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Moradores da Maré falam seus desejos e conquistas de 2023

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Moradores da Maré que concederam entrevista na edição 144 de janeiro deste ano fazem uma avaliação das suas metas e sonhos

Maré de Notícias #155 – dezembro de 2023

Em janeiro de 2023, o Maré de Notícias perguntou a 16 moradores da Maré, um de cada favela do conjunto, quais eram os seus desejos para o ano que começava. Pedidos por trabalho, educação, saúde e paz estavam no topo da lista. Na edição de dezembro, voltamos a estes moradores para celebrar suas conquistas.

Nova Maré

Richelly Ferreira, 25 anos, tinha como meta conseguir um emprego para dar um futuro melhor para as filhas.

“Realizei os meus desejos, graças a Deus. Consegui não só trabalho, como minha casa própria. Ela está em obra, mas é minha, e estou alcançando aos poucos meus objetivos!”

Bento Ribeiro Dantas

Rafael Barbosa, 36 anos, tinha como prioridade ser promovido no emprego para dar mais qualidade de vida à família.

“Sou grato a Deus por tudo que se realizou. Foi sofrido, às vezes um pouco doloroso, cansativo, mas consegui alcançar tudo aquilo que queria. Minha promoção deu certo e o que eu precisava para dar mais conforto e paz para minha família foi conquistado.”

Roquete Pinto

Francisca Medeiros, 67 anos, tinha como objetivo concluir a reforma da casa, além de ter paz, saúde e união na família.

“Graças a Deus consegui terminar as obras, reformei a casa. A família está muito bem, com muita paz e amor.“

Vila do João

Elaine Lopes, 44 anos, pretendia se posicionar como comunicadora popular, encontrar seu espaço e se destacar no jornalismo. Ela havia acabado de se tornar parceira na Defensoria Pública e queria levar mais defensores para a Maré.

“Consegui me destacar na área do jornalismo através da reportagem que realizei para o programa do Observatório de Favelas, em parceria com a revista da Fundação Oswaldo Cruz, a RADIS. Quem quiser conferir é só acessar o meu perfil no Instagram: @lane_mlopes.”

Marcílio Dias

Anderson Vieira, 35 anos, conhecido como Jedai, queria que 2023 fosse o ano para falar inglês, aprender libras e ser embaixador do CAVA, uma marca que tem propósito social, cultural e ambiental. Outras metas eram vender bastante o curso online do Rei das Unhas, implantar o aplicativo Papoom em toda Maré e abrir nova franquia do Carteiro Amigo.

“Consegui ser embaixador da CAVA, da GLOCAL e sócio da loja Marca da Favela, que investe 10% do lucro em projetos de educação e qualificação profissional. Esse ano me tornei presidente do projeto Impactando Kelson e implantamos o aplicativo Papoom no Parque União e na Nova Holanda. Abrimos uma franquia do Carteiro Amigo na Cidade de Deus, além de Rocinha e Rio das Pedras. Além disso, sou professor de comunicação, tecnologia e mídia no SESC de Ramos e tenho me destacado como poeta.”

Morro do Timbau

Juliana Machado, 31 anos, queria estudar mais sobre a favela e continuar contribuindo para o desenvolvimento da juventude que ela enxerga como potência do território.

“O que mudou em 2023 é minha força de vontade. Vou continuar com meu foco em potencializar a juventude de favela.”

Parque Maré

Raniery Soares, 26 anos, queria continuar estudando para se graduar em 2024. Ele pensava em como atuar na vida acadêmica e na formulação de políticas públicas junto aos movimentos sociais.

“2023 impactou a minha vida em muitos aspectos, principalmente na força de se trabalhar coletivamente e potencializar a vontade de mudança social. Academicamente, iniciei projetos de extensão e pesquisa e fortaleci ainda mais minha área de atuação como militante e ativista para a redução das desigualdades sociais.”

Conjunto Esperança 

Estephany Lopes, 27 anos, é manicure e havia acabado de conseguir seu espaço próprio de trabalho. Com isso, ela pretendia dar aulas na área de nail design e fazer mais cursos.

“Consegui me formar no curso de instrutora, ampliei muito o conhecimento profissional e montei o espaço da forma que eu queria para as clientes. Foi um ano de muitos avanços.”

Praia de Ramos

Juliana Marques, de 25 anos, desejava conseguir um bom emprego e se realizar profissionalmente. Queria também concluir o curso de inglês e esperava que os moradores tivessem um ano melhor, com mais expectativa de vida na comunidade.

