A operação que aconteceu nesta quinta (6/05) entra na história como a mais letal. Segundo a Polícia Civil, foram cumpridos mandados de prisão de pessoas que estariam aliciando menores. Ministério Público informou ter sido notificado da ação.
Por Amanda Pinheiro, em 06/05/2021 às 18h27, atualizado em 11/5/2021.
Editado por Andressa Cabral Botelho
Despertados ao som de tiros desde as primeiras horas da manhã, moradores da favela do Jacarezinho, na Zona Norte, viveram um dia de horror nesta quinta-feira (6), devido a operação realizada pela Polícia Civil. Até às 16h, foram 28 mortos, sendo um agente, e os 27, segundo a corporação, eram suspeitos, mas os números ainda são incertos. A ação, nomeada de “Operação Exceptis”, já pode ser considerada a segunda maior chacina da história do Rio de Janeiro, de acordo com o Fogo Cruzado.
Além das vítimas da favela, dois passageiros que estavam no metrô, na estação de Triagem, foram levemente feridos após serem atingidos por balas perdidas. Durante esta tarde, na Avenida Dom Helder Câmara e na Avenida Democráticos, moradores protestaram contra as mortes e o abuso policial relatado por muitos, já que, segundo eles, a polícia invadiu casas e confiscou celulares sem autorização.
A coordenadora da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), Mônica Cunha, classificou como uma chacina a operação policial. “As pessoas têm vida dentro da favela, mas a vida não teve como funcionar. A única coisa que funcionou foi uma chacina, várias pessoas mortas, sendo um policial morto. Um absurdo e qual é o saldo disso? Pessoas mortas e luto. Hoje é no Jacarezinho, ontem foi na Maré, anteontem foi na Cidade de Deus e assim vai”, afirmou, em entrevista, para o portal Brasil de Fato.
A chacina ocorreu menos de três semanas depois da audiência do STF (Supremo Tribunal Federal) sobre a ADPF 635 – a ADPF das Favelas – que visa suspender as operações policiais em favelas durante a pandemia, podendo acontecer somente em casos excepcionais. Esses casos, antes de qualquer ação, devem ser comunicados ao MPRJ (Ministério Público do Rio de Janeiro), com uma justificativa e enviar um relatório com o resultado. De acordo com Silvia Ramos, coordenadora geral da Redes de Observatório de Segurança a operação foi desastrosa e em tom de vingança.
“O que aconteceu hoje na favela do Jacarezinho é, com certeza, o fato mais grave relacionado à violência e à segurança pública no Rio de Janeiro durante a pandemia. Aparentemente, uma operação desastrada, mal sucedida, em que a polícia estava atrás de grupos, que têm menores que assaltam na Supervia, e se tornou abertamente uma ‘operação vingança’. E a polícia, sem objetivo, simplesmente matou mais de 20 pessoas”, declarou Silvia, que questionou a motivação da chacina e ressaltou que o alvo são jovens negros.
“Basta ser jovem, negro, morador de favela, para ser suspeito para a polícia. Então, a polícia empilha corpos desses jovens e diz: ‘são todos criminosos’. E a gente pergunta: Quais os nomes deles? Qual a idade deles? Onde estão as famílias desses jovens? É muito simples dizer que são todos criminosos. Não é possível continuar matando gente assim. Em 2019, a polícia matou mais de 1800 pessoas. Ano passado, foram mais de 1300. Este ano, matou 157 e segue matando os que são suspeitos de crime. Até quando a polícia vai entrar na favela e deixar corpo no chão e sair? Que objetivo é esse?”, perguntou.
Em nota, o MPRJ informou que a polícia comunicou o órgão depois de ter iniciado a operação e que, ao longo do dia, recebeu denúncias de abusos por parte da corporação.
“O MPRJ informa que a operação realizada nesta data na comunidade do Jacarezinho foi comunicada à Instituição logo após o seu início, sendo recebida às 9hs. A motivação apontada para a realização da operação se reporta ao cumprimento de mandados judiciais de prisão preventiva e de buscas e apreensão no interior da comunidade, sabidamente dominada por facção criminosa. O MPRJ, desde o conhecimento das primeiras notícias referentes à realização da operação que vitimou 24 civis e 1 policial civil, vem adotando todas as medidas para a verificação dos fundamentos e circunstâncias que envolvem a operação e mortes decorrentes da intervenção policial, de modo a permitir a abertura de investigação independente para apuração dos fatos, com a adoção das medidas de responsabilização aplicáveis.
O canal de atendimento do Plantão Permanente disponibilizado pelo MPRJ recebeu, nesta tarde, notícias sobre a ocorrência de abusos relacionados à operação em tela, que serão investigadas. Cabe ressaltar que, logo pela manhã, a atuação da Coordenação de Segurança Pública, do Grupo Temático Temporário e da Promotoria de Investigação Penal, teve início a partir do conhecimento dos fatos pela divulgação na imprensa e redes sociais. Por fim, o MPRJ reafirma que todas as apurações serão conduzidas em observância aos pressupostos de autonomia exigidos para o caso, de extrema e reconhecida gravidade”, informou o MPRJ.
Nas redes sociais, ativistas e moradores de favelas repudiaram a ação da polícia. Durante o dia, o advogado Joel Luiz Costa publicou alguns vídeos e fotos do resultado da operação e fez um questionamento:
O outro advogado, Djeff Amadeus, também criticou a operação e lembrou da decisão do STF:
Ao longo do dia, levantaram a #ChacinanoJacarezinho no Twitter para que moradores pudessem compartilhar o que estava acontecendo, o que fez com que o assunto fosse um dos mais comentados no Rio na rede social.