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A folia no “Bloco do Sofá”

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O que você precisa saber para assistir aos desfiles das grandes escolas pela TV

Maré de Notícias #109 – fevereiro de 2019

Daniela Name

Todo Carnaval a história se repete: ao invés de pensar na melhor fantasia ou sair pela cidade atrás dos melhores blocos, muitos preferem fazer parte da Unidos do Controle Remoto e do Bloco do Sofá. Balde de pipoca no colo e sentam-se em frente à TV para assistir ao desfile das Escolas de Samba. O cortejo é realmente irresistível, mas fica ainda melhor quando sabemos, previamente, dos enredos e sambas que as maiores Escolas vão apresentar. 

Diferentemente do ano passado, quando a Mangueira se sagrou campeã absoluta com um enredo sobre os heróis esquecidos pelos livros de História, o Carnaval 2020 promete uma disputa acirradíssima pelas primeiras posições. Um dos temas mais evidentes que percorre os enredos é o debate sobre liberdade de culto e intolerância religiosa, mas há ainda os tradicionais temas históricos e grandes homenagens.

A Mangueira tentará o bicampeonato com “A verdade vos fará livre”, com o carnavalesco Leandro Vieira propondo qual seria a reação da população carioca se Jesus nascesse, hoje, como um morador da favela: “Se Jesus fosse um favelado e começasse a falar das coisas que sempre falou, será que seria ouvido? Será que estaríamos preparados para o seu discurso ou ele seria crucificado novamente?”, pergunta Leandro, que defende a liberdade para abordar uma figura como a de Jesus na festa cultural que é o Carnaval. “A Mangueira pode falar de Jesus, assim como o teatro, o cinema e a história da pintura já falaram”, destaca. 

Outro samba comentadíssimo pela crítica é o da Grande Rio, cujo enredo primoroso ajuda a contar a história de um personagem importante da Baixada Fluminense, berço da Escola de Caxias: o pai de santo Joãozinho da Gomeia. Homossexual e transformista, Gomeia era um ídolo popular, e o canto dos componentes de Caxias vai lembrar sua trajetória pedindo respeito a todas as religiões [“Eu respeito o seu amém/Você respeita o meu axé”].

“Quisemos reconectar os componentes da Grande Rio com o seu território, a Baixada, por meio deste grande personagem”, conta Gabriel Haddad. “Foi impressionante como a comunidade abraçou o enredo.”

Enredo da Mangueira se dirige diretamente à população das favelas e de outras periferias do Rio |OSCAR LIBERAL

Outras quatro Escolas têm chamado a atenção dos especialistas: Portela, Beija-Flor, Vila Isabel e Mocidade Independente de Padre Miguel. Na azul e branco de Oswaldo Cruz, o enredo “Guaxupiá, terra sem males”, é baseado no livro “O Rio antes do Rio” (Relicário), de Gabriel Freitas da Silva. O desfile vai mostrar a Guanabara Tupinambá, conjunto de aldeias indígenas que existia no lugar, hoje, chamado de Rio de Janeiro, antes da chegada dos invasores portugueses. A Beija-Flor de Nilópolis celebra o orixá Exu e todos os criadores e artistas de rua, com o enredo “Se essa rua fosse minha”, enquanto a Vila Isabel investe em mais um enredo ligado à história oficial, narrando a criação de Brasília e com um refrão lembrando o “gigante pela própria natureza” presente em nosso Hino.

Outra forte concorrente ao título, a Mocidade Independente de Padre Miguel, presta tributo a uma grande figura de sua própria história: a cantora Elza Soares, que já desfilou interpretando sambas-enredo de sua escola de coração. O enredo proposto pelo carnavalesco Jack Vasconcelos, ex-Tuiuti e outro talento emergente da Sapucaí, e composto também por Sandra de Sá, é um tributo a Elza. “É emocionante ver o que Sandra fez com o samba, como a letra acaba abraçando todas as mulheres que são como Elza”, diz o jornalista Fabio Fabato, que escreveu a sinopse do enredo da Mocidade.

“Festa não é fuga, é uma forma de resistir”, acredita o historiador Luiz Antonio Simas. “Quanto pior foi o País, melhor o Carnaval, essa tem sido a história. Por isso, espero um grande Carnaval nos desfiles de 2020, com a Avenida narrando e nos ajudando a superar nossas dores.”

