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Inscrições abertas para cursos preparatórios e pré-vestibular da Redes da Maré

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Os únicos requisitos é ser morador da Maré e ter concluído o Ensino Médio ou estar cursando o último ano

Chegou a hora de os moradores da Maré que sonham em alçar novos voos educacionais no próximo ano ficarem de olho no calendário de inscrições dos cursos da Redes da Maré em 2025. Ainda há vagas para algumas turmas do curso Pré-Vestibular (CPV) e também para os cursos preparatórios para o 6º ano e para o Ensino Médio, todos com aulas começando em fevereiro. Mas é preciso ficar atento às datas dos editais.

Para quem quer entrar na universidade em 2026, a boa notícia é que dá tempo de concorrer a vagas para as turmas do tradicional CPV na sede da Redes do Pinheiro, que fica no CIEP Ministro Gustavo Capanema, e também na Ação Comunitária do Brasil, na Vila do João. São 50 vagas para cada uma das unidades e as inscrições foram prorrogadas até o dia 10 de janeiro, podendo ser feitas virtualmente. Os únicos requisitos é ser morador da Maré e ter concluído o Ensino Médio ou estar cursando o último ano. 

Depois da inscrição, o estudante passará por uma entrevista presencial de seleção. A lista dos selecionados será divulgada no dia 28 de janeiro, nos murais das sedes da Redes e também no Instagram da organização. As matrículas serão realizadas dias 30 e 31 deste mês e as aulas começam logo no dia 10 de fevereiro. As turmas regulares do CPV têm aulas de segunda a sexta-feira, das 18h30 às 22h30, nas sedes da Nova Holanda (cujas inscrições já foram finalizadas) e Pinheiro, além da Ação Comunitária na Vila do João. 

Quem se inscrever no CPV até o dia 10 de janeiro também tem chance de participar do terceiro ano do Pré-Vestibular Atuários do Futuro, que é um preparatório especifico para cursos universitários na área de ciências exatas, como Matemática, Ciências Atuariais, Estatística, Ciências Contábeis, Economia e Engenharias.Com patrocínio da seguradora Prudential, são selecionados anualmente 25 estudantes.

“Já na inscrição sabemos quem são os candidatos interessados em ciências exatas e eles podem participar do Atuários do Futuro, caso tenham disponibilidade de horário. Esse grupo tem 15 horas de reforço de física, matemática, química e redação todas as tardes da semana, na Ritma, para depois, à noite, assistir às aulas regulares do CPV nas turmas divididas nos nossos três espaços para o curso, na Nova Holanda, Pinheiro e Vila do João”, explica Luana Silveira, coordenadora do CPV.

Preparatórios

Já as inscrições para o curso Preparatório para o Ensino Médio ficam abertas até o dia 9 de fevereiro. Neste caso, há 120 vagas, distribuídas nas turmas da sede da Nova Holanda e do Pinheiro, que têm aulas de segunda a sexta-feira, das 15h às 18h15. O curso tem como objetivo preparar alunos do 9º ano do Ensino Fundamental para as provas que dão acesso às escolas técnicas e federais de Ensino Médio no Rio de Janeiro. 

Segundo o calendário da Redes da Maré, haverá entrevistas presenciais para a seleção no início de fevereiro, com a divulgação final dos selecionados no dia 14 de fevereiro. O início das aulas está previsto para 17 de fevereiro.

Finalmente, as inscrições para as crianças e adolescentes interessados no curso Preparatório para o 6º ano vão de 13 de janeiro a 10 de fevereiro virtualmente (link para o edital que ainda não entrou no site), mas quem tiver dificuldade em fazer o processo online poderá comparecer às sedes da Redes. São 50 vagas destinadas a estudantes que este ano estão cursando o 5º ano do Ensino Fundamental. Há turmas na sede da Redes da Nova Holanda e na Ação Comunitária do Brasil, na Vila do João, que têm aulas das 15h30m às 18h, de segunda a sexta-feira. 

Depois da inscrição online, será obrigatória a confirmação presencial por um responsável legal. E no dia 11 de fevereiro, os alunos cujas inscrições forem confirmadas farão uma avaliação de seus conhecimentos de Português e Matemática. O resultado final dos selecionados está previsto para 14 de fevereiro, com o início das aulas em seguida, em 17 de fevereiro.

