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Nas últimas semanas de março, alguns especialistas questionaram a relevância do isolamento social e como o fechamento dos comércios impacta na economia.

Maré de Notícias #111 – abril de 2020

Andressa Cabral

Na tentativa de frear a pandemia do novo coronavírus, muitos países estão limitando a circulação de pessoas. Com o processo de isolamento social e o fechamento de estabelecimentos que não são reconhecidos como essenciais, a economia tende a girar mais devagar. Além disso, aconteceram diversas mudanças na rotina de trabalho de milhares de trabalhadores, como a substituição do trabalho presencial para o trabalho à distância (home office, trabalho remoto), antecipação de férias, entre outras. Os trabalhadores informais perceberam o impacto dessas mudanças de forma mais direta, com o esvaziamento das ruas e a redução do consumo.

Os estados de São Paulo e Rio de Janeiro têm o maior número de casos de infecção e óbito pela COVID-19 desde o início da pandemia, assim como possuem duas das cidades mais ricas do País, segundo o IBGE. Desta forma, os governos desses dois estados adotaram o isolamento voluntário como estratégia preventiva para que não chegássemos em uma situação semelhante à da Itália, que em um período de mais de um mês de contágio ainda não chegou no pico de infecção e tem milhares de mortos.

Diante do estado de calamidade pública, foi preciso pensar em alternativas que seriam adotadas por empregadores, para a preservação da renda e do emprego formal, de forma a garantir a manutenção do vínculo empregatício. A Medida Provisória n° 927, aprovada em 22 de março, prevê algumas medidas para a manutenção do trabalho neste período de pandemia, como o teletrabalho e alteração no pagamento das férias.

No dia 1 de abril foi aprovado também o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, que autoriza empresas que aderirem ao programa a reduzirem proporcionalmente jornada de trabalho e salários dos empregados em um período de três meses. A medida serve para evitar que as empresas demitam arbitrariamente durante o período de crise provocada pelo novo coronavírus. A redução de jornada e salarial será de 25%, 50% ou 70%, mas preserva o valor de salário-hora do trabalhador. Para aqueles que tiverem o salário reduzido e recebem até um salário mínimo, o governo irá complementar o salário até o valor integral.

É preciso observar que essas medidas emergenciais para trabalhadores formais preveem uma série de arranjos temporários nos direitos trabalhistas previstos na Consolidação de Leis do Trabalho (CLT) e que são os empregados os mais prejudicados com as mudanças recentes. 

Medidas emergenciais que podem ajudar

Mesmo com as restrições de circulação, é um período de instabilidade financeira e muitas pessoas não têm o privilégio de ficar sem trabalhar. Desta forma, algumas medidas econômicas têm sido tomadas. Em âmbito estadual, o governador Wilson Witzel sancionou, no dia 23 de março, a Lei 1999/20, que proíbe a interrupção de serviços essenciais, como luz, água e gás, e permite o parcelamento dessas contas após o período de isolamento no estado do Rio de Janeiro.

No dia 02 de abril foi sancionado texto sobre auxílio emergencial por período de três meses a trabalhadores autônomos, informais e sem renda. Mães e pais solos que se encaixam nas categorias também serão beneficiados. O auxílio será limitado a duas pessoas da mesma família. O pagamento será feito por meio de agências bancárias e lotéricas. Na segunda semana de abril foi foi lançado pelo Ministério da Cidadania o aplicativo Caixa | Auxílio Emergencial e divulgado calendário de saques para aqueles que podem receber o benefício.

Desta forma, milhares de pessoas poderão dar entrada no auxílio, incluindo diversos empreendedores da Maré. De acordo com o Censo de Empreendimentos da Maré, organizado pela Redes da Maré em 2014, existem mais de 2.900 estabelecimentos, sendo 2.233 de caráter informal, sem vínculo e benefícios empregatícios.

O auxílio emergencial prevê apoio financeiro a pessoas cuja renda individual seja de até meio salário mínimo. Aqueles que têm direito ao auxílio irão receber R$ 600,00 e mães que são chefes de família poderão receber R$ 1.200,00. Bia Santos, administradora e Diretora da Barkus Educacional, que ensina educação financeira para crianças e adolescentes, reconhece o momento difícil, mas tenta ter calma: “[A medida] é um alento para as famílias que mais irão sofrer durante a crise.” A administradora reconhece ser um período de fragilidade financeira, mas observa a importância do planejamento para evitar gastos desnecessários.

Neste momento de contingenciamento, é importante manter a calma para fechar as contas no final do mês e não deixar que as dívidas aumentem. “Em momentos como este, é comum nos desesperarmos com as contas e os vencimentos. Apesar disso, é momento de respirar fundo e se organizar. Depois, examine a sua lista de compromissos financeiros e, caso sua renda não seja suficiente, avalie as prioridades”, concluiu Bia.

A importância do isolamento horizontal para a economia

Nas últimas semanas, especialistas levantaram dois modelos de isolamento que podem ser adotados: o horizontal e o vertical. Levando-se em consideração o crescimento diário dos casos e a fragilidade do nosso Sistema de Saúde, atualmente vivenciamos um modelo próximo do isolamento horizontal. Não há confinamento total, mas por determinação da Organização Mundial de Saúde (OMS), a recomendação é que todos que possam, FIQUEM EM CASA, para evitar o contágio. No caso do isolamento vertical, medida que não é defendida por autoridades e especialistas de saúde, apenas as pessoas que fazem parte do grupo de risco devem ficar isoladas, com a rotina de comércio e escolas voltando ao normal. Entretanto, o isolamento vertical não impede que essas pessoas que continuarão com a rotina normal sejam contaminadas. Pelo contrário, colocam-as em risco e pode ajudar a causar um colapso no sistema de saúde.

Segundo a economista e empreendedora Jorgilene Maciel, o cenário não é tão simples quanto parece: “O isolamento, seja vertical ou horizontal, leva a um fechamento parcial dos mercados, reduzindo as transações financeiras. O volume de dinheiro, mercadorias e pessoas em circulação é reduzido de maneira muito acentuada em um período de tempo muito curto e isso gera impactos”. Ela observa que haveria impactos na economia mesmo que não fosse adotada nenhuma medida de isolamento. “Em uma pandemia em que pessoas estão morrendo, é impossível que o mercado não seja afetado”, destacou.

E mesmo com as medidas de fechamento de comércio e de isolamento social até o dia 13 de abril determinado pelo governo do Estado do Rio, é possível percorrer algumas favelas da Maré e perceber a normalidade no funcionamento em algumas localidades.

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