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Projeto Na Régua surge como oportunidade para moradores de favela reformarem suas casas

Mobilização traz parceria do Estado com Universidade Estadual do Rio de Janeiro, a UERJ

Por Hélio Euclides e Jorge Melo, em 17/03/2022 às 07h. Editado por Edu Carvalho

Diante do gênio da lâmpada e da possibilidade de fazer um desejo, parte dos brasileiros certamente trariam como demanda a realização da casa própria, além da mobília e reformas (para aqueles que já possuem um imóvel). Na vida real o sonho pode virar pesadelo, pois a inflação e os juros altos causam impacto nas finanças familiares e empurram os cidadãos para o aluguel. As exigências para os financiamentos imobiliários para a baixa renda são muitas. Para quem já tem sua casinha , o desafio é reformá-la e deixar com a cara dos proprietários, da escolha do cimento, passando pelos tijolos até chegar ao acabamento. 

Foi pensando nessas questões, que o governo do estado do Rio de Janeiro, em parceria com a Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), criou o projeto Na Régua, que oferece assistência técnica e reformas para até 15 mil imóveis em favelas.

A iniciativa do governo do estado traz esperança para as favelas assistidas pelo projeto, que faz parte do Programa Casa da Gente, lançado em setembro do ano passado, que prevê investimento de cerca de R$ 100 milhões. O projeto oferece assistência técnica e intervenções para melhorar as condições das habitações e a salubridade de casas em locais vulneráveis da cidade do Rio de Janeiro e da Baixada Fluminense.Nesta etapa, serão inseridas famílias de baixa renda das seguintes favelas: Brás de Pina, Buriti Congonhas, Cajueiro, Mangueira, Parque Acari, Maré (Rubens Vaz e Marcílio Dias), Providência, Rocinha e Serrinha. Já na Baixada Fluminense, o projeto já está em atuação no Morro da Paz, Kisuco e Vila Coimbra, no município de Queimados.

O projeto Na Régua construirá 50 mil casas nos próximos cinco anos e reformará 60 conjuntos habitacionais no decorrer de 12 meses A Secretaria de Estado de Infraestrutura, em cooperação técnica com a Uerj, dará oportunidade para jovens do sistema de cotas, alunos de graduação e pós-graduação, para desenvolverem suas habilidades e competências. 

As atividades vão desde o censo nas comunidades até a instalação de escritórios de Arquitetura e Engenharia de família, que contarão com assistentes sociais e demais técnicos. A expectativa é elaborar cerca de 10 mil projetos de reformas, que serão aprovados  com a participação dos moradores. Jeniffer Caroliny de Souza Carneiro, moradora da Nova Holanda, que atua no projeto está vendo o território com outro olhar. “Vejo que é um projeto interessante, onde ajudará pessoas que realmente precisam, que realmente vivem em situações de extrema vulnerabilidade, onde traz esperança para essas pessoas em ter uma moradia com mais dignidade. Fazendo as entrevistas, tenho visto muitas casas, muitas pessoas em situações que nunca pensei existir aqui e que tá tão do nosso lado assim”, comenta.

Serão atendidas famílias que tenham renda de até três salários mínimos, que possuam um único imóvel e residam há pelo menos três anos no local. Terão prioridade famílias que se encontram na faixa de vulnerabilidade extrema; chefiadas por mulheres; idosos; pessoas com deficiência; pessoas com doenças respiratórias crônicas ou de fácil disseminação. Estão aptos a receber a assistência técnica gratuita com arquitetos e engenheiros de família, todo morador da favela com renda inferior a seis salários mínimos, que seja proprietário. 

Em três meses de trabalho, a equipe de pesquisadores do Projeto Na Régua já realizou mais de oito mil entrevistas em residências espalhadas  por 13 das 18 favelas que serão beneficiadas pela iniciativa. Até o final do primeiro trimestre deste ano, o Governo do Estado pretende finalizar o Censo de Inadequação Habitacional. Um dos pesquisadores do projeto é Rubens Izidoro Blanc, morador da Nova Holanda, que atua na favela de Marcílio Dias. Ele trabalhou antes no projeto Territórios Sociais e conheceu as outras favelas que fazem parte da Maré. “Me sinto gratificado por fazer parte de um projeto que promove melhorias no conjunto de favelas em que sou nascido e criado”, diz. 

