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Curso capacitará líderes comunitários em temas como direitos humanos e implementação de políticas públicas

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Por Amanda Pinheiro, em 20/07/2021 às 07h

Líderes comunitários terão até o dia 23 de julho para se inscrever no curso do Seac-Rio em Rede – Líderes que Transformam. A capacitação, promovida pela Secretaria Especial de Ação Comunitária, é gratuita e oferecerá uma formação em assuntos como direitos humanos e políticas públicas para esses líderes que atuam nas favelas.

Com o intuito de fazer com que essas pessoas continuem lutando por melhorias, direitos básicos e qualidade de vida, durante o curso, essas pessoas serão orientadas sobre implantação e acompanhamentos de políticas públicas na cidade do Rio de Janeiro, além de planejamento, gerenciamento de crise, noção de gestão e conhecimentos sobre direitos humanos.

As aulas, divididas em quatro módulos, serão ministradas em quatro dias: 9 e 18 de agosto e 8 e 22 de setembro. Além disso, serão 120 vagas e os participantes terão a possibilidade de estudar de forma remota, ou presencial, na sede da Prefeitura, na Rua Afonso Cavalcanti 455. nos turnos da manhã e da tarde. Ao fim do curso, que será disponibilizado nos turnos da manhã e da tarde, eles receberão uma declaração de participação.

É necessário ter cópias da identidade, CPF e CNPJ (para instituições). E os interessados poderão se inscrever através deste link – clique aqui. Mais informações podem ser fornecidas através do e-mail da Secretaria Especial de Ação Comunitária ([email protected]).


Um ano do Painel Unificador Covid-19 nas Favelas: conheça sua História

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Por RioOnWatch, em 20/07/2021 às 10h25

Este mês o Painel Unificador Covid-19 nas Favelas, desenvolvido através de 24 coletivos de favela e aliados, inclusive com apoio de técnicos da Fiocruz, marca um ano desde seu lançamento. A última atualização do painel, realizada no dia 16 de julho, documenta quase 80.000 casos e mais de 6.000 mortes nas favelas fluminenses desde o início da pandemia, sem contar com as subnotificações e baixa testagem e cobrindo somente 68% dos domicílios em favelas da capital. Quer dizer: os dados reais são ainda mais altos. Assim mesmo, o número de mortes só em nossas favelas chega a ser maior do que em 166 países inteiros desde o início da pandemia.

A proposta do Painel Unificador surgiu já no início da pandemia, em abril de 2020, quando organizações comunitárias integrantes de projetos organizados pela ONG Comunidades Catalisadoras (ComCat)* relatavam, semanalmente, casos e mortes durante reuniões virtuais, principalmente da Rede Favela Sustentável (RFS). Ao ouvir destes casos, e por estar notificando a pandemia pelo próprio RioOnWatch, a ComCat montou uma planilha para acompanhar os casos noticiados pelas suas redes comunitárias. Juntou-se a estes casos as fontes do Voz das Comunidades e Fala Roça, jornais comunitários que estavam fazendo acompanhamento de casos em várias favelas, além de casos noticiados em jornais. Porém, em nenhum lugar, a prefeitura estava fazendo um levantamento por favelas. Isso apesar de termos sabido, desde o início da pandemia, que as favelas seriam as regiões mais vulneráveis da nossa cidade.

Ação organizada por Conexões Periféricas - RDP. Foto: Conexões Periféricas - RDP

Para atender essa demanda por dados nas favelas, para que pudessem ser realizadas ações preventivas e de apoio estratégico, e pela falta de ação do poder público, a ComCat começou a se reunir junto com os coletivos e grupos comunitários que estavam na linha de frente da resposta à Covid-19 em seus territórios. Isso em maio de 2020, quando simultaneamente conseguiu, através de parceiros internacionais, conectar com a empresa de mapeamento global, Esri, que cedeu o trabalho de um engenheiro durante um mês para a montagem do Painel Unificador Covid-19 nas Favelas.

Ação de máscaras por Fazendo Mágica Com Tecidos.

Durante reuniões semanais destes coletivos em junho de 2020 o Painel foi sendo desenvolvido, a parte técnica por este engenheiro e os dados pelos coletivos, utilizando fontes principalmente compostas de relatores locais. Estes variavam de grupos captando dados por formulários virtuais, a grupos indo de porta em porta, ou analisando dentro do possível os dados da prefeitura. Ainda outros recebiam familiares de doentes em suas sedes e contabilizavam assim, ou levantavam dados em clínicas da saúde locais ou por WhatsApp.

Isso até que finalmente, em 9 de julho de 2020, o Painel foi lançado em coletiva de imprensa virtual, refletindo dados por 123 favelas, com falas dos coletivos integrantes destacando a sua importância. De lá para cá, foram realizadas mais três coletivas de imprensa, cada vez alertando para novos dados e situações de vulnerabilidade preocupantes. Realizar as coletivas é sempre uma decisão coletiva, durante as reuniões semanais (em 2020) e quinzenais (em 2021) dos integrantes. Nestas reuniões, que servem também como espaços de troca de afetos onde a situação pesada da pandemia é relatada através das próprias lideranças locais, momentos críticos ao longo da pandemia foram sendo percebidos antes mesmo de serem relatados na imprensa. Assim foi percebida a importância de se realizar as coletivas.