“Consegui o estágio que queria e estou muito feliz. Para 2024 espero concluir o curso de inglês.”

Vila dos Pinheiros

Ana Paula Medrado, 28 anos, desejava um ano de mais lazer e mais cuidado com a saúde física e mental. Queria concluir o MBA na área de Dados, na Universidade de São Paulo, e sonhava com o retorno que esse conhecimento poderia gerar.

“Foi um ano de mais lazer, viagens e de atividades físicas, apesar da constante luta para ter esse tempo dedicado. Tive que postergar a conclusão do MBA, mas estou na reta final. Em 2024 quero conhecer a Bahia, quem sabe entrar em um mestrado, mas se tem uma coisa que 2023 me ensinou é que a nossa maior revolução é viver nossa vida, e preferencialmente o agora.”

Nova Holanda

Ana Maria Oliveira, 56 anos, queria melhorar a saúde e alcançar o peso que necessitava para realizar uma cirurgia. Esperava que as filhas ficassem bem e não que faltasse emprego para elas.

“A cirurgia da perna ainda não aconteceu, mas as dores melhoraram bastante com o uso dos remédios certos. Minhas filhas estão bem, uma está com um emprego muito bom e a outra está caminhando e melhorou, mesmo com os problemas.”

Rubens Vaz

Thainá Guedes, 28 anos, queria abrir um negócio na área de alimentação, alcançar estabilidade financeira e viajar mais. Desejava que a violência diminuísse na Maré e que houvesse mais atividades infantis.

“O negócio não deu muito certo, mas graças a Deus consegui estabilidade financeira. Em relação à comunidade, acho o mesmo ainda, faltam atividades para as crianças.”  

Parque União

Josefa Fernandes, de 80 anos, queria ver as pessoas vivendo em harmonia e paz, se amando mais, se respeitando. Desejava também que os governantes tivessem sensibilidade e governassem pensando no povo que sofre.

“Para 2024 desejo a todos amigos e familiares um mundo melhor, sem violência e sem guerra. Com muita paz, saúde para todos nós e, com a benção de Deus, para toda humanidade.”

Salsa e Merengue

Ana Maria Camilo, de 27 anos, tinha a meta de cuidar mais da saúde física e mental. Queria tentar estar mais próxima da natureza, apesar de saber que este é um grande desafio para os favelados, vítimas do racismo ambiental e cada vez mais distantes dos locais verdes e arborizados.

“Este ano viajei para dois lugares que tinha vontade de conhecer, Petrópolis e Paraty. 

Continuo desejando mais contato com a natureza, acho isso extremamente importante. O que ainda está em construção é o cuidado com a minha saúde física. Para o ano de 2024, pretendo realmente começar a fazer algum tipo de exercício físico. Cuidar da saúde mental não é só fazer terapia, o exercício físico também ajuda a manter o equilíbrio. Quero viajar mais em 2024, nem que seja para conhecer cidades no estado do Rio de Janeiro, quero provar novas gastronomias e desejo muito que o próximo ano seja de paz para todos os mareenses.”

Baixa do Sapateiro

Rafael Lima, 34 anos, desejava um ano de mais amor ao próximo. Para a Maré, ele queria que os moradores pudessem ser potência nas áreas de cultura e esporte.

“Foi um ano que eu consegui entender como a saúde mental afeta os atletas e percebi que é possível vencer a depressão e a ansiedade.”

Conjunto Pinheiros

Jessica Cristina, 33 anos, esperava conseguir trabalho, além da casa e negócio próprio.  Infelizmente, não conseguimos contato com ela, mas ainda queremos saber se Jéssica conseguiu realizar os seus desejos.

Boas notícias para os estudantes da Maré, saiba as promessas para a educação

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2024 promete mais vagas, melhorias infraestruturais e novas perspectivas de ensino para a comunidade escolar

Adriana Pavlova e Hélio Euclides

O ano de 2023 não foi fácil para os estudantes das 50 escolas públicas da Maré. Dos 208 dias de aulas previstos no calendário anual determinado pelo Ministério da Educação (MEC), até 15 de dezembro as unidades escolares da região ficaram fechadas 27 dias por conta das recorrentes operações policiais no território. 

