Escolinha de futebol dribla obstáculos e há 28 anos promove formação técnica e incentivo à educação
Por Hélio Euclides, em 05/05/2021 às 12h30
Editado por Edu Carvalho
Há muito tempo as favelas e periferias são vistas como referências no surgimento de talentos do esporte, de um modo geral, mas principalmente do futebol brasileiro. Um exemplo disso são os projetos e os campeonatos voltados para esse público, como a Taça das Favelas. Mas não adianta apenas ter o campinho e ensinar as técnicas do esporte. Junto com eles vem a orientação para os estudos e a formação para a vida fora do campo. Seguindo esse caminho, o projeto União do Salsa estimula o gol no campo, mas também na escola, com a valorização do ensino de cada atleta. O projeto, que surgiu há 28 anos na Nova Holanda e depois continuou na Baixa do Sapateiro, funciona hoje no Salsa e Merengue trabalhando com crianças e incentivando o futebol feminino.
Essa preocupação com a vida da meninada fez com que Raimundo Mendes, mais conhecido como Junior, criasse uma das primeiras escolinhas de futebol na Maré. “Quando cheguei do Piauí percebi que não tinha quase projetos sociais. Isso me incentivou a começar a escolinha”, conta. Só no Salsa e Merengue são 11 anos reunindo mais de 100 crianças com idade abaixo de 12 anos. Somado a isso, ainda tem o futebol feminino, com 22 jovens na faixa etária entre 18 e 22 anos.
O projeto tem muitas dificuldades, que começam com a falta de locais para treino, já que o Salsa e Merengue não tem espaços apropriados para a prática de esporte. O projeto utiliza os campos do Conjunto Esperança. Para continuar durante tanto tempo fazendo este trabalho, os idealizadores do projeto revelam que além de ensinar o toque de bola, é preciso muito esforço para superar a falta de recursos. Na escolinha para criança, um exemplo da falta de dinheiro é a impossibilidade de comprar novos coletes de treino. Antes da pandemia, a escolinha recebia um valor fixo de R$300 por mês de um projeto de um clube internacional, que ajudava nos pequenos gastos.
Mesmo desempregado, só realizando bicos, o treinador não desiste do projeto. “A alegria e a felicidade em ver o sorriso das crianças não tem preço. Falo para eles que se um dia estiverem num clube, não se esqueçam nunca da família. Aqui não queremos só formar jogadores, mas sim cidadãos. É um espaço para distrair a mente, mas o importante é que incentivo a estudar, no futuro a trabalhar e se formar”, diz.
Os treinos, que acontecem às segundas, quartas, quintas e sextas-feiras, das 17h às 20h, e são divididos por faixa etária, fazem muita diferença na vida das famílias.
A luta das mulheres no futebol
A Revista Retratos, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostrou na edição de agosto de 2017 um panorama das Práticas de Esporte e Atividade Física, com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 2015. Na análise, o futebol foi a principal modalidade esportiva praticada no Brasil, com 15,3 milhões de pessoas. Mas a pesquisa revela que, deste número, a atividade é praticada majoritariamente por homens, sendo eles a representação de 94,5%, e somente 5,5% referente às mulheres.
Outra constatação da disparidade de gênero foi percebida em um estudo da FIFA, realizado em 2019. A apuração apontou que o Brasil tem apenas 15 mil mulheres jogando futebol, em disputa de campeonatos amadores ou profissionais. No futebol de base, o número é ainda mais tímido, com apenas 475 jogadoras abaixo de 18 anos registradas nos clubes.
Jogando contra esse desafio, Andressa Fernandes, de 18 anos, é atleta e treinadora do projeto União do Salsa. Para a jovem, uma das dificuldades encontradas é o preconceito. “Acreditam que não sabemos jogar. Quando estou como treinadora, as organizações das competições não me aceitam. Já ouvi várias vezes falas como ’futebol é para homem’, ’lugar de mulher é na cozinha’. A minha resposta é no campo”, comenta.
Inspirada por Miraildes Maciel, a conhecida Formiga, a jovem não deixa se abater e põe fé nos seus sonhos. Mas salienta a necessidade de se fortalecer a entrada de mulheres no esporte. “É preciso investir mais no futebol feminino para que cresça. Meu sonho é viver do futebol’’, observa Fernandes.