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Além do autismo: a vida vibrante de Daniel

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Na Maré, o jovem empreendedor com autismo quebra estereótipos e inspira a favela com sua alegria, talento e sonhos

Na Maré, um lugar vibrante e cheio de histórias, encontramos Daniel Barros, um jovem de 26 anos que reina com maestria no Gato de Bonsucesso. Com um sorriso cativante e uma mente brilhante, Daniel nos mostra que o autismo não define quem ele é.

Nascido e criado na Nova Holanda, Daniel é camelô, percorre o território vendendo bolsas, chaveiros, canetas e é a prova viva de que o autismo, diferente do que é difundido, vai muito além do diagnóstico. Em entrevista ao Maré de Notícias (MN), a neuropsicóloga e diretora do Autonomia Instituto, Bárbara Calmeto afirma: “É possível promover o desenvolvimento de habilidades, a superação de obstáculos e a construção de uma vida plena e significativa para os indivíduos autistas.”

Segundo a neuropsicóloga, assim como Daniel, pessoas com TEA possuem diferentes habilidades e capacidades de aprendizado e desmistifica alguns dos principais imaginários em torno do assunto: “Temos muitos mitos, como por exemplo de que autistas não conseguem fazer nada, que não conseguem aprender ou que são mega inteligentes e isso não é verdade. Muitos deles estão relacionados principalmente ao estereótipo da pessoa com autismo criado pela televisão, filmes e novelas”, explica.

Tratamento individualizado e apoio essencial

O comerciante conta que foi diagnosticado ainda criança, mas encontrava dificuldade no tratamento na época. Atualmente, ele é acompanhado pelo CAPS – Centro de Atenção Psicossocial Carlos Augusto da Silva (Magal) em Manguinhos.

O tratamento deve ser direcionado às necessidades específicas de cada indivíduo, considerando déficits, habilidades e as terapias que devem abordar diferentes áreas. Bárbara Calmeto enfatiza a importância de uma avaliação singular para cada paciente: “Questões emocionais, sociais, afetivas, profissionais e comportamentais são importantes ao compreender os desafios e as características do autismo”, ressalta.

O apoio da família e da comunidade é essencial para o sucesso do tratamento e para a inclusão social da pessoa com autismo. Daniel relata que foi abraçado por uma parte fundamental da cultura da Maré, o samba: “Eu entrei no Gato de Bonsucesso em 2006, quando eu era pequeno. Entrei no ônibus que estava parado e saí junto com as crianças. Era pra ser. Teve desfile do Gato na mesma semana e eles foram lá em casa pedir pra eu participar e tô lá até hoje. Fui mestre-sala das crianças, miúdo e agora sou rei”, diz.

Longe do estereótipo, ele vive de forma leve, fala sobre seus desejos e mostra que sabe bem os problemas sociais enfrentados na favela: “Era meu sonho ser deputado estadual desde pequenininho, porque é para ajudar as pessoas, para lutar pelos nossos direitos e fazer a diferença. Lutar pela história que a história não conta”, diz.

O sambista afirma que é uma pessoa feliz e que seu maior desejo é que as pessoas o enxerguem como ele é: “Eu não gosto de botar o símbolo, não, porque as pessoas têm que respeitar a gente da forma que é, não por causa do cordãozinho. Eu sou assim e não devia precisar disso para mostrar respeito”, ressalta. 

A sociedade precisa refletir e ouvir pessoas com TEA. Para hoje, fica o incentivo de lembrar do Daniel, o rei do Gato de Bonsucesso, e aprender que o autismo não é uma limitação.

Núcleo Piratininga de Comunicação forma há 20 anos comunicadores com o olhar para a favela

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A organização tem desempenhado um papel crucial na promoção do engajamento comunitário e na educação popular

Por Gabriel Pereira e Hélio Euclides

Para fazer uma comunicação popular é necessário entender e falar a mesma linguagem dos seus leitores. Não é só saber falar com a população das favelas e dos sindicatos, é preciso vivenciar os anseios e as potências. E é com o papel de formar esses comunicadores favelados que nasce o Núcleo Piratininga de Comunicação (NPC). A organização tem desempenhado, durante duas décadas, um papel crucial na promoção do engajamento comunitário e na educação popular.