O projeto propõe discutir com as famílias as melhorias que serão implementadas, ouvindo e aprendendo com cada território sobre as suas necessidades. A ideia é elaborar propostas arquitetônicas práticas e criativas, de acordo com a especificidade de cada lar. Os serviços de adequação levarão em conta a salubridade, o reforço estrutural, o conforto ambiental e a adequação sanitária.

“O projeto traz grandes benefícios para a comunidade, uma vez que tem a perspectiva de levar dignidade às moradias, fazendo melhorias habitacionais em residências nas favelas participantes. No momento o projeto está na fase de assistência técnica. Os arquitetos e engenheiros estão fazendo adequações de reformas para os moradores que querem ter esses projetos em mãos.” 

Rubens Izidoro Blanc, morador da Nova Holanda

Para mais informações, os moradores da Maré são convidados a participar de uma reunião no dia 23 de março, às 18h, na quadra da Escola de Samba Gato de Bonsucesso, que fica na Rua São Jorge, s/nº, Nova Holanda. 

Lar doce lar

Alguns programas de TV que realizam a reforma na casa dos telespectadores participantes das promoções. Um tipo de assistencialismo que atinge poucos. A maioria das pessoas, apesar do grande esforço, precisa, muitas vezes escolher entre elementos básicos, como alimento, ao cimento e tijolos. 

A coordenadora de estudos da construção da FGV, Ana Maria Castelo, em entrevista à revista Exame declarou que houve queda da oferta e da demanda de materiais no fim do ano. Segundo ela, as famílias vinham procurando materiais para reformas e pequenas obras domésticas, mas a inflação generalizada passou a inibir o consumo. Os lojistas estão tendo de driblar a alta de preços que, de acordo com a Federação das Associações dos Comerciantes de Materiais de Construção (FECOMAC), subiu entre 50% e 80% nos últimos dois anos. Os preços das tintas, por exemplo, subiram em razão da alta de preço das resinas, com variação atrelada ao dólar.

Desde o início da pandemia os materiais de construção vêm registrando forte aceleração. O Índice Nacional de Custo da Construção, apurado pela Fundação Getúlio Vargas, mostra que de julho de 2020 a junho de 2021, a alta acumulada foi de 32,92%, praticamente quatro vezes a inflação. Os materiais de construção como areia, tijolo, telha, brita, entre outros, registram aumento ao longo do período da pandemia e demonstram que deve demorar para que ocorra redução no preço. 

De acordo com dados do Índice Nacional da Construção Civil (INCC), apurados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o custo nacional da construção, por metro quadrado chegou a R$ 1.421,87 em junho, sendo R$ 829,19 de materiais e R$ 592,68 de mão de obra.

A situação habitacional 

É possível perceber visualmente que a quantidade de pessoas em situação de rua aumentou com a pandemia. Segundo dados da Secretaria Municipal de Assistência Social da cidade do Rio de Janeiro, de outubro de 2020, foram identificadas 7.272 pessoas em situação de rua. Muitos sentiram o peso do aluguel, principalmente os de menor renda.

Uma pesquisa da Fundação João Pinheiro mostrou que em 296 mil moradias do estado do Rio de Janeiro, às famílias que ganham até três salários-mínimos gastam pelo menos 30% da sua renda com aluguel. Uma das soluções seria um Programa Habitacional para a população mais vulnerável. Um levantamento da Prefeitura do Rio mostrou que na região central da cidade existem 877 imóveis vazios ou subutilizados. Imóveis que poderiam ser usados num programa popular de moradia.

Um dos caminhos possíveis para reduzir o déficit habitacional nas faixas de renda menor seria a utilização do Fundo Estadual de Habitação de Interesse Social (FEHIS), que vem dos royalties do petróleo produzidos no estado do Rio de Janeiro. Esse fundo foi criado em 2007 com o objetivo de centralizar e gerenciar recursos orçamentários para a implementação de políticas habitacionais direcionadas à população de menor renda. 

Pesquisa realizada pelo Instituto Locomotiva, em parceria com o Data Favela e a Centra Única das Favelas (Cufa), mostrou que cerca de 8% da população brasileira mora em favelas, num total de 17,1 milhões de pessoas. Segundo o último Censo Demográfico realizado pelo IBGE, o número de domicílios em favelas no Brasil é de 5,12 milhões, sendo o Rio de Janeiro a cidade com mais pessoas vivendo em logradouros deste tipo: 1,39 milhão de pessoas, ou seja 22,16% da população. Diversas dessas áreas estão localizadas em regiões sujeitas a deslizamentos. Um exemplo foi o Morro da Oficina, em Petrópolis, que não suportou as chuvas, o que causou uma tragédia com desabrigados e mortos. 