Ação organizada pelo LabJaca do Jacarezinho. Foto: LabJaca

Foram também realizadas três campanhas. A primeira #DadosSalvamVidas foi lançada nas redes sociais e é realizada através de um vídeo desenvolvido pelo LabJaca do Jacarezinho. O objetivo: comunicar a importância de coletar dados nas favelas e realizar ações com base nestes dados, que garantam a sobrevivência da população. A campanha também utilizou a hashtag #DadosSãoPoder, pois sem dados, não há política pública.

A segunda campanha #VacinaPraFavelaJá chegou junto das vacinas no Brasil, chamando atenção para os numerosos motivos pelos quais a vacina deveria ser priorizada em territórios de favela. O artista Carlos Latuff realizou a charge solidária da campanha, que foi enviada para todos os vereadores do Rio de Janeiro e assinada por 48 instituições.

Finalmente, foi realizada uma campanha internacional contra a fome e por cestas básicas para os coletivos envolvidos no Painel, trazendo R$10.000 em doações para cestas básicas, muitas das quais foram realizadas em parceria com pequenos produtores agroecológicos da Região Metropolitana do Rio, apoiando “dos dois lados”.

Anna Paula do A.M.I.G.A.S. de Itaguaí realizando ação de coleta de dados e educação. Foto: A.M.I.G.A.S.

Aos poucos os integrantes do Painel foram identificando novas fontes de dados. Foi inclusive desenvolvida uma nota técnica pelos voluntários do projeto, e os dados foram liberados para análise por pesquisadores e jornalistas. Grupos novos chegaram para participar das reuniões, como o coletivo de mulheres, A.M.I.G.A.S de Itaguaí, que havia feito o trabalho de coleta de dados em domicílio em cinco favelas, sem lugar para divulgar estes dados, chegando no Painel dando um triste susto ao incluir seus dados, que ficaram em segundo lugar no Painel. Com o tempo, ainda o Painel contou com a expertise de Renata Gracie, pesquisadora do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (ICICT), que desenvolveu uma técnica de identificar “Áreas de Influência de CEP” para qualquer favela, utilizando mapas para realizar uma profunda análise. Através deste levantamento, identificando os CEPs aproximados de serem utilizados, favela por favela pela cidade, e pela parceria com o Covid por CEP que repassa os dados destes CEPs para inclusão, hoje o Painel consegue refletir dados de 330 favelas, 324 delas no município do Rio.

Atuar próximo aos dados e às pessoas mais responsáveis pela prevenção nos territórios mais vulneráveis da nossa cidade, tem possibilitado uma compreensão maior da pandemia pelos integrantes. Durante as reuniões regulares, a troca de informações é muito rica, esclarecimentos são prestados e o apoio mútuo é garantido. 

É comum a imprensa, que tem chegado em peso para cobrir o impacto da pandemia nas favelas e com isso utilizado bastante os dados do Painel Unificador, chegar em conclusões equivocadas: por exemplo, olhando para o Painel e vendo a Maré em primeiro lugar e presumindo que isso é fruto de um maior contágio na Maré do que em outras comunidades. A verdade é outra: a Maré consta em primeiro lugar por conta da qualidade do levantamento sendo feito lá, onde os dados representados no Painel Unificador são aqueles da ONG Redes da Maré, uma organização grande com presença importante em todas as favelas da Maré, que inclusive conseguiu apoio para realizar a testagem em massa. O fato é que a Maré é talvez a única favela onde os dados se aproximam da realidade.

Ação do Centro Comunitário Raiz Vida. Foto: Centro Comunitário Raiz Vida

Havendo completado um ano de existência do Painel Unificador, os coletivos abriram inscrições para o público para uma nova live, no dia 22 de julho, às 14h, para realizar uma retrospectiva sobre o impacto da pandemia em seus territórios neste ano, e falar do agora. Também será apresentada pela primeira vez uma análise de dados histórica, cobrindo as 330+ favelas hoje contempladas no Painel, desde o início da pandemia. O que essa análise—e toda a proposta e realização do Painel—demonstra é simples: o levantamento por favelas não é nenhum bicho de sete cabeças. Está sendo realizado há um ano por um grupo de voluntários e novatos da sociedade civil. Imagina-se então o que poderia ter sido feito, caso a prefeitura tivesse cumprido com sua função desde o início da pandemia, e levantado dados para dar resposta imediata à situação?

Saiba mais e se inscreva para a live imperdível marcando um ano do Painel, este 22 de julho, às 14h.

