Sem lenço, sem documento

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Nos casos de maior vulnerabilidade social, ainda há entraves para se conseguir documentos

Maré de Notícias #128 – setembro de 2021

Por Hélio Euclides

Se o auxilio emergencial dado pelo governo federal é o que garantiu a sobrevivência de boa parte da população brasileira, outra parcela, vulnerável social e economicamente , não recebeu até hoje nenhuma parcela  por ser  invisível aos olhos do Estado. São pessoas que não têm um único documento de identificação ou, em alguns casos, condições de tirar uma segunda via. 

 Essa situação pode ser comprovada nas duas unidades do Detran na região: a cada ação visando a expedição gratuita de documentos na Maré, centenas de pessoas procuram os postos em busca de informações e obtenção dos documentos.

No fim do mês de junho, foi realizada uma ação social na Praça do Dezoito, na Baixa do Sapateiro. Entre muitas atividades, foram distribuídas cem isenções na obtenção da segunda via de documentos, mas a procura pelo serviço superou em muito essa cota.

“Moradores entraram em contato pedindo essa ação. Essa necessidade se deve ao fato de que o poder público não aproximar o cidadão da documentação. Acredito que 90% da população que tinha direito ao auxílio emergencial e não recebeu foi por não ter a documentação necessária ou informação. Aqui, mostramos o que é preciso para receber um benefício e indicamos o Centro de Referência em Assistência Social (CRAS)”, explica Jubdervan Menezes, apoio de projetos do Instituto Nacional de Desenvolvimento Humano (INADH).

A ação foi também uma iniciativa do Instituto Maria Aparecida Tereza Lopes (IMATL) e do Maré Solidária, além de contar com a parceria da Fundação Leão XIII. A quinta ação nesses moldes na Maré distribuiu isenção para segunda via de identidade e para as  certidões de nascimento, óbito e casamento. Jairo Nunes, do IMATL, defende que a população tenha mais oportunidade de acesso aos serviços. “Esse trabalho é gratificante, mas é triste perceber que falta oportunidade para os moradores. Os políticos só veem a favela como curral eleitoral, mas depois de eleitos não têm intenção de ajudar. É um absurdo ter que pagar para tirar segunda via de identidade dentro da favela”, reclama. 

Duas horas antes do início da ação já havia gente na fila atrás de isenção. “Tinha que ter mais vezes essas ações, pois é complicado tirar documento. Esses momentos nos ajudam a, no futuro, conseguir um emprego”, diz Gina Ferreira, moradora da Baixa do Sapateiro. Para sua vizinha de território Vânia Cristina,  a população vulnerável necessita de mais amparo: “É preciso proporcionar mais assistência nas favelas. Os órgãos públicos devem ter boa vontade e oferecer mais acesso, de uma forma simples.” 

A invisibilidade no Brasil

Durante a última ação social, Dominyck Marcelino, da Nova Holanda, conseguiu retificar seu nome na identidade – Foto: Matheus Affonso

Um levantamento da Fundação Getúlio Vargas Social mostrou que hoje cerca de 2,27 milhões de brasileiros (1,08% da população) não têm registro de nascimento. “A falta de certidão de nascimento é apenas o caso mais extremo da ausência de um direito que repercute em outros, como o ingresso na escola, no mercado de trabalho e mesmo na assistência social. É preciso criar políticas que facilitem o acesso à documentação”, enfatiza Marcelo Cortes Neri, economista da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Sueli Figueiredo, moradora da Praia de Ramos, agendou para tirar a identidade do sobrinho. “Gostei do atendimento, melhor ainda sendo perto de casa, sem precisar gastar com passagem. Ele chegou do Nordeste sem o documento e para conseguir trabalho o RG é indispensável”, diz. 

Para pessoas em situação de rua como Luiz Carlos, a questão ainda é mais delicada: “Tirar segunda via da identidade sem dinheiro é muito difícil. Só consegui com o apoio da Redes da Maré, que intermediou o processo junto à Fundação Leão XIII.”

Com a reabertura depois do início da campanha de vacinação, a procura por atendimento no Detran aumentou, não apenas de moradores dos territórios como de outras localidades como Bangu, Méier, Penha, Campo Grande e até Três Rios. “Está difícil, então como foi oferecido para a comunidade eu aceitei”, diz José Orlando, morador de Inhaúma. 

Passo a passo dos documentos

Certidão de Nascimento:  feito gratuitamente em qualquer cartório de registro civil com a identidade, CPF dos responsáveis ou certidão de nascimento ou casamento e a Declaração de Nascido Vivo (DN) da criança. Em Bonsucesso o cartório fica na Avenida Guilherme Maxwell, 555.

Cadastro de Pessoas Físicas (CPF):  emitido de graça pelo site da Receita Federal, tendo o título de eleitor em mãos.  Dúvidas pelo e-mail  [email protected]

Carteira de identidade: necessário agendamento pelo site do Detran ou via teleatendimento 3460-4040 e 3460-4041. Os postos do  Detran da Maré  ficam na rua Principal, s/nº, Baixa do Sapateiro e na rua Teixeira Ribeiro, 629. 

Carteira de Trabalho: emitida pelo  aplicativo “carteira de trabalho digital” pelo celular ou pelo site www.gov.br.

Alistamento Militar: todo jovem no ano que completar 18 anos, deverá agendar  o alistamento no site https://alistamento.eb.mil.br/ até seis meses após o aniversário.   A Junta de Serviço Militar (JSM) mais próxima fica na  X Região Administrativa – Rua Uranos, 1230, Ramos, e o atendimento acontece das 10h às 16h. 

Isenção

  • Os Centros Comunitários de Defesa da Cidadania (CCDCs) oferecem isenção de taxas para casamento, 2ª via de certidões de nascimento, casamento, óbito e Registro Geral (RG). O CCDC Maré funciona na Rua Principal, s/n°, Baixa do Sapateiro, das 9h às 17h.
  • A Fundação Leão XIII também oferece isenção para documentação civil. Na Nova Holanda, o atendimento é feito de segunda a sexta, das 9h às 18h ou presencialmente na rua Sargento Silva Nunes, nº 1.012 ou pelo  telefone 2334-7801. Na Praia de Ramos, a Fundação Leão XII fica na rua Gerson Ferreira, 06, Praia de Ramos,  e o atendimento pode ser feito também pelo telefone 2334-7802.

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