Os escritórios regionais 

O projeto Na Régua tem como uma das etapas a instalação de um escritório de assistência técnica em cada favela. Até o momento já são 12 escritórios para oferecer assistência técnica à comunidade, para elaboração dos projetos, gerenciamento das reformas e acompanhamento das famílias. Veja abaixo os locais dos escritórios que funcionam de segunda à sexta-feira, das 9h às 18h. 

  • Rua General Bento Ribeiro, nº 4 – Fundação Leão XIII, Mangueira.
  • Rua da Bica, nº 29 – Impacto das Cores, Providência.
  • Rua Mestre Darcy do Jongo, nº 162 – Serrinha.
  • Travessa Central do Sossego, 39 – Associação dos Moradores do Cajueiro.
  • Rua Macunaíma, nº 209 – Buriti Congonhas, Vaz Lobo.
  • Avenida Lobo Júnior, nº 83 – Marcílio Dias. 
  • Rua Guaiuba, nº 210 A – Acari.
  • Rua João Araújo, nº 117 – Associação de Moradores do Conjunto Rubens Vaz. 
  • Autoestrada Engenheiro Fernando Mcdowell, nº 15 – Ciep 303 Ayrton Senna da Silva, Rocinha. 
  • Rua 51, quadra D3 – Associação de Moradores da Santa Edwiges.
  • Avenida Irmãos Guinle, 1497 – salas 104, 106 e 108 – Centro, Queimados.

Artigo: A importância de se falar em mudanças climáticas nas favelas

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Por Julia Rossi, em 16/03/2022 às 12h25.

Hoje é o dia nacional da conscientização sobre as mudanças climáticas e, apesar desse tema parecer às vezes distante do nosso cotidiano, ele está mais próximo do que imaginamos. O clima é sentido por nós de várias maneiras, seja na temperatura ambiente, nas condições do tempo, como chuvas, seca e sol intenso. Essas variações do clima são naturais, mas as ações humanas têm intensificado cada vez mais esses eventos climáticos extremos como enchentes, deslizamentos de terra e altas temperaturas.

 O Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) divulgou no mês passado um relatório que detalha os impactos, riscos e adaptação das mudanças climáticas nas cidades, onde vive mais da metade da população mundial. E não temos dúvidas que quando se fala em cidade, as favelas sempre são os territórios mais afetados, e com meio ambiente não seria diferente. Além do direito à educação, saúde, segurança pública, também precisamos pautar o direito ao meio ambiente nas favelas, que está relacionado ao esgotamento sanitário, a qualidade do ar, o abastecimento de água, a drenagem das chuvas e a gestão adequada dos resíduos sólidos.

Na Maré temos dados alarmantes sobre as questões climáticas. Segundo o documento da Coppe/UFRJ sobre as estratégias de adaptação às mudanças climáticas da cidade do Rio de Janeiro, que identificou o potencial de exposição e a avaliação de vulnerabilidade de todas zonas da cidade, a região onde estão as 16 favelas  da Maré  possui uma propensão muito alta a inundações e altas temperaturas. Essas transformações ambientais, que estão cada vez mais nítidas, já afetam a vida de muita gente e existem ações e políticas que podem contribuir para que esse impacto não seja tão severo para essas populações mais expostas.  As perdas materiais e humanas decorrentes de enchentes e deslizamentos, bem como complicações de saúde devido a má qualidade do ar e da água são exemplos desses impactos na vida dos moradores de favela.  

Figura 1: Mapa do Rio de Janeiro onde a Maré se encontra na região em vermelho onde as temperaturas são mais altas.

A responsabilidade de garantir saneamento básico adequado, é do Estado. A sociedade civil, como a Redes da Maré e outras instituições localizadas no território tem dentre outras tarefas, cobrar junto aos moradores para que ele, Estado, cumpra esse papel. Nesse sentido, que a Redes por meio do Eixo eixo de direitos urbanos e socioambientais (Dusa) que vem se estruturando na Redes da Maré a partir das experiências do eixo de desenvolvimento territorial, vem realizando encontros de saneamento com especialistas e moradores para construir uma agenda para o saneamento que se materializou na Carta de Saneamento.  