Apesar disso, há boas notícias para a comunidade escolar mareense: em 2024 haverá mais vagas nas escolas municipais e há estudos para o aumento do número de turmas nas unidades estaduais. Isso deve evitar que muitos alunos fiquem fora das salas de aula ou sejam obrigados a estudar longe da Maré, como historicamente acontece. 

Outra novidade é a sobre melhorias na infraestrutura das unidades do estado e a promessa da construção de uma quinta escola de Ensino Médio.

Mais turmas

Nas escolas do município, a grande notícia é a abertura de turmas de 7º ano do Ensino Fundamental II no CIEP Hélio Smidt, para absorver a demanda dos estudantes que completam o 6º ano das escolas do Campus Maré da Nova Holanda. 

Cristiane Cardoso, gerente de supervisão e matrícula da 4ª Coordenadoria Regional de Educação (CRE), diz que, se for da vontade dos responsáveis, todos os alunos do 6º ano que já estudam em unidades da região vão continuar na Maré:

“Começamos a transição do CIEP Hélio Smidt para uma escola com disponibilidade do 7º a 9º ano, porque na região da Nova Holanda só tínhamos uma escola de Ensino Fundamental II (Olimpíadas Rio 2016) para sete escolas de Fundamental I (1º a 6º ano)”, diz. Cristiane.

Segundo ela, “no CIEP, haverá mais 105 vagas de 7º ano para acomodar todos os alunos desse segmento em unidades próximas. Vamos ainda abrir 12 vagas para alunos novos, no período de matrículas de janeiro”.

Mais vagas

Outras notícias para alegrar os responsáveis: em toda a Maré haverá mais 80 vagas de pré-escola — 40 para as crianças já matriculadas e 40 para alunos novos. 

A Escola Municipal Clotilde Guimarães, localizada em Ramos e que atende prioritariamente o público mareense, será em 2024 um Centro de Educação de Jovens e Adultos (CEJA), oferecendo 150 vagas a mais de ensino semipresencial e 31 vagas de ensino à distância. 

Finalmente, na Escola Municipal Vereadora Marielle Franco e no CIEP Ministro Gustavo Capanema, na Vila dos Pinheiros, haverá turmas retomando o horário integral. As duas unidades voltaram a funcionar separadamente depois da conclusão das obras da escola estadual.

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Reformas

Cristiane Cardoso diz que, em janeiro de 2024, mais vagas em diferentes segmentos serão oferecidas para novos alunos.

“Após estudos e remanejamentos, vamos abrir as matrículas com mais vagas. Antes havia segmentos que já começavam com falta de vagas, o que provocava o deslocamento dos estudantes para fora do território. Ainda não é um número totalmente confortável, mas já é um caminho”, diz Cristiane. 

A abertura de vagas também poderá se estender ao Ensino Médio na Maré. Uma equipe comandada pela subsecretária de Planejamento e Ações Estratégicas da da Secretaria Estadual de Educação (Seeduc), Myrian Medeiros, passou os últimos meses em contato estreito com as direções das quatro escolas da região.

O objetivo era estudar a possibilidade de abertura de mais vagas para a primeira série do Ensino Médio em 2024. Segundo Myrian, se tudo der certo, a previsão é que, até 2026, sejam oferecidas mais 480 vagas, contemplando todas as séries.

Novo colégio

Ao mesmo tempo, a proposta da construção de mais um colégio estadual está avançando. Em parceria com a Redes da Maré, a Seeduc está em busca de um terreno onde a nova unidade possa ser construída. 

O diálogo com a equipe do Eixo de Educação da Redes da Maré ganhou mais intensidade depois da participação de Myrian Medeiros no 4ª Seminário de Educação da Maré, realizado em junho, no Centro de Artes da Maré.

“No seminário, fizemos reuniões com as equipes dos colégios da região e agendamos visitas às unidades, a partir das quais ouvimos as necessidades de cada escola. Já estamos realizando reformas e manutenção da infraestrutura dos colégios professor João Borges de Moraes e do CIEP 326 Professor César Pernetta”, diz a subsecretária.

Segundo a Seeduc, nesta última escola estão em andamento reformas no anexo onde funciona a biblioteca, os laboratórios, a quadra poliesportiva e o reservatório de água. 

Há ainda projetos para a revisão do sistema elétrico e de incêndio. No Colégio Estadual Professor João Borges de Moraes, com o fim da reforma da infraestrutura elétrica estão sendo instalados aparelhos de ar-condicionado, e está prevista a construção de um novo reservatório de água.

