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Maré de Notícias #30

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Área de lazer, projetos e moradia

Por Silvia Noronha

A comunidade de Marcílio Dias, que teve início com a construção de barracos sobre palafitas erguidos por pescadores em 1948, viveu dias agitados em maio. As famílias de Mandacaru tiveram de sair e seus barracos foram imediatamente destruídos pela prefeitura. Os moradores foram reassentados em um conjunto habitacional com apartamentos de dois quartos que passam a ser de propriedade eles, porém situados em Campo Grande, Zona Oeste da cidade.

As famílias esperavam por este momento desde fevereiro de 2010, quando a Secretaria Municipal de Habitação marcou casa por casa com as suas iniciais SMH. Na época, o Maré de Notícias (Ed. nº 4, de março de 2010) esteve no local e a reclamação era a falta de diálogo com a prefeitura. Os moradores queriam sair, devido à total falta de infraestrutura, mas não esperavam ir para tão longe. O Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano Sustentável do Rio de Janeiro recomenda que as remoções sigam alguns parâmetros, entre eles que o reassentamento seja feito em áreas próximas, o que não foi respeitado.

Os comerciantes, por sua vez, pelo menos até fins de maio, não haviam recebido qualquer indenização. Segundo a prefeitura, as ruas desocupadas servirão para dar passagem para o Mercado São Sebastião.

Boas novas para Marcílio

Mas Marcílio Dias também vive boas novas, embora parte delas ainda esteja no campo da “promessa”, conforme frisa a presidente da Associação de Moradores, Jupira dos Santos, ao listar os planos anunciados. Um deles é a transformação de um trecho que contorna a Marinha na Av. Lobo Júnior em área de lazer. O projeto, porém, está emperrado, pois parte da obra é de responsabilidade da prefeitura, que precisa limpar o local, e a outra parte mais colada ao muro será feita pela Marinha.

A reforma da praça, pelo menos, já está em andamento. Além da reforma da quadra, a prefeitura prometeu a transformação dos trailers em quiosque. Bem ao lado, atrás da associação, segundo Jupira, será construído um Espaço de Desenvolvimento Infantil (EDI), com creche e pré-escola. “Por enquanto, tudo promessa”, ressalva.

Jupira deseja ainda melhorias no abastecimento de água potável. O programa Água para Todos foi desenvolvido no local, porém a água continua sem força. “As coisas são feitas picadas. Não existe um planejamento para a comunidade”, reclama o diretor da associação, Edmilson Joaquim da Silva.

Um projeto que anda a pleno vapor é a Colônia de Pescadores de Marcílio Dias, que recebe toneladas de pescado diariamente, a maior parte capturado dentro da Baía, e um bom movimento de compradores com seus caminhões frigoríficos. “Tem bastante peixe (na Baía). Sinto que melhorou de um ano e meio, dois anos pra cá. Os pescadores da própria colônia e de fora estão conseguindo trabalhar”, conta Igor Leonardo Cunha da Silva, que administra a Colônia junto com Milca Gino.

Nossa história bem contada

Por Silvia Noronha

“Memória e identidade dos moradores de Nova Holanda”, primeiro livro de uma série que pretende apresentar a história das 16  favelas da Maré, nos transporta para os tempos de outrora, a partir da vivência dos próprios moradores. Eles contam sobre a chegada à comunidade, sobre a ligação com a cultura local, o estabelecimento dos laços familiares e demais fatores que contribuem para o assentamento de raízes.

O livro será lançado dia 15 de junho, às 17h, no Centro de Artes da Maré (CAM), pelo Núcleo de Memória e Identidade (Numim), da Redes da Maré, com o patrocínio da Secretaria de Estado de Cultura do Rio de Janeiro e do Instituto Estadual do Patrimônio Cultural (Inepac). O segundo e o terceiro volumes já começaram a ser produzidos e serão sobre o Morro do Timbau e o Parque Maré. O objetivo do projeto é resgatar a contribuição dos moradores da comunidade na construção da sociedade carioca e fluminense, reconhecendo-os como sujeitos plenos da história.

O livro da Nova Holanda, que também traz textos sobre as origens da comunidade, foi coordenado por Edson Diniz, diretor da Redes, Marcelo Castro Belfort e Paula Ribeiro. O trabalho contou ainda com a participação de quatro jovens estudantes da Maré: Higor Antonio, Marcelo Lima, Kelly San e Diogo Vitor. “A cidade precisa ser uma só, reconhecendo a diversidade de seus espaços, histórias e identidades como algo positivo, como uma característica que a torna mais bela, melhor de se viver e que marca de forma indelével a alma carioca”, avalia Edson.

