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Maré

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MARÉ

Toda a região à margem da Baía de Guanabara caracterizada por vegetação de manguezal e ocupada por pântanos é conhecida como Maré. A região compreendia ainda, as praias de Maria Angu e do Apicu, Praia de Inhaúma e alguns acidentes geográficos como o Saco de Viegas, o Saco de Inhaúma e Ilha dos Pinheiros.

O termo “Maré” tem origem num fenômeno natural, que afligia os moradores das palafitas, trazendo sujeira e lama. Ocupada desde meados do século XX por barracos e palafitas, a Maré se formou sobre os manguezais, que foram progressivamente aterrados, quer pela população e também o poder público.

Dos muitos projetos que visavam a transformação do espaço, com interesse político ou urbanístico, o que mais se destacou foi o Projeto Rio. Idealizado pelo Governo Federal, em 1979; e  executado na década de 1980, o projeto tinha como objetivo “sanear” a orla da Baía da Guanabara.

A Maré recebeu atenção prioritária, pois as favelas da área eram apontadas como as principais responsáveis pela poluição na Baía. O projeto incluía proposta de remoção das famílias residentes em palafitas, para casas populares dotadas de infraestrutura “básica”.

A delimitação do bairro Maré foi instituída pelo decreto nº 7.980, de 12 de agosto de 1988. E a fundação foi em 19 de janeiro de 1994 pelo Projeto de Lei nº 2119, sancionado pelo Prefeito da época, Cesar Maia. O surgimento do novo bairro provocou uma reorganização do espaço. Comunidades, algumas distantes, se agruparam à Maré.  Assim a Maré ganhou representação municipal, com uma Região Administrativa que congrega as dezesseis comunidades, espalhadas por 800 mil metros quadrados, próximos à Avenida Brasil e cortados pela Linha Vermelha e pela Linha Amarela.

A Maré é constituída por uma faixa contígua, que se estende do Conjunto Esperança à Praia de Ramos; ao longo de favelas que faziam parte dos bairros de Manguinhos, Bonsucesso e Ramos. Mas a delimitação não incluiu o território da comunidades de Marcílio Dias, situada em um dos extremos da Maré. No entanto, historicamente, é parte integrante do Conjunto de Favelas da Maré.

Hoje, em toda a Maré há um processo de verticalização, ou seja, a ampliação de casas com o surgimento de novos andares. E o comércio é variado.

Olá Morador da Maré, esse texto poderá sofrer ser acrescido com novas contribuições. Para isso, você vai pode enviar informações que nos ajudem a contar a História da Maré. Para compor a seção também recebemos fotos antigas, que vão ilustrar esse espaço. Então mãos à obra:  [email protected]. Sua opinião e colaboração serão valiosas.

* Abaixo estão listadas as comunidades, em ordem cronológica, a partir de suas constituições. A ideia é construir uma síntese do processo de expansão da Maré, por iniciativa dos moradores ou por meio de ações dos Governos Municipal, Estadual ou Federal.

  • 1940: Morro do Timbau
  • 1947: Baixa do Sapateiro
  • 1948: Conjunto Marcílio Dias
  • 1953: Parque Maré
  • 1954: Parque Rubens Vaz
  • 1955: Parque Roquete Pinto
  • 1961: Parque União
  • 1962: Nova Holanda
  • 1962: Praia de Ramos
  • 1982: Conjunto Esperança
  • 1982: Vila do João
  • 1983: Vila do Pinheiro
  • 1989: Conjunto Pinheiro
  • 1992: Conjunto Bento Ribeiro Dantas
  • 1996: Nova Maré
  • 2000: Salsa e Merengue

MORRO DO TIMBAU

Palavra nascida do tupi-guarani “thybau”, que quer dizer “entre as águas”, originalmente uma área seca entre os manguezais e alagadiços à margem da Baía de Guanabara. A ponta ou Morro do thybau era uma das única localidades em terra firme, constituído de rochas.

Com a abertura da Avenida Brasil, em meados das década de 1940, a ocupação nessa área tomou impulso. Com a instalação, nas proximidades, do antigo Regimento de Carros de Combate do Exército brasileiro, em 1947, hoje (Centro de Preparação de Oficiais da Reserva), os militares passaram a controlar sistematicamente todo o Morro do Timbau, de propriedade da União. O acesso dos moradores era vigiado, sendo-lhe cobrada uma espécie de “taxa de ocupação”. A arquitetura das habitações também era controlada, sendo vedada a construção de qualquer estrutura permanente na área (paredes de alvenaria, cobertura de telhas), sob pena de demolição. Obras que pudessem trazer melhorias, como as que garantiriam serviços básicos, também eram reprimidas.

Esse controle conduziu à organização da população que, em 1954, fundou uma das primeiras Associações de Moradores de Favela do Rio de Janeiro. Aos poucos, a organização comunitária começou a render frutos, tais como a distribuição de água, eletricidade, esgoto, pavimentação e coleta de lixo.

Finalmente, com o Projeto Rio, os moradores da área conseguiram a propriedade da terra. Em torno do morro ficava a Praia de Inhaúma, que desapareceu com os aterros, hoje só restou a lembrança e uma rua que leva esse nome.

Associação de Moradores – presidente Glauco dos Santos (Caco) – Telefone: 3104-5114

BAIXA DO SAPATEIRO

Ao contrário do Morro do Timbau, cuja ocupação ocorreu em uma área elevada, com alguma organização, a da Baixa do Sapateiro, que lhe é adjacente, desenvolveu-se em uma área de baixada, alagadiça, sem maiores cuidados na organização.

Sua ocupação teve início em 1947, a partir de um pequeno grupo de palafitas de madeira conhecido como Favelinha do Mangue de Bonsucesso. Existem três versões para a origem do atual nome da comunidade:

  1. Haveria realmente um sapateiro na ocupação inicial da área;
  2. Seria uma alusão à Baixa dos Sapateiros em Salvador, na Bahia, uma vez que, na origem, a comunidade era integrada por vários imigrantes nordestinos;
  3. Seria uma referência à vegetação de manguezal, em que predominava a espécie Rhizophora mangle (mangue vermelho), denominada popularmente como sapateiro. Essa espécie era extraída para a produção de tamancos, um calçado popular entre a comunidade de origem portuguesa no Rio de Janeiro.

Iniciada a partir das obras para a abertura da Avenida Brasil, a comunidade tomou impulso com a construção do primeiro grande aterro, promovido dentro do projeto de construção da Cidade Universitária, em torno da Ilha do Fundão. Com a construção da ponte Osvaldo Cruz, a região tornou-se trânsito obrigatório para quem ia e vinha do Fundão. Por essa razão, moradores expulsos das ilhas aterradas e operários da construção iam erguendo os barracos à noite, com sobras de materiais de construção (madeira e latas), sobre palafitas de cerca de dois metros de altura.