Fantasia de composição “Maria das Dores Brasil” | Divulgação

Operação segue há mais de 15 horas na Maré e já deixa 3 mortos e diversos danos

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Violações de direitos agride o direito à vida, de ir e vir e bens materiais dos moradores da Maré

A operação policial que acontece nesta terça-feira (18) teve início por volta de 5h da manhã no Parque União, Rubens Vaz, Nova Holanda e Parque Maré e já passa de 15 horas de duração. A ação está sendo marcada por intensos tiroteios relatados por moradores, com a presença de dois caveirões circulando pelas favelas. As violações durante a operação foram diversas, inclusive a morte de 3 pessoas e o fechamento de unidades de ensino e  de saúde. 

Por volta de 7h da manhã a operação avançou para as favelas Nova Maré e Baixa do Sapateiro, com relatos de tiroteio e com a chegada de  muitas denúncias pelo Maré de Direitos, projeto da Redes da Maré, que atende a vítimas de violações de direitos. Foram identificadas invasões de domicílio sem mandados judiciais, agressões verbais, ameaças, uma casa incendiada, o uso de gás lacrimogêneo por parte dos agentes do Estado.  

Após essa série de denúncias, a equipe da REDES DA MARÉ foi até o local de uma das violações para averiguar e mediar a situação e foi recebida com xingamentos e ameaças por parte dos policiais.  Os agentes de segurança pública, com o fuzil apontado, ordenaram que a equipe da REDES DA MARÉ se retirasse do local de maneira extremamente agressiva. No momento em que a equipe estava se retirando, um grupo de policiais atirou na direção da equipe enquanto outro grupo permaneceu na casa dos moradores xingando-os e quebrando seus pertences. Todos os agentes do BOPE estavam com o rosto coberto e sem identificação. 

Foi também no início da manhã que moradores do Beco da Glória, na Baixa do Sapateiro, presenciaram momentos de terror. Enquanto policiais do Batalhão de Choque circulavam na região, houve registro de tiros sucessivos que atravessaram um prédio onde vivem mais de 3 famílias. Em uma das casas, enquanto duas crianças junto de seus responsáveis tentavam se proteger, um tiro atravessou o fogão próximo ao botijão de gás. Ao saírem da casa, moradores viram o corpo do jovem de 18 anos morto, na frente do prédio. Segundo relato, o jovem foi retirado pelos policiais e levado para o Hospital Geral de Bonsucesso. A mãe do jovem estava no local mas não pode acompanhar o corpo do filho.

Por volta das 11h um grupo de policiais realizou uma abordagem em um bar na Nova Holanda, onde ordenou agressivamente que o proprietário diminuísse o volume da caixa de som. Prontamente o dono do bar desligou o som. Um dos policiais exigiu que os clientes se levantassem e saíssem, um dos moradores não se levantou e foi agredido com uma cadeira por esse policial. Segundo relatos, o policial quebrou a cadeira na cabeça do morador. Logo após arremessou a cadeira e atingiu uma mulher nas costas que andava com uma criança no colo. 

A operação teve momentos mais silenciosos ao longo do dia mas com muitos relatos de violação de direitos. Uma das vítimas relata que um grupo de policiais invadiu sua casa e roubou o videogame que seu filho ganhou recentemente no seu aniversário de 7 anos. A mesma vítima relata ainda que os agentes roubaram alimentos como iogurte e biscoitos e demonstra sua indignação ao afirmar que essa prática é recorrente em dias de operação policial.

Os moradores relatam que em dois casos de letalidade violenta por intervenção policial, os agentes retiraram os corpos já em óbito. Um corpo foi retirado em um lençol e o outro foi colocado em um carrinho de mão. Não tivemos a informação de ter acontecido perícia no local. A terceira vítima foi socorrida por moradores já em óbito. 

Por volta das 17:30h, quando parecia que a operação policial tinha se encerrado, houve um intenso tiroteio na Nova Holanda, onde quatro pessoas foram baleadas. Uma delas foi socorrida por moradores já em óbito. 