Selecionamos alguns trechos para dar ainda mais vontade de ler o livro inteiro.

Seu Joaquim Severino da Silva

“Se o cara pergunta se você já encontrou um lugar que é melhor que a Nova Holanda, você diz: ‘Melhor que a Nova Holanda, só quando eu chegar no céu’, porque Nova Holanda é só aqui na Nova Holanda. Porque a Nova Holanda tem tudo, tem comércio, tudo, tudo, tudo. A gente tá  tomando um cafezinho, o homem passa aí, todo dia, a comunidade, cinco da manhã até oito da noite, perdi as contas, todos trabalham. Tem ônibus pra Barra, ônibus pra Alvorada, ônibus pro Leblon! Kombi, ih, meu Deus, quer melhor do que isso? Está tomando um cafezinho e o cabra diz: “Ôh, seu Joaquim!” E eu digo: “Ôh, meu filho, espera aí que tô tomando meu cafezinho aqui”. O cara para a Kombi, a gente toma o cafezinho, joga o copo dentro da pia e pega a Kombi e vai para Bonsucesso. ”

Seu Adevanir de Oliveira

“Lá no Esqueleto, a gente tinha fundado um blocozinho carnavalesco, mas com a saída de lá, aquilo se espalhou, mas aqueles que vieram pra cá fundaram um outro bloco: “Unidos de Nova Holanda”, do qual eu assumi a direção da bateria. E ali a gente fazia reunião toda semana, muito bonito aquilo também. Era um bloco sem compromisso, era simplesmente pra complementar um lazer que não tinha na comunidade. Eu me sentia muito bem fazendo aquilo, independente da diretoria do bloco da Nova Holanda, porque eu fiz uma diretoriazinha para ajudar a bateria. E a gente fez uns dois ou três desfiles. A gente preparava, se ajeitava, entrava no ônibus e ia pra  idade, porque não tinha que tirar licença. Então, a gente ia lá e desfilava na Rio Branco, fazia aquela farra. Depois, ia pra casa. Aí desfilava por aqui e aí acabava. Até que houve um ano em que a gente chegou no desfile na Presidente Vargas, a passarela era na residente Vargas, aí não deixaram a gente passar na passarela. Já tinha televisão e deu um problema danado lá com o pessoal que tomava conta. Aí, todo mundo me viu na televisão reclamando e tal. Acho que aquilo que me tornou muito conhecido na comunidade… E eu disse: “Não tem problema, vocês não deixam a gente passar pela pista, a gente vai passar por de trás”. Passamos por de trás da pista e a televisão filmando a gente. Fomos até o final, voltamos e cumprimos a nossa meta, que era de desfilar. Eu acredito que a gente tinha umas 800 pessoas mais ou menos e fizemos nosso desfile até chegar aqui. ”

Jurema Onofre de Souza, a Dona Noca

“Eu vim pra cá com dez anos, quando aconteceu a remoção. Não ficamos no albergue, não. Era barraco, tudo madeira. Era madeira, assim, azul e branquinha. A janelinha e as porta eram azuis. Era só barraco, mas tinha piso, tudo direitinho. O banheiro também, tudo de pau. O Carlos Lacerda removeu a gente pra cá. (…) Ah, eu gosto daqui, sim. A Nova Holanda era melhor do que o Esqueleto. Eu me lembro sabe o quê?! Aqui, na Teixeira Ribeiro, nós passamos com o caminhão da gente, da remoção, e era numa pinguela! Aí, tinha uns barraquinhos na água e, quando a gente passou, falaram assim: “Lá vêm os esqueletos humanos! Olha os esqueletos humanos chegando!” Eu me lembro disso até hoje. Hoje em dia, esse pessoal é grande amigo meu. Você tinha que ver a Teixeira Ribeiro como é que era! Hoje em dia, isso aqui está um sucesso. Isso aqui está a Zona Sul! ”

Dona Maria Lopes, a Maria da Cocada

Essa iniciativa que vocês estão tomando é muito importante. É muito importante que vocês tenham o que contar, contar o que foi a Nova Holanda e o que é a Nova Holanda. Como a Nova Holanda iniciou e o que ela é hoje e está se tornando. Muito abençoado. E talvez as pessoas que moram lá embaixo, na sociedade… aqui dentro tem pessoas com muito mais categoria. Entendeu?! ”