O NPC tem como defesa os direitos humanos e a busca por uma sociedade mais justa. O seu desafio é a produção e a disseminação de conteúdo que desafia as narrativas convencionais. Para isso, oferece uma variedade de cursos e oficinas, desde jornalismo comunitário até produção audiovisual alternativa. A instituição capacita indivíduos e grupos a contar suas próprias histórias e a fazer ecoar suas vozes.

A entidade não é meramente educacional, mas promove campanhas e projetos que visam transformar a realidade, impulsionando a democratização da comunicação e fortalecendo os alicerces da democracia participativa. Fundamentos defendidos por Vito Giannotti, militante italiano que foi preso e torturado na época da ditadura militar brasileira, sem jamais desistir da luta democrática e da defesa do socialismo. Vitor, que morreu em 2015, e sua companheira de vida e de sonhos, a jornalista e historiadora Claudia Santiago, fundaram o NPC.

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Vitor esteve na Maré diversas vezes nos anos 2000 para convidar moradores a conhecerem o seu trabalho e serem alunos do curso. Uma dessas alunas foi Renata Souza, atualmente deputada estadual, que teve uma ajuda nos primeiros passos profissionais. “Antes de me formar jornalista profissional, eu já atuava, ainda adolescente, como comunicadora na Maré, no jornal O Cidadão, nele, por dez anos fui repórter e depois editora. E eu devo não somente a minha formação como comunicadora popular aos cursos do NPC. Devo também a minha própria formação política, com a expansão da minha consciência de classe. Com Cláudia e Vito aprendi a me apropriar da comunicação como instrumento de resistência e luta favelada contra a violência e o racismo de Estado”, destaca.

Compromisso contínuo com a mudança social

O NPC teve seu início há 20 anos, quando houve uma chacina no bairro onde mora a coordenadora Cláudia, na Tijuca, mais especificamente no Morro do Borel. “Foi a gota d`água para mim, me fez entender que a violência contra jovens nas favelas, majoritariamente negros, precisava ser denunciada amplamente por pessoas que moram em favelas. Aquilo precisava ter um fim. Ali começou a minha participação ativa na luta contra o racismo”, comenta. 

A partir desta denúncia marcante, nasceu o curso de Comunicação Popular do NPC, não apenas para abordar os aspectos práticos da comunicação, mas também promover uma compreensão mais profunda das questões sociais e políticas que afetam as favelas e periferias. A visão crítica do sistema e o compromisso com a justiça social são elementos essenciais do curso, que visa capacitar os participantes a desafiar as narrativas convencionais e amplificar as vozes. 

O curso tem a colaboração da Fundação Rosa Luxemburgo e é destinado a moradores de favelas, periferias, ocupações e estudantes de comunicação interessados na linha popular. As aulas ocorrem entre abril e junho, aos sábados, quinzenalmente, em locais variados que incluem sindicatos, ocupações urbanas, favelas, museus e cinemas. “Sempre entendi que devíamos apoiar os moradores que se interessassem pela transformação social a fazer a própria comunicação”, resume Santiago. 

Thaís Cavalcante, jornalista que atuou na Maré nos jornais O Cidadão e Maré de Notícias, fez dois cursos no NPC, sendo um para iniciante e outro de comunicação popular avançado. “Comecei essa relação com eles em 2014, aprendendo a ter um olhar mais crítico sobre as pautas que devemos levantar. Percebi que foi muito importante primeiro passar pelo NPC antes da faculdade. Lá conheci pessoas parecidas comigo, com os mesmos ideais, daí se cria uma rede de força para a caminhada na comunicação comunitária. É valioso ver que o curso formou comunicadores da Maré, o que fortaleceu a favela e nos mostrou a importância de uma comunicação feita pelo povo para o povo”, exalta.

Ao final do curso, os participantes contribuem para a produção de um Manual de Comunicação Popular, capacitando-os a se tornarem agentes ativos na construção de um mundo mais justo e inclusivo. “É mais importante do que nunca garantir que as vozes das favelas e periferias sejam ouvidas e valorizadas. O NPC não é apenas um curso, mas sim uma manifestação do poder da comunicação para promover a mudança, tendo o compromisso de contar histórias autênticas e desafiar narrativas dominantes”, finaliza Santiago.