Matrículas 2024

As matrículas de estudantes de pré-escola, Ensino Fundamental e EJA que estão fora das salas de aula e que buscam vagas nas 46 unidades municipais da Maré vão acontecer de 12 a 17 de janeiro de 2024. 

O processo é feito online pelo site www.matricula.rio  ou no aplicativo Rioeduca em Casa. Como aconteceu em 2022 e 2023, a Redes da Maré e as associações de moradores se uniram para a realização da campanha Vamos pra escola. 

Nas sedes da Redes da Maré da Nova Holanda e Vila dos Pinheiros e nas associações de moradores, há garantia do acesso das famílias à internet para a realização da primeira fase das matrículas, com ajuda de voluntários e tecedores da instituição. 

O atendimento presencial tem como objetivo facilitar a pré-matrícula de todos os que estão fora da escola. Na edição da campanha de 2023, foram 318 atendimentos, com 137 pré-matrículas. Na primeira Vamos pra escola em 2022, os 175 atendimentos resultaram em 102 pré-matrículas.

A perspectiva este ano é que os atendimentos sejam ampliados e mais pré-matrículas, concretizadas, como reforça Andréia Martins, diretora da Redes da Maré:

 “Como a campanha é um projeto institucional e já entrou para o calendário de eventos da Maré, acreditamos numa mobilização maior em 2024. Outro fator positivo é a perspectiva de termos mais vagas para todos os segmentos em todas as escolas do conjunto.” 

Ações em 2024

A Redes da Maré prevê para junho do próximo ano o 5º Seminário para Educação da Maré. Na edição de 2023, foi lançada a Carta para a Educação da Maré, construída colaborativamente com 42 sugestões ao poder público para a melhoria do ensino e ampliação do direito à educação nas favelas da Maré. 

Como desdobramento do documento, a coordenadora da 4ª CRE, Fátima Barros, propõe que em 2024 sejam feitas ações nas escolas da Maré para a discussão das recomendações.

 “Seria interessante criar grupos de trabalho nas escolas, com especialistas, professores e diretores para esmiuçar as propostas da Carta, para partir para a execução das recomendações”, explica.

Finalizamos esta série de reportagens agradecendo a todos que participaram deste trabalho: secretarias, instituições, professores, alunos, responsáveis, diretores. E esperamos que 2024 seja um ano melhor para toda a comunidade escolar mareense.

Maré celebra cultura com diversidade e resitência

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Polos de cultura da Maré vão além de instituições. São coletivos, estabelecimentos, pessoas que estão atuando em prol do fortalecimento do cenário cultural do território

Maré de Notícias #155 – dezembro de 2023

Em 2003, o então Ministro da Cultura, GIlberto Gil, em visita a Festa Literária de Paraty (FLIP) disse em entrevista: “Precisa acabar com essa história de achar que cultura é uma coisa extraordinária, cultura é ordinária, cultura é igual a feijão com arroz é necessidade básica. Tem que estar na mesa, tem que estar na cesta básica de todo mundo.”

Em 5 de novembro foi celebrado o Dia Nacional da Cultura e a Maré comemorou sua diversidade cultural em diferentes polos. Um deles foi o Centro de Artes da Maré (CAM), na Nova Holanda, que teve programação especial durante todo o mês de novembro.

Entre as atrações estavam as comemorações de aniversário de 12 anos da Escola Livre de Dança da Maré. A escola é uma iniciativa da Redes da Maré em parceria com a Lia Rodrigues Companhia de Dança.

Luciana Barros é uma artista de dança e performer formada pela escola, e comemorou a longevidade do projeto. Segundo ela, todos os anos investidos ali ajudaram a formar uma parte de quem eu sou: a menina que sonhava em dançar, e que luta todo dia para continuar dançando”.

Ela se sentiu “muito grata pelo convite de estar com um trecho do solo Anastácia nesse dia tão simbólico, como ex-aluna, ex-secretária do CAM, como artista da dança, e moradora da Maré”.

Ato político

Marcos Diniz é produtor do CAM e reforça que “a cultura está além da manifestação artística, é um ato político que temos entendido como um movimento de resistência”. O CAM nasceu em 2009, criado pela Redes da Maré e tem a arte e a incidência política em foco.