Seu Genival de Oliveira
“Isso aqui tudo era maré. Maré enchia, enchia tudo aqui. Começaram a aterrar e eu, quando vim para cá, ainda não tinham aprontado ela [a Nova Holanda]. Ainda faltava botar luz, água, calçada… Não tinha calçada aí na rua, não era asfalto, era barro! De manhã cedo, só via nego com um balde d’água, com uma criança atrás, até a mulher mesmo ia junto com ele, com o marido, ia levando um balde d’água e um pano pra ele enxugar os pés, que lavava lá na Avenida Brasil, se calçava e ia trabalhar. A lama dava no meio da canela, o barro. Porque… como ia pisar na lama calçado? Era um barro vermelho aqui, só você vendo. Chovia, pronto, acabava a graça aqui. E quando fazia sol era aquela poeira de barro… Era um sofrimento aqui. Depois botaram paralelepípedo e daí botaram o asfalto. Em 1961, já tinha a Light. Tinha uma associação já, de morador, que a gente pagava um trocado. Não tinha relógio ainda, não tinha nada. Tinha um cara que tomava conta lá da sede, o seu Ezaquiel, e se não pagava aquela taxa, ele ia lá e cortava a luz. Aí, o cara pagava, ele ia lá e ligava de novo. Quando estourava um transformador, queimava um fusível, a gente fazia vaquinha pra comprar outro. ”

Arrasta-pé na praça

Por Rosilene Miliotti

Localizada às margens da Avenida Brasil, a praça do Parque União, onde acontecem shows de forró, recebe uma média de público de 5 mil pessoas nos fins de semana e gera cerca de 250 empregos diretos e indiretos. Mas se engana quem pensa que são apenas moradores que frequentam o local. Um dos organizadores dos eventos e morador do Parque União, Edivan Valério, diz que “vem gente de todo lugar: Rio das Pedras, Rocinha, Copacabana, Pavuna, Baixada Fluminense. Em dia de show de bandas muito conhecidas, chegamos a receber 8 mil pessoas. Depois da feira de São Cristóvão é o local mais frequentado pelos forrozeiros, nordestinos ou não”, afirma.

A quem diga que prefere o forró da praça em vez da Feira de São Cristóvão. É o caso Antonio Carlos dos Santos, morador de Duque de Caxias, que frequenta o Parque União há 10 anos. “Aqui tem forró do bom, comida e bebida mais barata, não tem que pagar para entrar, tem segurança e tranquilidade. Além disso, é pertinho do ponto de ônibus e táxi”, relata ele. Já para o cearense recém chegado, André Santos, morador de Copacabana, o ambiente é muito bom e tem muita mulher bonita. “É um lugar ótimo para paquerar e foi um dos primeiros lugares que meus amigos me trouxeram para conhecer”.

Para Adriana Ferreira, moradora da Vila do João, os dois lugares são diferentes, mas prefere a praça por ser mais perto. “Dá para decidir na hora com os amigos, não precisa programar”, conta. Entretanto, sua amiga, Valéria Nunes, prefere a Feira de São Cristóvão por ter mais espaço para dançar. “Aqui é apertado. Na hora dos shows lota e a gente quase não consegue se mexer”, lamenta.

O Fazendeiro
Há 22 anos, Luis Fazendeiro, como era conhecido, um nordestino que gostava de forró, começou a organizar apresentações de bandas na Rua Roberto da Silveira, ao lado da praça. A primeira banda a se apresentar foi a Sol e Magia, composta por moradores da comunidade.

Na época, as bandas se apresentavam na rua, fora da praça, porque o local ainda não tinha a estrutura de hoje. Luis começou então a dividir as despesas dos shows com os comerciantes e, a partir daí, surgiu o modelo de cooperativa informal que funciona até hoje. Atualmente, a praça conta com 31 financiadores, entre donos de bares, restaurantes e quiosques.

A organização
Andre Gonçalves, coordenador dos seguranças, diz que o trabalho dele e de sua equipe consiste em manter a ordem durante os shows, evitando brigas, usando educação acima de tudo e energia se preciso for, mas nunca violência ou agressão. “Estamos aqui para manter a ordem de um local seguro e de diversão. Aqui, os frequentadores são, na maioria, cearenses. Domingo é o dia que mais enche e por isso requer mais atenção dos seguranças. O forró gera lucro e emprego para o comércio local. Além disso, os seguranças e todos os eventos são financiados pelos próprios comerciantes. Bandas famosas no meio artístico do forró como Gatinha Manhosa, Frank Aguiar, Bonde do Forró vêm pra cá e trazem mais público para o Parque União”, conta.

O paraibano Pedro Gomes de Sousa, mais conhecido como Cazuza, lembra que no início havia apenas três quiosques. “Antes de ser na praça ao ar livre, as pessoas iam para o Forró do Bola Branca, também conhecido como Forró do Lampião. Mas com o tempo o clube foi acabando e o forró da praça ganhando força. A primeira grande banda que veio foi a Magníficos; cerca de 10 mil pessoas estiveram aqui. A partir daí percebemos o potencial cultural e de entretenimento desse lugar”, conta.