A repressão à nascente comunidade era promovida pela Guarda Municipal que, utilizando-se de cabos de aço, puxados por tratores, cortava os esteios das palafitas, demolindo-as. Procurando organizar a luta e conquistar o direito à moradia, fundou-se a Associação de Moradores da Baixa do Sapateiro (1957).

As palafitas desapareceram gradualmente graças aos aterros promovidos pelos próprios moradores ao longo dos anos. As últimas foram demolidas na década de 1980, por iniciativa do Projeto Rio, do Governo Federal, sendo esses moradores transferidos para os novos conjuntos então construídos: a Vila do João e, mais tarde, a Vila do Pinheiro.

Associação de Moradores – presidente Charles Gonçalves – Telefone: 2290-1092.

CONJUNTO MARCÍLIO DIAS

Formada na antiga Praia das Moreninhas, entre os terrenos da Casa do Marinheiro e da fábrica Kelsons, a partir de 1948. O processo de ocupação começou quando oito famílias de pescadores que ali ergueram palafitas. O seu nome é uma homenagem ao marinheiro da Armada Imperial Brasileira, Marcílio Dias.

Apesar da proximidade com o Mercado São Sebastião, atualmente conta com um comércio de pequeno porte. Dentro dessa comunidade alguns moradores denominam uma parte como Kelsons. A comunidade da Marcílio Dias recebeu a visita de madre Teresa de Calcutá, em 1982. Na época, a favela nem de longe parecia o que é hoje. Eram 800 barracos de madeira onde se abrigavam cerca de quatro mil moradores em situações de pobreza extrema.

É a comunidade mais distante do restante da Maré. Marcílio Dias está a, aproximadamente, 2,300 km da Praia de Ramos e entre esses dois territórios existe um conjunto de unidades pertencentes à Marinha do Brasil. O Censo Populacional da Maré 2013 contou 6.709 residentes em Marcílio Dias, ocupando 2.248 domicílios. O Censo Demográfico 2010 do IBGE contou em Marcílio Dias 6.219 moradores, residindo em 1.768 domicílios.

Associação de Moradores – presidente Jupira dos Santos – Telefones: 2584-4534 e 2584-4527.

PARQUE MARÉ

Originalmente uma extensão da Baixa do Sapateiro, distinguia-se por sua proximidade da Avenida Brasil, apresentando, por essa razão, uma densidade demográfica mais elevada. As primeiras palafitas e precários barracos foram erguidos a partir do início da década de 1950, a partir dos mangues existentes no final da Rua Flávia Farnese e 17 de fevereiro. Os moradores pediam aos caminhões de entulho que transitavam pela Avenida Brasil, que despejassem a sua carga na área, promovendo desse modo um aterro coletivo.

O nome tem origem no fenômeno natural das marés que causava grande sofrimento aos moradores da localidade, a maioria vivendo em palafitas. Segundo moradores mais antigos, a maré cheia trazia cobras, ratos e muita lama. O Parque Maré aumentou sua expansão na década de 1960. Nessa mesma época, foi criada a sua Associação de Moradores que, dentre outros objetivos, tinha como missão principal lutar pela permanência da comunidade e pela não-remoção dos moradores, uma vez que as investidas dos governos para a erradicação dessa ocupação foram muitas. Sua ocupação consolidou-se após a atuação do Projeto Rio, do Governo Federal, nas décadas de 1980 e 1990, que demoliu as últimas palafitas, transformando-as em casas de alvenaria. Hoje em dia a comunidade conta com relativa infraestrutura.

Associação de Moradores – presidente Vavá – Telefones: 3105-6930 e 3881-9783.

PARQUE RUBENS VAZ

Formou-se a partir de 1954 e recebia o nome de Areal, uma vez que, devido à drenagem e à canalização do canal da Zona Portuária, a comunidade recebia a areia oriunda dessa obra, causando problemas aos moradores. Também ficou conhecida como Caracol, nome provindo de uma passarela próxima, que ficava na entrada da comunidade e que tinha esse formato. A ocupação surgiu junto ao canal do Rio Ramos, hoje transformado em um canal, chamado de valão.

O aterro foi realizado pelos próprios moradores que utilizaram carvão, serragem e entulhos. Um detalhe importante na demarcação do limite dos lotes era o seguinte: o barraco era construído na frente do terreno e o banheiro nos fundos para aumentar o tamanho do lote. Quando uma família não tinha condição de construir o banheiro, ela utilizava uma ponte de madeira para usar o banheiro do vizinho.

O nome Parque Rubens Vaz foi oficializado em 1965, homenagem do governo ao militar da Força Aérea Brasileira (FAB), o Major Rubens Vaz. O número de habitantes foi crescendo e não tardou a surgir entre eles um líder: João Araújo. Um paraibano que começou a organizar a área, alinhar as construções e formar as ruas. Em homenagem a ele, uma das ruas do local leva o seu nome. Recentemente outro líder foi homenageado, com nome de um Espaço de Desenvolvimento Infantil, o ex-presidente de associação João Crisóstomo.

Associação de Moradores – presidente Vilmar Gomes (Magá) – Telefones: 3105-7146 e 3014-5388.

PARQUE ROQUETE PINTO

Surgiu por meio de uma série de aterros realizados pelos próprios moradores, a partir de 1955, às custas do manguezal, no final da Rua Ouricuri. O processo de urbanização deu lugar a domicílios de alvenaria. O seu nome é uma homenagem a Edgar Roquette Pinto, fundador da primeira rádio do estado do Rio de Janeiro, hoje a Rádio MEC, pois na época da ocupação havia uma antena de transmissão de rádio na comunidade.

A comunidade de Roquete Pinto fica ao lado do terreno do antigo quartel do 24° Batalhão de Infantaria do Exército Brasileiro, hoje pertencente a Polícia Militar. E apesar da proximidade com o Piscinão de Ramos, que se tornou um ponto turístico da comunidade, a Roquete Pinto sofre com a ausência de infraestrutura.

Associação de Moradores – presidente Cristiano Anselmo – Telefone: 3104-5069.

PARQUE UNIÃO

Formou-se a partir de um loteamento promovido por um advogado ligado ao Partido Comunista Brasileira – Margarino Torres – que demarcou lotes, vendendo-os por valores acessíveis. Um facilitador desse processo foi o aterro realizado por uma empresa particular que, posteriormente, teve que abandoná-lo por motivos financeiros. Desta maneira, deu-se início à construção dos barracos.