O espaço já foi palco de espetáculos de dança e teatro, shows, rodas de conversa, exposições, intervenções e exposições como a Mostra Maré de Música e a audiovisual em realidade virtual Metaverso Brasil

Nomes importantes da cultura brasileira, como a escritora Conceição Evaristo, e do cenário político, como a Ministra da Igualdade Racial Anielle Franco, também já marcaram presença em atividades no CAM. 

Único equipamento

Dois outros marcos culturais importantes em novembro foram a inauguração da Areninha Cultural Herbert Vianna e a reabertura da Biblioteca Jorge Amado, em Nova Maré.

Anteriormente chamada de “Lona da Maré”, a Areninha é o único equipamento cultural público para os mais de 140 mil habitantes do território. Ela faz parte do programa de recuperação dos equipamentos culturais do subúrbio como uma nova modalidade de espaço cultural gerido pela Prefeitura do Rio.

Cultura no centro

Os polos de cultura da Maré vão além de instituições e são mais do que projetos: são coletivos, estabelecimentos, pessoas que estão atuando em prol do fortalecimento do cenário cultural das 16 favelas do território. 

A Tabacaria Dreadlocks, na Vila dos Pinheiros, desde a sua abertura promove, apoia e realiza eventos, mobilizando moradores e a cultura dentro da favela. 

“O espaço fomenta o Rock de Favela, a Roda Cultural do Pontilhão, o Pontilhão Reggae Dub, entre outros eventos musicais”, conta Eduardo China, fundador e gerente do espaço. 

Segundo ele, a Dreadlocks ainda promove “outras formas de fomento à cultura, como rodas de conversas e literárias, exibição de filmes, festival de arte e cultura e até mesmo a exibição de jogos esportivos, visando o estímulo e à aderência ao esporte no cotidiano dos moradores, gerando entretenimento e lazer para a comunidade”.

De acordo com China, o propósito do estabelecimento é estimular a valorização dos artistas de favela e dos ritmos que percorrem as ruas da Maré.

 “O rock, o rap e o reggae são de origem periférica, originalmente de uma população preta e pobre, marcadas em suas raízes por muita luta. Mesmo com essa ascensão da cultura de favela, ainda faltam oportunidades para que artistas periféricos possam se desenvolver”, analisa. 

Outro fazedor de cultura do território é o rapper Madiba MC. Morador da Baixa do Sapateiro, ele enxerga a cultura como algo transformador. 

Ele explica que “a cultura do rap e do hip-hop tem o poder de transformar, motivar e informar sobre a realidade que para muitos não é tão clara, pois só consomem o que a grande mídia divulga e acabam absorvendo um estereótipo que não condiz com a verdade”.

Reconhecimento

Apesar das dificuldades, as ações culturais da Maré têm sido reconhecidas e premiadas. Em 2023, a Orquestra Maré do Amanhã conquistou o título de Patrimônio Cultural Imaterial do Rio de Janeiro, depois de 20 anos de trabalho. 

Além disso, o CAM recebeu o Prêmio de Cria para Cria — Cultura e Favela das mãos da vereadora Mônica Benício (PSOL). Já a diretora mareense Renata Tavares ganhou o Prêmio Shell de Teatro com a peça Nem todo filho vinga, da Cia Cria do Beco.

Em setembro deste ano, a Escola de Fotógrafos Populares Imagens do Povo participou como convidada de mais uma edição do Paraty em Foco, festival de fotografia na histórica cidade fluminense.

Por sua vez, o espetáculo Noite das Estrelas está em turnê por diversos espaços da cidade com a celebração dos corpos LGBTQIA+, e o festival Comida de Favela realizou a segunda edição, com a participação de 16 estabelecimentos.

Berço Cultural

Os saraus nos bares, as rodas de rap nas praças, as rodas de samba nas quadras, os bailes funk na rua e as exibições de filmes na esquina são todos espaços que legitimam a cultura favelada. 

As 16 favelas da Maré são uma mostra da diversidade e da potência da cultura produzida nas periferias. O produtor Marcos Diniz enxerga a Maré como um berço cultural:

 “Eu vejo esse movimento na Maré como uma grande onda, vasta e ampla no sentido de possibilidades e diversas linguagens artísticas. Onde você for dentro das 16 favelas da Maré você vai ver a cultura sendo reverberada de alguma forma, seja pela música, pela arte, pela intervenção urbana, dança, teatro, literatura. É impossível circular pelo território sem perceber manifestações culturais. A cultura mareense, de fato, é algo gigante”, diz.

