Após notícia de sua morte nesta quarta-feira (11), o cineasta e cria da Maré recebeu homenagens nas redes
Por Thaís Cavalcante em 11/11/2020 às 15h10
“Ele sempre esteve por perto. Foi e vai continuar sendo uma referência pra nós. Jovem da Maré que corria atrás de produzir uma comunicação que representasse a gente. Amarévê tem um pouco de Cadu Barcellos. Valeu por tanto! Vamos seguir por aqui também por você!” A postagem publicada no twitter do coletivo Amarévê resume como Carlos Eduardo, mais conhecido como Cadu, vai ficar na lembrança das pessoas que inspirou e em todos os lugares por onde passou. Cadu era muitos: pai do Bernardo, cineasta, produtor cultural, diretor artístico e o que mais seu talento e vontade permitisse.
As favelas e toda a cidade do Rio de Janeiro acordaram de luto. Cadu Barcellos, 34 anos e cria da Maré, foi morto a facadas na madrugada de terça para quarta-feira (11) na Avenida Presidente Vargas, no Centro do Rio de Janeiro. De acordo com a Polícia Civil, o caso está sendo investigado pela Delegacia de Homicídios da capital e um inquérito foi aberto para apurar as circunstâncias do crime. Testemunhas vão prestar depoimento para ajudar na investigação e identificar o autor. O cineasta deixa sua esposa Gabriela Alves, e seu filho Bernardo, de 2 anos, além de um legado de narrativas sobre a favela no cinema nacional.
Grande colecionador de produções, começou bem cedo experimentando o universo audiovisual nas Organizações Não-Governamentais da Maré e também na arte, atuando no grupo Corpo de Dança da Maré. Seus futuros trabalhos viriam do aprendizado na Escola de Cinema Darcy Ribeiro e na Escola Popular de Comunicação Crítica (ESPOCC), do Observatório de Favelas, onde também foi professor.
Cadu produziu curta-metragens, filmes, séries e documentários – a maioria sobre a temática periférica e usando o seu olhar local, de experiência e crítica social – como Feira da Teixeira (2006), Crônicas da Cidade (2007), Cinco Vezes Favela – Agora por Nós Mesmos (2010), Mais X Favela (2011), 5x Pacificação (2012). Em 2020, era diretor artístico do grupo musical No Lance e assistente de direção do programa Greg News, da HBO.
Seu legado na comunicação do Conjunto de Favelas da Maré pode ser visto também nas publicações da página Maré Vive. Ele criou a página em 2014 com outros moradores e comunicadores para informar, em tempo real, sobre a Ocupação Militar que ocorria no território. Seis anos depois, hoje o Maré Vive é uma mídia independente e colaborativa, com mais de 193 mil seguidores em suas redes.
Amigos e colegas de trabalho, além de organizações locais publicaram mensagens de carinho e luta nas redes sociais, como forma de manter viva a trajetória desse mareense que não está mais presente fisicamente, mas continua vivo em suas produções.
Leia as homenagens deixadas por amigos e organizações locais:
Raull Santiago (Coletivo Papo Reto)
“Cadu Barcellos foi meu professor na ESPOCC – Escola Popular de Comunicação Crítica. Uma das primeiras referências que tive de uma pessoa jovem e de favela, fazendo a diferença no a partir do local onde vivia. Carismático, empreendedor e inspirador, me ajudou muito nessa vida. Ajudou literalmente, de bom ouvinte, bom conselheiro, até emprestar grana em momentos que passei muito mais perrengue no passado. Cadu me inspirou de muitas formas e foi uma daquelas pessoas que eu olhava lá em cima, grande, potente, trilhando um caminho que abriu portas para a favela. Eu realmente estou sem chão! Minhas amizades dessa época estão entre as minhas maiores inspirações vivas. E você foi importante para eu chegar nos lugares que estou hoje, irmão. Que dia terrível. Obg por tanto, mano. Valeu, Cadu!”
Dayana Leonel Barcellos (Amiga)
“Garoto, parecia que a vida não tinha dias ruins pra você… Cadu Barcellos vc acreditou em cada projeto seu… Correu atrás, alcançou lugares altos… Mas sempre tava aqui… Sempre voltou pra raiz… Já deu alguns sustos na gente como seu desaparecimento RS no carnaval… E como eu queria que essa notícia tb fosse algo enganoso, mas não é. A gente segue daqui… Faça suas gravações daí e monte o filme mais brabo que você puder… Um segredo de estado seu sobrenome. Segue em paz, mano. Força pra gente que fica. Você deixou, sim, um legado para nós”.