As casas eram construídas primeiramente em madeira. Internamente os moradores levantavam as paredes em alvenaria, isso tudo feito às escondidas, pois, segundo a população, o governo proibia essa forma de construção. A madeira só era retirada quando a casa já estava praticamente pronta.

O projeto inicial era o de criar um bairro popular, com boa infraestrutura urbana. Outras fontes mostram que a comunidade é fruto de uma das primeiras invasões urbanas planejadas de que se tem notícia, em fins da década de 1950. No início da década de 80, ocorreria a desocupação da comunidade organizada pelos militares. Contudo, a moradora Mironeide Rezende Beleza enviou carta ao então presidente João Figueiredo. Depois da resistência, o presidente respondeu com outra carta descartando a ideia. Fica situado junto à Avenida Brigadeiro Trompowski, próxima a entrada da Ilha do Governador. A partir do ano 2000 teve ampliação, a partir da aquisição de antigas fábricas, que foram loteadas legalmente pelos moradores, chamadas de Sem Terra.

Associação de Moradores – presidente Edinaldo dos Santos (Deraldo) – Telefones: 3882-5510 e 3881-9783.

NOVA HOLANDA

A Nova Holanda teve um processo de formação que se distingue dos outros da época. Localizada sobre um aterro realizado ao lado do Parque Maré, no final da Rua Teixeira Ribeiro, ela foi planejada e construída pelo poder público na década de 1960, sob o governo de Carlos Lacerda. Tinha como objetivo ser um abrigo provisório destinado aos moradores de morros do Rio que foram demolidos para a ampliação da cidade. O grande porte desse aterro influenciou a escolha do nome do empreendimento – Nova Holanda – uma vez que aquele país europeu localiza-se, em grande parte, abaixo do nível do mar.

Não se constituía, entretanto, em um Conjunto Habitacional, uma vez que foi concebido como um Centro de Habitação Provisório (CHP). O seu projeto era regular, disposto sobre uma malha ortogonal, com casas em série, idênticas, erguidas em madeira, em duas tipologias:

  1. Unidades individuais, simples; e
  2. Unidades duplas, em dois pavimentos (denominadas como modelo “vagão” ou “duplex”).

Essa característica não permitia, originalmente, que fossem realizadas benfeitorias pelos moradores, registrando-se, em pouco tempo, a rápida degradação das unidades. Os seus primeiros moradores chegaram em 1962, oriundos da remoção da Favela do Esqueleto (atual campus da Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ), da Praia do Pinto, do Morro da Formiga, do Morro do Querosene e das margens do Rio Faria Timbó, sob a coordenação da Fundação Leão XIII, que controlava tanto o processo de remoção quanto o gerenciamento dos CHPs.

Os alojamentos deveriam servir como uma etapa intermediária no assentamento definitivo dessas populações em Conjuntos Habitacionais na periferia da cidade. Entretanto, por falta de continuidade política do projeto, as casas provisórias de madeira acabaram por se tornar definitivas, registrando-se a favelização do conjunto na medida em que cada morador introduziu medicações arquitetônicas conforme as próprias necessidades e segundo próprio critério. A falta de serviços básicos e o rígido controle da Fundação Leão XIII ocasionou o surgimento de conflitos.

Tantos conflitos propiciaram a mobilização popular. Na década de 1970, solidificam-se grupos de apoio à comunidade, sendo eles: grupo das mulheres e o grupo de jovens da Igreja Católica. Em 1979 é instituída a primeira assembleia para a criação da Associação de Moradores de Nova Holanda, e, posteriormente, a Creche e Escola Comunitária de Nova Holanda e a Cooperativa Mista e de Consumo dos Moradores de Nova Holanda.

Em 15 de novembro de 1984, um fato inédito chama a atenção da sociedade para a comunidade. Uma jovem de 22 anos, Eliana Sousa Silva, vencedora da eleição para presidente da associação de moradores, toma posse, superando a discriminação por ser nova e mulher. O ato também inspirou as autoridades a atuarem junto às comunidades sobre a importância da eleição. Eliana continua atuando na comunidade com trabalhos por meio da instituição Redes de Desenvolvimento da Maré. Nova Holanda até hoje é referência de comunidade articulada e militante no cenário dos movimentos sociais oriundos das favelas no Rio de Janeiro.

Associação de Moradores – presidente Gilmar Gomes – Telefone: 3105-7148.

PRAIA DE RAMOS

Originalmente uma comunidade de pescadores que surgiu por volta de 1962. A praia mais famosa do subúrbio carioca aparecia nos mapas antigos como Mariangú, que na linguagem indígena significava mangue. A região era território de criação de caranguejos que serviam de alimentos para animais do entorno da Baía de Guanabara. O nome Maria Angú foi uma adaptação livre dos próprios moradores. Há ainda uma outra versão que fala sobre a existência de uma antiga moradora chamada Maria, conhecida na região por vender angu.

Apesar de fisicamente pertencer ao conjunto de comunidades que formam o Bairro Maré, a região também participa das comemorações anuais da festa do Bairro de Ramos. Pertence a essa comunidade a única praia existente hoje na Zona da Leopoldina. Esse antigo balneário está poluído e proibido para o banho de mar. Em substituição à área de lazer, foi inaugurado em dezembro de 2001 um grande lago artificial, chamado de Piscinão de Ramos. Hoje é administrado pela Prefeitura, e foi rebatizado de Parque da Vizinhança de Ramos.

Associação de Moradores – Cristiano Anselmo – Telefone: 3104-5069.

CONJUNTO ESPERANÇA

Conjunto habitacional erguido em 1982 pelo Projeto Rio, do Governo Federal, com 35 edifícios totalizando 1.400 apartamentos. Recebeu, à época, cerca de 7.000 pessoas. Fica localizado próximo ao prédio de expansão da Fundação Oswaldo Cruz, com acesso pela Avenida Brasil. Foi construído às margens do Canal do Cunha.

Com a ausência de comércio, a comunidade foi improvisando e criando novos espaços, além dos prédios. No fim da comunidade, às margens da Baía de Guanabara, surgiu também um novo espaço formado por casas construídas pelos próprios moradores, denominado Vila Esperança, também conhecido pelo apelido pejorativo de Pata Choca.

Associação de Moradores – presidente Pedro dos Santos – Telefone: 3104-7407.