Essa carta faz parte das agendas locais 2030 em parceria com a Casa Fluminense e foi direcionada para os candidatos das eleições municipais. Além de contribuir com a conscientização sobre a importância do direito ao saneamento para a diminuição dos impactos das crise climáticas, a carta é um material construído de forma participativa com demandas para implementação de políticas públicas. 

A Campanha Climão também é um exemplo de ação que objetiva chamar a atenção da comunidade para as mudanças climáticas nas favelas. Os personagens trazem características do território e discutem as questões ambientais a partir de temas como racismo ambiental, ilhas de calor, poluição atmosférica, dentre outros assuntos relacionados com mudanças climáticas. Além dos materiais digitais que circularam pelas redes, também foram feitas impressões de lambe lambe para colar nas ruas da Maré 

Figura 2: Personagens da Campanha Climão Chuveirão, GuaraVitinho, CarangueiJão e Dona Faveleira.

Esse ano teremos uma série de eventos e datas importantes que apontam para a emergência políticas que atendam às populações em maior vulnerabilidade social nesse contexto de eventos climáticos recorrentes. No Rio de Janeiro vai acontecer a Cúpula dos povos dos dias 25 a 27 de maio, e a Rio 2030 dos dias 5 a 11 de junho, espaços importantes para se discutir e propor medidas efetivas para que as populações das favelas tenham seus direitos efetivados e não sofram com impactos da crise climática. 

Nesse mês, a Redes da Maré fez aniversário no dia internacional das mulheres,dia 8 de março, e está organizando uma série de atividades. Sabendo da importância do papel que as mulheres da Maré tiveram e continuam tendo para conquista de direitos desse território, o Eixo Dusa organizou uma ação para chamar atenção para as mudanças climáticas. Uma das questões que mais atinge os moradores são as enchentes e alagamento das ruas e casas. Como a Maré já foi mar na época das palafitas, resgatamos essa ideia a partir da pintura e desenhos nos bueiros, locais importantes para o escoamento da água que permite não encher as ruas. Por isso a necessidade de haver uma limpeza periódica dos bueiros por parte da COMLURB e o não fechamento desses bueiros por parte do morador. 

Figura 3: Pintura dos bueiros na atividade “A Maré começa aqui” 

Além de direitos que reivindicamos diariamente para a Maré ter direito à educação de qualidade, saúde e segurança pública, é fato que nós precisamos também de ruas mais limpas e mais iluminadas, que nossas praças sejam preservadas, que haja saneamento adequado e para todos, bem como espaços mais arborizados na Maré.

Para saber mais sobre como ficou essa intervenção nos bueiros “A Maré começa aqui” acesse as redes sociais da Redes da Maré e para entender mais sobre o tema das mudanças climáticas nas favelas acesse nossos materiais: https://linktr.ee/CampanhaClimao 

Julia Rossi – Pesquisadora e coordenadora de projeto do eixo Direitos Urbanos e Socioambientais (Dusa) da Redes da Maré.

Seminário gratuito aborda a importância da educação antirracista no Brasil

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Evento on-line reúne profissionais de educação, comunicação e juventude

O Projeto Seta (Sistema de Educação por uma Transformação Antirracista) promove nas datas 17 e 18 de março, o Seminário “Seta – Caminhos Possíveis: por uma educação antirracista no Brasil”, que reúne profissionais da educação, comunicação e jovens ativistas para abordar temas ligados à pauta antirracista. Os debates poderão ser acompanhados no Youtube da ActionAidnoBrasil.

O evento faz parte da campanha de lançamento do Projeto SETA, que tem como foco a construção de um sistema de educação pública antirracista no Brasil e contará com participação de nomes importantes, como Thuane Nascimento, do PerifaConnection, Jaqueline Santos, doutora em Antropologia Social pela UNICAMP, Arathi Sriprakash, da Universidade de Bristol, Luciana Viegas, do Movimento Vidas Negras com Deficiência Importam, Fernanda Barros, professora Adjunta no Núcleo de Estudos de Políticas Públicas em Direitos Humanos (NEPP-DH), entre outras pessoas de referência.

O Projeto Seta é uma aliança inovadora, com sete organizações da sociedade civil nacional e internacional: ActionAid, Ação Educativa, Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ), Geledés – Instituto da Mulher Negra, Makira-E’ta e a Uneafro Brasil. O Seta é um dos finalistas da ação global da Fundação Kellogg para promoção da equidade racial (Racial Equity 2030).