Eliana Sousa (Redes da Maré)
“Cadu Barcelos era um jovem cheio de vida. Tinha uma alegria e energia contagiante. Fruto das possibilidades que foram gestadas a partir das lutas que travamos na nossa Maré, ele nos deixa de forma brutal. Ele se tornou um cineasta e buscou retratar a vida de muitos jovens de favelas, a partir de suas próprias vivências. Hoje a vida fica mais triste, ao pensarmos que não teremos, de agora em diante, a contribuição do Cadu nos muitos desafios que temos de lidar todos os dias. Saudades hoje e sempre”.
Jessé Andarilho (Biblioteca Marginow)
“Agora como é que eu vou dizer que a rua é nós? Cadu Barcellos era muito foda. Estudamos na Espocc, trabalhamos na Malhação, jogamos várias partidas de futebol e ele exibiu um dos seus filmes no sarau Marginow em Antares e trocou ideia com a menozada. O mano era puro, engraçado, inteligente e conhecia a cidade como a palma da mão. Tô boladão”.
Gregório Duvivier (Greg News)
“Assassinaram um amigo, um parceiro de trabalho, uma das melhores pessoas que eu já conheci na vida. Um ser humano bom. Brilhante. Família. A morte do Cadu Barcellos deixa um buraco do tamanho do mundo”.
Fábio Justino (Amigo)
“A violência na cidade do RJ é tão traiçoeira como um vírus. Direta ou indiretamente ela vai te encontrar. A Nação perdeu um dos seus mais apaixonados torcedores, a favela da Maré perdeu um dos seus filhos mais talentosos e nós perdemos um grande amigo: Cadu Barcellos”.
Naldinho Lourenço (Frente de Mobilização da Maré)
“Os passos vêm de longe, amizade mais ainda. Vários desenrola firmes e sérios, visão de futuro, risadas era o que não faltava quando nos encontrávamos, muita história pra contar que não cabe dentro deste singelo texto. É meu mano, vá em paz Cadu Barcellos, tamo daqui orando por você”.
Rene Silva (Voz das Comunidades)
“Descanse em paz, Cadu Barcellos! Sentiremos muita falta aqui, mas seguiremos a sua luta pela diminuição da desigualdade e ao incentivo da potência da juventude da favela em termos oportunidades de transformação social”.
Maré Vive
“Hoje, nós do Maré Vive estamos de LUTO, mesmo que o amanhã ainda seja de Luta. Perdemos um amigo para essa violência diária, cria da Favela que esteve conosco tantas vezes. Existe um projeto de Estado que continuará tirando vidas, seja direta ou indiretamente. Nosso abraço forte e solidário para a família, em especial pra Dona Neilde, e aos nossos amigos que estão sem chão e sem acreditar nessa partida tão precoce. Seu legado foi deixado, Cadu. Obrigado!”
Redes de Desenvolvimento da Maré
“Cadu nos deixa muitos aprendizados importantes. Chamamos a atenção para um desses que é a certeza de que jovens de favelas, como ele, têm muito a contribuir com os desafios da cidade. Seu exemplo e seu trabalho se tornaram uma inspiração para todos os meninos e meninas de favelas e periferias. Nesse momento de imensa dor, fica a lembrança do jovem sempre alegre, disposto a colaborar, firme em seus propósitos e amoroso na convivência com todas as pessoas que tiveram o privilégio de conhecê-lo”. Leia aqui a nota completa.
Observatório de Favelas
“A Maré, as favelas e o conjunto da cidade amanheceram tristes hoje. Cadu foi aluno da Escola Popular de Comunicação Crítica – ESPOCC e seu talento, olhar e atuação é parte importante dessa história, da nossa história. Aos tantos amigos, aos familiares – sobretudo sua mãe, irmã, esposa e filho – a nossa solidariedade e carinho”.
Além das homenagens, amigos e colegas de trabalho de Cadu criaram o Fundo de Apoio a Bernardo Barcellos, filho de Cadu. Para doar, acesse: http://www.cadubarcellos.bonde.org
Assista algumas das produções dirigidas por Cadu Barcellos:
Curta-metragem “Feira da Teixeira” (2006)
Trailer do Filme “Cinco vezes Favela – Agora por nós mesmos” (2010)
Série “Mais X Favela” (2011)
Trailer do Documentário “5x Pacificação (2012)
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Velório de Carlos Eduardo Barcellos
Dia 12 de novembro de 2020
Velório às 10h / Sepultamento às 13h15
Capela 3 do Cemitério da Penitência
Rua Monsenhor Manoel Gomes, 307 – Caju. Rio de Janeiro – RJ.