Conheça os 24 coletivos e aliados que compõem o Painel Unificador Covid-19 nas Favelas: A.M.I.G.A.S. | Associação Vó Cleusa | Centro Comunitário Raiz Vida | Centro Social Fusão | Coletivo CDD | Coletivo Conexões Periféricas-RP | Comunidades Catalisadoras | Covid por CEP | Data_Labe | Dicionário de Favelas Marielle Franco | Fala Roça | Favela Vertical | Fiocruz | Fórum Grita Baixada | Frente de Mobilização da Maré | Instituto Educacional Araujo Dutra | LabJaca | Maré de Notícias | Marias em Ação | Mulheres de Frente | Observatório de Favelas | PerifaConnection | Redes da Maré | SOS Providência | TETO.

*O RioOnWatch, a Rede Favela Sustentável e o Painel Unificador Covid-19 nas Favelas são iniciativas da Comunidades Catalisadoras

‘Maré Olímpica’: ações esportivas visam potencializar trajetórias além de torneio mundial

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Excelência e escalada de sucesso atraem a atenção, mas especialistas, esportistas e mentores da Maré reforçam a importância da prática de esportes para além dos holofotes

Por Tamyres Matos, em 20/07/2021 às 07h 

Editado por Edu Carvalho

A relação entre os esportes e a construção das identidades sociais é marcada por palavras como ‘superação’, ‘inclusão’, ‘realização de sonhos’. Tais termos marcam as falas de praticantes, cientistas sociais, torcedores e órgãos públicos. Com a proximidade dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos de Tóquio, que começa nesta sexta-feira, dia 23, o Maré de Notícias resolveu se debruçar sobre a importância da disseminação de oportunidades para o desenvolvimento dos talentos e a relação entre esportes, território e identidade.

O coordenador esportivo da ONG Luta pela Paz, Roberto Custódio, acredita que a prática esportiva é uma metáfora para a vida. Nascido e criado na Maré, ele começou a treinar boxe através da organização aos 14 anos de idade, logo após ter a vida atravessada pela crueza da violência: seu pai, motorista de ônibus, foi assassinado por grupos armados da Maré. Sua busca inicial teve a ver com a necessidade de extravasar a raiva, mas seu discurso hoje em dia é totalmente voltado ao interesse em propagar as oportunidades que foram essenciais para sua formação.

“Esses jovens chegam aqui com sede de vitória, querem ser campeões. O que a gente passa para eles é que a preparação para a vida merece a mesma dedicação que a preparação para um campeonato. É normal que eles cheguem querendo tudo para agora, mas a lição mais importante do esporte tem a ver com resiliência, com saber cair e levantar”, pondera.

Coordenador esportivo da ONG Luta pela Paz, Roberto Custódio, carregando a tocha olímpica na Rio 2016 | Foto: Divulgação

Custódio chegou ao esporte porque queria aprender a se defender, mas, também, porque estava interessado em se destacar. Ele conheceu a Luta pela Paz após o contato com um ex-aluno quando trabalhava em uma locadora de vídeos. Segundo o mareense de 33 anos, à época, havia um evento anual na região do Parque Rubens Vaz e seus olhos brilhavam ao assistir as demonstrações de luta que ocorriam ali.

“Eu senti naquele momento que não precisava pegar numa arma para ser reconhecido. Ficou claro para mim que meu destino era subir no ringue e lutar na frente de todo mundo”, relembra.

Em uma trajetória vitoriosa, ele passou a fazer parte da seleção brasileira de boxe em 2009. Quatro anos depois, se tornou campeão continental, consagrando-se como o melhor das Américas no Campeonato Pan-Americano de Boxe disputado no Chile (categoria até 69 kg). Chegou, inclusive, a participar das Olimpíadas de Londres, em 2012, como primeiro reserva do pugilista Myke Carvalho.

Roberto Custódio e Myke Carvalho, nas Olimpíadas de Londres, em 2012 | Foto: Arquivo pessoal

“Sempre fui muito disciplinado, mas não almejava viver tudo o que vivi através do boxe. O esporte me levou a lugares inimagináveis. Fui três vezes campeão brasileiro e passei nove anos na seleção. Participei do revezamento da tocha olímpica nas Olimpíadas do Rio, em 2016. Quando saí da seleção, em 2018, iniciei minha primeira graduação em educação física, que era licenciatura. Agora estou na segunda, para alcançar o título de bacharel”, relata, devidamente contente com a própria trajetória.

‘Honra ao mérito’ e coletividade

O esporte é matéria constitucional. No artigo 217, a Constituição Brasileira expressa: “É dever do Estado fomentar práticas desportivas formais e não formais, como direito de cada um”. O poder público tem a responsabilidade de incentivar o lazer e o esporte como formas de promoção social. 

De acordo com o doutor em serviço social e professor da Escola de Educação Física e Desportos (EEFD) da UFRJ Marcelo Melo, a construção de uma narrativa de ascensão social através do esporte é algo muito forte em toda a sociedade brasileira. No entanto, é essencial o entendimento de que essa construção da profissionalização como escalada para o sucesso esconde fatores essenciais. 

“A perspectiva de direito social ao esporte e lazer é muito importante para oportunizar vivências relevantes para jovens, crianças, adultos e idosos no esporte e outras vivências corporais. Isso não se faz sem políticas governamentais, com aportes de recursos, contratação de servidores públicos”, explica o professor, que deu aula na Vila Olímpica da Maré entre 2001 e 2003.