A operação desta terça foi realizada quatro dias após o lançamento da 4ª Edição do Boletim Direito à Segurança Pública na Maré, da Redes da Maré, que traz dados sobre os impactos da política de segurança pública da região, assim como os vividos hoje pelos milhares de moradores  das favelas afetadas. Confira a 4ª edição do Boletim Direito à Segurança Pública na Maré: http://redesdamare.org.br/br/info/22/de-olho-na-mare.

A Assessoria de Imprensa da Secretaria de Estado de Polícia Militar informou em resposta ao contato do Maré de Notícias que equipes do Comando de Operações Especiais (COE) realizaram a operação com Policiais do Batalhão de Ações com Cães (BAC), do Batalhão de Operações Policiais Especiais (BOPE) e o Grupamento Aeromóvel (GAM) utilizando dados de inteligência com o objetivo prender criminosos e combater o tráfico de drogas. Houve confirmação da assessoria sobre um ferido na Nova Holanda. Porém até o fechamento desta matéria não obtivemos retorno sobre a existência de mandados e confirmação sobre os mortos pela PMERJ.

Leia a nota da Redes da Maré sobre a operação de hoje:

http://redesdamare.org.br/br/artigo/80/nota-sobre-a-operacao-policial-de-180220

Por uma favela mais verde

Iniciativa de plantio de mudas para a urbanização da Vila do João

Maré de Notícias #109 – fevereiro de 2020

Hélio Euclides

A Rio-92 [ou ECO-92] foi a Conferência da Organização das Nações Unidas sobre “ambiente e desenvolvimento”, que mobilizou o mundo pelas questões sociais e ambientais. O encontro reuniu líderes mundiais que fizeram diversas promessas de preservação do Planeta e conscientizou a sociedade civil para o papel de cada um no cuidado da natureza. Partindo da ideia de levar verde onde só tem cimento, a Associação de Moradores da Vila do João vem plantando mudas em espaços da favela e grafitando os muros próximos. Essa iniciativa de urbanização do espaço público já chama a atenção de quem passa pelas calçadas.

O objetivo, com o plantio, é trazer mais qualidade de vida para os moradores e para quem passa pelas futuras árvores. Para aprofundar essa ideia, a Associação teve a parceria da advogada especializada em direito e gestão ambiental, Cristina Luz, e assim foi idealizado o projeto socioambiental “Viver com Mais Verde”. Ela conta que: “Além do plantio, o projeto contempla ações de reciclagem, gerenciamento de resíduos sólidos e educação ambiental.” Outras parcerias foram estabelecidas com a NHJ do Brasil Container, que doou anéis de concreto e ofereceu mão de obra, e a Fundação Parques e Jardins, subordinada à Secretaria de Envelhecimento Saudável, Qualidade de Vida e Eventos, que contribuiu com 35 mudas que foram plantadas.

“Onde plantamos, na saída da favela, era uma lixeira, o resultado é uma limpeza urbana e as ruas se tornam menos quentes e menos poluídas”, comenta Valtemir Messias, conhecido como Índio, presidente da Associação de Moradores da Vila do João. Ele assegura que o ganho maior é conscientizar todos sobre a importância das árvores. Valdenise Brandão, conhecida como Val, realizou com seus colegas garis as modificações de locais que antes acumulavam lixo e, hoje, são canteiros. “São inúmeras as transformações com o plantio de árvores, como purificar e umedecer o ar, a beleza do local e uma vida mais saudável, sem pontos de lixo. Essas iniciativas realizam mudanças na vida dos moradores, como maior socialização”, explica.

Quem caminha pelas ruas da Maré percebe a necessidade de mudanças. “A favela tem visíveis problemas como a coleta de lixo e acúmulo de entulho, o desperdício de água e ruas com buracos. Para melhorar o local, devemos fazer a nossa parte, como plantar árvores, que ainda dão sombra”, avalia Kátia Muniz, moradora da Vila do João.

Fernanda Santiago, professora de Biologia da Redes da Maré e de Ciências na Luta Pela Paz, avalia a iniciativa como um direito previsto na Constituição Federal, no artigo 225, que fala do meio ambiente. Ela acredita que esse direito promove um ar mais limpo, já que a Maré é um dos locais urbanos mais poluídos, principalmente por não ser arborizada. Acredito que a comunidade escolar precisa falar mais sobre o assunto, de forma que seja levado para casa, para que todos entendam o direito ao ambiente como questão de saúde”, conclui.

