Entre pintar, resistir e reinventar André Vicente enfrenta os desafios de fazer arte sem desistir dela
Para André Vicente, morador da Vila dos Pinheiros, a vida é um ciclo constante de idas e vindas, de novos afetos e amores adormecidos, que podem despertar.
O artista, que redescobriu a paixão pela pintura após anos longe das telas, hoje possui um acervo de mais de 50 painéis e incontáveis artes produzidas, sempre com a essência da Maré presente em suas obras.
“O que me motiva hoje é poder criar, inspirar e passar adiante [minha arte]. Seja vendendo ou dando de presente, tendo sempre o nome aqui da Maré, tendo nas telas referências aqui onde eu moro”, diz.
Arte e ciência
A jornada artística de André começou em 2008, inspirada por revistas de bancas de jornais. A falta de dinheiro para os materiais, fez com que ele experimentasse misturas incomuns, criando obras pequenas e abstratas. O artista relembra a trajetória e os desafios que enfrentou, como o desemprego.
“Anos mais tarde, eu decidi voltar para a área de saúde, como técnico de enfermagem e trabalhei em várias coisas. Em um momento de desemprego, fui trabalhar com serviços gerais, morei fora, em Brasília de 2008 a 2010, onde perdi 99% dos meus materiais de pintura”, conta.
Em 2019, ele voltou para o Rio de Janeiro, como biomédico, para trabalhar na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), tendo contato com projetos de arte e ciência e com obras de Van Gogh, Monet e Picasso, o que reacendeu o desejo de pintar. A pandemia e o isolamento foram catalisadores para a retomada dessa paixão, além do incentivo de um amigo.
Criatividade como aliada
Sem recursos para um professor particular, André se empenhou a aprender técnicas no YouTube e a desenvolver sua própria visão artística, com auxílio de artistas que produzem vídeos gratuitos na plataforma, como os brasileiros Amauri Júnior e Pollyanna Ferreira, Joules & Joules, Fiuza & Moraes, Jaime Trindade e o espanhol Hangel Montero.
Ele incentiva que, outras pessoas, explorem a arte utilizando materiais disponíveis. “Não tem idade, né? Qualquer pessoa pode fazer, nem que seja para deixar na parede de sua casa e falar assim: ‘olha, essa tela é assinada por mim, ela é feita por mim e não há outra igual’, e sempre levando em conta que a imaginação é a senhora das ideias”, reforça.
Desempregado no momento, André confessa que o processo de criação não tem sido fácil, e que o apoio financeiro a artistas periféricos ainda é uma luta constante. “Às vezes, eu vendo uma tela para comprar outra, para pintar e seguir adiante. Às vezes, eu vejo uma tela antiga que serviria até como um documento de trajetória, mas acabo fazendo uma coisa por cima dela. Passo a tinta por cima, coloco outra coisa no lugar do anterior, e transformo em algo novo”, conta.
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Maré como inspiração
A paixão pela pintura o conecta com o território e o inspira a compartilhar sua visão artística com o mundo. André pinta cenas do cotidiano da favela, como crianças brincando de bola nas ruas e as belezas simples da vida na Maré.
Uma das telas, retratando um mosaico de diferentes favelas, foi exposta na Creche e Escola Sonho Infantil – SER, na Baixa do Sapateiro.
Para ele, a pintura é uma forma de se expressar: “Eu gosto de recriar, de transformar minha imaginação em tinta, em cores, formas, curvas retas, de transformar a arte em sentimentos”.