9 em cada 10 brasileiros perceberam mudanças climáticas nos últimos anos, diz pesquisa

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Percepção aumentou em relação à pesquisa de 2022; 92% dos entrevistados dizem que sentem mudanças climáticas e a ação contra o aquecimento global deve ser imediata

Reportagem de Gabriel Tussini originalmente publicada no portal ((o)) eco

91% dos brasileiros perceberam alterações na temperatura e mudanças climáticas nos últimos anos, mesma proporção dos que consideram o aquecimento global um problema grave ou muito grave. É o que dizem os resultados da pesquisa Sustentabilidade & Opinião Pública, contratada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) e realizada pelo Instituto de Pesquisa em Reputação e Imagem. Os números, divulgados na segunda (11), demonstram um aumento de preocupação com as mudanças climáticas em relação ao ano passado, quando 86% da população considerava o problema como grave.

As entrevistas foram feitas presencialmente entre os dias 18 e 21 de novembro, com 2.021 pessoas maiores de 16 anos em todos os estados e no Distrito Federal. A margem de erro é de 2 pontos percentuais e o intervalo de confiança é de 95%, e devido ao arredondamento, a soma dos percentuais pode variar de 99% a 101%. “A pesquisa identifica a preocupação do brasileiro com fatores climáticos, principalmente olhando para inundações, secas, e todos os efeitos extremos que a questão climática vem trazendo para o contexto nacional”, comentou Davi Bomtempo, gerente executivo de Meio Ambiente e Sustentabilidade da CNI.

A pesquisa captou as diferentes formas de impacto das mudanças climáticas de acordo com cada região. No Norte e no Centro-Oeste (agrupados pela pesquisa), por exemplo, 90% dos entrevistados disseram perceber uma diminuição no volume de chuvas, e 76% citaram a seca em rios – tendência parecida com a do Nordeste, em que 82% e 73% da população apontou, respectivamente, os mesmos problemas. Já na região Sul, ao contrário, 69% das pessoas citaram o aumento no volume de chuvas, enquanto 76% citaram a maior frequência de transbordamento de rios.

Já sobre temperaturas, é quase unânime a percepção de aquecimento – é o que apontam 95% dos entrevistados no Norte e Centro-Oeste, 92% no Sudeste e no Nordeste, e 86% no Sul. Por outro lado, é no Sul que está a maior proporção, embora ainda pequena, de pessoas que dizem que tem feito mais frio (11%). 

Nessa realidade, o número de pessoas que considera as mudanças climáticas um problema imediato, que deve ser combatido urgentemente, cresceu. É essa a visão de 61% dos entrevistados, contra 51% no ano passado. Apenas 3% das pessoas consideraram que não é preciso ação imediata – mesmo número do ano passado –, enquanto 5% não souberam ou não responderam. Portanto, para 92% dos entrevistados, é preciso agir imediatamente contra as mudanças climáticas.

“Os dados recentes sobre as mudanças climáticas confirmam a importância de acelerarmos as ações voltadas à adaptação e à redução dos impactos de secas, enchentes, ondas de calor e frio intensos e outros fenômenos extremos, que vêm causando enormes prejuízos sociais e econômicos em todo o mundo”, afirmou Ricardo Alban, presidente da CNI.

“A necessidade de transição para uma economia de baixo carbono, que esteja alinhada com a contenção do aumento da temperatura do planeta dentro da meta do Acordo de Paris, é urgente. As mudanças climáticas têm afetado cada vez mais a vida das pessoas, e é de interesse coletivo a promoção de um sistema produtivo mais sustentável”, complementou.

É nessa linha que vão 38% dos entrevistados, que citaram o desmatamento de florestas como a primeira ou segunda maior ameaça ao meio ambiente no Brasil – enquanto 55% considera como ruim ou péssima a conservação do meio ambiente no país. O desmatamento, vale lembrar, é o maior responsável pelas emissões de carbono em território nacional.

Completam o pódio das ameaças percebidas o aquecimento global, citado por 23%, e a fumaça e emissão de gases poluentes, citados por 22%. Já entre as maiores prioridades para a conservação, 30% dos entrevistados citaram o tratamento de água e esgoto, 27% o combate ao aquecimento global, e 25% apontou o combate ao desmatamento.

