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Altos preços dos alimentos provocam mudanças na ceia de Natal

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A razão da alta dos preços dos importados, itens obrigatórios até pouco tempo nas festas natalinas, é a cotação do dólar

A mesa farta, com o tradicional peru de Natal, e produtos importados como castanhas portuguesas, nozes e amêndoas, por exemplo; aos poucos vai sendo alterada em função de novos hábitos da população. No entanto, em 2022, algumas mudanças no cardápio natalino são determinadas também pelos preços dos produtos, principalmente aqueles importados. 

A razão da alta dos preços dos importados, itens obrigatórios até pouco tempo nas festas natalinas, é a cotação do dólar, que no início de dezembro chegou a R$ 5,60. Por outro lado, de março de 2017 a março de 2022, o real perdeu 31,32% de seu valor e compra. E com o mesmo valor agora se consegue comprar apenas dois terços do que se comprava naquele ano. 

Um quilo de nozes, com casca, está custando R$ 45; 500 gramas de amêndoas, com casca R$ 30; Figo, R$ 18, 250 gramas. Mas não são apenas os importados que pesam no bolso do consumidor. Os produtos nacionais também estão inflacionados. A ceia de Natal deve ficar, pelo menos, 16,2% mais cara do que no natal de 2021, segundo estudo realizado pelo pesquisador Fernando Agra da Universidade Federal de Juiz de Fora, em Minas Gerais.

Produtos nacionais também estão caros

Para entender o impacto da alta dos preços dos alimentos na ceia de Natal das famílias da Maré, acompanhamos o cuidadoso planejamento da lista de compras de Arides Menezes. 

Ele tem 71 anos, está aposentado há sete anos, recebe uma pensão de dois salários-mínimos por mês; e está fazendo muitas contas para preparar uma ceia de Natal para os dois filhos, as respectivas noras e dois netos, “para a ceia eu em geral escolho o que está mais em conta. Os preços estão muito altos”. A primeira decisão já foi tomada, o peru vai ser substituído pelo chester, “bem mais em conta” afirmou o aposentado. 

Um quilo de peru, nas principais redes de supermercado do Rio de Janeiro custa em torno de R$ 28. Arides precisaria de um peru com pelos menos três quilos e meio, ou seja, R$ 100. As sobras da ceia vão compor o almoço do dia 25. A diferença de preço entre peru e chester não é tão grande, cerca de um ou dois reais por quilo, mas o chester rende bem mais, tem mais carne. 

O quilo do chester nos supermercados mais populares custa em média, R$ 27. Por um chester de três quilos e meio, Arides vai pagar R$ 94. O aposentado, na realidade, sonhava com um suculento bacalhau para a ceia do dia 24 de dezembro, “Não dá nem para pensar, vamos de chester mesmo.” diz Arides conformado. Um quilo bacalhau do porto não sai por menos de R$ 150.

Preços dos alimentos disparam

Nos últimos 12 meses o grupo alimentação e bebidas acumulou inflação de 11, 21%, de acordo com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo-IPCA, calculado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística-IBGE. O aumento nos preço dos alimentos ficou acima da inflação geral, que nos últimos 12 meses, que foi de 5,97%.

E essa inflação dos preços dos alimentos está atingindo até mesmo um dos pratos de maior popularidade da ceia natalina, a rabanada que, segundo Arides, “não pode faltar de jeito nenhum na nossa ceia”. 

Com a inflação dos alimentos e a perda de poder de compra do Real, mesmo os pratos mais simples como a rabanada ficaram bem mais caros. O pão, o leite e ovo subiram mais que a inflação desde dezembro de 2021. O pão teve uma alta de 18,1%. Leite e derivados, 26,6% desde dezembro de 2021. E o ovo de galinha, 19,7%. 

Arides vai restringir os importados, com algumas poucas exceções e uma delas é a castanha portuguesa, outro item muito tradicional e que também não pode faltar na ceia. Um quilo de castanhas na cidade do Rio de Janeiro está custando em torno de R$ 110.