Imagens que reconstroem memórias

Conheça profissinais que tornaram a fotografia ferramenta para questionar narrativas e recontar histórias de territórios favelados e periféricos

Por Affonso Dalua

A fotografia, nas últimas décadas, se transformou em uma ferramenta essencial para questionar narrativas e recontar histórias de territórios favelados e periféricos. Fotógrafos e fotógrafas têm usado suas lentes para reconstruir memórias, resgatar identidades e afirmar a resistência das populações desses espaços. Lais Reverte e a mareense Jones são exemplos desse movimento, explorando a conexão entre território, ancestralidade e arte contemporânea.

Foto Affonso Dalua – Segunda das almas

Diálogo visual 

Cruzando experiências pelos becos e vielas as obras das artistas se encontram na fotoperformance, apresentando identidades e narrativas faveladas produzindo cenários de ressignificação, transformando memórias e vivências em arte visual. 

A fotoperformance combina elementos artísticos da performance (dança, música, teatro, moda) e da fotografia. Nela, a ação performática é concebida especificamente para ser capturada pela câmera, resultando em uma obra de arte fotográfica.

Foto Jones – série “Os lá de casa”

Jones, cria do Conjunto Esperança, constrói as narrativas a partir de histórias orais e registros de fotografia analógica, costurando memórias de famílias pretas no território de favela. Sua pesquisa questiona o apagamento histórico ainda em curso e busca reescrever imagens que antes viviam apenas na oralidade. Para Jones, a fotografia é mais do que uma técnica, é uma forma de preservar a memória ancestral e garantir que as histórias do povo preto não sejam esquecidas.

Lais Reverte nasceu no Espírito Santo, mas atualmente vive na Zona Norte do Rio. Na obra “Foluke, O Protegido”, ela explora a fé e a resistência de um jovem negro que busca nos orixás a força para superar as adversidades da vida urbana. O nome Foluke, que significa “aos cuidados da mão de Deus”, simboliza a esperança e a proteção divina que o guia em sua jornada. Ele carrega a força dos orixás como bússola para superar os desafios do morro e manter os sonhos vivos.

Ambas as artistas revelam, por meio de suas lentes, mundos em que o concreto e o espiritual coexistem, desafiando os limites entre a realidade e a imaginação.

Foto Lais Reverte – Editorial Foluke, O Protegido

Transformação imagética

Na Maré, o movimento da fotografia popular nasce com iniciativas como o programa Imagens do Povo, do Observatório de Favelas, localizado na Nova Maré, que há 20 anos forma fotógrafos e fotógrafas, fortalecendo a produção de narrativas sobre as favelas do conjunto. Nomes como Arthur Vianna, Affonso Dalua, Gabi Lino, Kamila Camillo, Douglas Lopes e Patrick Marinho vêm rompendo estereótipos, construindo movimentos de preservação de memórias a partir das suas experiências enquanto favelados. Estes artistas tem direcionado suas pesquisas para lugares particulares, que colocam a Maré como um dos principais produtores de fotografia popular no Brasil, produzindo uma documentação imagética única sobre as 15 favelas, com linguagens visuais que vão do documental à performática.

Foto Patrick Marinho – Navengantes

Esses artistas, ao lado de Jones e Lais, ressignificam a fotografia ao torná-la uma ponte entre a memória coletiva e as expressões contemporâneas. Jones define de forma poética que “assim como o fotolivro no botão, costuro memórias em tecidos até que se prendam no tempo do contar”. As obras dela são uma forma de reafirmar a existência, resgatar identidades e garantir que histórias sejam fixadas no tempo.

Arte Contemporânea 

Ao longo dos últimos anos, a fotografia popular foi além do registro cotidiano e passou a dialogar diretamente com as artes contemporâneas, explorando novas estéticas, que vão desde editorias com direção de arte, fotografias acompanhadas de instalações e áudios e outros formatos como as pipas e cangas do fotógrafo Arthur Vianna. Lais Reverte se insere nesse contexto com produções performáticas que transcendem o documental, enquanto Jones, com sua linguagem única, costura identidade e ancestralidade em uma narrativa profundamente conectada à história de sua família e as favelas da Maré.

Foto Arthur Vianna – Azul Walter Firmo

Essa transição não é apenas estética, mas política. Ela reafirma a favela como espaço de produção cultural de alta relevância, onde as histórias são narradas por quem vive nela. As obras são manifestações de resistência e potência criativa, ampliando o alcance das vozes faveladas e periféricas no cenário das artes visuais contemporâneas e mostram como a fotografia pode ser uma ponte poderosa entre o passado, o presente e o futuro das favelas e periferias do Brasil.