VILA DO JOÃO

Antes da construção, no terreno funcionou o Aeroclube do Brasil. O conjunto habitacional foi erguido pelo Projeto Rio, do Governo Federal, no início da década de 1980. O Projeto Rio logo gerou grande controvérsia porque o governo se limitou a erradicar as áreas alagadas. Mas o que fazer com a população que era retirada desses espaços? Segundo levantamento inicial, nesta época um terço dos habitantes da Maré morava sobre palafitas, principalmente nas comunidades da Baixa do Sapateiro e Parque Maré. Depois de muita polêmica, os moradores começaram a ser transferidos para o primeiro conjunto habitacional do Projeto Rio.

O objetivo era acabar com moradias construídas precariamente. As casas pré-fabricadas sobre aterros na Baía de Guanabara eram destinadas a abrigar as pessoas que viviam em palafitas na Baixa do Sapateiro. As casas coloridas que caracterizaram a Vila do João foram inauguradas em plena campanha para o governo do Estado. O colorido das casas ficou conhecido preconceituosamente de “Inferno Colorido”, mas na década de 90 esse apelido caiu em desuso.

Essa comunidade representava um símbolo de prosperidade para os militares, que denominaram o nome como uma homenagem dos moradores ao então Presidente da República, General João Baptista de Oliveira Figueiredo (1979-1985). Outros pontos surgiram como a creche Tia Dulce, em alusão à primeira-dama Dulce Figueiredo, hoje rebatizada de Espaço de Educação Infantil. Outra creche também teve esse mesmo propósito, a Creche Municipal Tio Mário, que lembra Mário Andreazza, Ministro do Interior do governo militar.

Associação de Moradores – presidente Valtermir Messias (Índio) – Telefone: 3109-3143.

VILA DO PINHEIRO

Foi a segunda fase do Projeto Rio, uma grande intervenção na região da Maré, para reassentar os moradores das palafitas, em conjuntos habitacionais. Tais conjuntos foram erguidos sobre aterros dos manguezais e tinham o financiamento do extinto Banco Nacional de Habitação (BNH).

A área denominada genericamente como “Pinheiro”, é fruto de um aterro promovido à época do Projeto Rio, do Governo Federal, na década de 1980, que ligou a Ilha do Pinheiro, ao continente, o que resistiu até o aterro da Cidade Universitária. A ilha chegou a ser conhecida como Ilha dos macacos, por ser área de experiência com macacos da Fundação Oswaldo Cruz. O novo aterro destinava-se a assentar os antigos moradores das palafitas removidas da Baixa do Sapateiro e do Parque Maré.

Hoje a Ilha do Pinheiro passou a ser um parque ecológico, conhecido como “Mata”, que fica localizado bem no meio da comunidade. A Vila do Pinheiro foi constituída por casas de pequenas dimensões, geminadas, unifamiliares. Atualmente poucas casas guardam a estrutura original.

Nos anos 90, um projeto federal construiu na comunidade uma escola, o Centro Integrado de Atenção à Criança e ao Adolescente (CIAC), transformado em Centro de Atenção Integral à Criança (CAIC), posteriormente demolido por ter sido construído em área imprópria e apresentar rachaduras. Na mesma época, a Prefeitura usou outro terreno da Vila do Pinheiro para abrigar temporariamente 209 famílias removidas de áreas de risco da cidade.

Essa comunidade teve como característica a construção fragmentada. Os galpões – pequenos, coloridos e desconfortáveis, tinham apenas um banheiro para cada 25 famílias – foram logo apelidados de Kinder Ovo, em uma referência ao chocolate de embalagem colorida em moda na época. Hoje, esse espaço não existe mais. A penúltima fase, construída atrás da Associação de Moradores, seria um desligamento, que receberia o nome de Vila Pasqualini, algo não aprovado pelos moradores. E por fim, atrás do Ciep Ministro Gustavo Capanema, surgiu uma nova construção que recebeu moradores remanescentes de enchentes, e que não foram agraciados com residências em outras comunidades. Essas casas foram batizadas popularmente como Marrocos. Contudo, ambas são assistidas pela Associação de Moradores da Vila do Pinheiro. Já a Vila do Pinheiro, pela grande extensão, tem uma divisão na Via B/1, onde é assistida também pela Associação de Moradores do Parque Ecológico.

Associação de Moradores da Vila do Pinheiro – Jhonata Marques – Telefone: 3109-2576.

Associação de Moradores do Parque Ecológico – presidente Cláudia Santana – Telefones: 3104-8950 e 3109-2576.

CONJUNTO PINHEIRO

O Conjunto Habitacional Pinheiros, também erguido em 1989 pelo Projeto Rio, do Governo Federal, é constituído por grandes blocos de prédios multifamiliares de formas retas e modernistas. O Conjunto Pinheiro é a comunidade da Maré que permanece mais próxima dos traços retos e racionais do projeto original, apesar da construção de garagens dentro do terreno. Alguns desses puxadinhos foram transformados em biroscas para qualquer tipo de comércio gerador de renda.

Em 1999, os 34 prédios passaram por reformas custeadas pela Companhia Estadual de Habitação (CEHAB). A reforma consistiu na recuperação do revestimento externo, pintura externa das esquadrias, impermeabilização das caixa d’águas, reforma dos telhados e dos esgotos. Em 2011, a segunda obra também foi realizada pela CEHAB, com recuperação do revestimento, pintura externa, e reforma dos telhados. As reformas não mudaram a estética inicial.

Seus prédios margeiam a Avenida Bento Ribeiro Dantas, junto à ciclovia da comunidade.

Associação de Moradores – presidente Eunice Cunha – Telefone: 3104-7183.

CONJUNTO BENTO RIBEIRO DANTAS

Foi erguido em frente ao Conjunto Pinheiro, na década de 1990. Ocupa área onde existiu, no passado, a praia e o Porto de Inhaúma. No início, foi popularmente apelidado de “Fogo Cruzado”, uma vez que se encontrava na linha de tiro entre duas comunidades.

Inaugurado em 1992, o seu projeto é de inspiração pós-modernista, utilizando o tijolo e o concreto aparentes, que lhe dá uma estética própria, bem diferente dos prédios modernistas do Conjunto Pinheiro. Esse modelo seria repetido no Conjunto Nova Maré.

Os seus moradores vieram de outras favelas, consideradas de risco pelos técnicos da Prefeitura, por meio do Programa Morar Sem Risco e que não podiam ser urbanizadas pelo Programa Favela-Bairro, implantado a partir de 1994.

Associação de Moradores – presidente Raquel Lellis – No momento sem telefone.