Unidades de saúde da Maré fecharam 26 dias em 2023 devido operações, aponta boletim

Dados do 8º Boletim de Segurança Pública da Maré mostram aumento das operações pelo segundo ano consecutivo, mas queda no número de mortes e outras violações

Edição #159 – Jornal Impresso do Maré de Notícias

Um bailinho de carnaval na escola é sempre uma alegria, mas algumas vezes, para as crianças de favela, o momento pode se tornar de angústia. Na manhã do dia 8 de fevereiro, mais uma vez, as aulas foram interrompidas por uma operação policial e, o que se viu foram mães e filhos correndo pelas ruas da Maré, com alunos usando fantasias. Era carnaval!

Essas e outras histórias de violações de direitos fazem parte dos dados do 8o Boletim Direito à Segurança Pública na Maré. O boletim é uma publicação do Eixo Direito à Segurança Pública e Acesso à Justiça da Redes da Maré, construído a partir do projeto De Olho na Maré! que, desde 2016, vem monitorando os impactos da violência armada no conjunto de favelas.

A análise dos dados do boletim acumulados ao longo dos anos tem sido fundamental para identificar medidas eficazes que vêm reorientando a política de segurança pública como um direito, e não como uma ameaça à população das favelas da Maré.

A publicação deste ano destaca a diminuição do número de mortes, mesmo com o aumento das operações policiais pelo segundo ano consecutivo. Em 2022 foram 39 mortes, contra 8 em 2023. Das operações, foram 14 em 2022 e 34 em 2023.

Enfrentar com dados

Raquel Willadino, diretora do Observatório de Favelas e coordenadora geral do Programa Direito à Vida e Segurança Pública, concorda. E acrescenta que: “o Boletim é uma ferramenta muito importante, não só para dar visibilidade para violações de direitos, mas também para pautar políticas voltadas para a redução de violências no território”. 

O antropólogo, cientista político e escritor, Luiz Eduardo Soares, que lutou pelo fim da Ditadura Militar no Brasil, sabia que não seria fácil construir um Estado democrático de direito em um país tão profundamente desigual e racista, patriarcal e violento. 

“Nunca poderíamos imaginar que, décadas depois, nossa luta ainda fosse pela edificação dos pilares do Estado de Direito. Sobretudo, em territórios excluídos de sua vigência, onde ocorrem ações policiais irresponsáveis, muitas vezes promovendo um verdadeiro genocídio”, avalia.

Luiz Eduardo considera que a esperança está nos modelos originais de organização popular e de produção coletiva de conhecimento. “Entre as iniciativas mais importantes, destaco o caso notável da Maré e o trabalho extraordinário que vem sendo feito articulando pesquisas, reunião de dados, análises e divulgação de críticas e propostas com base em evidências”.

Para o antropólogo,  isso representa um salto impressionante e aponta para novos horizontes. Faz com que a demanda social deixe de ser genérica, retórica ou abstrata, e se converta em vias realistas e positivas de mudança.

Impactos

Outro destaque do boletim é a Operação Maré, ocorrida entre os dias 9 e 18 de outubro de 2023. Mais uma vez os moradores do conjunto de favelas tiveram as rotinas interrompidas com a presença maciça das forças de segurança, impactando mais de 120 mil moradores com interrupção das aulas, fechamento de unidades de saúde e redução nas vendas do comércio local. Além disso, duas pessoas foram mortas e uma ferida por arma de fogo durante as operações.

Somente as unidades de saúde, em 2022, ficaram 19 dias sem abrir as portas, e em 2023, 26 dias, praticamente um mês sem atendimento. Em média, foram interrompidos 279 atendimentos por operação. 

No ano de 2023, as crianças da Maré ficaram quase um mês sem aulas e em média 8.099 alunos estiveram ausentes da escola por operação. Em cada operação são fechadas em média 20 escolas.