Estúdio no Parque União se destaca ao unir alongamento de unhas e bar

Preta Chic, de 25 anos, escolheu o Parque União como novo lar para realizar seu sonho: abrir um espaço de unhas que combina inovação, arte e criatividade

Estar com as crias, tomar um drink, fazer as unhas, jogar conversa fora e passar o tempo ouvindo rap, R&B e funk. Essa é a proposta do Studio Preta Chic: fazer você se sentir na casa de uma amiga. Localizado na Rua Darcy Vargas, 152, Parque União, a empreendedora e nail designer (design de unhas) Preta Chic, de 25 anos, criou um ambiente acolhedor e cheio de axé.

Nascida na cidade de Itaguaí e moradora do Parque União há três anos, ela conta que sempre vinha para a Maré a passeio, curtir o baile e comer no Polo Gastronômico. Em uma dessas ocasiões, observando as unhas das mulheres, percebeu que poderia haver espaço para o trabalho dela. “Numa sexta-feira eu estava olhando as monas, vendo as unhas delas e pensei: ‘cara eu vou me mudar pra cá, aqui eu vou ter acesso às novidades”.

Famosas fiéis

Preta Chic contrariou a família e mudou-se, mas conta que no início não foi fácil.

“Vim na cara e na coragem, sem conhecer ninguém. No começo, foi bem difícil. Nos primeiros quinze dias, fiquei sem atender nenhum cliente. Eu sabia que seria assim, mas também sabia que daria certo. Foi quando eu fiz contato com a Nina do Porte e, assim, ela me deu mais visibilidade”, relembra.

Nina é influencer, empresária, cantora e compositora, conhecida como “a bruta, a braba e a forte”, e tornou-se cliente fiel. Sempre que faz as unhas, faz questão de elogiar o trabalho da designer nas redes sociais: “Eu acho que essa foi a unha mais bonita que eu já fiz. Obrigada por me representar tão bem com a sua arte”.

Outra famosa e fiel cliente é a cantora baiana Majur, que passou por lá para fazer as unhas antes do show no Rock In Rio e escreveu em suas redes sociais. “A do rock esse ano é com ela, ficou impecável!”. 

Preta Chic se tornou uma figura tão importante na estética de unhas alongadas, as famosas garras, que ganhou uma homenagem na cena Ballroom: a categoria Best Nails (melhores unhas). Ela brinca que ser manicure de alguém é um relacionamento de longa duração.

O Studio sonhado

Preta relembra que, antes de montar seu estúdio, já havia trabalhado em outro salão e em casa. Mas, em uma noite ela teve um sonho: “Sonhei com um lugar nas cores preto e amarelo, com estampas de onça e a placa com esse nome, Preta Chic”. 

A empreendedora segue se aperfeiçoando: participou da formação Deu Match, promovida por Bianca Andrade, faz cursos de marketing e afro empreendimento e também o curso Espanhol para Tod@s, oferecido pela Redes da Maré.

O olhar empreendedor trouxe inovação para o trabalho. O espaço onde as cliente ficam em média cinco horas fazendo as unhas, oferece não apenas o tratamento estético, mas também um momento de descanso. “Minhas clientes não vem aqui com pressa, elas sabem que vão ficar um tempo, beber algo”. 

A empresária, que também já trabalhou com drinks, sempre oferece bebidas para as clientes. E agora, o espaço incluiu uma novidade: agora,  tem também um bar! O Bar da Preta é, segundo a empresária, o único estúdio de alongamento de unhas e bar do Rio de Janeiro, “para o acolhimento e diversão de todes”, completa.

Garota sucesso

Se na adolescência ela foi considerada “garota problema”, hoje ela é uma garota sucesso. Aos 21 anos se reinventou, dando um novo rumo à sua história, tornando-se referência para a família. “Hoje, eu mostro para todo mundo que é possível transformar sua realidade e sou exemplo para os meus 10 irmãos”.

De acordo com a pesquisa Empreendedorismo Feminino, do Sebrae, com base em dados do quarto trimestre de 2023, no Brasil há um total de 30 milhões de empreendedores.   A pesquisa mostrou  que só no Rio de Janeiro são mais de 2,5 milhões, sendo 964.360 mulheres contra 1.544.656 homens. Ou seja, as mulheres representam apenas 38,4% dos  empreendimentos  em todo o estado.