CONJUNTO NOVA MARÉ

Conjunto habitacional inaugurado pela Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro em 1996 com o fim de assentar moradores removidos de palafitas da Parque Roquete Pinto. Situado em área de aterro vizinha à Baixa do Sapateiro, decorrente da construção da Linha Vermelha, o seu projeto tem o mesmo perfil que o Conjunto Bento Ribeiro Dantas.

Hoje a comunidade é beneficiada por um espaço de lazer próximo, a Vila Olímpica da Maré.

Associação de Moradores – presidente Alexandre Ribeiro – Telefone: 2270-1274.

CONJUNTO NOVO PINHEIRO (SALSA E MERENGUE)

Meses após inaugurar os galpões do Kinder Ovo, a Prefeitura precisou construir um novo Conjunto habitacional. Essa unidade foi inaugurada no ano 2000, com o nome oficial de Novo Pinheiro. Embora tenha história e características próprias, não conta ainda com uma Associação de Moradores, sendo incluído tradicionalmente na Vila do Pinheiro. O seu nome popular é uma alusão à novela televisiva Salsa e Merengue, devido ao colorido das casas. Foi criado com o fim de assentar moradores removidos da comunidade conhecida como Kinder Ovo e em torno do rio Faria Timbó. Está situada próxima à Vila do Pinheiro e ao Canal do Cunha.

Associação de Moradores da Vila do Pinheiro – Jhonata Marques – Telefone: 3109-2576.

Violência afeta a saúde na Maré

Maré de Notícias #89 – junho de 2018

A tensão permanente adoece os moradores e assusta os profissionais

Jorge Melo

No dia 8 de maio, a coordenadora do Eixo de Segurança Pública da Redes da Maré, Lidiane Malanquini, participou da 168ª sessão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), na República Dominicana, e falou sobre o impacto da intervenção nas periferias. “Historicamente, os moradores de favelas, em sua maioria negros, são os mais afetados por essa política de Segurança militarizada, baseada em ações pontuais e extremamente violentas. É importante destacar o caráter racista desta política perversa que ataca o direito à vida, provoca o adoecimento e limita o acesso a outros direitos básicos”, disse Lidiane em seu discurso.

 

Violação de direitos e saúde

A referência de Lidiane ao adoecimento das populações em função da violência está baseada na realidade fria dos números. Em 2017, 42 pessoas morreram e 17 ficaram feridas em confrontos armados na Maré. O Conjunto de Favelas sofreu 42 operações policiais, uma a cada nove dias, com um saldo de 41 feridos. Não bastasse a tensão e o estresse da população, particularmente as crianças e adolescentes, os diversos serviços de Saúde, que atendem diariamente milhares de pessoas, tiveram suas atividades suspensas por 45 dias. Os números são do Boletim Direito à Segurança Pública na Maré, levantamento anual, realizado de janeiro a dezembro. Os dados são coletados por uma equipe da Redes da Maré, que acompanha os confrontos armados e as operações policiais e também pelo serviço de orientação jurídica das denúncias de violações de direitos, reportagens e notícias veiculadas pelas assessorias de comunicação das Polícias Militar e Civil. E também das Secretarias Municipais de Saúde e de Educação.

Sady Marchesi é psicólogo do Núcleo Ampliado de Saúde da Família e trabalha na Clínica Municipal de Saúde da Vila do João e na Clínica da Família Adib Jatene, ambas na Maré. Segundo ele, “o medo vira picos de pressão, vira açúcar alto, vira ansiedade, vira tristeza, vira pânico. Que precisa da compensação do Estado com remédios para baixar a pressão e o açúcar, calmantes para dormir e antidepressivos para sorrir”. Não existem números exatos e é impossível avaliar o prejuízo causado à população e aos profissionais de Saúde por esse estado de coisas. Mas não é difícil imaginar o estrago que provoca. Está provado que populações submetidas continuamente à violência têm a saúde afetada.

Sady alerta para o fato de que “nós, profissionais, também ficamos com medo. Por ouvir e vivenciar situações de violência. Alguns de nós passam mais tempo por, aqui,  que com a família. Quantos colegas foram afastados do trabalho por licença médica ou desistiram da Maré, após um conflito armado que atinge as paredes sem concreto da Unidade de Saúde, após uma ameaça, após um helicóptero policial passar atirando? É tão comum como triste a constante troca ou ausência de profissionais, o que dificulta a construção de vínculos com a população tão necessária para se produzir cuidado em Saúde”.

 

O que fazer? 

No dia 26 de março, pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz, militantes dos direitos humanos, profissionais da Saúde e moradores de comunidades se reuniram na Fiocruz, para debater a violência e a intervenção federal na Segurança pública no Rio de Janeiro. Foi elaborada uma lista com algumas medidas a serem colocadas em prática. Entre elas estão reuniões com agentes comunitários de Saúde, campanhas contra o racismo e iniciativas para divulgar canais de denúncias de violações de direitos.

De acordo com Hermano Albuquerque de Castro, pesquisador da Escola de Saúde Pública da Fiocruz, “praticamente todos os dias temos tido notícias de violência e de morte. E esse é também um debate da Saúde pública, que vem sendo profundamente afetada. Os agentes de Saúde não conseguem trabalhar nos territórios. As populações ficam desassistidas e são penalizadas”.

“Arraiá da Paz” promete agitar a Maré

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Maré de Notícias #89 – junho de 2018

Regada a caldos, maçã do amor e apresentação de quadrilha, tradicional festa acontecerá em três fins de semana de junho

Maria Morganti

O mês de junho chega aqui na Maré trazendo, além de temperaturas mais amenas, a promessa de muitas festas. A mais famosa, para 10 entre 10 moradores, é a da Paróquia Nossa Senhora da Paz, no Parque União, o tradicional Arraiá da Paz. Este ano, a festa que costuma receber milhares de pessoas em três fins de semana começará nos dias 8 e 9, seguindo os festejos pelos dias 15, 16, 22 e 23.

Apesar de ser realizada dentro da Paróquia, na Rua Guanabara, nº 2, “não é uma festa religiosa, é aberta ao povo, é para a comunidade”, enfatiza Maria de Fátima Donaria, costureira nascida e criada no Parque União, e uma das integrantes das Pastorais que realizam o evento. Fátima conta que frequenta a festa há mais de 20 anos, quando ainda era na Rua da Paz, antes da compra do terreno onde é realizada hoje. “Cada Pastoral assume um setor. As Pastorais da criança, cultura, jovem, terço dos homens, dos casais; cada uma fica com uma barraca. Todo o trabalho é dividido para sair tudo muito bonito e bacana”.