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Descumprimentos

A publicação destaca a Ação Civil Pública (ACP) da Maré, de 2017, como o primeiro ato judicial coletivo sobre Segurança Pública para favelas do Brasil, que determinou o cumprimento de medidas nas favelas visando a redução de danos e riscos durante as operações policiais. Outra vitória foi a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF 635), de 2020, no Supremo Tribunal Federal. A ação determina que o Estado cumpra uma série de requisitos a fim de reduzir a letalidade policial nas favelas.

“A ADPF é a consolidação [de uma vitória] não só na Maré, mas em outras favelas. É possível ter um instrumento que possa pautar as operações policiais”, comenta Liliane Santos, coordenadora do Eixo de Direito à Segurança Pública e Acesso à Justiça, da Redes da Maré.

No entanto, o boletim também mostra que apesar dos avanços, houve o descumprimento da ADPF entre janeiro de 2022 e dezembro de 2023. Os números apontam que os policiais continuam sem usar câmeras – nos uniformes e as operações seguem acontecendo sem a presença de ambulâncias e próximo a escolas.

Múltiplas violações

Seguindo o ritmo da diminuição da letalidade, outras violações de direitos também caíram no último ano: o total foi de 213 registros em 2023 contra 259 em 2022. “Isso reflete um recorte diferenciado na Maré. Contudo, queremos zero violações”, diz Aristênio Gomes, pesquisador do De Olho na Maré e morador do Parque União.

Segundos os dados, as violações como ferimento com arma de fogo e tortura policial, saíram de 21 e 27 registros em 2022 para 9 registros cada, em 2023. Em contraponto, os registros de invasão de domicílio subiram de 31 em 2022, para 58 registros em 2023.

Os dados do boletim revelam ainda o perfil das vítimas das violações de direitos em operações policiais em 2023. Pretos e pardos somam 50% das vítimas, contra 21% dos que se identificaram como brancos. Quando se reflete sobre as faixas etárias, os que mais sofrem são os jovens- entre 20 a 29 anos, com 22%, seguidos por adultos de 30 a 39 anos, com 16%.

Violência e negligência

Das 52 mortes ocorridas nas operações nos últimos dois anos, apenas uma teve a perícia realizada. “Não pode ocorrer um assassinato e as autoridades não ouvirem ninguém da família, como ocorreu com o assassinato de Jefferson de Araújo Costa, de 22 anos, em que a família foi testemunha do crime”, critica Maykon Sardinha, pesquisador da Redes da Maré. 

Jefferson estava com a família em um protesto contra as violações sofridas em uma operação, quando foi morto com um tiro à queima-roupa na barriga, por um policial militar. O crime aconteceu na Avenida Brasil e o jovem não foi socorrido pelos agentes policiais.

Denise de Araújo, de 51 anos, moradora da Nova Holanda,  mãe de Jefferson, conta que o filho foi aluno dos Cieps Samora Machel e Hélio Smidt, e era um jovem que ajudava as pessoas. 

“Vejo na minha mente a camisa dele ensanguentada e sinto o cheiro do sangue. Sinto muito a falta dele, da sua voz e do abraço, às vezes, fico na esperança dele voltar. Fiz um frango ensopado com bastante coentro e açafrão, do jeito que ele gostava e não consegui comer. Ele adorava bolo de fubá, não consigo fazer mais”. 

Denise conta que foi agredida pelos policiais e que ainda sente dores.  Passados dois meses do ocorrido, o inquérito virou processo e o policial acusado está preso aguardando decisão judicial.

Para Felipe Souza, assistente de pesquisa do boletim, é preciso pautar uma segurança pública que pense na população das favelas. “Nas operações que acontecem na Barra da Tijuca não há mortes e o bairro não precisa parar. A favela não pode sempre ter seus direitos violados”.

1° de Maio e o orgulho do trabalhador da Maré

A data que surge a partir de reivindicação operária também é oportuna para celebrar o trabalhador de favela

Passados mais de 80 anos desde a fundação da CLT, o trabalhador ainda luta para que seus direitos sejam garantidos e respeitados, principalmente o trabalhador da favela. 

O Maré de Notícias (MN) foi às ruas da Vila do João e perguntou aos moradores qual profissão não poderia faltar por aqui. E as respostas refletiram o receio dos moradores em perder os direitos básicos.