Seminário “Seta – Caminhos Possíveis: por uma educação antirracista no Brasil”

Programação (17/03)

09h30 – Seminário de abertura e lançamento do conselho consultivo

Presencial para convidados/as

Local: Museu do Amanhã (Rio de Janeiro)

Participantes: Alexsandro Santos, Escola de Parlamento da Câmara Municipal de São Paulo, Ana Paula Brandão, ActionAid Brasil, Raull Santiago, PerifaConnection e represetantes de todas as organizações parceiras do projeto e convidados/as.

14h – Curso “Educação Antirracista e Juventude”

Curso online via transmissão no youtube da ActionAidnoBrasil

Palestrantes convidadas: Thuane Nascimento (Thux), PerifaConnection e Adriana Moreira, Uneafro Brasil

Mediação: Midiã Noelle, projeto Seta

Programação (18/03)

09h30 – Curso “Educação Antirracista”

Curso online via transmissão no youtube da ActionAidnoBrasil

Palestrantes convidadas: Jaqueline Santos, doutora em Antropologia Social pela UNICAMP e Arathi Sriprakash, da Universidade de Bristol

Mediação: Dandara Oliveira, projeto Seta

14h – Curso “Educação Antirracista e Inclusão”

Curso online via transmissão no youtube da ActionAidnoBrasil

Palestrantes convidadas: Luciana Viegas, Movimento Vidas Negras com Deficiência Importam e Ingrid Anelise, da Universidade de São Paulo (USP)

Mediação: Luciana Ribeiro, projeto Seta

16h – Curso “Educação Antirracista e Gênero”

Curso online via transmissão no youtube da ActionAidnoBrasil

Palestrantes convidadas: Fernanda Barros, Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e Givânia Conceição, CONAQ.

Mediação: Beatriz Amparo, projeto Seta

Pesquisa da Redes da Maré revela os impactos da covid-19 em escolas públicas das 16 favelas

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Análise traça revelador retrato da pandemia na educação na Maré

Por Adriana Pavlova, em 15/03/2022 às 09h30.

“Às vezes dá até vontade de desistir. Não desisti, continuei estudando, só que numa frequência bem menor do que eu estudava quando tinha as aulas.”(Aluna do 3º ano do Ensino Médio) 

“Eu não consegui, não estudei. Eu não vou ser falso, fingir que eu fui um ótimo aluno. Eu estou boiando nas aulas.” (Aluno do 7º ano do Ensino Fundamental II).

Os dois depoimentos corajosos acima são de estudantes de escolas públicas localizadas na Maré e fazem parte de uma ampla pesquisa realizada com alunos, seus familiares e educadores para tentar dimensionar os efeitos da covid-19 na comunidade escolar local, depois de quase dois anos de pandemia e de 20 meses de aulas remotas e híbridas. O estudo Covid-19 e o acesso à educação nas 16 favelas da Maré: impactos nos anos finais do Ensino Fundamental e no Ensino Médio, realizado pela Redes da Maré em parceria com o Instituto Unibanco, teve início em março de 2021, estendendo-se até setembro daquele ano. Num primeiro momento, foram realizadas 89 entrevistas aprofundadas, em 18 escolas públicas da região, com gestores públicos de educação do município e do estado do Rio de Janeiro, profissionais de educação (diretores, coordenadores pedagógicos e professores)  e alunos e seus responsáveis. 

Em seguida, foram aplicados 832 questionários: 630 entre alunos do 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental II e dos 1º, 2º e 3º anos do Ensino Médio; 101 entre responsáveis; e 101 entre profissionais de educação. Nessa fase, a pesquisa concentrou-se em 13 escolas públicas da Maré (nove municipais e quatro estaduais), incluindo estabelecimentos de Educação de Jovens e Adultos (EJA) e um de Ensino Técnico. Em 2019, cerca de 20 mil estudantes estavam matriculados nas 50 escolas públicas do conjunto. Naquele ano, as 13 escolas onde foram aplicados os questionários tinham 6.068 estudantes — o equivalente a cerca de 30% do total de alunos na Maré. Os números evidenciam os efeitos dramáticos da pandemia tanto na vida escolar de toda uma geração de estudantes mareenses, como também de seus professores e familiares. 