A Secretaria de Envelhecimento Saudável, Qualidade de Vida e Eventos informou que plantar mudas numa cidade quente como o Rio de Janeiro é proporcionar qualidade de vida aos cariocas. Os moradores podem participar ajudando na conservação e participando do plantio. Além disso, deu a notícia que haverá uma segunda fase do projeto no início de fevereiro, em parte da Avenida Canal, em frente à Avenida Brasil e a Escola Municipal Professor Josué de Castro.

A arte da preservação

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Profissionais do conserto de roupas, sapatos e panelas resistem ao consumo em massa e provam que preservar pode ser muito melhor que comprar novo

Maré de Notícias #109 – fevereiro de 2020

Flávia Veloso

Qual foi a última vez que você mandou um pertence para o conserto, para não precisar comprar novos? A grande quantidade de lojas, promoções e condições de pagamento facilitam a compra de novos produtos, levando ao descarte dos antigos. Por que não consertar, ao invés de descartar?

Certos produtos, como aparelhos eletrônicos, eletrodomésticos e móveis, ainda recebem uma segunda chance, devido aos preços mais elevados quando comprados diretamente nas lojas, mas tornou-se muito comum que se substituam roupas, sapatos, panelas e demais objetos que não custam tão caro assim.

Os costureiros, sapateiros e funileiros de panelas são profissões que datam milhares de anos na História da humanidade e que resistem ao tempo. Além do conserto de acessórios e objetos, os trabalhadores destes ofícios preservaram seu espaço se reinventando, e até usam suas habilidades para dar outras utilidades aos objetos que chegam às suas mãos.

Neste funileiro de panelas, a Maré confia

José Severino é referência trabalhando com conserto de panelas | Foto: Douglas Lopes

José Severino de Oliveira conserta panelas na esquina da Rua Teixeira Ribeiro com a Flávia Farnese, há 10 anos. Aprendeu o ofício observando outros profissionais trabalhando, e hoje faz conserto de qualquer panela.

Uma cliente fixa de Seu José diz que ele é um dos únicos funileiros de panelas que conhece na Maré, então quando precisa dar uma renovada nos utensílios, sai de sua casa no Morro do Timbau e leva até ele, que sempre faz um bom trabalho.

O funileiro diz que não é uma profissão difícil, mas que, às vezes, precisa de ferramentas de trabalho que só encontra em oficinas, como quando precisa desamassar as panelas.

“Todo dia vem cliente consertar panela, da favela toda. Tem gente que não conserta bem, então o pessoal volta aqui, e eu não cobro caro. De manhã, saio para comprar material, porque também vendo peças de fogão, e à tarde fico aqui, de domingo a domingo”, contou José Severino sobre o dia a dia de sua profissão.

45 anos de experiência na sapataria

José Paulo, o Paulinho – Parque União – conserta e também confecciona sapatos | Foto: Douglas Lopes

Já no Parque União, na Rua Raul Brunini, o sapateiro José Paulo, conhecido como Paulinho, recebe vários pedidos de conserto de sapatos, de clientes que confiam no seu trabalho. E não é para menos, o sapateiro tem 45 anos de profissão. Aprendeu por curiosidade, aos 8 anos de idade, quando ficava sentado na porta de um sapateiro, até que ele se ofereceu para ensinar o ofício ao pequeno José Paulo. Seu trabalho é tão bom, que brinca: “Só não conserto chulé.” A qualidade do trabalho fez com que os fregueses se tornassem fixos, conquistando gente até de fora da Maré. 

Paulinho explica que consertar sapato tem de valer a pena. Não adianta mandar para o conserto se o sapato estiver muito gasto, e isso é analisado pelo sapateiro. E os reparos não são muito baratos, portanto, o produto deve ser de boa qualidade, que valha em loja no mínimo R$150. Paulinho garante que, depois do conserto, é muito difícil que volte a apresentar defeitos.