“Não pode faltar professores porque as crianças precisam e médicos especializados porque é o que mais necessita na Maré”; “Não pode faltar o assistente social para estar sempre averiguando as necessidades dos moradores.”; “A gente está em um lugar humilde que precisa ter benefícios pra gente, então não pode faltar nenhuma profissão.”, disseram os moradores Fátima, Cleide e Gilvan.

Hoje é um dia para refletir e analisar o contexto do trabalho em espaços marginalizados e suas condições. Dados do Digital Favela mostram que entre os moradores de favela do Brasil, 41% têm um negócio próprio, sendo que, para 22%, essa é a principal fonte de renda; 57% dos empreendedores declararam ter investido em si mesmos para driblar a ausência de oportunidades com carteira assinada no mercado formal. A pesquisa realizada em 2022 também aponta que 63% desses empreendedores não têm CNPJ, ou seja, são informais. 

De acordo com o estudo, os trabalhadores de favela são tomados pela necessidade de renda e, de forma criativa, constroem soluções para um problema social que se intensifica quando falamos de territórios como este.

Mas hoje também é um dia para se orgulhar e olhar com afeto para profissões que surgiram especificamente em territórios periféricos e favelados como já abordamos aqui a importância dos Mototaxistas, das Feirantes, do Funk e dos MCs para a geração de renda na favela.

A Maré produz excelentes profissionais todos os dias e de todas as áreas. Profissões essas que fazem a cidade funcionar, que sem elas, nada seria possível. Para além dos profissionais e serviços básicos de direito, o entregador da farmácia, a costureira, o vassoureiro, a manicure e a tia que vende bebidas no baile também merecem toda a celebração e melhores condições de vida. O dia de hoje é sobre eles, é sobre você e sobre todos nós que construímos e viabilizamos caminhos para a Maré e a sociedade que queremos através do nosso trabalho. 

A história por trás da data

O Dia do Trabalhador, estabelecido em 1º de Maio, não é apenas um feriado, mas um símbolo da luta histórica por melhores condições de trabalho e direitos sociais. Sua origem remonta ao século XIX, quando a jornada de trabalho excessiva e as péssimas condições eram realidades comuns para a classe operária, em sua maioria negra. 

Em 1886, nos Estados Unidos, trabalhadores de diversas cidades se uniram em uma greve geral para reivindicar a jornada de 8 horas de trabalho. Em Chicago, essa greve tomou proporções trágicas, com a morte de vários trabalhadores durante um confronto com a polícia. O massacre na cidade repercutiu no mundo todo, inspirando a criação da Segunda Internacional Socialista em 1889. Nesse congresso, realizado em Paris, a data de 1º de Maio foi oficializada como o Dia Internacional do Trabalho, em homenagem aos trabalhadores de Chicago e em reconhecimento à importância da luta por seus direitos.

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Já no Brasil, no início do século XX, a jornada de trabalho era maior que 8 horas diárias e as condições precárias levaram os trabalhadores a manifestar suas indignações e pedirem por direitos. Em 1917, São Paulo foi palco de uma enorme greve operária que reivindicava diversos aspectos do trabalho da época. 

Somente em 1930 que o movimento de fato ganhou força com a ascensão do então Presidente Getúlio Vargas que foi uma figura-chave nesse processo. 

Em 1940, ainda sobre o forte movimento operário, Vargas estabeleceu o salário mínimo, no ano seguinte, a Justiça do Trabalho foi criada. Em 1943, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) foi promulgada, unificando diversas leis trabalhistas e consolidando os direitos dos trabalhadores brasileiros.

Polícia Civil realiza 11ª operação na Maré, moradores relatam medo e danos aos patrimônios

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Casas e carros atingidas por tiros e atendimentos externos suspensos nas unidades de saúde próximas

6h45 da manhã. Nesta terça-feira (30) moradores indo para o trabalho, crianças se preparando para mais um dia de aula antes do feriado, e os comerciantes para abrir as lojas. Policiais Civis da Delegacia de Roubos e Furtos, Delegacia de Repressão a Entorpecentes e da Coordenadoria de Recursos Especiais atuaram no  Parque União na 11º Operação na Maré, marcada principalmente pelo medo. Houve operação também em Marcílio Dias. Com a violação de direitos, como saúde, educação e ir e vir, como os moradores podem continuar a rotina?