Entre os dados que mais chamam a atenção está a sensação de os estudantes terem perdido dois anos de aprendizagem. Três em cada quatro alunos contam que aprenderam pouco (48%) ou nada (26%), somando 74% do total. Mais da metade deles  ? 57% ? afirmou que sua vontade de estudar na pandemia diminuiu (33%) ou caiu muito (24%). Entre os motivos apontados pelos estudantes estão a dificuldade de adaptação ao ensino remoto (35%) e os problemas de aprendizagem (28%). No caso da saúde mental, 41% dos estudantes afirmaram terem sido afetados – 257 crianças e adolescentes enfrentaram algum tipo de sofrimento psíquico.

Moradores do Salsa e Merengue, a catadora de latinhas Jéssica Cristina Pinheiro e seus filhos Isaac e Pedro, de 14 e 15 anos, são rostos que ilustram esses números. Aluna do CEJA na Escola Erpídio Cabral, na Nova Holanda, Jéssica é categórica ao afirmar que a pandemia está deixando sequelas enormes nos estudos dela e de seus filhos: “Ninguém aprendeu nada. Nem eu, nem os meninos. E ainda esquecemos o que a gente sabia. Como não tínhamos telefone e nem internet, eles ficaram sem estudar. Às vezes, a gente conseguia falar com os professores pelo celular de um coleguinha”, diz ela, que foi beneficiada com o empréstimo de um tablet, do projeto Conectividade, da Redes da Maré, mas seguiu com dificuldades de comunicação. “O aplicativo Rioeduca era uma dor de cabeça só. Como vamos recuperar esses dois anos perdidos? Se eu tivesse condições, pagava uma explicadora para os meus filhos”, explica, referindo-se ao aplicativo lançado pela Prefeitura do Rio, que disponibilizava aulas ao vivo e gravadas, e materiais didáticos variados.

A pesquisa mostrou que 38% dos estudantes não acompanharam as atividades remotas. O motivo mais citado foi não ter entendido o que era pedido; o segundo motivo, a falta de internet e, em terceiro, a ausência de um dispositivo eletrônico. De acordo com 87% dos profissionais de educação, menos da metade dos alunos aderiu às atividades remotas. Um professor estimou que, “de uma turma de 30 alunos, cinco, quatro acessaram, quando muito”. Muitos estudantes usam o celular dos pais, o que os obrigava a esperar que o aparelho estivesse disponível, além de dividi-lo com os irmãos. A má qualidade da internet na Maré também foi mencionada como um fator complicador.

Pouco mais da metade (56%) dos profissionais de educação acredita que será possível reverter os efeitos negativos da pandemia na vida escolar de crianças e adolescentes. Para isso, eles sugerem aulas de reforço (55%); engajamento comunitário e parceria família-escola (48%); estratégias criativas e busca ativa (45%); e parcerias com instituições locais (43%).

Professora orientadora do Programa de Educação de Jovens e Adultos do CIEP Gustavo Capanema, Janete Trajano da Silva viu grande parte dos alunos matriculados sumir nos dois anos de pandemia. Em 2020, os professores sofriam para dar conta das novas ferramentas digitais de trabalho, e também fizeram um esforço para buscar cada um dos alunos e entender suas dificuldades. O recurso mais usado foi o Whatsapp. 

“O desafio foi manter os grupos ativos, porque é comum que eles troquem de número. Dos 200 estudantes matriculados em 2020, apenas 50 voltaram ao presencial em maio de 2021, porque muitos passaram a trabalhar à noite, na hora das aulas. Aos poucos, conseguimos trazer de volta 80 alunos. Foi um ano muito marcante para o EJA porque muitos alunos se viram sem perspectiva. Que horizontes é possível oferecer aos estudantes? Como transformar a informação em conhecimento num cotidiano tão difícil?” Para Janete, o ano escolar de 2022 na Maré deveria ser iniciado com um grande fórum sobre educação, para tratar das especificidades das escolas locais. “É preciso oferecer olhares diversificados sobre realidades tão complexas”, defende ela. 

Um dado muito impressionante da pesquisa é que 70% dos profissionais de educação disseram que sua motivação para trabalhar durante a pandemia diminuiu. Da mesma forma, 72% relataram o agravamento de problemas de saúde mental e emocional. Quase todos os respondentes (95%) pediram ajuda a colegas ou pesquisaram na internet para atuar remotamente.