O morador da Maré só vai gastar um pouco mais com os presentes, já que quer presentear todos que vão participar da ceia, filhos, noras e netos, “de preferência com roupas e sapatos”. Apesar ter sido obrigado a economizar na ceia, Arides diz que está feliz em poder reunir a família “o que e não pode faltar é harmonia”, disse.  

Símbolos de Natal iluminam a Maré

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Além da tradicional Árvore da Vila do João, favelas da Maré criam suas próprias representações dos símbolos natalinos

Andrezza Paulo e Lucas Feitoza

“Então é natal, e o que você fez? O ano termina e começa outra vez”. O Natal chegou e trouxe com ele os símbolos que iluminam as casas e as ruas da Maré. As árvores, as luzes, os presentes e a alegria desta época fazem parte da função dos símbolos natalinos: criar memórias afetivas, como é o caso dessa música lançada em 1995, interpretada pela cantora Simone. Aqui na Maré, além da tradicional decoração natalina nas residências ao longo das 16 favelas, a criatividade e as novas representações desses símbolos marcam o território e lembram quando é hora de pensar na ceia, decorar a casa e planejar as confraternizações. 

Registros históricos indicam que a árvore de natal, próxima ao que conhecemos hoje, nasceu ao final do Século XVI em Alsácia, antigo território alemão e que hoje pertence à França.  No início, as árvores eram decoradas com doces, nozes e maçãs. Somente em 1730 que as árvores brilhantes surgiram com decoração em velas. Na Maré, as árvores de Natal são recriadas todos os anos, sejam em sua forma tradicional, ou através de novas representações.

Árvore de livros Instituto Vida Real

Unindo literatura, sonhos e o espírito de renovação do natal, o Instituto Vida Real, localizado na Nova Holanda, fez uma criativa árvore de livros. A organização sem fins lucrativos (ONG) é focada em apoiar moradores da Maré nos eixos da educação, cultura e tecnologia. Arthur Pedro, coordenador pedagógico da ONG foi o idealizador da árvore e contou que a ideia surgiu para valorizar a biblioteca comunitária Luciana Savaget que fica na instituição. “Ano passado fiz uma árvore usando grafite como elemento principal para valorizar um pouco das oficinas que a gente tem, seguindo um pouco dessa ideia, esse ano pensei em exaltar a biblioteca comunitária”, disse. 

Trezentos livros foram usados para a composição e Arthur conta que o objetivo foi trazer o protagonismo de quem frequenta a biblioteca com foco nas crianças. Para isso foi utilizado um monitor com fotos de todos os alunos  e funcionários do instituto; “a ideia foi trabalhar outras estéticas e linguagens, tendo como ponto central elementos que fazem parte da nossa rotina”, conclui.

Árvore de natal de Heineken no Parque União

Há 10 anos, a árvore composta por garrafas de cerveja Heineken brilha na Praça do Parque União, conhecida na região pela gastronomia, música nordestina e pelo espaço de confraternização. Arilo Alves, comerciante da Chopperia Las Vegas e responsável pela decoração, conta que a ideia surgiu apenas um mês antes do Natal de 2012: “Eu fiz por ser bem diferente, são 1.800 garrafas e para juntar, precisamos dos comerciantes vizinhos, e todos ajudaram. As pessoas vêm de fora da comunidade para prestigiar a nossa árvore”.

Árvore de natal da Vila do João

A árvore de natal da Vila do João já é tradição da época e quem passa pela Avenida Brasil, na altura da passarela 6, pode vê-la iluminando a entrada da favela. A decoração é um patrocínio da NHJ Contêiner com apoio da Associação de Moradores da Vila do João representada por Valtermir Messias, presidente, conhecido como Índio, que informa que  a árvore é colocada há aproximadamente 12 anos, e que a deste ano tem 18 metros de altura. 