A pesquisa revela ainda que, entre as mulheres, embora haja uma semelhança no número de empreendedoras brancas e pretas, o comércio representa para as pretas uma oportunidade única. 

Na Maré, segundo o Censo de Empreendedores da Maré (2014), a maioria dos empreendedores são homens(59%), enquanto as mulheres representam apenas 39,5% dos pequenos negócios do território. A pesquisa analisou 2.953 empreendimentos, estima-se que a Maré tenha aproximadamente 3.182 empreendimentos, sendo a  maioria na área de prestação de serviço, seguido do ramo da beleza.

Para a empreendedora, “Preta” representa  força, além de atrair suas clientes, que na maioria também são mulheres pretas. “Meu trabalho tem conceito e ancestralidade. Além disso, o público preto é atraído por pessoas pretas”, opina.

Samba: o elo ancestral da música

Como o ritmo que nasceu na Pequena África ecoa na Maré e transforma vidas há gerações

Neste mês de dezembro, celebramos o Dia Nacional do Samba. Para além de sinônimo de música e dança, o samba é um dos representantes da herança africana, um dos povos que fundaram o Brasil e, ainda nos dias atuais, têm sua história desvalorizada. Uma história tão forte que nem mesmo a escravização e a criminalização foram capazes de esconder.

Em 2007, o samba foi consagrado como Patrimônio Cultural Imaterial pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). No conjunto de favelas da Maré, o pandeiro, o cavaquinho e o tantan ecoam os ritmos dos antepassados que, através da música, mantiveram sua cultura viva. Nessa matéria, vamos conhecer a trajetória de três desses grupos, o Fundamental, o Nova Raiz do Samba e o No Lance.

Se não fosse o samba

“E se não fosse o samba, quem sabe hoje em dia eu seria do bicho” é um verso do cantor e compositor Bezerra da Silva, mas Alexandre Gonçalves, 47 anos, voz e banjo do Grupo Nova Raiz do Samba, a usa para ilustrar sua juventude nos bailes cariocas. Mais conhecido como Dão, ele participava dos “bailes funk de corredor”, em que dois grupos (Lado A e Lado B) se enfrentavam.

O que o motivou a participar das brigas foi a raiva gerada por um episódio traumático. “Como eu imitava o Michael Jackson, eu ia para o baile dançar, só para dançar mesmo. Até que um dia fui vítima de uma violência e essa violência gerou outra violência, né? Toda a ação gera uma reação, comigo não foi diferente. E eu, atrás de vingança, procurei o meu algoz, o cara que me deu um tapa na cara”, conta.

Quando completou 18 anos, Dão decidiu retomar sua vocação para a arte. Já não se reconhecia e tinha medo de perder a vida da mesma forma que muitos dos seus amigos. “Eu também comecei a cometer pequenos delitos, mesmo que indiretamente. Eu usava a desculpa de que estava com a galera do baile e a gente acabava surrupiando pequenos pertences como relógios e cordões. E aí eu comecei realmente a me enveredar por um caminho obscuro, até que um amigo meu, o Léo, sumiu, desapareceu, e eu tive que mudar meu rumo, porque senão ia acabar me dando mal. E aí o samba retornou para o meu caminho”. 

O menino que batucava a música Mel na boca, de Almir Guineto, nas latas, galões e barris, enquanto aguardava na fila da bica, agora faz parte do grupo Nova Raiz do Samba, que recentemente completou 18 anos, ao lado de Marcelo Fernandes (Mamá), também na voz e repique de mão; Wagner Costa (Waguinho), no tantan e Luiz Henrique da Costa (Neguinho), na voz e no surdo.

Santo de casa

Thiago Pires Borba, 39 anos, morador do Parque União, também começou a amar o samba por influência dos que vieram antes. “Sempre amei música! De música clássica ao frevo, mas quando assisti aos grupos de samba que nos antecederam aqui na Maré, me despertou a vontade de fazer samba também!”, comenta.

Deu início ao seu caminho e encontrou pessoas que partilhavam do mesmo sonho. Após muito estudo, ensaio e aperfeiçoamento, o que era “brincadeira de tocar samba” fez sucesso nas festas e eventos da Maré. Hoje, Thiago é a voz do Grupo Fundamental, ao lado de Michel George (cavaquinho), Pedro Artur (reco-reco) e Hércules Cezar (percussão).

