Relatos de pessoas que tiveram covid confirmam que a doença não passa quando acabam os sintomas
Por Edu Carvalho em 11/03/2020 às 6h, editado por Daniele Moura
Falta de paladar, olfato, dor de cabeça, cansaço e perda de memória. Numa rápida publicação nas redes sociais, buscando personagens para esta matéria, foram os fatores mais evidenciados por quem contraiu o coronavírus ao longo do último ano. Mesmo aqueles que testaram positivo e durante 14 dias apresentaram sintomas leves, o clima de apreensão persiste meses após o contato com o vírus inimigo.
Mas para muitos, a situação foi outra. É o caso de Carlos Eduardo Prazeres, maestro da Orquestra Maré do Amanhã, no Rio, acometido pelo vírus no início de dezembro de 2020, onde foi internado por 15 dias, sendo oito deles em um leito de UTI. Não bastasse o sofrimento alinhado ao medo da morte, hoje Carlos luta contra os impactos deixados. ‘’Não consigo fazer esforços maiores, andar longas distâncias, sem que me falte o ar. Tive 60% do pulmão comprometido e vou passar alguns meses fazendo exercícios respiratórios com um fisioterapeuta para retomar minha rotina’’, conta ele, que teve atendimento médico pelo plano de saúde.
‘’Foram dias para esquecer, assim como todo o ano de 2020’’, reflete o dono da batuta que rege o projeto formado por crianças e adolescentes do conjunto de favelas da Maré. Em uma publicação feita em seu Facebook após a volta pra casa, Carlos fez um desabafo ‘’Deus me abençoou e voltei da morte, mas muitos não escapam. Tenham responsabilidade, nada de balada, nada de festa, em respeito ao seu pai, sua mãe, seus avós’’.
Manuela Moraes, 32, teve covid um pouco antes do Natal. Passado o período de resguardo, foi em viagem com família, seguindo todas as orientações, para a região dos Lagos do Rio.’’Senti muita tosse e muito cansaço. Atividades bestas pareciam muito desgastantes, como arrumar a cama. Eu tinha que parar e dar aquela respirada, fazia mais um pouco. Até na fala dava pra sentir que eu puxava um pouco mais de ar, uma certa dificuldade’’, diz.
Tendo asma, acreditou que os sintomas poderiam ser em relação à doença preexistente, mas ao comentar com uma amiga que é médica sobre seu estado, ouviu a recomendação de buscar saber mais sobre o que estava acontecendo. Foi ali que o conselho para procurar ajuda veio, na figura de um fisioterapeuta respiratório. “Quando fiz a avaliação, ele perguntou o que eu tinha dificuldade. Quando colocamos o oxímetro e fizemos exames, deu para perceber uma pequena lesão de um lado do pulmão e que meu batimento cardíaco estava alto. Sem que fizesse esforço, registrava 120 e quando se movimentava, superava 140. Os cuidados seguem por três vezes na semana. Sintetizando seu estágio, Manuela é enfática: ‘’Ainda estou no processo dos cuidados, mas sigo com os cuidados’’.
Mateus Costa é profissional de saúde em Barra Mansa, e em julho do ano passado, logo quando entrou na linha de frente para atendimento aos que precisavam, viu sua atuação mudar de lado, engrossando o número de casos. Oito meses depois do contágio voltou ao front e lida com as sequelas.“Eu tenho um pouco de esquecimento. Às vezes eu falo uma coisa e passa um tempo, não lembro. Acabo esquecendo, por exemplo, onde coloco as coisas minutos depois de ter guardado’’, diz o rapaz de 22 anos, que teve acompanhamento médico durante a doença. Para a volta ao trabalho, deu início a um check-up, ainda não terminado ‘’por conta da correria’’, mas já recebeu as duas doses do imunizante.
Robson Melo não conseguiu nem começar o check-up. ‘’Não tenho plano de saúde, dependo do SUS. Onde me consulto o elevador não funciona, você sobe e desce de escada. É tudo feito pra que você desista. Então imagina conseguir um check-up?’’, é o que relata o ator e morador da Rocinha, favela na Zona Sul do Rio de Janeiro, que testou positivo em dezembro passado.
‘’Quando comecei a ter os sintomas da covid, os primeiros foram a dor no corpo e febre por dois dias. Fui pra Clínica da Família, que receitou azitromicina, ivermectina e vitamina C com zinco’’ conta o rapaz que já tinha doenças preexistentes, como pressão alta, sobre o coquetel indicado para tratamento em casa. Mas antes de contrair, já pairava medo em sua cabeça. ‘’Olhava o panorama do país, e pensava que um vírus desse aqui vai fazer um estrago muito grande’’, sinalizava, já por morar na favela com maior índice de tuberculose no país.
Dos resquícios do novo coronavírus, ficaram alguns sinais. ‘’Às vezes tenho episódios de falta de ar, o que não tinha. Eu me levanto e sinto o corpo não corresponder’’. Além desses dilemas, somam-se as questões psicológicas, como ansiedade extrema, episódios de depressão e tristeza. Sem trabalho, aponta que uma das maiores dificuldades é ter recurso financeiro para dar atenção à saúde. ‘’Eu tento ao máximo me cuidar e cuidar do corpo, nos recados que ele manda’’ fala, enfatizando que vem tentando consulta em hospitais, mas não consegue. ‘’A vida é frágil, mas você dormir e acordar com a certeza dessa fragilidade, te dá impotência e medo”, finaliza.
Para a médica Mariana Sochaczewski, que já atuou no Hospital dos Servidores, Miguel Couto e Souza Aguiar, ambos públicos no Rio, e hoje atende em um espaço médico com preços populares, a recomendação é estar atento aos sinais do corpo. ‘’Como o vírus pode acometer cada pessoa de forma diferente, esses cuidados devem ser orientados de forma individual e específica no momento da alta hospitalar’’, reforça, elevando a atenção para a ida ao médico para avaliação completa.
‘’Se o paciente tiver um quadro mais grave ou com sintomas severos ou tiver alguma comorbidade, deve procurar atendimento quando tiver o diagnóstico suspeito ou confirmado. Cada alteração deve ser compartilhada com um profissional da saúde, porque os “sintomas” tardios podem variar de cansaço, inflamações, dores, confusão mental, esquecimento até dificuldade para respirar, e procurando atendimento médico precocemente, as chances de tratamento e alívio dos sintomas é muito maior’’
alerta a médica Mariana Sochaczewski