José Paulo já confeccionou sapatos, mas explica que a confecção é muito difícil para ele fazer sozinho. Ele, inclusive, já inventou um tipo de sapato que não deixa entrar areia, mas infelizmente não conseguiu vender a patente: “Há anos inventei um sapato que não entra areia, inclusive virou notícia, mas não consegui uma empresa que comprasse a patente. Por fim, dei de presente para um rapaz, que sempre traz chuteiras para consertar, e ele afirmou, depois de usar, que realmente não entra areia”, contou, sobre sua criação.

Um novo olhar para as roupas

Creusa Rosa da Silva nasceu no interior de Pernambuco e aprendeu o básico da costura com as matriarcas da família. Aos 18 anos, veio para o Rio de Janeiro, onde já trabalhou como dona de bar, vendedora de flores, de sanduíche na praia, de alho no trem e fazendo quentinhas. A intensa troca de ocupações de Creusa é um traço de seu espírito livre. “Eu não poderia ser uma mulher do tipo ‘Amélia’. Sou dessas mulheres livres. Se eu quero, vou fazer. Temos de respeitar o espaço das pessoas e elas têm de respeitar o nosso”, exalta a pernambucana.

Creusa da Silva – Morro do Timbau – faz ajuste de roupas e cria peças de retalhos das roupas | Foto: Douglas Lopes

Há aproximadamente 10 anos, já morando no Morro do Timbau e onde também é costureira, Creusa começou a se aperfeiçoar no conserto de roupas e reaproveitamento de tecidos assistindo a vídeos na internet, e vem adaptando as técnicas que aprende para dar uma cara nova às peças. “Trabalho com conserto, porque as pessoas precisam. Às vezes, as roupas custam muito caro, então elas consertam. E eu não remendo as peças, porque acho que fica feio, faço consertos que dão um detalhe de customização”, explica sobre seu trabalho diferenciado.

Essa criatividade faz tanto sucesso que ela possui clientes em toda a cidade, muitas na Zona Sul, inclusive. Além do bom trabalho nos consertos, ela ainda transforma roupas: vestidos viram saias, calças ganham customizações e até retalhos e tecidos inutilizados viram bolsas, mochilas e chinelos, que ela vende na favela.

Nem tudo o que é descartado, é lixo, mas…

Jogar fora não pode mais ser uma atitude inocente. O Brasil é o 4º País que mais produz lixo no mundo, com um total de 380 kg de resíduos sólidos produzidos por pessoa ao ano (Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil, 2018/2019). Certos materiais levam centenas de anos para se decompor.

Você sabia?

O sapato mais antigo já encontrado tem mais de 7 mil anos, é feito de fibra de plantas e foi encontrado no sítio arqueológico Arnold Research Cave, no estado de Missouri, nos Estados Unidos da América. Entretanto, nas pinturas rupestres (pré-históricas, que datam de 10 mil anos antes de Cristo), pode-se identificar sapatos usados pelas figuras humanas.

Você sabia?

Estudos mostram que as pessoas usam roupas há mais de 30 mil anos. As primeiras agulhas eram feitas de ossos de animais ou marfim. Foi só no século XIV depois de Cristo que a agulha de ferro foi inventada. Já a primeira máquina de costura foi patenteada em 1790, por Thomas Saint. O modelo da primeira máquina foi evoluindo até o ano de 1851, quando Isaac Singer, da famosa marca Singer, inventou a máquina de costura com pedal, a mesma usada ainda hoje.

Lançamento de boletim chama atenção para letalidade de operações policiais

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Violações e 300 horas de operações policiais marcam lançamento de dados sobre violência armada na Maré em 2019

Jéssica Pires
O lançamento da 4ª edição do Boletim Direito à Segurança Pública na Maré reuniu cerca de 100 pessoas na tarde dessa sexta-feira no Centro de Artes da Maré para apresentação e análise dos dados sobre violência armada na região em 2019.

Estiveram presentes Aline Maia, coordenadora do eixo de Direito à vida e Segurança Pública do Observatório de Favelas; Pedro Abramovay, diretor regional da Fundação Open Society para a América Latina e Caribe; Vitor Santiago, morador da Maré alvejado por agentes das Forças Armadas em fevereiro de 2015, moradores, ativistas dos direitos humanos, comunicadores e organizações locais.