No começo do grupo, devido às poucas oportunidades, criaram o Pagode do Fundamental, localizado no Parque União, de onde Thiago é cria. Em outubro, o evento completou 20 anos. Com o apoio dos moradores, da associação e do comércio local, sempre mantêm a casa cheia.

“Nossa trajetória não foi fácil, aliás continua não sendo fácil. Como toda pessoa periférica, esbarramos em vários empecilhos que torna tudo mais difícil e nos obriga a trabalharmos 10 vezes mais”. E completa: “Existe um ditado popular que diz que: ‘santo de casa não faz milagre’, mas esse ditado cai por terra com a gente. São 20 anos de grupo, de pagode na Maré e não teve um dia nesses 20 anos que não tocamos para muitas pessoas. Fora todo o apoio em tudo que fazemos. Sempre a nossa gente com a gente”, conclui.

Sonho e realidade

Danilo Siqueira, 37, voz do Grupo No Lance, explica que, embora seja reconhecido pela população e pelos contratantes, ainda é preciso valorizar ainda mais o trabalho dos capas (como são conhecidos os artistas do meio musical). “Para nós, o principal desafio é equilibrar o sonho com a realidade financeira. Atualmente, muitos de nós vivenciamos uma jornada dupla: trabalhamos no setor privado e dedicamos tempo à música. Essa é a realidade de vários artistas da Maré. Encontrar um equilíbrio saudável entre a paixão pela arte e a estabilidade financeira”, conta.

Dan, como também é conhecido, é cria da Vila dos Pinheiros. A história dele com o samba teve forte influência do pai. “Desde pequeno, fui imerso na música graças à minha família. Meu pai, um grande fã de samba, foi o responsável por despertar meu amor pela música. Lembro-me da primeira vez que ele me levou a uma roda de samba. Foi um momento que mudou minha vida. A partir daí, a música se tornou uma parte fundamental da minha jornada”, diz. Junto a Danilo, que é a voz do No Lance, estão Anderson Barros (Andy),  voz e violão, e Leonildo Lima (Nil), voz, reco-reco e gestor do No Lance.

O Grupo, fundado em 2002, na Maré, circula por todo o país, mas reverencia a potência da favela em promover arte e cultura em cada esquina. “A cena musical da Maré é incrivelmente rica e vibrante! Não precisa sair do bairro para curtir uma variedade de gêneros: samba, rock, funk, forró, trap e muitos outros. É maravilhoso como tudo se mistura de forma harmônica. Na Vila do João, por exemplo, uma única rua nos oferece uma jornada musical completa: começa com o forró da Entrada da Avenida Brasil, passa pelo MPB do Estrela da Vila e termina com o pagofunk do Castelo do Chopp. Tudo isso na mesma rua! É simplesmente incrível!”, elogia.

Nossa história

Depois da abolição de escravidão no Brasil, o Estado logo tratou de relembrar aos negros, agora ex-escravizados, que os interesses da Princesa Isabel eram mais comerciais do que humanitário. A Lei da Vadiagem foi a encarregada de proibir todas as expressões culturais e religiosas associadas à população negra.

O samba carioca nasceu na chamada Pequena África (região que abrange os bairros da Saúde, Gamboa e Santo Cristo), Zona Portuária e no centro do Rio. Nomes como Tia Ciata (Hilária Batista de Almeida) e Donga (Ernesto Joaquim Maria dos Santos) são os principais responsáveis pelo samba que conhecemos hoje.

Donga é um dos autores da música Pelo Telefone, primeiro samba a ser registrado e gravado, em 1916. Tia Ciata, reconhecida como a grande mãe do samba (além de candomblecista e cozinheira de mão cheia) promovia rodas de samba no quintal de casa, mesmo proibidas por lei, que eram frequentadas por músicos, negros alforriados e seus descendentes. Com a difusão do rádio no Brasil  (principal meio de comunicação da época) e o surgimento das escolas de samba, o ritmo conquistou cada vez mais espaço no cenário musical e social.

De lá para cá, apesar do samba ter conquistado o Brasil e o mundo, pouca coisa mudou em relação ao racismo e a marginalização dos corpos e territórios negros. Entretanto, a favela e o samba seguem sendo o que são: o espelho de uma gente que nunca desistiu de ser.