Para o cearense Antonio Rodrigues, dono do quiosque Rei das Cabritas há 20 anos, seu trabalho não é apenas vender carne de sol com aipim e manteiga de garrafa, é uma forma de divulgar a cultura e a culinária nordestina. “Aqui sirvo pratos tipicamente nordestinos. Temos carne de sol, manteiga de garrafa e baião de dois”, conta.

A agenda de shows, vídeos e fotos: www.encontrodosartistas.com

Uma conversa cara-a-cara

Por Hélio Euclides

Presidentes de associações de moradores, várias lideranças e representantes de instituições locais tiveram o primeiro encontro com o prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, para discutir as propostas contidas no projeto A Maré que Queremos. A reunião no Centro de Artes da Maré (CAM), na Nova Holanda, na manhã de 19 de maio, reuniu ainda três vereadores.

Os representantes da Maré manifestaram contentamento com o primeiro passo para a implantação de um projeto estruturante, com base nas demandas mapeadas pelos líderes comunitários. O coletivo A Maré que Queremos foi criado em fevereiro de 2010, reunindo os presidentes das associações de moradores, por iniciativa da Redes da Maré para, juntos, pensarem num projeto estruturante para o bairro. Desde então, o grupo vinha tentando se reunir com o prefeito. “Acho bom o incentivo à integração. Estão juntas as 16 associações e outras organizações da Maré, num só corpo”, resumiu o presidente da Associação de Moradores do Morro do Timbau, Osmar Paiva Camelo.

O prefeito elogiou a iniciativa e firmou compromisso de realizar reuniões periódicas com o fórum. A segunda reunião foi marcada para 14 de julho, às 15h. Saúde, Educação e Conservação foram os  temas escolhidos para serem tratados nos próximos dois meses, com a realização de reuniões com a presença dos secretários e executivos responsáveis por estas áreas. “Na próxima reunião eu vou ser o interlocutor. A proposta é fazer algumas rodadas com os secretários, para eles mapearem. Vamos trazer os representantes da educação, saúde e também a Comlurb. Esses encontros facilitam a minha vida”, afirmou o prefeito.

Ele firmou ainda o compromisso da continuidade do trabalho da Rio-Luz e da operaçãoTapa-buracos (Secretaria de Conservação). Ainda comentou que pretende investir na cultura, com aumento no número de arenas e melhoria das lonas. Sobre o transporte alternativo, Paes foi taxativo ao aceitá-lo apenas como complemento, dentro da comunidade.

Segundo Eliana Sousa Silva, coordenadora geral da Redes, um dos objetivos do grupo é acabar com práticas políticas de favor. “Somente organizados podemos mudar as coisas. Por isso, o envolvimento do conjunto das associações de moradores é fundamental. Temos de trabalhar na direção da autonomia das instituições locais”, ressaltou. ”Há muito investimento público aqui e, no entanto, o Índice de Desenvolvimento Humano da Maré, que mede a qualidade de vida de determinado território, é péssimo. Queremos não só que os equipamentos públicos cheguem até a Maré, mas sobretudo que tenham qualidade e sirvam permanentemente à comunidade”.

Nas pág. 8 e 9, conheça as reivindicações prioritárias da Maré entregues ao prefeito. Leia também o artigo de Eliana Sousa, na pág. 10. Fique por dentro e vamos todos cobrar resultados!

Maré de Notícias #29

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Os sem-direitos

Por Cecília Oliveira e Inaira Campos / Observatório de Favelas

O encontro “Megaeventos e Violações dos Direitos Humanos”, realizado na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) em 16 de abril, trouxe à tona um tema que merece atenção: o reassentamento urbano. Atualmente, no Rio de Janeiro, esse procedimento tem a finalidade de desocupar espaços urbanos para o desenvolvimento do projeto “Cidade Olímpica”.

A Lei Complementar n.º 111, de 1º de fevereiro de 2011, que dispõe sobre a Política Urbana e Ambiental do Município do Rio de Janeiro, institui, dentre outras coisas, o Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano Sustentável, que recomenda que as remoções sigam alguns parâmetros. Em seu parágrafo primeiro, o Art. 211 diz que: “no caso de necessidade de remanejamento de construções, serão adotadas, em ordem de preferência, as seguintes medidas, em conformidade com o disposto na Lei Orgânica do Município:

1- Reassentamento em terrenos na própria área;

2- Reassentamento em locais próximos;

3- Reassentamento em locais dotados de infraestrutura, transporte coletivo e equipamentos urbanos”.