Para Marcelo, é preciso estarmos atentos aos perigos do discurso meritocrático que, muitas vezes, soam bastante sedutores, especialmente quando falamos dos jovens. Ele acredita que esse discurso que aponta o sucesso de alguns poucos frente às trajetórias mais comuns – que são a maioria – como fruto unicamente do esforço individual é uma das coisas “mais perversas que existem”. 

“Primeiro porque quer fazer crer que as oportunidades estão aí e só não aproveita quem não quer; segundo: coloca o eventual fracasso unicamente sobre responsabilidade daquele que não teria se esforçado o bastante; terceiro: silencia sobre uma questão anterior e mais importante: nessa sociedade racial e sexualmente desigual não existe a possibilidade de inserção com mínimo de dignidade para as grandes maiorias”, critica.

O especialista explica que sucessos individuais têm grande impacto sobre a trajetória de muitos jovens, ou seja, tem profunda relação com a construção da identidade. “Essa é a riqueza do esporte, sua magia e presença. Isso não tem relação com ser atleta, mas sim poder vivenciar ao longo da vida. Claro que isso não existe essa possibilidade sem equipamentos públicos para a população acessar. Campos, pistas de caminhada, quadras, piscinas, aparelhos de ginástica e musculação são essenciais para essa aproximação e manutenção da relação dos cidadãos com esporte e lazer”, afirma. 

Maré nas Olimpíadas

As histórias de vida de Custódio e Wanderson de Oliveira se cruzaram na Luta pela Paz. O pugilista Wanderson, conhecido como “Shuga” (em referência à pronúncia do nome do ídolo e campeão olímpico estadunidense Sugar Ray Leonard), também começou na Luta pela Paz. Atualmente o jovem de 24 anos, que morava na Rua Tatajuba, na Maré, é uma das esperanças de medalha do Brasil nos Jogos de Tóquio.

Academia Luta Pela Paz, na Maré | Foto: Arquivo pessoal

“Eu entrei no local onde funciona o Luta pela Paz para beber água em 2009, reconheci um colega que ‘tirava onda’ comigo e com os meus amigos e decidi começar a treinar para ‘tirar onda’ com ele também. Não brigar, só na brincadeira. Dois dias depois eu estava matriculado e treinando”, relata o pugilista, em entrevista por telefone diretamente da capital do Japão.

O discurso de Shuga tem vários pontos de contato com o de Custódio. O interesse imediatista da juventude em se destacar é responsável pelo entusiasmo inicial, mas o envolvimento com a disciplina do esporte cria um movimento mais duradouro. “O esporte muda a pessoa, educa, deixa a pessoa mais madura. Eu acredito ter ganhado muita maturidade com o boxe, você precisa desenvolver responsabilidade com o que faz para alcançar resultados positivos”, afirma.

Registro de 2001 com a presença do fundador da ONG Luta pela Paz, Luke Dowdney (de short branco com listra azul), em meio aos jovens praticantes de boxe | Foto: Acervo Luta pela Paz

Aos 12 anos, o pequeno Shuga já era campeão do Galo de Ouro Infantil, disputa que venceu três vezes. De lá para cá, ele foi vencedor dos Jogos Sul-Americanos de Cochabamba (Bolívia) em 2018 e medalhista em diversos torneios ao longo do ciclo, como a Cologne World Cup, onde levou o ouro. Pensando muito além da lista de vitórias ou derrotas, Wanderson reforça: “Se eu puder deixar uma mensagem pra criançada de hoje em dia é a de que o esporte salva”.

E o ânimo olímpico, cadê?

O brasileiro é um povo reconhecido mundialmente pela animação com competições esportivas, mas é possível afirmar que o cenário de pandemia junto com o aprofundamento da crise política e econômica afetou a relação da população com as Olimpíadas e Paralimpíadas. Além disso, a própria confirmação da realização dos Jogos (após o adiamento em 2020) ocorreu num ritmo diferente das edições anteriores por conta das restrições em todo o mundo.

Atleta paralímpico da classe T11 para deficientes visuais, Felipe Gomes representa a Maré nas Paralimpíadas. O multicampeão nasceu em Campos dos Goytacazes e morou na infância no Espírito Santo, mas foi criado e chegou à vida adulta na Nova Holanda. Vivendo a emoção das Paralimpíadas pela quarta vez, ele analisa o cenário de uma competição desse porte durante uma pandemia ainda fora de controle em tantos países.

Felipe Gomes, atleta paralímpico da classe T11 para deficientes visuais, representa a Maré nas Paralimpíadas | Divulgação

“Os atletas têm a percepção de uma falta de entusiasmo. Não estamos sentindo aquele espírito torcedor das pessoas a partir do crescimento de expectativa com a proximidade de competição. É claro que vamos competir com firmeza, seriedade. Sabemos da importância, mas também temos noção de que muitas mortes ainda estão acontecendo no Brasil, o processo de vacinação ainda está se arrastando. Isso tudo afeta o envolvimento das pessoas, inclusive o nosso. Mas que a gente, com a rigidez dos protocolos durante as práticas, consiga trazer um sorriso, uma alegria nesse momento tão difícil. O esporte tem essa capacidade”, pondera.