Prefeitura do Rio reforça protocolo de calor com a chegada do verão

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O plano inclui uma série de ações para monitorar os níveis de calor e reduzir os efeitos da crise climática na cidade

O último sábado (21) marcou oficialmente o início do verão, que no Brasil também chega junto com as férias escolares e festas de fim de ano. Mas, nem tudo é agradável: a cidade do Rio, já muito conhecida por ter “verão o ano todo”, tem tido dias de sol ainda mais cruéis nos últimos anos, com impactos que afetam diretamente a qualidade de vida da população.

Para mitigar os efeitos da crise climática, a prefeitura do Rio de Janeiro  criou, por meio de decreto, o Comitê de Desenvolvimento de Protocolos para Enfrentamento de Calor Extremo (CDPECE). Em seu plano de contingência, o órgão diz que o acompanhamento dos Níveis de Calor (NC)  é uma medida para melhor demandar a atuação de outras esferas governamentais quanto aos riscos à saúde.


Protocolo de Calor

O Protocolo de Enfrentamento ao Calor Extremo é uma resposta às altas temperaturas sentidas, literalmente, na pele. Em parceria com órgãos de saúde, sanitários e defesa civil, o plano inclui uma série de ações para reduzir os efeitos da crise climática, buscando entender as vulnerabilidades individuais e comunitárias. As unidades de saúde já têm sido reforçadas com equipes capacitadas para atender casos de desidratação e outros problemas relacionados ao calor, bem como priorizar o atendimento aos grupos de riscos (gestantes, idosos, crianças e imunossuprimidos). Os avisos para ondas de calor serão dados com antecedência por meio de sistemas de monitoramento meteorológico, permitindo que as autoridades preparem a cidade para a chegada de temperaturas extremas.

No último dia 16, ainda na primavera, a cidade do Rio de Janeiro entrou no segundo dos cinco níveis de calor. O NC2 se caracteriza por temperatura entre 36° e 40°, por um ou dois dias consecutivos e mais de quatro horas diárias. Com a chegada do verão as preocupações são ainda maiores: “No município do Rio de Janeiro, em 2023, foram observados os maiores registros contínuos de temperatura desde 2003. Em 2024, a observação já se repetiu, com previsão da ocorrência de cada vez mais eventos climáticos severos” , alerta a prefeitura.

Maré 40°

Ainda que a crise climática seja globalizada, o racismo ambiental escancara que para alguns tudo pode ser ainda pior. Ao andar pela zona sul da cidade, logo é possível notar a arborização trazida pelas árvores, mesmo em dias quentes, mas basta alguns minutos no “outro lado da cidade” para perceber que as mudanças climáticas não são iguais para todo mundo.

Em cartilha lançada pelo projeto EcoClima, da Redes da Maré, é possível notar que as Ilhas de Calor evidenciam as desigualdades sofridas pela população de um mesmo município. Segundo a pesquisa, “o desconforto térmico causado pela forma como o espaço urbano é produzido, afeta, não só o meio ambiente, mas também põe em risco a saúde de nós, moradores de favelas e periferias”. 

Com a qualidade do ar cotidianamente inferior devido a territorialização das três principais vias expressas da cidade ao redor da Maré, as Ilhas de Calor intensificam o acúmulo  de poluentes causado pela baixa qualidade do ar, assim agravando a possibilidade de  problemas respiratórios em moradores. Além disso,  o fenômeno  pode alterar  os padrões climáticos locais, interferindo na formação de nuvens e chuvas.

Para minimizar os impactos das alterações do clima, o  projeto incentiva o desenvolvimento de espaços verdes na comunidade, e políticas públicas que trabalhem para um melhor planejamento urbano sustentável.

Se cuida, morador! 

Principais recomendações:

  • Aumente a ingestão de água ou de sucos de frutas naturais, sem adição de açúcar, mesmo sem ter sede;
  • Consuma alimentos leves, como frutas e saladas;
  • Utilize roupas leves e frescas;
  • Evite bebidas alcoólicas com elevado teor de açúcar. Pode provocar desidratação;
  • Evite a exposição direta ao sol, em especial, das 10h às 16h;
  • Informe-se sobre os níveis de calor na cidade do Rio de Janeiro por meio das redes sociais e sites do Centro de Operações e da Secretaria Municipal de Saúde

Maiara Carvalho é estudante de Rádio e TV da Universidade Federal do Rio de Janeiro e faz parte do projeto de Extensão Conexão UFRJ com o Maré de Notícias.