Os dados coletados e apresentados pelo projeto “De Olho na Maré”, do Eixo Direito à Segurança Pública e Acesso à Justiça da Redes da Maré, revelou violações de direitos fundamentais e o impacto da violência armada, tendo como principal referência a percepção e o cotidiano vividos pelos mais de 140 mil moradores da Maré.

Em 2019, a Maré foi cenário de uma operação a cada 9 dias. Foram 49 mortes, num aumento de mais 100% em relação a 2018 (34 em decorrência de ação policial e 15 por ação dos grupos armados), e 45 feridos por arma de fogo na região em 2019. O caráter racista das mortes foi evidenciado na fala dos participantes.

A saúde e a educação dos que residem e trabalham na Maré também foram diretamente afetadas pela violência armada. Houve 24 dias de atividades suspensas nas escolas da região, totalizando até 12% dos dias letivos perdidos e 25 dias de atividades suspensas em unidades básicas de saúde.

Camila Barros incluiu um ponto muito importante na reflexão sobre os dados. “Falar da mulher, sobretudo da mãe favelada, é muito emblemático. Os dados quantitativos falam sobre os jovens negros que mais morrem, mas os qualitativos evidenciam a presença das mulheres que estão próximas nesse momento de luto”, observou a coordenadora do projeto durante a sua fala.

Além da apresentação de dados, foram discutidas propostas sobre o cenário de violações e impactos da política de segurança pública na Maré. “A favela é parte da cidade e as políticas de segurança pública tem que ter como foco a vida”, comentou Aline Maia.

Confira a íntegra da  4ª edição do Boletim Direito à Segurança Pública na Maré com os dados completos: www.redesdamare.org.br

Futuro incerto para profissionais da saúde da Maré

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Briga entre Prefeitura e Organização Social causa demissões nos Centros Municipais de Saúde e Clínicas da Família. 

Hélio Euclides

No dia 17 de janeiro, a Prefeitura do Rio de Janeiro assinou um termo de rescisão de contrato de gestão, anunciando o rompimento com a organização social (OS) Viva Rio. A OS administrava 78 unidades de saúde na capital – sete no território da Maré -, e está sendo substituída pela Empresa Pública de Saúde do Rio de Janeiro – RioSaúde. Com isso, os profissionais de saúde entraram em aviso prévio. Na favela, as unidades de saúde administradas em parceria com a Prefeitura são quatro Clínicas da Família e três Centro Municipais de Saúde (CMS), entre eles o localizado em Marcílio Dias.

No mês passado, a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) informou que a rescisão do contrato com a Viva Rio foi “uma decisão estratégica de gestão” e que a troca foi “uma escolha por serviços com mais qualidade e eficiência para o cidadão que busca atendimento”. A Prefeitura afirmou que a mudança vai garantir uma economia de R$ 200 milhões e que a RioSaúde abriu processo seletivo para contratar ou recontratar os profissionais que quiserem continuar trabalhando nas unidades. Profissionais do Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF) disseram que houve uma promessa de recontratação da equipe de farmacêuticos, técnicos de enfermagem, odonto e administrativos, mas voltaram atrás. “Isso foi uma crueldade e desrespeito dessa gestão”, comentou um dos funcionários demitidos que não quis se identificar. Equipe de limpeza e segurança também foram dispensados. Outras empresas terceirizadas farão o serviço.

As lideranças da favela estão preocupadas. “Mandaram as pessoas embora, mexeram com todo mundo. Tem profissional com 20 anos dedicados à saúde da Maré! Serão 2.500 profissionais desempregados. Isso é um jogo político dessa administração municipal”, comenta Vilmar Gomes, conhecido como Magá, presidente da Associação de Moradores do Rubens Vaz. Gilmar Junior, presidente da Associação de Moradores da Nova Holanda concorda com o colega. “Estão tirando o Viva Rio só por ser parceiro da Rede Globo. São profissionais que fazem bom atendimento, que escutam tiro e continuam o trabalho. Será que os novos vão se adaptar? Já temos que aturar o gasto de quase 100 mil reais por mês com óleo diesel para o gerador da Clínica da Família Jeremias Moraes da Silva e agora mais essa”, reclama. 