Com uma lista extensa de prêmios, como a medalha de ouro nos 200m rasos nos Jogos de 2012 em Londres e outro ouro no revezamento 4x100m (T11-13) nas Paralimpíadas Rio 2016, Felipe é mais um a destacar que a importância do esporte na vida dele vai muito além das premiações. “Com o esporte, alcancei lugares e possibilidades que jamais imaginei”, conclui, reforçando a narrativa.

Iniciativas da Maré buscam reverter abandono escolar e fortalecer ensino público

Segundo dados da Unicef, em 2020, quase 1,5 milhão de crianças e adolescentes de seis a 17 anos não frequentavam a escola

Por Hélio Euclides, em 20/07/2021 às 07h

Editado por Edu Carvalho

Um livro, uma caneta, uma criança e um professor podem mudar o mundo”, essa frase da ativista Malala Yousafzai resume os elementos da educação. Mas a evasão escolar é o componente que separa os itens e traz como resultado uma maior desigualdade acadêmica e por sua vez, social. Com a pandemia, muitos estudantes ficaram distantes do ensino, e grande parte teve dificuldade para acesso ao material didático compartilhado de maneira remota, processos que afastaram ainda mais quem passou a fazer da sala de casa o ambiente da aula. Na medida que a vacinação avança e há reabertura escalonada, profissionais da educação saem em busca desses alunos, para garantir o término da formação. 

Segundo o estudo “Cenário da Exclusão Escolar no Brasil – um alerta sobre os impactos da pandemia da Covid-19 na Educação”, lançado pela UNICEF, em parceria com o Cenpec Educação, no ano de 2019 havia quase 1,1 milhão de crianças e adolescentes em idade escolar obrigatória fora da escola no Brasil. Com a pandemia, a situação piorou. Em novembro de 2020, quase 1,5 milhão de crianças e adolescentes de seis a 17 anos não frequentavam a escola. E não para por aqui: 3,7 milhões estavam matriculados, mas não tiveram acesso às atividades escolares e/ou não conseguiram se manter aprendendo em casa. No total, são 5,2 milhões de meninas e meninos que não tiveram o direito à educação 

Para muitos, a pandemia revelou diversos problemas a serem resolvidos pelo Estado em relação ao pilar número um do desenvolvimento de um país. Isso é o que defende Jonatan Peixoto, de 21 anos, morador da Nova Holanda, que atua como estagiário na educação inclusiva. Ele percebe que muitos alunos não conseguem conectar as aulas por não compreender os aplicativos, não possuem dispositivos e mesmo tendo material, os responsáveis não conseguem acompanhar seus filhos e netos.

Quem concorda com o colega de ofício é Lucas Ferreira, professor que atualmente coordena a Lona Municipal Cultural Herbert Vianna, na Nova Maré, além de atuar no setor de inclusão de pessoas com deficiência na instituição Luta Pela Paz, sediada na Maré. Para ele, a evasão escolar geralmente está ligada a uma questão de renda e raça. “É o Estado falhando em garantir a permanência das pessoas pobres e pretas na escola. Os mais vulneráveis à evasão estão principalmente nas séries mais altas, onde nas quais muitos alunos largam a escola para trabalhar e ajudar no orçamento familiar”, detalha.

No quadro dos fatores que compõem a evasão, o que não falta são motivos. Como atrair e manter a criança e o jovem assistido? “A solução é a garantia de direitos básicos como segurança alimentar para jovens em idade escolar, formação técnica e profissionalizante e políticas públicas que acolham os alunos e ofereçam espaços de desenvolvimento de potencialidades”, comenta Ferreira.

Incentivo para alunos na escola

Até metade da década de 1980, metade da população brasileira estava fora da escola. À época, educadores importantes como Paulo Freire e Darcy Ribeiro formaram ações diretas de impacto para transformar a realidade, e até hoje são vistos como símbolo de resistência para uma educação digna e que abarque todas as classes e segmentos da sociedade. 

Desde então, demais iniciativas foram criadas com o mesmo objetivo. É o caso do Projeto Nenhum a Menos, da ONG Redes da Maré, que iniciou um trabalho de construção de grupo de famílias do conjunto de favelas para manter o contato. Mesmo durante a pandemia, as atividades seguiram, com material de apoio à campanha de saúde e manutenção do trabalho, realizado antes da crise sanitária. O meio utilizado? O WhatsApp, possibilitando também vídeos chamadas, feitas com agendamento de horários para atualização de dados, distribuição de matérias e orientações pedagógicas.

Inês Cristina, coordenadora da iniciativa, descreve o perfil de quem, infelizmente, vive com o abandono escolar. “Quem teve dificuldade de manter o vínculo escolar, de se alimentar, de se manter trabalhando, de manter estrutura de conectividade, de frequentar aulas remotas ou receber material impresso para acompanhar o que estava sendo oferecido pelas escolas foram os estudantes pretos, pardos, pobres das periferias e favelas do Brasil. É mais uma face do racismo estrutural”, expõe. 