Pesquisa vai mostrar como é a alimentação das crianças da Maré 

O estudo vai mapear o cotidiano alimentar de famílias com crianças de 5 a 10 anos. Dividida em três etapas, a iniciativa começou com um grupo focal, promovendo uma roda de conversa no Observatório de Favelas

O Instituto Desiderata deu início a pesquisa: Avaliação do Ambiente Alimentar e Estado Nutricional de Crianças e Adolescentes Residentes em Favelas. O estudo consiste em avaliar o ambiente alimentar de favelas de três favelas brasileiras, Maré, Caramujo, em Niterói e Coque, no Recife. O objetivo é associar a situação de segurança alimentar e o estado nutricional de famílias com crianças, com vistas a subsidiar ações de incidência política.

Um dos pontos que a pesquisa vai identificar é como se encontra o grau de obesidade infantil nas favelas. Segundo um levantamento do Observatório de Saúde na Infância, uma parceria da Fiocruz e da Faculdade de Medicina de Petrópolis (Unifase) revela que em crianças brasileiras de até 5 anos, o excesso de peso, que inclui casos de sobrepeso e de obesidade afeta uma em cada dez e um em cada três adolescentes, de 10 a 18 anos, em 2022. No quadro mundial, o Brasil possui 14,2% de crianças com excesso de peso e 5,6% da média global registrada em 2022. Em relação aos adolescentes, a média nacional apontou que 31,2% estão acima do peso, quase o dobro da média global de 18,2%.

Na Maré, a pesquisa vai mapear o cotidiano alimentar de famílias com crianças de 5 a 10 anos. Dividida em três etapas, a iniciativa começou com um grupo focal, promovendo uma roda de conversa no Observatório de Favelas. Na ocasião, sete responsáveis participaram do encontro e discutiram as características do ambiente alimentar nas favelas. Os participantes destacaram a importância de uma alimentação saudável, ressaltando os benefícios de verduras e legumes. Também compartilharam suas experiências sobre onde costumam fazer compras no território, como feiras livres, mercados e sacolões. Apesar disso, apontaram a ausência de estabelecimentos que ofereçam opções como sanduíches naturais, evidenciando lacunas na oferta de alimentos mais saudáveis.

Os responsáveis também relataram a existência da dificuldade financeira e de tempo. Segundo eles, nas áreas urbanas é muito difícil manter a alimentação saudável, pois há muita concorrência de alimentos ultraprocessados. Para eles, uma alimentação mais natural só é mais fácil para quem mora em sítios. Eles também deram sugestões de como incentivar para alavancar as vendas de produtos saudáveis, os comerciantes a colocarem os produtos que estão perto de vencer a validade por um preço mais baixo ou até mesmo doar. Também pediram mais cursos envolvendo o ambiente gastronômico na favela, mas sem o limite de idade.

“Acredito que aprenderemos sobre os alimentos mais saudáveis e vamos compartilhar”, conta Cleide de Oliveira, moradora da Nova Holanda. Os moradores avaliaram também a alimentação escolar. Uma característica é que as crianças criam um hábito dos horários que se alimentam na escola, que acabam seguindo isso em casa.

A segunda etapa acontece em 2025, com a realização de 400 entrevistas de casa em casa, nas favelas da Nova Holanda, Parque União, Parque Rubens Vaz, Parque Maré, Praia de Ramos e Morro do Timbau. Serão perguntas socioeconômicas sobre compra de alimentos para casa, sobre o acesso aos alimentos, e o consumo desses alimentos pelas crianças, além de medir o peso e altura da família. Além das entrevistas nas residências, ocorrerão pesagem dos familiares. “A primeira etapa foi um momento produtivo, em que todos puderam participar da conversa e que venha a pesquisa para a melhoria”, comenta Joyse Gabriel, moradora da Nova Holanda.

Os questionários vão revelar as condições das pessoas que se alimentam em diferentes localidades, especificamente qual a diferença da Maré para a Zona Sul. A terceira etapa tem como objetivo final propor políticas públicas para que a favela possa acessar a alimentação adequada a partir das necessidades percebidas na pesquisa.“Acredito que essa fase foi um sucesso. É muito importante escutar e assim conhecer os desafios e estratégias que são feitas para colocar no prato os alimentos saudáveis. Podemos juntos argumentar com os governantes para a implantação de políticas públicas necessárias”, destaca Sophia Rosa, gerente de saúde em obesidade do Instituto Desiderata.