Mas, na prática, não é isso que as famílias atingidas estão vivenciando. Além da grave violação em relação aos métodos atuais para a remoção, moradores reclamam ainda da falta de comunicação com representantes do governo e dos valores das negociações. Favelas como Campinho, Madureira, Vila Recreio 2, Metrô Mangueira, Maracanã, Favela do Sambódromo, Barreira do Vasco, Favela da Providência, Pavão Pavãozinho, entre outras, estão sendo removidas para áreas onde obras de revitalização não chegam.

A Vila Autódromo, que vem resistindo à remoção desde os Jogos Panamericanos, em 2007, teve sua sentença decretada em abril: será removida em 90 dias (em meados de julho). O intuito é que ela dê lugar ao Parque Olímpico do Rio, que pegará inclusive a área do Autódromo de Jacarepaguá. A obra, que está para começar também dentro de 90 dias, será feita mesmo antes da desocupação dos móveis.

A prefeitura já informou que não pagará indenizações, afirmando que moradores não possuem título de propriedade, informação esta contestada pela Defensoria Pública do Estado, que acompanha o processo e diz que há moradores que têm títulos desde a década de 1990.

De acordo com a Associação Brasileira de Direito Ambiental, mesmo aqueles que não têm o documento devem ser indenizados com base no direito à moradia, previsto na Constituição. A Lei Federal 11.124, de 16/06/2005, que dispõe sobre o Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social, explicita que a utilização prioritária de terrenos de propriedade do poder público devem ser para a implantação de projetos habitacionais de interesse social. E não o contrário.

Controvérsias: Deslocamentos Involuntários

O anúncio de que o Brasil sediaria Olimpíadas e Copa do Mundo foi recebida com festa pela imprensa, políticos e sociedade. Porém iniciativas como o coletivo de documentação Entre Sem Bater e Comitê Popular da Copa têm acompanhado a violação de direitos em decorrência das obras que preparam a cidade para receber esses grandes eventos.

“Me sinto um otário, porque quando o Brasil ganhou esta porcaria de Olimpíada eu estava na Linha Amarela com meu carro, fiquei buzinando igual um bobão. Agora estou pagando por isso. Isso que é Copa do Mundo? Isso que é espírito olímpico?”, indaga Michel, ex-morador do bairro da Restinga, Rio de Janeiro, removido compulsoriamente.

“As remoções são desrespeitosas e violentas. A maneira como eles [poder público] estão tratando os moradores, com truculência na hora que chegam para avisar sobre a remoção da casa, a falta de comunicação, de respeito, a maneira como atuam… Isso é violento demais”, relata Leo Lima, fotógrafo do Imagens do Povo, que documenta as remoções através do Entre Sem Bater.

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[toggle title=”Terra boa demais!”]

Por Jéssica Oliveira

Quem passa pela Rua Sargento Silva Nunes, na Nova Holanda, pode encontrar um senhor idoso, baixinho, com a pele negra e poucos cabelos brancos na cabeça. Provavelmente ele estará consertando um banquinho, vendendo um litro de cloro ou, quem sabe, tocando acordeon. É o Seu Joaquim, como cumprimentam os vizinhos que passam por ali: “Oi, Seu Joaquim, tudo bem?”, “Paz de Cristo, fulano”, responde, sempre muito simpático.

Joaquim Severino da Silva é o dono de uma pequena marcenaria no térreo do sobradinho onde mora há 50 anos. Ainda jovem, deixou Mamanguape, no interior da Paraíba, cidade em que nasceu. Subiu em um pau de arara aos 17 anos e com muita coragem e determinação enfrentou as dificuldades da viagem que o traria para o Rio de Janeiro. “Vim ganhar dinheiro. A vida na Paraíba era muito difícil”, conta, relembrando o tempo em que trabalhava como agricultor nas terras nordestinas.

Ao chegar ao Rio morou primeiro no morro do Timbau e trabalhava como ajudante de pedreiro. Com uma memória de dar inveja, Seu Joaquim conta sua história lembrando com exatidão os anos que marcaram sua vida: “Eu cheguei no dia 10 de maio de 1948. Trabalhei e juntei um dinheiro pra ir pra Paraíba visitar os parentes, mas em 1954, quando estava com a passagem comprada, não pude viajar por conta da morte de Getúlio Vargas: ninguém entrava e nem saía do Rio de Janeiro”.

Quando enfim pôde voltar para sua terra, Seu Joaquim logo conheceu a jovem Luzia de Souza Silva, mulher com quem está casado até hoje. “Olha que linda a minha princesa”, diz sorridente enquanto mostra dona Luzia numa pintura antiga. “Esse quadro foi feito pelo Seu José, em 1963. Ele morava em Alcântara, mas já faleceu. Disse que sempre que eu olhasse essa pintura me lembraria dele. E lembro mesmo”, afirma.