Segundo o Censo Maré, concluído em 2019, somente 42,4% dos domicílios do território possuem computador e internet. Destaca-se ainda que apenas 18,96% da população da Maré concluiu o ensino médio. De acordo com pesquisa realizada no final de 2020 da C6 Bank/Datafolha, quatro milhões de estudantes brasileiros abandonaram os estudos. Uma análise da UNESCO sobre os impactos da COVID-19 no ensino superior mostra que 17,4% dos alunos não pretendem retornar. Os analistas de educação apontam diversos fatores extraescolares e pedagógicos que contribuem para a evasão escolar, como a gravidez na adolescência. A média nacional de adolescentes grávidas é de 18% e na região do Complexo do Alemão e Maré chega a 26,34%, segundo a Nascer Brasil/Fiocruz em 2013.

“Ainda temos a questão do trabalho infantil, já que muitas crianças estão nas ruas trabalhando, fruto das dificuldades das três esferas governamentais de se organizarem para financiar os programas de auxílio emergencial, de segurança alimentar e educação”, avalia Cristina. Ela defende que é preciso a garantia das condições de funcionamento pleno das escolas para garantir o acolhimento com segurança, já que no caso do Rio de Janeiro, das mais de 1.500 escolas, 500 não têm condições de funcionamento pleno, algo em torno de 30% de toda a rede pública da cidade. 

Para aprender, é preciso se apreender os conhecimentos e dinâmicas trazidas pelos estudantes, responsáveis e fatores externos que dialogam com a subjetividade. “É preciso trazer o encantamento para quem aprende e ensina, construir sentidos na escola para os estudantes, criar um ambiente para ser e pensar sobre si mesmo e a vida, uma escola que ofereça experiências que podem transformar as realidades, dialogar com a comunidade e valorizar cada estudante e família como parte deste processo em parceria”, sinaliza.

Uma busca ativa por alunos

A Redes da Maré vem realizando encontros periódicos com diretores desde o início da pandemia. Houve apoio às escolas quando algumas foram invadidas, para testagens das equipes em parceria com o Conexão Saúde e acompanhamento das visitas junto com o comitê de saúde. Outra estratégia é o projeto Busca Ativa, criado a partir de um monitoramento da frequência escolar pensada e executada como política intersetorial de articulação do sistema de garantia de direitos, envolvendo todos os setores da sociedade que podem apoiar a participação dos estudantes e famílias no processo escolar. 

O objetivo maior do projeto Busca Ativa é incluir a criança que esteja fora da escola ou em situação de evasão. A iniciativa começou em janeiro, com atuação nas 16 favelas da Maré, a partir de demandas repassadas pelas escolas. São sete articuladores que realizam visitas domiciliares para entender o que ocorre, inserir a criança na escola e depois acompanhar. O projeto tem o convênio com a Secretaria Municipal de Educação e apoio das Fundações Malala e Itaú. A ação nasceu da metodologia do trabalho realizado de 2013 a 2016, com o Aluno Presente e do Nenhum a Menos.

Os locais de mais ações são a Vila do João, Vila dos Pinheiros, Conjunto Esperança, Nova Holanda, Parque União, Rubens Vaz e Parque Maré. São 456 cadastros, desses 314 foram encaminhados para o projeto Impacto de Vida, para ter segurança alimentar e saúde. Essas famílias recebem cestas básicas, internet e tablete para continuar nos estudos. “São famílias que não sabem a necessidade de buscar material impresso nas escolas. Falta informação e orientação, por isso em alguns casos encaminhamos para os serviços de saúde e assistência social”, comenta Elza Sousa, assistente social do projeto Busca Ativa.

A assistente relata um caso que demonstra a importância da ação: o caso de um adolescente que caiu da laje, fraturou a bacia e precisou de cirurgia, o que causou afastamento das aulas. O Projeto ajudou na necessidade de transporte para as consultas, intermediando para que o estudante tivesse acesso de políticas públicas. “Dialogamos com a Secretaria para que ocorra soluções. Na questão estadual são apenas quatro escolas no território, o que não absorve todos os estudantes e conseguir uma vaga é difícil. Em outro caso, o sistema estava indicando que o menino da Maré teria que estudar em Bangu. O projeto colabora para o diálogo e mostra o valor da educação para a vida, tanto da criança, quanto para a família”, conclui Sousa. 

Geruso Oliveira é pai do jovem Lucas, morador da Nova Holanda. Ele avalia que os projetos de incentivo à permanência do estudante são fundamentais no território. “Sou grato ao projeto Peritech Maré, de oficina de robótica, realizado no Colégio Estadual Professor João Borges de Moraes, localizado na Nova Holanda, onde a equipe ajudou muito o meu filho, que estava desanimado com os estudos. Hoje ele é um jovem dedicado só tenho que agradecer a iniciativa”, conta. 

