública e acesso à justiça, da Educação, da Arte, Cultura, Memórias e Identidades, da Saúde, dos Direitos Urbanos e Socioambientais e outros.

Nesse dia 7 de abril saudamos a todas e todos que acreditam, contribuem e estão comprometidos com um fazer jornalismo responsável, com um olhar central para a efetivação de direitos, que contribua para a construção de uma sociedade democrática e que não alimente uma lógica que reduz favelas a lugares de produção violência. É fundamental que mais pessoas estejam envolvidas nessa missão de amplificar as vozes das favelas. Portanto, se você é jornalista, se engaje cada vez mais em uma comunicação não-violenta e que respeite os territórios periféricos e de favela. Para a sociedade, que todos possam valorizar e viabilizar o jornalismo comunitário. Lendo veículos alternativos, compartilhando as informações que vêm desse lugar, apoiando e fortalecendo os projetos desenvolvidos por eles. Amplifique essas vozes também.

Foto: Arquivo MN | Da esquerda para a direita: Samara Oliveira, Amanda Célio, Jéssica Pires, Lucas Feitoza, Andrezza Paulo e Gabi Lino. Parte da equipe que construiu e constrói o Maré de Notícias

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