No final do mês de novembro (25), um incêndio causado por um curto circuito, danificou o cartão postal da região, mas foi restaurado em dois dias. O acidente ocorreu no mesmo dia da operação policial que deixou 8 pessoas mortas, feridos no Parque União e Nova Holanda e violou direitos  dos moradores da Maré.

“Imagina a quantidade de moradores que tem no nosso território e a maioria é cidadão de bem, então a cerca de 12 anos a gente tem esse compromisso com o espírito natalino e com a Maré de colocar a árvore de natal” conta Índio.

As decorações de Natal carregam a alegria, a união e a esperança que são características não só desta época do ano, como das 16 favelas da Maré que mesmo sendo atacadas de forma violenta não perdem a fé e mostram que o diferencial está na união dos moradores.

Projeto social da Maré trabalha inclusão social através do esporte

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A iniciativa Rogi Mirim atua há 25 anos sem patrocínio ou apoio financeiro

Samara Oliveira 

Uma paixão inesperada aos 20 anos repleta de parceria, amor, renúncias e transformações. Parece casamento, mas não é. Estamos falando do projeto social Rogi Mirim fundado pelo mareense Glaucio Aleixo, de 45 anos. A paixão foi inesperada porque curiosamente Glaucio nunca gostou de futebol e o projeto fundado e mantido por ele há mais de duas décadas é uma escolinha que fomenta a prática do esporte para cerca de 250 crianças de 3 a 10 anos. 

Para entender melhor essa história, precisamos voltar no tempo de quando Glaucio foi convidado para apitar uma partida de futebol. 

“Meu sonho sempre foi cantar, mas Deus achou melhor trocar este sonho e em 1998 um amigo me chamou pra apitar uma ‘pelada’. Eu fui e me apaixonei pelo futebol. Alguns dias depois vendo a ociosidade das crianças, vendo elas cada dia mais indo pro lado errado, vendo crianças e adolescentes de 13 anos não voltando pra casa… não porque não são bem criadas, mas porque seus pais trabalham e não têm com quem deixar seus filhos ou pagar a alguém para olhar. Sendo assim montei o projeto. Na primeira semana tinha apenas 10 alunos e na segunda já tinha 100”, relembra o treinador.

Já a renúncia está ligada a escolha que o treinador fez para conseguir continuar tocando o projeto. Glaucio decidiu que trabalharia como entregador de comida por aplicativo porque até o momento, foi o único jeito que encontrou para conciliar seu sustento com a iniciativa.

“Toda vez que vejo o sorriso nos olhos destas crianças revigora mais ainda a vontade de continuar. Alguns me chamam até de pai. Não queria chegar no final da minha vida e ver que eu podia ter feito a diferença e não fiz nada. Afinal, se você não usa sua vida para ajudar outra vida do que serve viver?”, reflete.

Falando em fazer a diferença, Glaucio relembrou também da história que marcou sua vida há cerca de seis anos.Todos os dias durante o treino, o professor notou um jovem que observava ao redor do campo os jogos que aconteciam.Ele se aproximou e descobriu que o rapaz tinha o sonho de começar a jogar, mas não podia na época por fazer parte de um dos grupos civis armados da região. Glaucio conseguiu reverter a situação. O jovem entrou no projeto, não seguiu carreira, mas mudou o rumo da vida construindo família e trabalhando.

Os treinos acontecem no mesmo lugar até hoje. No Campo da Toca, na Vila dos Pinheiros, de segunda à sexta durante todo o dia. As categorias são divididas entre sub 6 ao 17. Apesar da constância e do tempo que a iniciativa existe no território, Glaucio não conta com nenhum apoio financeiro público. Os custos saem do próprio bolso e de outros voluntários do projeto. E aí está a parceria que dá certo e faz o projeto durar todos esses anos. 

O jogador de futebol Felipe Wallace, 31, é um desses voluntários que há um ano também foi tocado pela iniciativa e agora integra o projeto como um dos treinadores. 

