Um leitor apaixonado

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A dedicação de um morador da Marcílio levou à comunidade uma das poucas bibliotecas da Maré

Maré de Notícias #100

Hélio Euclides

Era uma vez um homem que tinha um sonho, que não era de creme ou de doce de leite. Pode-se dizer que tinha um objetivo: ter uma biblioteca. Mas seu sonho não era um desejo egoísta. Seu sonho era levar alegria e cultura, por meio de livros, para moradores de Marcílio Dias, na Maré. Este sonhador é Geraldo Oliveira, 70 anos, cuja história de vida se mistura com a de tantos outros sonhadores do nosso bairro.

Geraldo chegou à Maré vindo da Paraíba, no dia 3 de junho de 1966. Nessa época, ainda tinha a Praia das Moreninhas e uma vila de pescadores. Mas tinha também as palafitas, que eram, aos seus olhos, perigosas, com pontes de madeira enfincadas na lama e no lodo.

Um ano depois de sua chegada, presenciou, com seus olhos de rapazinho de 18 anos, uma cena pitoresca e inesquecível: uma multidão compareceu a uma festa nas palafitas (festa sim! O povo era alegre!). Tinha tanta, tanta gente, que o piso não aguentou e caiu todo mundo! Foi uma confusão danada. Mas pensa que isso atrapalhou?  Que nada! Ajeitaram as madeiras com escoras e a festa continuou. Geraldo tem nostalgia, sente saudades desse tempo e acha que o que faz falta é uma maior união entre as famílias. O emprestar de açúcar e de café, por exemplo.

Geraldo também tem uma grande paixão, a qual se dedica com a maior das devoções: os livros. São eles que foram e sempre serão o farol que ilumina sua estrada. Esse amor é altruísta, generoso. Por isso, em 2004, deu o primeiro passo para dividir as delícias de sua paixão com todos os moradores da sua querida Marcílio: transformou uma sala de sua casa em um espaço de leitura público.

A biblioteca mesmo surgiu em 2007, em uma loja. No início não tinha nome, então um amigo falou de Nélida Piñon. Geraldo se apaixonou pela história da escritora da Academia Brasileira de Letras e decidiu que a biblioteca teria o nome dela. E mais, Nélida conheceria o espaço e saberia da homenagem.

Dito e feito. No dia 11 de maio de 2011, a imortal visitou a biblioteca. Na ocasião, Nélida disse que conhecia diversos países, mas que estava profundamente honrada em conhecer a Favela da Maré. Um momento mágico para o nosso herói.

Mas depois veio a crise. E o acervo de 5 mil livros foi para um espaço menor. Geraldo, porém, não desiste deste amor. Fez e faz muita coisa para mantê-lo vivo. Uma delas foi deixar de pagar a prestação do carro para quitar o aluguel da biblioteca. Outra, foi participar de um programa de TV. Atualmente, o aluguel da sala é de R$ 450, que tira da sua aposentadoria e da ajuda de amigos.

Geraldo sabe que para “ser feliz pra sempre” é preciso lutar incessantemente. Assim, já planeja novos passos. Para trilhá-los pede ajuda a todos que, como ele, sejam apaixonados por livros. Para colaborar, basta acessar e contribuir: www.vaquinha.com.br/vaquinha/nao-deixe-a-unica-biblioteca-da-favela-morrer. Todos os amantes de livros de Marcílio (os atuais e os vindouros) agradecem.

Você sabia?

  • A ocupação de Marcílio Dias começou quando oito famílias de pescadores ergueram palafitas, em 1948.
  • Segundo o Censo Maré 2013, Marcílio Dias conta com 6.342 habitantes e 2.248 domicílios.
  • ?        Marcílio Dias era negro e é o marinheiro mais homenageado na Marinha de Guerra Brasileira. Se destacou, sobretudo, na Batalha Naval do Riachuelo.

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