Em um dos casos recebidos pela equipe do Maré de Direitos, da Redes da Maré, um morador precisou se esconder nos fundos de uma padaria e usar sacos de farinha para se proteger dos disparos. Em outro, um casal soube através de reportagem na televisão que teve o carro quebrado durante a operação e avalia o prejuízo em R$ 3 mil. Uma moradora, que preferiu não se identificar, relatou que sua mãe estava no ponto de ônibus quando o carro blindado da Polícia Civil disparou em direção à região conhecida como Cão Feroz, no Parque União. “Ela falou que foi tanto tiro, ficou desesperada, o pessoal no ponto de ônibus tudo correndo!”, conta.

Além dos danos psicológicos, e aos patrimônios dos moradores, houve impactos no acesso a escolas e a unidades de saúde. Pelo menos 14 escolas, sendo duas estaduais e 12 municipais foram afetadas. Até o momento não foi informado quantos alunos foram impactados.

A Clínica da Família (CF) Jeremias Moraes da Silva, suspendeu o atendimento durante a manhã, já a CF Diniz Batista dos Santos manteve o atendimento, porém suspendeu as visitas domiciliares, segundo a Secretaria Municipal de Saúde.

A Polícia Civil diz que equipes da Delegacia de Roubos e Furtos, Delegacia de Repressão a Entorpecentes e da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core) foram cumprir mandados de prisão temporária de dois suspeitos de participação no roubo de computadores e monitores que seriam entregues a escolas pública do Rio de Janeiro.  A Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro (PMERJ)  informou que não participou da ação.

Maré 30 anos: caminhos da saúde na Maré

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A trajetória de lutas e conquistas pelo acesso a saúde pública em 30 anos de bairro

Henrique Silva e Luna Arouca

Edição #159 – Jornal Impresso do Maré de Notícias

Atualmente, o conjunto de favelas da Maré e sua população de 140 mil habitantes, tem a cobertura de atendimento em saúde realizada por 7 unidades básicas, uma Unidade de Pronto Atendimento 24h (UPA). 

O território possui também um Centro de Atenção Psicossocial que atende pacientes infanto juvenil (CAPSi Visconde de sabugosa), e dois que atendem adultos: CAPS Carlos Augusto Magal e CAPS Miriam Makeba. 

Mas, não foi sempre assim, na década de 1970, a população da Maré tinha somente um Centro Municipal de Saúde, o Américo Veloso. Para ilustrar a trajetória de como a Maré chegou à conquista desses serviços, vamos relembrar algumas das lutas pelo acesso a esse direito, resgatando histórias sobre a mobilização e articulação política dos moradores ao longo dos anos. 

Saúde para todos

O direito ao acesso à saúde pública e gratuita só foi garantido para toda a população brasileira na Constituição de 1988, com a criação do Sistema Único de Saúde (SUS). Antes disso, somente  os trabalhadores com carteira assinada tinham acesso garantido à saúde através do Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (Inamps). 

Nas favelas, as formas de acesso à saúde mais comuns e possíveis eram feitas através de  instituições de caridade, religiosas, filantropia, trabalhos voluntários de médicos sanitaristas, instituições de ensino e pesquisa.

Na Vila do João, por exemplo, foi criada a Unidade de Cuidados Básicos de Saúde (UCBS) no início dos anos 1980, gerenciada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) com o apoio da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). 

Durante os 12 anos de funcionamento, a UCBS da Vila do João deixou de atender os moradores em várias ocasiões devido a diversos conflitos. A unidade só foi fechada definitivamente em 1995 e é importante destacar o papel que os moradores e as associações locais tiveram mobilizando o território, provocando o Estado e participando de espaços de debate sobre saúde. 

Formação comunitária

Do ponto de vista formativo, os espaços de saúde da Maré também tiveram um papel importante na construção de lideranças locais. Um exemplo foi o Posto de Saúde Comunitário da Nova Holanda, criado em 1979, que teve apoio da Fiocruz na condução da equipe dos agentes comunitários de saúde.