Nos dias de festa, as barraquinhas começarão a funcionar a partir das 18h, mas o evento completo só às 20h30. “A preparação começa na sexta-feira antes da festa. Um mês antes, eles já começam a armar as barracas, pedir doações, para a comunidade, de alimentos e de bandeirinhas para enfeitar, porque a Igreja se move com doações”. Segundo Fátima, no quesito guloseimas, caldo verde, sopa de ervilha e  vaca atolada. “Aí uma descasca batata, outro o aipim, outro o milho.” Nos doces, canjica, bolo de aipim, maçã do amor… “E tem muito mais”, comenta Fátima. “Não sou muito boa de dança, não. Mas é uma das coisas de que eu mais gosto?!”, conta, rindo, Fátima, sobre a quadrilha. Ao todo, três grupos de quadrilha irão se apresentar: o da catequese, dos jovens e a do grupo chamado Aliança de Casais.

Iuri Felipe Santos, 25 anos, também “cria” do Parque União, é um dos “marcadores” (responsável por ensaiar uma quadrilha), mais conhecidos da Paróquia. A primeira que marcou foi com 12 anos de idade. “A gente tem de marcar ensaio, montar passo, montar música, coreografia, uma coisa em cima da outra. Em outubro, eu já estava postando no Facebook:vamos dançar, vai ter quadrilha, estou com uma ideia boa’, e marcamos um aquecimento”.

Ele conta que uma quadrilha pode chegar a ter 18 casais, o mínimo é 12. O grupo de jovens da Igreja já conquistou sete troféus e se apresentou na Feira de São Cristóvão. Iuri, este ano, não  vai marcar a quadrilha, mas está fazendo a montagem das músicas e apoiando outros marcadores, para o momento que considera o auge da festa junina. E avisa: “tem um dia que todo mundo pode dançar. É no último domingo de festa, a famosa quadrilha do ‘cata-cata’,  entra qualquer um. É a maior quadrilha que tem. Chega a ter mais de 50 casais”.

“É um dos eventos mais esperados do ano”, diz a moradora do Parque Rubens Vaz, Letícia Felix, de 26 anos. A jovem conta que as principais festas são organizadas pelas Igrejas católicas da região, que tentam se articular, para não haver sobreposição de datas e os moradores terem a oportunidade de participar de todas. “A festa mais expressiva é o ‘Arraiá da Paz’, pela sua história desde muito cedo, de carinho, todo ano nesse evento. É uma festa democrática, para todos. Não importa se você é ateu, protestante… As festas juninas realizadas pelas paróquias não são só para os paroquianos, são preparadas com muita dedicação para todos os moradores da Maré. Vem pessoas de fora, de outros conjuntos da Maré, famílias, crianças, adultos, jovens, idosos. É um momento de muita alegria, de convivência, de escape da rotina e dos problemas diários”.

Além do Arraiá da Paz, outras paróquias realizarão festas, como a Paróquia Sagrada Família, na Nova Holanda, e a Nossa Senhora dos Navegantes, além das que acontecem pelas ruas. Opção é o que não vai faltar para se divertir!

A Educação resgatando projetos de vida

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Maré de Notícias #89 – junho de 2018

Mais de 400 jovens da Maré matriculados nas 14 turmas do Telecurso

Maria Morganti

 

“É necessário sempre acreditar que o sonho é possível, que o céu é o limite e você, truta, é imbatível”. Edi Rock

O trecho da música A vida é desafio, do grupo Racionais MC, estava escrito em uma folha A4, pregada na parede da sala de aula, do prédio da Redes da Maré, numa tarde ensolarada de segunda-feira. Ao lado, um cartaz com uma frase de Martin Luther King, líder negro norte-americano, pacifista, assassinado em 1968, aos 39 anos.

“Eu tenho um sonho”

Diante da turma, a primeira das 14 que reúnem mais de 400 alunos, do Telecurso na Maré,  está o professor Luan Costa. A iniciativa possibilita a conclusão do segundo seguimento e do ensino médio em um ano e meio.

A pré-inscrição começou no dia 19 de fevereiro e foi até o começo de março. “A procura foi muito grande”, diz Patrícia Viana, integrante do Núcleo de Educação da Redes. Na lista dos critérios para participar estavam ser morador da Maré e ter disponibilidade de três horas por dia, quatro vezes por semana. As aulas acontecem em diversas áreas da Maré, como Nova Holanda e Vila do João. Essa iniciativa é uma tentativa de contribuir na solução de um dos mais graves gargalos educacionais do Brasil: o grande número de jovens e adultos que interromperam os estudos e enfrentam dificuldades, entre elas, a de se integrar ao mercado formal de trabalho.

Experiência acumulada

O Telecurso foi criado com o objetivo de ampliar o acesso à educação. A partir dos anos 70, passou a levar educação de qualidade pela TV, e ajudou a formar cerca de 7 milhões de estudantes nos ensinos fundamental e médio em todo o país. A partir dos anos 90, uma metodologia presencial foi desenvolvida a partir do material do Telecurso.  Desde 1995, 1,6 milhão de estudantes se formou em escolas públicas de 12 estados brasileiros, em programas coordenados pela Fundação. No Rio, para atender a jovens e adultos que estão fora da escola, a Fundação Roberto Marinho tem uma escola que adota o Telecurso, e está presente no Jacaré, em Manguinhos, Santa Marta, Porto da Pedra (São Gonçalo), Rio Comprido, Jacarepaguá e na Maré.

Sonhos interrompidos

Segundo o Ministério da Educação (MEC), de 2013 a 2017, as matrículas no 9º ano do Ensino Fundamental caíram 14,2%,no Rio de Janeiro. O Censo Escolar da Educação Básica 2017 revelou que a redução do número de matrículas acontece nos ensinos Fundamental e Médio pelo 4º ano consecutivo. Menos estudantes estão chegando nos últimos anos. A evasão escolar, no Ensino Médio, chegou a 11%, segundo os dados da pesquisa. Ou seja, quem chega, se chega, ao fim do ensino fundamental, pode não seguir no ensino médio.

Os números tomam forma de gente na história de vida de jovens como Júlio Cesar Acioli e Silva, de 19 anos; Amanda Marques, de 17 e Luciana Silva, de 20. Por motivos diferentes tiveram que deixar a escola. Mas têm em o comum os sonhos interrompidos e a possibilidade de mudar suas histórias.

Amanda, a caçulinha dos três, é vidrada no k-pop, “é a cultura popular coreana que nem tem na cultura popular brasileira”, explica didaticamente. Passou os últimos meses em casa, realizando tarefas para ajudar a mãe, empregada doméstica, e lendo romances. “Em um ano eu leio mais de seis livros. Gosto de livros que inventam um mundo novo. Pode ser até de ficção científica, mas tem de ter romance”.  A jovem, que se define como tímida, diz para a repórter:  “está sendo difícil vir aqui falar com você”. Amanda parou de estudar, porque sofreu bullying na escola. “Eu tentava me enturmar e não dava. Não me achava nem na escola e nem nos amigos. Parei de ir pra escola por desânimo. Também perdi mais de 20kg”.