“Mesmo sem ajuda vamos firme e forte com amor e esperança em dias melhores a todos eles. Eu enxergo que esse projeto é um canal de luz e expectativas muito boas no amanhã para se tornarem grandes cidadãos ou atletas profissionais”, afirma.

Conquistas 

Apesar de somar mais de 60 títulos desde a fundação contabilizando todas as categorias, o tque o projeto mais se orgulha em apresentar é o de serem  “campeões de Influenciar na formação do cidadão de maneira positiva buscando a inclusão social através de iniciativas e ações interação social cooperativa e competitiva de forma consciente e reflexiva”, como está definido no site oficial do projeto.

Mas além dele, é importante mostrar também algumas conquistas alcançadas dentro das quatro linhas. O time já foi campeão da Copa FAFERJ no Maracanã (1998), da Blue Cup. sub 17 e sub 13 (2016 ),  vice campeão da Zico Sub 13 (2016), vice campeão Carioca Sub 17 (2013), pentacampeão da Copa Roberto Dinamite (2004, 2006, 2007, 2009 e 2010), campeão da Copa Carioca Sub 13 e sub 15 (2018), entre outros título internos disputados dentros de outras favelas. 

Para ajudar a equipe basta doar qualquer valor para chave pix [email protected]

Morre a acadêmica Nélida Piñon

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A frente de seu tempo, escritora foi a primeira mulher a presidir a ABL

Por: Hélio Euclides e Jorge Melo

Editado por: Amanda Célio

O mês de dezembro vai terminar mais triste. Em Lisboa, capital de Portugal, morreu neste sábado (17), aos 85 anos, a escritora Nélida Piñon. A causa foi em decorrência de complicações após uma cirurgia realizada há dez dias para tentar conter um problema nas vias biliares. Ocupante da Cadeira 30 da Academia Brasileira de Letras (ABL), para qual foi eleita em 27 de julho de 1989, ela foi a primeira mulher a presidir a entidade em 100 anos. 

Nélida Piñon era jornalista, romancista, contista e professora. A acadêmica escreveu 25 obras que foram traduzidos para inúmeros países. Ela recebeu 23 prêmios, entre eles o Jabuti, ao longo de 61 anos de carreira. Sua estreia na literatura foi com o romance Guia-mapa de Gabriel Arcanjo, publicado em 1961. Com vasta bibliografia, suas obras – entre romances, contos, ensaios, discursos, crônicas e memórias – foram traduzidas em mais de 30 países. Foi eleita para uma cadeira da Academia Brasileira de Letras (ABL) em 1989 e tornou-se a primeira mulher, a presidir a ABL, no ano de seu centenário. Sua última obra publicada foi o romance Um Dia Chegarei a Sagres, lançado em 2020. Piñon deixa uma obra inédita, Os Rostos que Tenho, que deve ser lançada em 2023. 

Biblioteca comunitária da favela Marcílio Dias leva nome da escritora

Nélida esteve por duas vezes na Maré, em 2011 e 2019, onde visitou a biblioteca comunitária que leva o seu nome, na favela de Marcílio Dias. A primeira visita ocorreu na tarde de 11 de maio, comemorando o quarto aniversário da biblioteca. Essa visita teve a parceria da Redes da Maré. “Esse ato de trazer a escritora é louvável, vai marcar a história”, destacou o professor de história, Edson Diniz que, na época, era diretor da Redes da Maré. A escritora recebeu uma placa como homenagem. “A palavra é fundamental, coloquei nos livros e assim me expressei, por isso que estou aqui”, comentou a acadêmica em visita a Marcílio Dias.

No ano passado, Nélida deu uma entrevista exclusiva ao Maré de Notícias sobre o Dia Mundial do Livro. Ela contou que estava ansiosa pelo fim da pandemia e a possível terceira visita a biblioteca. “Leitores, tenho a maior admiração pelos fundadores da Biblioteca Comunitária Nélida Piñon, na Maré. Quando tudo isso passar, eu quero estar junto para uma troca de saberes”, expôs. 