Moradores também estão sensibilizados. “Esses profissionais não podem sair, pois mesmo quando estavam com salário atrasado, nunca deixaram de atender. Mas é preciso investimento na saúde, pois médico é difícil. Desde setembro tento marcar uma consulta para minha mãe, que é hipertensa”, conta Valter Brito, morador da Nova Holanda. Familiares dos profissionais estão angustiados. “Minha filha começou como agente de saúde e hoje é técnica de enfermagem. Ela está no projeto há 19 anos, desde quando era administrada pela Maré Limpa. Ela ama o território e o pessoal daqui. O que estão fazendo com minha filha é uma injustiça. Será que essas pessoas novas vão trabalhar na favela?”, questiona Elza Ferreira, mãe de Bruna de Lima.

Mesmo quem ficou reclama da redução de salário. No site da RioSaúde há os novos valores. Para enfermeiro, a empresa pública irá pagar o valor bruto de R$ 4.448,23, só que profissionais dizem que antes recebiam R$ 4.900,00. A diminuição é ainda maior, pois vão o valor líquido, após os descontos, fica em R$ 3.900,00. Em nota, a Organização Viva Rio classificou a medida da prefeitura de fim do contrato como “intempestiva”. Hoje a Viva Rio administra na Maré apenas a Unidade de Pronto Atendimento (UPA), em parceria com o Governo do Estado. O Fórum das Associações de Moradores da Maré em conjunto com a Redes da Maré estuda quais medidas vai tomar para defender os profissionais não readmitidos.  

Quais os passos da empresa municipal?

Segundo assessoria, a partir do dia 11 de fevereiro a RioSaúde começou a admissão direta dos funcionários da OS Viva Rio que optarem por continuar trabalhando nas unidades de Atenção Primária da Área de Planejamento (AP) 3.1, que engloba a Maré.  No site da RioSaúde há um edital de convocação para admissão direta de 1.164 funcionários, como médicos de diversas especialidades, enfermeiros, agentes comunitários de saúde, musicoterapeuta, educador físico, entre outras categorias. As contratações acontecem até o dia 20 de fevereiro, no Hospital Municipal Ronaldo Gazolla (HMRG), em Acari, das 8h às 15h. 

Para as vagas não preenchidas e inexistentes no banco dos últimos concursos da RioSaúde, será realizado processo seletivo simplificado por tempo determinado. As inscrições são feitas no próprio site da RioSaúde. Conforme determina a legislação, a empresa pública convocará os aprovados no seu concurso público para as vagas das demais categorias profissionais, como assistente administrativo, assistente social, cirurgião dentista, farmacêutico, fisioterapeuta, fonoaudiólogo, técnico de enfermagem, técnico de saúde bucal, psicólogo, técnico farmácia e nutricionista.

Um passado bem recente

Até chegar a essas sete unidades de saúde primária, uma UPA e um Centro de Atenção Psicossocial Infantil (CAPSi), os moradores antigos lutaram junto aos órgãos governamentais para uma saúde pública na Maré. Na década de 1980, uma empresa privada realizava atendimento gratuito em duas unidades na Maré, uma na Nova Holanda, onde hoje é a associação de moradores, e outra no Morro do Timbau, no local onde se encontra o Espaço de Desenvolvimento Infantil Pescador Isidoro Duarte – “Doro”.

Com o fim do serviço privado, o Conselho de Saúde da AP 3.1 e moradores reivindicaram a implantação de unidades primárias de atendimento, pois só existia o Centro Municipal de Saúde Américo Veloso na Praia de Ramos e um posto gerido pela UFRJ na Vila do João. Após diversas discussões, foram implantados seis postos de saúde, onde existiam consultórios dentários dentro dos CIEPs. Essa foi a primeira vez na Maré ocorria a terceirização da saúde. Na época, a competência para administrar a saúde ficou a cargo da ONG Maré Limpa, que tinha sua sede onde hoje se encontra o Setor de Comunicação da Redes da Maré. Em Marcílio Dias, os primeiros atendimentos vieram por meio dos Médicos Sem Fronteiras, que atendiam em um galpão.

Fique de olhoNa Edição 108 do jornal Maré de notícias fizemos uma matéria que abordava a crise da saúde do Rio de Janeiro, incluindo funcionários com salários atrasados, falta de equipamentos, remédios e funcionários em algumas unidades. Neste momento, a relação entre a Prefeitura e a OS Viva Rio já tinha sido mencionada.