Depois de enfrentar uma forte depressão, sem acompanhamento médico, agravada por problemas externos, Amanda conta que quis voltar a estudar com o projeto de tornar-se professora de Inglês e de Português para estrangeiros, ir para a Coreia do Sul e realizar um sonho triplo: “Eu queria voltar a estudar para dar orgulho a minha irmã, e fazer faculdade para realizar o sonho da minha avó. Porque ela pensava muito em terminar os estudos dela. Estou fazendo pela minha irmã, minha mãe e minha avó”.

Para Júlio, que é barbeiro no Parque União e nasceu no Recife, a perda da tia e o horário do trabalho impediram que ele continuasse na escola, ficou desanimado. Depois teve de optar entre o trabalho, que tinha a maior clientela à noite, e as aulas, que também eram noturnas. A necessidade de pagar as contas foi mais urgente naquele momento que o boletim escolar. Hoje, matriculado na turma da manhã, diz que tudo mudou. “Agora eu encontrei a oportunidade de voltar a estudar. Espero concluir o Ensino Fundamental, o Ensino Médio, fazer uma faculdade de Educação Física ou Contabilidade e ter uma vida melhor”.

Luciana, que tem 20 anos, diz que durante muito tempo “não queria ter coisa séria com os estudos”. Com 13 anos, já fazia unha (manicure), ofício que tem como profissão até hoje. Mesmo assim, a distância da escola e os problemas familiares pesaram e ela teve de parar de estudar. Depois, já casada, tentou voltar. Se matriculou, começou a frequentar as aulas, até que, ao fim da primeira e única gestação, há dois anos, parou mais uma vez. Mas não desistiu. “Eu falei, já deu o tempo de ela desmamar, e eu procurar o estudo”. Ela está mais uma vez matriculada. “Espero terminar os meus estudos; já estou pensando em colocar minha filha na escola ano que vem. Não quero que ela passe pelo que eu passei, não. Eu penso em fazer faculdade, eu acho tão bonito quem vai para a faculdade… É um sonho”.

Metodologia transformadora

Único paranaense do time de professores, Bruno Dias, de 29 anos, conta que muitos foram levados a deixar a escola por desinteresse e isso significa “ falta de assistência, de algumas políticas públicas eficazes para Educação”. O professor ressalta que a metodologia do Telecurso prioriza a criação do laço afetivo com a turma, para, a “partir do conhecimento deles, construir outros conhecimentos”.

“Nada que vai ser ensinado aqui vai ser uma imposição. A escola, às vezes, tem um pacote de conteúdos que precisa ser passado e transmitido para os estudantes. Um modelo conteudista, no qual os estudantes têm de absorver aquele conteúdo, no qual muitas vezes eles não veem aplicabilidade. Aqui, todas as aulas são contextualizadas com a história, com o porquê daquele conteúdo, e qual é a aplicabilidade dele; de Matemática, de Português, no cotidiano”.

Tirando o sonho da gaveta

A gerente-geral da Educação da Fundação Roberto Marinho, Vilma Guimarães, explica que o Telecurso tem como especificidade considerar a história de vida de cada um, para que os alunos possam aprender, com prazer. “Eles perdem os medos e rótulos, que muitas vezes foram dados em suas experiências escolares e que faziam eles pensarem que falharam, e não o sistema. Esse reencontro com as competências, habilidades e essa possibilidade de produzir conhecimento ressignificam a prática escolar. Eles descobrem rapidamente que sabem muito. Estou muito feliz com essa parceria; de poder estar com a população da Maré, de poder somar esses conhecimentos que a Redes da Maré acumula a serviço da população. Podemos gerar uma transformação na vida de tantas pessoas”, finaliza.

 Na prática, é a possibilidade de gente como Júlio, Amanda e Luciana finalmente tirarem o sonho da gaveta de uma vez por todas.

 

O Telecurso da Maré representa uma nova oportunidade para a estudante Amanda Marques, de 17 anos | Foto: Elisângela Leite

Alguma coisa está fora da ordem

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Maré de Notícias #89 – junho de 2018

O problema do lixo na Maré é sério e exige diálogo entre Comlurb e moradores

Hélio Euclides

“O lixo de um homem é o tesouro de outro”, esse é o lema do artista português Artur Bordalo, conhecido como Bordalo II. Ele desenvolve ideias com materiais reciclados. No Rio de Janeiro, visitou uma cooperativa e, com os resíduos encontrados, fez um lobo-guará gigante, e a criação está na Cidade das Artes. Mas nem sempre o lixo é considerado luxo. Na Maré, o lixo se transformou em um problema para os moradores. Apesar da coleta domiciliar diária, ainda existem lugares onde o descarte é feito de forma inadequada. O projeto dos laranjões, caixas coletoras de 3,2 metros quadrados, ainda não funcionou, e pequenas quantidades de lixo são dispensadas no chão, por ausência de caixas coletoras.

Ao andar pelas ruas da Maré, é fácil encontrar copos, garrafas, latas e todo tipo de papel. Material que poderia ser reciclado, mas acaba indo parar nos bueiros de águas pluviais. A cidade do Rio de Janeiro produz cerca de 10 mil toneladas de lixo por dia, e dessa quantidade, apenas 1,9% são destinados à reciclagem. “Falta o pensamento da qualidade de vida, com a diminuição do consumo e a reciclagem. O lixo serve de geração de renda, pode voltar como outro produto. É preciso reeducar, ter uma mudança de hábitos, como andar com copo na bolsa, evitar usar descartáveis, repensar o consumo, comprar a granel e separar o lixo para os catadores”, aconselha a bióloga e educadora Júlia Rossi.

Para Júlia, não existe uma dinâmica de como tratar o lixo na comunidade. “Ele acaba ficando a céu aberto. O controle do lixo é necessário, em especial quando pensamos nos descartes e no lençol freático. Não podemos deixar de fazer a nossa parte e cobrar do Poder público caixas de coleta para as embalagens do que consumimos na rua. A humanidade necessita pensar no ciclo do lixo, que pode acabar poluindo, pois ele não evapora”, adverte.