Segundo a ABL, o sepultamento ocorrerá no mausoléu da Academia, que fará uma Sessão da Saudade no dia 2 de março de 2023, no Salão Nobre, em homenagem à autora. Nélida não teve filhos, mas deixou uma legião de leitores que admiravam essa escritora que sempre teve vontade de revelar a alma brasileira. “Estamos arrasados, e órfão culturalmente”, resume Geraldo de Oliveira, coordenador da Biblioteca Comunitária Nélida Piñon. 

Mareenses temem tormento das quedas de energia

Com a chegada do verão, moradores revivem a insegurança e o medo provocados pela instabilidade das instalações elétricas

Por Hélio Euclides

 “Vem chegando o verão/ O calor no coração”. A música Uma noite e meia, composta por Renato Rocketh e eternizada na voz da cantora Marina Lima, anuncia a proximidade da nova estação. Mas em parte da Maré, o que os moradores sentem no coração quando chega o verão é o medo de ficar no escuro. Uma das favelas mais prejudicadas é a Salsa e Merengue. 

“O verão todo ano é sinônimo de falta de luz à noite. Quando acaba geral, ainda é sorte. Certa vez foi embora apenas uma fase, foram 15 dias de tormento. A solução foi fazer uma vaquinha para comprar o cabo e um eletricista da comunidade colocar no lugar. O descaso é visível: são postes ainda de madeiras, outros tortos e cabos velhos cheios de remendos”, reclama uma moradora que preferiu não se identificar.

A coordenadora do Eixo de Direitos Urbanos e Socioambientais da Redes da Maré, Shyrlei Rosendo, quer “saber da Light como está a carga de energia, pois quando chega o verão falta luz direto. Isso ocorre pelo aumento a cada ano no número de habitantes da Maré e o fornecimento de energia precisa acompanhar isso”. 

Nem todas as favelas sofrem dos apagões. Luiz Gustavo, morador da Baixa do Sapateiro, diz que o fornecimento de energia é bem diferente na favela onde mora e naquela onde trabalha. “Na Vila dos Pinheiros a queda de luz é frequente. Falta por cerca de dois minutos e volta com toda a força. Acho que isso foi o que queimou a placa de um computador”, relata. 

O Parque União é outro lugar onde a falta de luz é constante. Isso é o que confirma Caitano Silva, social mídia da associação de moradores: “Pelo menos, sempre que é preciso a associação consegue falar com a concessionária. O atendimento às vezes demora; já chegou a sete horas de espera.” 

Melhoria depende do CEP

Francesca Pilo, pesquisadora de pós-doutorado na Universidade de Amsterdã, na Holanda, é a autora do estudo de 2016 Consumo de energia elétrica nas favelas e a transformação de “consumidores em clientes”. Nele, há o relato do ocorrido na favela Santa Marta em 2010, quando a antiga rede de distribuição foi substituída por uma subterrânea. A nova rede ganhou 3.200 quilômetros de cabos, 19 transformadores e 63 postes de fibra substituindo os antigos, de madeira. A obra dobrou a capacidade de distribuição de energia e levou a melhorias na qualidade do serviço. 

Enquanto em 2009 a interrupção do fornecimento de energia foi de 29 horas, em 2011 faltou luz por oito horas durante o ano inteiro. Entretanto, a qualidade do serviço ainda não se aproxima ao do bairro de Botafogo, que experimentou pouco mais de duas horas de interrupção do fornecimento de energia no mesmo período.

A diferença no tratamento a depender do CEP dentro do município ficou bem caracterizado quando os centros de alguns bairros, incluindo Bonsucesso, foram submetidos a uma intervenção urbana no período de 1995 a 2000. O Projeto Rio Cidade previa a modernização dos serviços, como o cabeamento de telefonia, iluminação pública e fornecimento de energia. Toda a fiação foi trocada e passou a ser subterrânea. 