Depois que casou, Seu Joaquim permaneceu na Paraíba por cinco anos trabalhando em lavouras. “Lá eu plantava café, tomate, batata… tudo!”, conta. Mostrando que sempre foi um bom administrador, Seu Joaquim mais uma vez juntou um dinheirinho, mas dessa vez voltou sozinho para o Rio de Janeiro.

Quando retornou, foi morar em Cordovil, trabalhando na escola Nova Holanda – que fica em frente a sua atual casa –, até conseguir dinheiro suficiente para trazer a esposa e os três filhos para conhecerem a Cidade Maravilhosa. “Naquele tempo, quando um homem pedia uma moça em casamento, a primeira coisa que o pai queria saber é se o noivo tinha casa. Como eu ia trazer minha mulher pra cá sem lugar certo pra morar? Tem que saber administrar”.

Tudo por um bom emprego

Pouco depois de trazer sua família para o Rio de Janeiro, Seu Joaquim sofreu uma desapropriação. Foi então que se mudou para Nova Holanda, onde fixou residência permanente. Ele lembra que a favela começou a ser aterrada em 1958, a mando do então governador Carlos Lacerda. “A comunidade era um mangue. Caranguejo morria atropelado na Avenida Brasil”.

Representando um perfeito exemplo de homem trabalhador, Seu Joaquim nunca mediu esforços para ganhar o pão de cada dia. Ele conta aos risos a vez em que teve a oportunidade de trabalhar numa grande empresa de construção civil, mas a falta de estudo complicou sua situação. “Pensei: vou arrumar uma ‘boca boa’. Mas a firma pedia diploma do ensino fundamental e eu não tinha”. Perder essa chance era algo que não passava pela cabeça deste paraibano arretado. Sabia ler e escrever, mas faltava o certificado. Foi então que contou sua situação a um amigo que logo o aconselhou a comprar um diploma. “Eu cheguei em casa, falei com a mulher e peguei o dinheiro. No mesmo dia fui ao local indicado, que ficava em Duque de Caxias”. Apesar da grande espera que ocupou todo o dia de Seu Joaquim, ele esperou pacientemente sua vez. Pagou o diploma com cinco cruzeiros e no dia seguinte o levou para a empresa. Dali em diante, bateu cartão todos os dias às 7h da manhã.

Em pé, frente à sua lojinha, ele contou essas e outras das suas histórias. Disse que o dia mais feliz que passou na Nova Holanda foi quando entrou para a igreja. “O Senhor me tocou e faço parte da Assembleia de Deus há 41 anos”. Segundo ele, antes de ser sensibilizado pela fé, não dedicava a devida atenção e carinho à sua família: “Eu ficava na ‘gandaia’, gastando dinheiro com bebedeira, com mulher na rua. Às vezes até deixava faltar coisas pros meus filhos, mesmo bem empregado. Isso era muito errado”.

Hoje, aposentado, Seu Joaquim acorda cedo, ajuda “sua princesa” nas tarefas domésticas e faz dez flexões para manter a boa forma. “Faço isso de domingo a domingo!”. E claro, lê a Bíblia e frequenta religiosamente a Assembleia de Deus de Nova Holanda. Pai de quatro filhas formadas em Enfermagem, um estudante de Direito, um professor de História e um presbítero, olha para a Escola Municipal Nova Holanda e diz, com orgulho, que todos de sua família estudaram ali, lamentando sua interdição desde o começo do ano (para reforma). Mas não perde o bom humor e a fé na vida, tampouco, o amor pela Maré: “Ah, gente… Nova Holanda é terra boa demais!”, encerra sorrindo.

São 14 creches e ainda faltam vagas

Por Hélio Euclides

Quando se descobre que são 14 creches públicas na Maré, divididas entre as municipais, conveniadas e uma estadual, a impressão é de que esse número de unidades dá conta da demanda. Porém, devido ao grande número de crianças em idade para frequentar as creches, o total é insuficiente. Além disso, seis comunidades ainda não dispõem de uma unidade infantil pública: Bento Ribeiro Dantas, Conjunto Esperança, Conjunto Pinheiro, Marcílio Dias, Praia de Ramos e Roquete Pinto. Por enquanto, as mães de Marcílio Dias, Praia de Ramos e Roquete Pinto são as que mais precisam caminhar para deixar os filhos em unidade pública.

Para reverter essa deficiência, a prefeitura vem investindo nessa área, prometendo a ampliação do número de vagas. Segundo a Secretaria Municipal de Educação, mais quatro unidades estão previstas para a Maré, sendo uma a ser inaugurada em 2012, na comunidade Nova Maré; duas a serem construídas, na Nova Holanda e no Morro do Timbau; e uma projetada para Roquete Pinto.