Os resultados da pesquisa expõem o enorme desafio das escolas e do poder público neste início de ano letivo, ainda marcado pelas incertezas em relação ao coronavírus. O objetivo imediato é de compreender o contexto e qualificar o diálogo com as diferentes instâncias, sobretudo as secretarias municipal e estadual de educação, a fim de colaborar com políticas educacionais alinhadas às necessidades concretas dos moradores da Maré.

“A pesquisa evidencia o acirramento das desigualdades educacionais de moradores da Maré. Esse cenário só poderá ser enfrentado com uma política robusta não só dos órgãos responsáveis pela educação, como também através de uma perspectiva intersetorial que considere a participação efetiva dos pais e das instituições locais”, defende Andréia Martins, diretora da Redes da Maré e coordenadora do estudo. Ela espera “que, com esse trabalho, possamos trazer à tona questões fundamentais que interferem no desenvolvimento da Maré, mas que também podem ilustrar a realidade das periferias de diferentes estados brasileiros”.

Quatro anos sem Marielle Franco e Anderson Gomes

Por todo o país, mobilizações lembram a data e reivindicam a elucidação do crime

Por Edu Carvalho, em 14/03/2022 às 09h40. Editado por Dani Moura.

Dor, indignação, revolta e saudade. Esses são alguns dos sentimentos que marcam os quatro anos do crime que chocou o Brasil e o mundo. As perguntas seguem sem resposta: “Quem matou Marielle Franco e Anderson Gomes? Quem mandou matar Marielle e por quê? “

Marielle Franco se formou pela PUC-Rio, e fez mestrado em Administração Pública pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Sua dissertação teve como tema: “UPP: a redução da favela a três letras”. Iniciou sua militância em Direitos Humanos após ingressar no pré-vestibular comunitário e perder uma amiga, vítima de bala perdida, num tiroteio entre policiais e grupos civis armados na Maré, onde nasceu e cresceu.

Trabalhou em organizações da sociedade civil como a Brasil Foundation e o Centro de Ações Solidárias da Maré (Ceasm). Coordenou a Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) e construía diversos coletivos e movimentos feministas, negros e de favelas.

Marielle foi eleita a quinta vereadora mais votada da cidade em 2016, com 46.502 votos. Socióloga com mestrado em Administração Pública, foi assassinada junto com seu motorista Anderson Gomes dentro do carro com 13 tiros.

No início de fevereiro deste ano, foi a quinta vez que Polícia Civil confirmou a mudança do delegado que está à frente das investigações do crime.

Processo nesse momento

O Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) voltou a ouvir testemunhas, pessoas da família e que trabalhavam com a vereadora, e a analisar informações dos celulares apreendidos durante as apurações. O Ministério Público também disse que aguarda decisão do Supremo Tribunal Federal sobre recurso do Facebook contra o compartilhamento de dados de interesse para a investigação.

Ainda não se sabe por que e quem mandou matar Marielle. A força-tarefa do Ministério Público tenta desvendar quem foi o mandante do crime. Em agosto do ano passado, investigações deram conta de uma ligação de Ronnie Lessa com o ex-vereador do Rio Cristiano Girão. O parlamentar foi preso preventivamente em 2021, sob a acusação de ter participado com Lessa de um duplo homicídio — supostamente de um miliciano rival e esposa — praticado em 2014 na zona oeste do Rio. O MP na ocasião pontuou que a prisão não tinha relação com o caso Marielle e Anderson, mas o Deputado Marcelo Freixo ventilou nas redes que a prisão de Girão poderia ajudar na elucidação dos crimes.

Em junho do ano passado, o caso passou a ser acompanhado por um grupo formado pelo “Comitê Justiça por Marielle e Anderson”, que tem o Instituto Marielle Franco, a vereadora Mônica Benício (PSOL, viúva de Marielle), Agatha Reis (viúva de Anderson) e as organizações Justiça Global, Coalizão Negra por Direitos e Anistia Internacional.

Na última quinta-feira (10/3), o comitê esteve em reunião com Herdy, no Rio. Segundo a advogada Marinete da Silva, mãe de Marielle, o objetivo do encontro com o novo delegado foi “criar vínculo para que tenhamos informações sobre novidades em relação ao processo”.

Quem mandou matar Marielle e Anderson?

Em mais um 14 de março, haverá uma série de ações e atividades pedindo a resposta para a pergunta “Quem mandoui matar Marielle?”