Se em Bonsucesso foram instalados 4.670 metros de dutos da Light, as favelas continuaram a viver sob um grande emaranhado aéreo de fios e cabos remendados, trazendo riscos aos moradores. 

Distração fatal

Na Maré, o crescimento vertical levou à perigosa proximidade entre algumas casas e os cabos de energia. Os pedreiros são os mais prejudicados, trabalhando com possibilidade de acidentes. Nestes casos, uma distração pode ser fatal. 

Foi o que ocorreu em abril de 2012 com o pedreiro Paulo Roberto do Carmo. Ele realizava obra no Parque União quando escorregou do andaime e caiu por cima dos fios. Na época, a Light informou que havia sugerido a interrupção da obra, porque só assim seria possível realizar o devido isolamento. O Corpo de Bombeiros alerta que, ao trabalharem próximo à rede elétrica, pedreiros liguem para a Light para que a concessionária desligue a rede elétrica ou isole os cabos.

Mas não são apenas os profissionais responsáveis por obras que sofrem com o descaso com as instalações elétricas nas ruas. Em setembro de 2021, uma menina de sete anos queimou-se seriamente ao chegar perto de um cabo de média tensão no Salsa e Merengue. Ela acabou perdendo um braço e três dedos do pé.

“Foi tudo rápido, eu estava instalando uma porta quando ela subiu para o terraço, pegou um pedaço de ferro e o aproximou do fio — nem chegou a tocar”, conta Danilo dos Santos Pinheiro, pai da menina. Ele reclama que os cabos de energia da favela são desencapados e a rede precisa de uma reformulação. 

“A minha luta hoje é para que a Light faça alguma coisa em relação ao cabeamento que, por ser antigo, não tem mais isolamento. Já são cinco acidentes com mutilações no Salsa e Merengue; duas pessoas morreram. Espero que isso não venha a acontecer com outros inocentes”, diz ele.

Danilo critica a Light por não fazer nada com relação à filha dele: “Tive que arcar com todas as despesas. Sei que nenhuma quantia vai reverter o dano que foi causado à minha filha.” Sua mulher, Angélica Pinheiro, também se sente desamparada. “Eles têm conhecimento dos riscos e não fazem nada para trocar os cabos. Quantas pessoas ainda vão ser mutiladas ou mortas para que se faça algo?”, questiona. 

Vista encoberta por fios já começa a ser eliminada em algumas partes do Rio de Janeiro, mas mudança ainda não chegou na favela – Foto: Elisângela Leite

Oscilação incendiária

Este ano, os moradores do Bloco 4 do Conjunto Pinheiros passaram por um susto quando o quadro de luz pegou fogo. Muitos tiveram que pular pela janela ou sair pelo buraco do ar-condicionado para fugir do fogo e da fumaça tóxica que tomou conta do lugar. 

“Aqui a energia oscila muito, essa variação pode ter ajudado no acidente. Por sorte não houve vítimas. A recuperação do quadro ficou em cerca de R$ 20 mil, e há uma promessa de que isso seja incluído na reforma dos prédios feita pelo governo do Estado”, conta o morador Francisco Ricardo.

O susto mais recente aconteceu no último dia 17 de novembro: um poste em frente à Escola Municipal Tenente General Napion, em Roquete Pinto, pegou fogo, assustando alunos e funcionários. A unidade teve que interromper as aulas. Uma professora que preferiu não se identificar disse que a Light chegou duas horas depois do chamado. 

“Tivemos que cancelar a participação de algumas instituições na Feira de Ciência Integrada Etnicorracial, que ia acontecer no dia seguinte. Pelo horário, ficamos com medo de a luz não voltar. Foi feita uma ligação direta pela empresa, pois o relógio de luz não suporta o uso da unidade. Não conseguimos usar o ar-condicionado nas salas, pois a Light até hoje não colocou um medidor ideal que comporte a carga”, explica a professora.