Na favela muitos alunos vão à escola por falta do básico em casa. “Vejo pouco investimento nessa juventude vulnerável, que precisa se sentir orgulhosa, com sentimento de dever cumprido ao estudar. Falta incentivo dos que estão à frente da pasta de educação. Por isso, faltam muitas coisas nas escolas públicas. Por outro lado, o que se encontra são iniciativas de muitos professores que acreditam no aluno”, diz Oliveira.

É preciso correr atrás

As dificuldades que a pandemia trouxe aumentam os riscos de evasão escolar, e o Brasil, que vinha avançando nos últimos anos, pode retroceder até 20 anos no acesso à educação. Para Daniel Remilik, conselheiro tutelar e professor, o assunto merece urgência nos debates. “Recebemos muitas denúncias de escolas informando da evasão de alunos. Na maioria dos casos são meninos. Não consigo falar de números, mas a maioria dos casos vêm do CIEP Estadual César Pernetta, localizado no Parque União, que só em uma semana de junho foram seis evasões. Precisamos agir, no preparatório da Redes da Maré estamos trabalhando o tema Inclusão, acessibilidade e engajamento”, comenta.

A Secretaria de Estado de Educação (Seeduc) informou que está fazendo uma busca ativa para que os alunos não parem de estudar e retomem o vínculo com a escola. Adiantou que as direções estão mobilizadas para reaproximar os jovens que, de alguma maneira, não acessaram a plataforma virtual ou receberam as apostilas. Completou que em relação a Maré, os números de taxa de aprovação e reprovação, respectivamente, das escolas são: Colégio Estadual Professor João Borges de Moraes (93,5% e 6,5%); CE Bahia (97,1% e 2,9%); CE Tenente General Napion (69% e 31%); e Ciep Cesar Pernetta (77% e 23%).

Até o fechamento da matéria a Secretaria Municipal de Educação não tinha retornado o contato.

“De pouco adianta produzir dados e criar novas tecnologias se elas não servirem à população”, diz Fernando Bozza, fundador da ONG Dados do Bem

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Por Luciana Bento – Conexão Saúde – De Olho No Corona, em 19/07/2021

Entusiasta da ciência de dados aplicada à saúde, o médico epidemiologista, pesquisador da Fiocruz e fundador da ONG Dados do Bem Fernando Bozza tem acompanhado de perto, desde o início da pandemia, os números da Covid no Brasil e no mundo. 

No entanto, os números específicos da Maré e de Manguinhos têm ganhado especial atenção do pesquisador: “o projeto tem se tornado um case por diversos motivos, como o uso de tecnologias como aplicativos inteligentes, a Telessaúde, o Isolamento Domiciliar de pacientes com Covid, a transformação de dados em conhecimentos para ação nos territórios”, destaca. 

“Mas o que torna o Conexão um case poderoso é que estas ações estão dando resultados, em especial na redução do número de mortes”, explica Bozza. “De nada adianta uma série de ferramentas tecnológicas e ações diferenciadas se elas não têm capacidade de chegar de fato às pessoas”, pontua. 

Em entrevista exclusiva para o boletim Conexão Saúde – De Olho no Corona, Bozza explica porque o projeto se destaca como uma iniciativa bem-sucedida de combate à pandemia em favelas, com vários indicadores positivos, dentre eles a redução da taxa de mortalidade ajustada (ou letalidade) – que na Maré caiu 88% e em Manguinhos 62% em um ano.  

Por Luciana Bento – Jornalista, Coordenadora de Comunicação do Conexão Saúde na Maré

Após a atuação do projeto Conexão Saúde, houve queda de óbitos na Maré e em Manguinhos em relação à Capital e outras favelas da cidade. A partir de resultados como este, o projeto tem sido apontado como um case no combate à pandemia. Por que? 

Fernando Bozza: Isso ocorre por vários aspectos e o primeiro deles é a inovação em várias frentes: inovação no modelo de gestão, já que o Conexão reúne ONGs, academia, setor público e privado, mas é uma iniciativa da sociedade civil. Este modelo de trabalho conjunto não é comum, não foi algo que vimos ao longo da pandemia. 

Depois, a inovação tecnológica, com o uso de aplicativos, testagem em massa, disseminação da Telessaúde, criação do conceito de Isolamento Domiciliar Seguro e utilização de estratégias de comunicação customizadas, voltadas para os territórios. 

Ao lado desta série de inovações, temos os resultados quantitativos das ações: número de pessoas testadas, atendidas em consultas médicas e psicológicas, acompanhadas durante o isolamento, assistidas em necessidades básicas como refeições e kits de higiene… Estamos falando de uma população de 140 mil pessoas só na Maré, maior do que 96% das cidades brasileiras. Então estes dados são relevantes numericamente.

Mas o que torna o Conexão um case poderoso é o fato de que estas ações são efetivas, estão dando resultados no controle da pandemia na Maré, em especial na redução do número de mortes. De nada adianta uma série de ferramentas tecnológicas se elas não têm capacidade de chegar de fato às pessoas, fazer a diferença. 

Esta experiência pode ser replicada em outros locais? 