Às 9h, em frente ao Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, no Centro do Rio, as famílias de Marielle e Anderson fizeram uma ação exigindo acesso aos autos e a solução do crime. Em seguida, às 10h30, houve uma missa na Igreja de Nossa Senhora da Candelária, organizada pela família de Marielle.

Às 15h, a família de Marielle junto ao Comitê Justiça por Marielle e Anderson, articulação das famílias de Marielle e Anderson com o Instituto Marielle Franco, o mandato da vereadora Mônica Benício, e as organizações Anistia Internacional Brasil, Justiça Global, Coalizão Negra por Direitos e Terra de Direitos, terá uma reunião com o Governador do Rio de Janeiro no Palácio Guanabara. Às 16h, o Comitê se reuniu com o Ministério Público do RJ.

No mesmo horário, o Festival Justiça por Marielle e Anderson, organizada pelo Instituto Marielle Franco – criado e dirigido pela família – acontece no Circo Voador, na Lapa. Haverá roda de conversa, oficina de escrita e apresentações musicais, abrindo com o maracatu do Cortejo Baque Mulher, seguido pela DJ Tamy, MC Martina e MC Zuleide. Engrossam o coro por justiça, artistas como Karol Conká, BK, Juçara Marçal, Marina Iris, Jéssica Ellen, Lellê e Doralyce. O encerramento será com o Bloco Malunguetu, que fez sucesso na inauguração do Instituto Marielle Franco em 2021.

Artigo: Eu, a pandemia e a Redes da Maré

Ao completar dois anos de pandemia, uma reflexão por quem esteve (e ainda está) na linha de frente, articulando medidas que amenizem os impactos da crise

Por Luna Arouca, em 13/03/2022 às 7h

Logo nas primeiras semanas da pandemia eu peguei covid. Na época, os laboratórios não tinham testes e eu fiquei isolada 14 dias, como muitos, sem saber meu diagnóstico. Meses depois, com o exame sorológico veio a confirmação da covid.

Quando voltei ao trabalho, a organização que trabalho, Redes da Maré, tinha se reconfigurado completamente. Todos os projetos tinham se redirecionado para apoiar prioritariamente a entrega de cestas básicas aos moradores nas 16 favelas do conjunto. A fome era urgente.

Inicialmente, fiquei na entrega de quentinhas para população em situação de rua, por conta do projeto que coordenava, o Espaço Normal, que atende esse grupo, além de pessoas que fazem uso abusivo de drogas. Com a consolidação desse trabalho e ajuda de muitos voluntários, fui apoiar a entrega das cestas que crescia em demanda e logística, trazendo desafios tecnológicos e sociais. Com as entregas, vinham as informações de pessoas contaminadas, sem acesso a exames ou mesmo sem atendimento médico. Eram os casos subnotificados e, como consolidado posteriormente em um painel, eram os invisíveis: não eram contados, nem vistos pela política pública.

Assistimos, acompanhamos e atuamos enquanto organização em todas as principais consequências da COVID no território : fome, perda de renda e emprego, contaminação, morte, medo, violência doméstica, falta de acesso à educação e a informação. Mas no meio do caos tinha luz. O que me trouxe esperança e força nesse período foi ver a cooperação, o trabalho coletivo e comum, o esforço sem limites da Redes da Maré para tentar responder às novas demandas dos moradores, os voluntários que doaram seu tempo para ajudar seus vizinhos e sua favela.

Para mim, esse esforço foi simbolizado e teve seu pico na campanha Vacina Maré. Depois de um ano de implementação do projeto de combate a covid Conexão Saúde (com testagem, atendimento médico online e programa de isolamento domiciliar) foi possível no âmbito de uma grande pesquisa em parceria com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e a Secretaria Municipal de Saúde realizar um mutirão de vacinação e finalizar a imunização com primeira dose na Maré. Em quatro dias vacinamos 36 mil pessoas.

O Vacina Maré honrou o legado mareense de mobilização e de luta por direitos. Foi emocionante ver associações de moradores, profissionais da saúde e da educação, moradores, tecedores da Redes, todos em uma ação conjunta de proteção à vida, mas também de celebração. Desse processo nasceu dentro da organização um novo eixo, o de direito à saúde, que tenho a honra de coordenar atualmente. Sem dúvida ele nasce cheio de força e desafios e com o objetivo de ser mais uma ferramenta da luta pela saúde universal, gratuita e de qualidade e defesa desse direito na Maré. Para isso precisamos continuar com os moradores mobilizados. Não podemos esquecer que saúde é democracia.