Na pesquisa: Uma Maré de Lutas: memória e mobilização popular na favela Nova Holanda – Rio de Janeiro, a autora Monique Carvalho Batista escreve:

“A partir de 1981, o trabalho no Postinho toma novos rumos e se volta para a formação de agentes de saúde locais, visto que a ideia central era de formar grupos dentro daquele espaço e, buscava-se, ainda, uma maior participação dos moradores frente aos problemas da comunidade. Para isso, eram realizadas reuniões na rua, onde todos pudessem participar.”

 Na associação de moradores da Vila do Pinheiro, no início dos anos 1990, foi criado pelo Hospital Geral de Bonsucesso um ambulatório. Durante um pouco mais de um ano, além do atendimento aos moradores, também foram oferecidos cursos para formação de agentes comunitários no local.

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Experiência modelo

Com o desenvolvimento do SUS e a criação de espaços de participação popular na política de saúde, foram implementados os conselhos distritais de saúde, espaços que formulam, supervisionam, avaliam, controlam e propõem políticas públicas. 

Por meio desses conselhos, a comunidade (com seus representantes) participa da gestão pública. No início dos anos 1990, foi conduzido à presidência da primeira gestão do conselho da Área Programática 3.1, região onde fica a Maré, um usuário do sistema de saúde que era morador. 

Com essa conexão direta com o território, a Maré teve um papel fundamental para a articulação da primeira experiência no Rio de Janeiro com os postos simplificados e que foram criados dentro dos 6 CIEPS do território.  Sob a gestão de uma organização comunitária, a ONG Maré Limpa, e logo depois pela União das Associações do Bairro da Maré (UNIMAR), as instituições gerenciaram os postos até o início dos anos 2000. Essa experiência foi crucial para o fortalecimento do programa de saúde da família e para a proposta de aprimoramento dos agentes comunitários de saúde nos territórios de favelas.

Demandas específicas

Em uma matéria para o jornal O Povo de novembro de 1999, José Carlos, então diretor de uma das organizações que administrava os postos, destaca a importância das atividades culturais para envolver os moradores com a saúde e, ainda, exemplificou questões específicas da saúde da população negra da favela:

“Também já está agendado uma outra festa, desta vez na quadra da escola de samba Gato de Bonsucesso, marcada para o dia 20 deste mês, quando se comemora o Dia da Consciência Negra. Além da apresentação do grupo de músicas afro-brasileiras, serão debatidos programas de saúde voltados especialmente para as pessoas negras. Existem algumas deficiências específicas da raça negra e isso precisa ser mais trabalhado” 

Nesse sentido, é possível ver o esforço da população e das organizações comunitárias na luta pelo direito à saúde e  podemos ver o impacto no território pela criação e construção de equipamentos de saúde.

Pandemia

Na pandemia de covid-19, o tema da saúde foi central na vida de todos. Na Maré,  os moradores, as organizações e os coletivos seguiram o histórico do território e se mobilizaram para apoiar as famílias que mais precisavam, mas também para desenvolver ações de combate ao coronavírus no território. 

Um exemplo ilustrativo foi a campanha Vacina Maré, em 2021, que sensibilizou os moradores para uma vacinação em massa contra a covid-19,  com um resultado impressionante de 36 mil pessoas vacinadas em quatro dias. A campanha foi realizada com o envolvimento de organizações locais, moradores, trabalhadores da saúde, da educação, além de parcerias históricas como a Fiocruz, que garantiu as doses da vacina, mobilizando recursos e desenvolveu uma pesquisa sobre a vacinação no território. 

A experiência da Maré serviu como referência para outras cidades no país e também no cenário internacional, garantindo até reportagem no jornal americano The New York Times.  

Por fim, é possível afirmar que as lutas pelo acesso à saúde como um direito, ao longo dos anos foi e segue sendo protagonizada pelos moradores do conjunto de favelas da Maré, através de inúmeros processos de mobilização e articulação territorial. As demandas de saúde no território ainda são grandes: precisamos de mais médicos, um melhor atendimento, práticas integrativas, saúde mental, entre outras. No entanto, se nos guiarmos pelo histórico de luta e envolvimento com o tema da saúde, será possível conquistar essas melhorias para a população.