Fernando Bozza: Um ponto importante é dialogar e conhecer outras iniciativas positivas que aconteceram. O Conexão Saúde não é a única, embora seja um modelo bem particular. Precisamos entender o que há em comum entre estas iniciativas e o que é de cada local, cada realidade, cada território. Neste sentido, há um limite para a replicabilidade do projeto como um pacote fechado, é preciso olhar para as especificidades. 

Mas há vários aprendizados, sobretudo nestes modelos de tecnologia, que podem ser apropriados por governos e organizações, que podem funcionar isoladamente em outras iniciativas. Minha dúvida é: este modelo Conexão Saúde, que vem dando certo na Maré e em Manguinhos, é replicável em qualquer local, sem adaptações? 

No caso do Conexão, quais seriam estas especificidades? 

Fernando Bozza: Acredito que a grande capacidade de escuta e articulação de atores locais, de engajamento dos moradores, de capilarização das ações dentro do território fez toda a diferença, deu potência para o projeto. 

E também a expertise de cada parceiro. Nenhuma das organizações participantes do Conexão começou suas ações por conta da pandemia. Todas já tinham experiência em suas áreas. O desafio foi adapta-las para a realidade dos territórios, em um momento crítico de pandemia, em tempo recorde. Mas a estrutura estava lá. 

O SAS Brasil já tinha uma longa expertise em Telessaúde, o Dados do Bem já vinha trabalhando dados em outros estados e municípios, a Redes da Maré já tinha um conhecimento profundo do território, o Centro Comunitário de Manguinhos trouxe uma bagagem de atuação… Isso possibilitou a ações efetivas nestes territórios, que sofrem com questões estruturais, de antes da pandemia, sobretudo a violência.    

Com a vacinação temos vislumbrado uma luz no fim do túnel. Já podemos falar em cenários pós-pandemia? 

Bozza: Hoje muito do que trabalho e penso é sobre as lições e aprendizados da pandemia e este cenário pós. No caso do Conexão, o que pode ficar de legado e se tornar uma ação de inovação contínua voltada para o sistema de saúde pública? Como a gente transforma o Conexão, que foi uma ação voltada para a pandemia, em uma experiência de inovação em saúde pública mais ampla, que olhe para os desafios – que não são poucos – do pós-pandemia? 

Quais seriam estes desafios? Pode destacar alguns? 

Bozza: A lista é longa. A pandemia no Brasil vem deixando o sistema de saúde destroçado, equipes cansadas, hospitais sucateados, sem investimentos suficientes, atenção primária desestruturada… Isso é um grande problema, com consequências futuras, e agora é um momento importante de repensar a reestruturação do sistema pós-pandemia. 

Do ponto de vista da saúde da população, existem muitos desafios. O pós-covid, que ainda não sabemos exatamente como será, mas que deixa sequelas, seja do ponto de vista da saúde mental, seja da saúde física. Há também uma série de demandas que ficaram reprimidas: pessoas com câncer que interromperam o tratamento, doenças que precisavam de acompanhamento, preventivos que não foram feitos, cirurgias que foram adiadas… 

Isso sem falar nas perspectivas de futuro que apontam para outras pandemias e epidemias, tanto de doenças emergentes, como a Covid, quanto doenças reemergentes, como o sarampo e a dengue. Muitas crianças não foram vacinadas durante a pandemia e isso vai trazer consequências, doenças que estavam relativamente sob controle podem voltar. 

Ou seja, a pandemia pode arrefecer mas os desafios continuam…

Bozza: Exato. Por isso é essencial novas maneiras de olhar a saúde da população. Quais são os desafios que surgem? Como utilizar estas novas tecnologias, que se mostraram tão úteis, num contexto pós-pandemia? Como fazer com que sirvam à população? Como desenvolver novas soluções a partir das novas necessidades? 

Não bastam novas tecnologias. Elas precisam ser testadas, validadas e servir ao coletivo, no contexto da saúde pública, sendo incorporadas ao SUS. Neste sentido a experiência do Conexão Saúde é muito valiosa, pois ela foi testada e validada em territórios e populações reais. 

Além das ações de saúde propriamente ditas, o Conexão Saúde tem investido em ações de comunicação e na produção de dados sobre os territórios. Por que esta dimensão é estratégica para o projeto? 

Bozza: Não tenho dúvidas de que este é um dos pilares do projeto e pra mim foi um dos maiores aprendizados que tive da experiência do Conexão. Como eu chego às pessoas e comunico claramente sobre a saúde delas? Como informo, como oriento? Como levo informação consistente quando fake news são disseminadas sem qualquer freio? As pessoas estão abarrotadas de informação e têm dificuldade de entender o que é relevante. Este é um grande desafio deste momento. 

A tradição brasileira é coletar dados na ponta e alimentar um sistema de notificação, sem qualquer retorno para as pessoas. Há uma mudança de paradigma que precisa ser feita: hoje muitos dados são gerados e colocados a serviço de empresas privadas, governos, instituições financeiras… As pessoas disponibilizam os dados, muitas vezes de forma compulsória e sem transparência. Como o dado vai ser utilizado? A serviço de quem? Como? Os dados são valiosos, dizem muito, mas nada disso retorna pras pessoas. Isso precisa mudar.