Antonia de Souza dos Santos acha que teve sorte de conseguir vaga para o filho, pois a fila para a matrícula costuma ser grande. “Não demorei a conseguir vaga, mas isso não acontece com todo mundo”, observa ela, que já foi funcionária de creche conveniada. O filho de Antonia estuda na creche Pescador Albano Rosa, na Vila do Pinheiro. A mãe elogia o desempenho dos profissionais da unidade, o que considera um diferencial. “Do prédio não gosto muito, pois o banheiro é longe. Mas é superado pelo bom trabalho dos profissionais”, avalia.

É que na creche Albano Rosa as crianças ficam em acomodações provisórias, onde funcionava a Escola Municipal Professor Paulo Freire. “Aquelas instalações não são adequadas, isso qualquer um pode ver, nem precisa ser engenheiro para chegar a essa conclusão. Essa situação vem ocorrendo há vários anos, mas todos os profissionais se empenham para desenvolver o melhor trabalho possível”, revela uma funcionária, que prefere não ser identificada.

Nem todas as creches enfrentam esse obstáculo. As instalações do programa Espaço de Educação Infantil Vila do João, administrado pelo Riosolidário/ Obra Social do Governo do Estado, estão em bom estado, funcionando em um prédio que nada lembra a antiga Creche Tia Dulce. Uma parceria que começou com a iniciativa privada, a empresa NHJ do Brasil, que colaborou na reativação, construção e na manutenção das atividades e agora conta ainda com o apoio da Loteria do Estado do Rio de Janeiro (Loterj). O espaço foi inaugurado em 2008, funciona em horário integral e oferece ensino de educação infantil nas modalidades creche e pré-escola.

Na educação municipal, uma novidade são os Espaços de Desenvolvimento Infantil (EDI), modelo implantado pela atual administração da capital, unindo creche e pré-escola. A Maré conta com dois desses novos modelos, ambos no Timbau: EDI Pescador Isidoro Duarte e Professora Kelita Faria de Paula. Voltado para crianças entre zero e cinco anos e 11 meses, o EDI trabalha com auxiliares de creche e professores infantis, do berçário até a pré-escola. Nas unidades comuns, que atendem crianças de zero a três anos de idade, não há a presença do professor infantil.

“O EDI é totalmente diferente. Esse projeto é o menino dos olhos do prefeito e da secretária, de uma valorização da primeira etapa, um olhar diferenciado da educação infantil. O único problema são as outras unidades ficarem esquecidas”, alerta uma funcionária, que também prefere não ser identificada.

Valorização da alimentação

No passado, o diferencial das creches da prefeitura era a supervisão da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social (SMDS). As unidades eram então dirigidas por assistentes sociais, que tinham um olhar especial de cuidar das crianças. Para as conveniadas, a verba era menor, pois a prefeitura era responsável pela alimentação. Com isso, um marco desse trabalho foi a capacitação nutricional.

Quem lembra bem dessa fase é Maria Euzinete, a dona Nete. Ela é administradora da Creche Comunitária Sagrado Coração de Maria, no Parque Maré, que completou 24 anos de atividade. No início eram 35 crianças; hoje são 125 meninos e meninas. O trabalho já recebeu até um prêmio de reconhecimento, vindo de um jornal carioca. “Queremos o melhor para as crianças e fazemos esse conjunto com a família. As minhas meninas são muito competentes”, destaca d. Nete. Ela observa que hoje alguns tópicos melhoraram, como o trabalho dirigido por pedagogas e o repasse da verba pública em dia.

Quem não conhece, pode até se assustar com a quantidade diária de comida para a merenda. Dona Nete revela que a alimentação é muito importante. São cinco quilos de arroz e outros dois de feijão. Para a mistura são cinco quilos de carne ou oito de frango. Como complemento também pode ter sopa, pois são quatro refeições diárias. A sobremesa é fruta: oito quilos de banana ou oito de maçã ou 15 de laranja e ainda uma melancia. Para o lanche 14 litros de leite, achocolatado e sucos. Essa nutrição só é possível por causa de doações e da parceria com a prefeitura, que banca 70% das despesas da creche.

Veja a relação de creches públicas da Maré e a resposta da Secretaria Municipal de Educação na edição digital.