A Light informou que existe um elevado número de ligações clandestinas na localidade que impactam na qualidade do fornecimento de energia, o que explica as oscilações de energia reportadas. A empresa tem um plano de manutenção permanente da sua rede e só atua em localidades onde exista segurança para que  seus técnicos trabalhem.

Corrente do bem na Maré

Conheça coletivos que realizam campanhas de solidariedade por um Natal mais feliz nas favelas 

Por Samara Oliveira

O Natal é uma festa que representa amor, solidariedade, perdão e harmonia, e isso se concretiza o ano inteiro pelas ações de gente como Rafael Lima, Jeferson Costa, Rosângela Mello, Silvia Regina e Alusca Cristina. Através de coletivos e projetos que se empenham em fazer a vida das pessoas do conjunto de favelas da Maré um pouco melhor.

Com ações durante todo o ano, as iniciativas ganham ainda mais força em dezembro, com ceias coletivas, apadrinhamentos e a chegada de novos engajados para somar esforços. Nesta edição, o Maré de Notícias apresenta alguns desses coletivos, projetos e voluntários que fazem a diferença.

Maré Solidária

Fundado em 2017 por Rafael Lima, de 34 anos, o projeto Maré Solidária tinha como público-alvo a população idosa da Maré. No entanto, enxergando também as demandas de outros públicos, ele expandiu suas ações para gente de todas as idades. Entre os serviços prestados pelo coletivo durante o ano estão assessoria jurídica, distribuição de quentinhas para população em situação de rua, serviços básicos de saúde com aferição de pressão e glicose, festa do Dia das Crianças, distribuição de fraldas geriátricas e empréstimos de muletas, cadeiras de rodas e de banho. 

Para o fim de ano, o Natal Solidário arrecada e distribui brinquedos para crianças previamente mapeadas. “Às vezes as doações não conseguem chegar em alguns pontos porque a Maré é muito grande, aí vamos de carro até esses locais. Assim fazemos os brinquedos chegarem às mãos da molecada”, explica Rafael.

Mais informações, doações ou ajuda:
Instagram: @maresolidaria_sejaluz

Maré Solidária

Espaço Tijolinho

Jefferson Costa, de 28 anos, é mais conhecido como Shaolin nas aulas de jiu-jitsu que ministra no projeto no Tijolinho, na Nova Holanda. Ele olhou além dos tatames onde treinam os 200 alunos divididos entre as práticas de jiu-jitsu, caratê e luta livre. Há cerca de três anos, Jefferson e sua equipe decidiram que, em dezembro, seria servida uma ceia para todos os alunos. A ideia veio depois de um trabalho de acompanhamento individual de cada atleta realizado por uma voluntária, Viviane Melquiades.

“Ela faz o acompanhamento de todos os nossos alunos e alunas e se deparou com a insegurança alimentar de muitos atendidos. Daí veio a ideia de oferecermos uma ceia de Natal para fortalecer o vínculo do nosso grupo”, relembra o educador esportivo.

A Ceia Solidária é realizada no próprio prédio onde acontecem as aulas e conta com apoio de voluntários para custear a celebração de fim de ano. “Eu sou fruto do desenvolvimento pessoal através do esporte, cria do Tijolinho. Há sete anos criei o espaço para mudar a perspectiva dos favelados, elaborar novas referências no território e ressignificar ser ‘cria do Tijolinho’ — o que, para muitos, era uma vergonha. Hoje, eu vejo crianças e jovens falando com orgulho do lugar onde elas treinam”, diz Jefferson. 