 

Os laranjões

A questão do lixo abriu um debate entre os moradores. A Edição 55 do Maré de Notícias, de julho de 2014, trazia o lançamento do projeto Comunidade Limpa, que tinha como carro-chefe os laranjões. Já a Edição 66, de setembro de 2015, apresentou uma fotonovela, com a avaliação de jovens sobre a coleta de resíduos. Há um ano, na Edição 77, mostramos as consequências do descarte em local não apropriado. “Não vejo ninguém levantado esse tema tão importante na comunidade, aliás só esse Jornal. É triste ver o acúmulo de lixo na segunda-feira, na entrada das travessas da Vila do Pinheiro. Antes tinha a caçamba, que era lavada. Depois acabaram com o sistema e ficou o cheiro ruim. Agora retiraram os laranjões e ficaram as montanhas de lixo, que atraem ratos. O prefeito precisa vir à favela ver isso”, reclama o morador Paulo Maurício.

Os laranjões são questionados desde o início de sua implantação. “Quando foi oferecido o Projeto, não aceitei aqui. Foi a única comunidade que disse não. Hoje vemos alguns na beirada do valão, entre o Rubens Vaz e o Parque União, com lixo caindo na água. O problema é que o caminhão vive quebrando e junta muito lixo”, comenta Vilmar Gomes, o Magá, Presidente da Associação de Moradores do Rubens Vaz. Em algumas comunidades, as caixas coletoras estão sendo retiradas. “O morador não quer lixo na sua porta, mas joga na do vizinho, onde ainda tem os laranjões. Retiramos alguns, por reclamações de roedores, mau cheiro e lixo no chão. Muitos colocam o lixo na esquina da rua, o que traz insetos e entope os ralos de águas pluviais. A empresa tem de dialogar com a população, para que a coleta seja feita de porta em porta”, sugere Cláudia Santana, Presidente da Associação de Moradores do Parque Ecológico.

 

Todos precisam fazer a sua parte

A questão do lixo afeta o dia a dia da população e da empresa pública de coleta. “Parte do lixo espalhado tem um percentual nosso. Temos de colaborar, fazer a nossa parte, preservando o meio ambiente. Vejo os garis trabalhando e alguns laranjões pela comunidade, mas o que falta é organização desse descarte do lixo”, avalia Raquel Figueira, moradora da Vila Pinheiro. “É preciso fazer o certo, se o caminhão passou e o morador perdeu a coleta, que guarde o lixo para o outro dia”, sugere Solange Oliveira. Já Vânia Correia pensa numa coleta seletiva. “É preciso um trabalho de educação. Eu separo o lixo reciclável dos resíduos, o que ajuda os catadores. O ideal seria caçambas de cores diferentes para dar início à coleta seletiva na Maré”.

Messias, conhecido como Rei do Cloro, diz que tenta fazer a parte dele, ao varrer a frente da sua loja, na Nova Maré, todos os dias. “Por outro lado, não vejo o gari buscar na porta aqui na Nova Maré. Assim, o ideal é colocar o lixo na caçamba, e lembrar de pisar no pedal para abri-la. Onde moro, no Beco das Américas, no Parque Maré, só vejo a Comlurb (Companhia Municipal de Limpeza Urbana) de vez em quando, e não tem hora para passar. O morador perdeu o momento da entrega do lixo, então vai buscar um ponto de acúmulo na comunidade”.

“A questão do lixo está cada vez pior. Às vezes, o caminhão passa e outras vezes, não. O Salsa e Merengue está precisando de uma limpeza geral”, reclama Marluce Almeida. Para Márcio José, morador da Vila do Pinheiro, o lixo é o grande problema da Maré. “O serviço de coleta deixa a desejar, em especial nas travessas. Não podemos colocar o lixo nas esquinas, então saímos atrás dos laranjões, pois temos de dar um jeito”, explica.

 

A opinião de quem coleta

No dia 16 de maio foi comemorado o Dia do Gari. A palavra é uma homenagem ao empresário francês Aleixo Gary, que se destacou na história da limpeza da cidade do Rio de Janeiro, em 1876. Contratado pela Prefeitura, ele coletava e levava o lixo para uma ilha, Sapucaia. E conseguiu resolver um dos maiores problemas da cidade. A partir de então, quando os cariocas queriam que as ruas fossem limpas, chamavam os garis.

Um gari que atua no caminhão recolhendo o lixo domiciliar da Maré e preferiu não se identificar avaliou algumas questões: “é uma pena que os moradores ainda joguem muito lixo no chão. Nosso trabalho e o dos garis comunitários vai ser mais fácil se tiver apoio. O maior problema é que os caminhões estão no limite, e a Empresa que administra, a TRD Serviços e Administração Ltda., não tem como trocá-los. Dessa forma, eles vivem quebrados, o que interrompe a nossa ação e, por isso, a reclamação da coleta. Não existe caminhão reserva”, alerta.

Para o gari com quem conversamos foi boa a retirada dos laranjões. Ele diz que “diminuiu o lixo no chão. O correto é lixo na porta. A população reclamava muito do mau cheiro. A Empresa explica que eram lavados, mas não esfregavam; o chorume (líquido) e alguns resíduos ficavam neles. Era dinheiro jogado fora, então não se usa mais esse tipo de caminhão. Se tem problema na coleta, não é culpa da gerência-adjunta, que fica na Nova Holanda, eles se esforçam para fazer com o que tem”.

 

Uma das áreas mais críticas é a Via C4, onde é possível ver uma montanha de lixo | Foto: Elisângela Leite

A limpeza urbana da Maré

A Maré, pela quantidade de ruas e habitantes, supera muitos bairros e se aproxima do padrão de uma cidade. Segundo a Comlurb, para coletar as 143 toneladas diárias, num total de 4.290 toneladas mensais, a Empresa utiliza 227 laranjões, 12 equipamentos compactadores, 33 veículos, 56 garis da Empresa, e 67 garis comunitários, que realizam a varredura nas principais vias.

Cláudio Brito, o Chiquinho, é Gerente de Departamento da Comlurb, responsável pela Maré, e tem como uma das principais preocupações o lixo próximo aos valões. “É um trabalho de educação, é cansativo, mas não podemos parar. A população precisa ficar atenta e colocar o lixo cedo, para não perder a coleta”, aconselha. Uma das carências da favela é o coletor de papel, fixado nos postes. “É um custo alto de manutenção. Estamos voltando a colocá-los em praças e próximo às escolas. Sobre os laranjões, alguns foram retirados por não se adaptarem, pois ficava muito lixo no seu entorno. Quem precisar da coleta de entulho, deve procurar a Gerência local (Rua Tancredo Neves, Nova Holanda). Sabemos que ainda existe falha, mas procuramos fazer o melhor”, conclui.