Doutor es da Maré

Por Silvana Bahia / Observatório de Favelas

No dia 28 de abril foi comemorado o Dia Mundial da Educação. A data faz menção ao Fórum Mundial da Educação realizado entre os dias 26 e 28 de abril de 2000, em Dakar, no Senegal. Neste encontro, representantes de 180 países se comprometeram a construir políticas que viabilizem, entre outros objetivos, o acesso universal à educação. Doze anos depois, na mesma semana que se comemorou esse compromisso, o Supremo Tribunal Federal (STF) julgou e aprovou, por unanimidade, a constitucionalidade das cotas raciais. A decisão foi considerada a consolidação de um avanço nas políticas de ações afirmativas que visam diminuir a disparidade na educação do Brasil.

O ingresso de brasileiros, inclusive da Maré, na universidade vem aumentando na última década. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o número de pessoas com o nível superior completo passou de 4,4% para 7,9% da população do país – ou seja, oito pessoas em cada cem. Embora o índice tenha aumentado, esse número ainda é irrisório. Na Maré, mais de mil pessoas possuem curso superior. Os últimos números do IBGE indicam 1,8% da população local formada ou cursando faculdade.

Sandra Tomé, moradora da Maré, passou pelo pré-vestibular comunitário e se formou aos 39 anos em Serviço Social. “Na Maré, na minha adolescência, ninguém pensava em chegar à faculdade. O máximo que as pessoas chegavam era no ensino médio. Quando surgiu a oportunidade do pré-vestibular, falei com meu marido e decidi voltar a estudar. Sou a primeira pessoa da minha família a ter um diploma de curso superior”, conta Sandra, que se sente uma vitoriosa.

Os cursinhos comunitários são uma alternativa para os jovens que desejam ingressar na universidade pública, sem pagar as mensalidades de cursos preparatórios que não cabem no bolso.

Diretor da Redes de Desenvolvimento da Maré e coordenador do pré-vestibular Preparando para o Futuro, Edson Diniz acredita que mais investimento nas universidades e na qualificação de professores é a estratégia para o fortalecimento da educação. “O Estado precisa garantir um ensino público de qualidade e isso se faz com investimentos na qualificação dos professores, no aumento de seus salários e na valorização da categoria. Paralelo a isso é necessário investir na melhoria das faculdades de educação, melhorar  os programas de avaliação de aprendizagem, equipar melhor as escolas e incentivar a criação de uma cultura onde a aprendizagem dos alunos deve ser vista como o objetivo mais importante da educação”, ressalta ele.

O Preparando para o Futuro é uma iniciativa da Redes da Maré em parceria com a Supergasbras, existe há 14 anos e já contribuiu para o ingresso de mais de 900 alunos de espaços populares nas universidades públicas do Rio. “Em média temos 40% de aprovação por ano”, afirma o coordenador.

Maré na pós-graduação

A novidade este ano foi a criação do programa Novos Saberes, projeto de iniciativa da Redes com o Observatório de Favelas, para levar mais moradores para a pós-graduação. O curso, com duração de dez meses, é um preparatório para as provas de ingresso em mestrados e doutorados nas universidades, na área de ciências Humanas.

“Hoje, na agenda pública da cidade, as favelas tem uma posição bastante relevante. Até então as favelas eram invisibilizadas, era outra cidade. Hoje estamos num momento importante porque as favelas estão se afirmando do ponto de vista cultural e político. Isso traz novas questões para as próprias universidades e no conhecimento do reconhecimento desses espaços se produz uma necessidade de um conhecimento mais apurado, sensível, mais de dentro. Neste sentido, as pessoas desses espaços populares trazem essa sensibilidade, a vivência. Por isso é importante que elas tenham oportunidades novas de produzirem conhecimento científico. Aliado a uma dimensão política da favela na agenda pública da cidade”, analisa Jorge Barbosa, diretor do Observatório de favelas.

Para o jovem Felipe Souza, graduando em Ciências Sociais, o Novos Saberes é uma experiência ímpar. “Cursos preparatórios para o vestibular têm diversos, mas para pós-graduação nunca vi nenhum. Além dos professores, que são excelentes, a abordagem aqui vai além da capacitação e o reingresso de pessoas na universidade, porque aqui é um espaço para problematizar as questões, inclusive de metodologia”, pontua o jovem.

A pluralização dos alunos do Novos Saberes também é considerado um ponto positivo por quem participa. “A dimensão da rede e as trocas favorecem ao fortalecimento do projeto”, conclui Felipe.

Ação Afrmativa

Conjunto de políticas públicas adotadas com vistas a contribuir para a ascensão de grupos socialmente minoritários, sejam eles grupos étnico-culturais, sexuais ou portadores de necessidades especiais. Tem como objetivo combater as desigualdades sociais resultantes de processos de discriminação negativa, dirigida a setores vulneráveis e desprivilegiados da sociedade.

Fonte: Programa de Pós-Graduação em Ciências Jurídicas da Universidade da Paraíba.

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