Mais informações, doações ou ajuda:

Instagram: @espacotijolinho

Telefone: (21) 97573-1481

Espaço Tijolinho

Juntos e misturados 

Tudo começou há cerca de dez anos, quando Rosângela Mello, hoje com 39 anos e técnica de enfermagem, precisou de uma cadeira de rodas para sua sobrinha com deficiência. A cadeira custava R$ 3 mil e Rosângela, trabalhando numa imobiliária na época, não tinha condições de comprar. 

Através do dono da loja que trabalhava, ela conheceu uma pessoa chamada Everaldo Souza, conhecido como Rony, que, ao saber da história, ofereceu ajuda. Depois de conseguir a cadeira que precisava e reconhecendo a mesma necessidade de outras famílias na Maré que têm crianças com deficiência, Rosângela se uniu ao marido, a amigos e ao Rony para, todo fim de ano, arrecadar cestas básicas e material de higiene para famílias previamente cadastradas do Conjunto Esperança e das vilas do Pinheiro e do João.

“Eu só posso sentir gratidão. Um dia eu fui ajudada e hoje eu estou ajudando o Rony a ajudar. Estar nesse evento é uma coisa muito grandiosa, assim como é ver o sorriso das pessoas, que às vezes não tem o que comer, ao receberem uma cesta básica”, conta. 

Rosângela e sua família também trabalham de forma voluntária no combate à fome durante o ano, distribuindo quentinhas todo mês para moradores da cena de uso de drogas na Rua Flávia Farnese, na Nova Holanda. 

Mais informações, doações ou ajuda:

Telefone:  (21) 97212-9231 (também chave PIX) 

Juntos e misturados

Projeto Bela Herança 

Esperança de que, através da educação e da dedicação a estas crianças, sejamos capazes de derrubar o muro erguido pela sociedade individualista e fria” — esse é o principal motivo que faz a professora Silvia Regina, de 51 anos, dar continuidade à iniciativa “Eu também faço parte desta família”, do projeto Bela Herança. Ela atua há três anos em Marcílio Dias (território mais conhecido como Kelson’s pelos moradores), e a ação de fim de ano é a de apadrinhamento das crianças.

“No primeiro ano atendemos 113 crianças; no seguinte esse número foi menor, mas este ano vamos ver o que Deus vai preparar para a gente. A ajuda que temos ainda é pequena, não temos apoio governamental ou empresarial; contamos muito e apenas com doações individuais”, conta Silvia. 

Ela distribui para cada criança roupas, calçados, um kit de higiene e um brinquedo. Além do apadrinhamento no fim do ano, o Bela Herança abre as portas do seu espaço na Kelson’s para o Hotelzinho da Criança, que funciona como uma creche comunitária, oferecendo aulas de alfabetização, de reforço escolar e de balé. 

Mais informações, doações ou ajuda:

Instagram: @projetobelaheranca
Telefone: (21) 98803-7072 (também chave PIX)

Projeto Bela Herança

Especiais da Maré

Mãe de uma criança com deficiência, Aluska Cristina, de 33 anos, viveu até o ano passado no conjunto de favelas da Maré e, apesar de ter se mudado, mantém a Associação Especiais da Maré, que fundou há quatro anos. A organização funciona com doações de voluntários e atende 500 famílias cadastradas de diversas comunidades do território.

O projeto auxilia as famílias na busca por tratamento e também com doações de roupas, alimentos, fraldas, brinquedos e cadeiras de rodas. No fim do ano, realiza a campanha Natal Solidário, com o objetivo de distribuir cestas básicas para os moradores. 

“Acolher essas famílias, oferecer informações, incentivar a troca de experiências e o amor são o que nos motivam a continuar com esse projeto. Também temos um sonho de abrir um centro de reabilitação aqui para Maré que possa dar assistência às pessoas com deficiência e suas famílias”, contou Antônia Maria Souza Pirangi, 42, integrante do projeto. 

Mais informações, doações ou ajuda:
Instagram: @especiaisdamare.

Para ajudar com doações, basta doar qualquer valor para a chave Pix 11362434701, de Antônia Maria.

Especiais da Maré