*Gabriel Tussini é estudante de jornalismo na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), redator em ((o))eco e interessado em meio ambiente, política e no que não está nos holofotes ao redor do mundo

Dezembro vermelho: prevenção ainda é o melhor ‘remédio’ contra HIV

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SUS oferece também novo remédio para tratamento contra doença

Maré de Notícias #155 – dezembro de 2023

Teresa Santos

Dia 1° de dezembro é o Dia Mundial de Luta Contra a Aids, e o Brasil segue como um dos países mais ativos no combate à doença. Em outubro, o Instituto de Tecnologia em Fármacos da Fundação Oswaldo Cruz (Farmanguinhos/Fiocruz), começou a fornecer ao Sistema Único de Saúde um novo medicamento.

O Dovato é uma terapia dupla combinada em um único comprimido (Dolutegravir 50 mg e Lamivudina 300 mg). Até então, o tratamento era feito por terapia tripla (Dolutegravir, Tenofovir e Lamivudina), com dois comprimidos.

Segundo Mônica Bastos, pesquisadora do Farmanguinhos/Fiocruz, com o novo medicamento “conseguiremos ter mais pacientes com carga viral indetectável, ou seja, um maior número de pacientes que não vai transmitir o vírus”.

Benefícios

Outro benefício é a melhoria da qualidade de vida dos pacientes. De acordo com a pesquisadora, um dos efeitos do Tenofovir é a possibilidade de prejudicar os rins — sua retirada da combinação terapêutica ajudará a diminuir esse efeito.

Agora, os pacientes portadores do HIV que chegam ao SUS pela primeira vez já vão iniciar o tratamento com o Dovato. Os que já estão em tratamento serão avaliados para se saber se é possível fazer a troca.

 Nesse caso, será preciso cumprir alguns critérios como: estar em um regime antirretroviral estável, sem histórico de falha ao tratamento e nenhuma substituição associada à resistência aos componentes do Dovato, ter carga viral indetectável no último ano, não ter coinfecções (como hepatite B e tuberculose), ter mais de 12 anos e pesar mais de 40 kg.

Fim da aids

Segundo dados do Programa das Nações Unidas sobre HIV/aids (Unaids), em 2022 havia 39 milhões de pessoas vivendo com HIV no mundo. No Brasil, eram 990 mil. No ano passado, o país registrou 51 mil novas infecções pelo HIV.

Os números do Observatório Epidemiológico da Cidade do Rio de Janeiro (EpiRio) apontam para 3.470 notificações de aids em 2022. Na Área de Planejamento 3.1, na qual a Maré está inserida, foram 466 casos, sendo 61 entre mareenses.

De acordo com o relatório global do Unaids O Caminho que põe Fim à AIDS, lançado este ano, o fim desta pandemia é possível, mas é uma escolha política e financeira.

Prevenção é vital

Os avanços terapêuticos são muito importantes, porém prevenir é fundamental e o uso de diferentes abordagens preventivas é a melhor estratégia.

A mais indicada é o uso de camisinha. A chamada Profilaxia Pré-Exposição (PrEP) é outro recurso. Ela consiste em tomar diariamente um comprimido (Tenofovir e Entricitabina) que vai preparar o organismo para uma eventual contaminação pelo HIV. 

A PrEP é recomendada para pessoas consideradas de comportamento de risco (que têm mais chances de contrair a infecção), como profissionais do sexo, pessoas trans e homens que fazem sexo com homens, entre outros grupos.

Pela Vida na Maré

O educador em saúde Marcio Villard é coordenador-geral do Grupo Pela Vidda, organização que há quase 35 anos desenvolve ações de conscientização sobre a aids e de luta contra o HIV.

Além de informações sobre a doença, o Grupo Pela Vidda promove a testagem para o vírus em diferentes locais, através da coleta da saliva; o resultado sai na hora, e é informado “seguindo as normas de sigilo e de segurança das pessoas que participam”, explicou Márcio.

É importante destacar que o beijo não é uma via de transmissão do HIV. Segundo o Ministério da Saúde, o teste “detecta os anticorpos produzidos em resposta a infecção pelo HIV e não o vírus diretamente, portanto o fluido oral não é infectante”.

Segundo o educador, os testes acabam servindo como triagem. Se o resultado for positivo para a doença, a pessoa é orientada a fazer outro teste mais completo para confirmar ou não o diagnóstico.

Márcio explica que este tipo de ação em espaços públicos é feita no mundo há quase 20 anos,mas no Brasil ela ainda é limitada, principalmente por causa do preconceito enfrentado pelos soropositivos.

Direitos humanos

Alberto Duarte é coordenador da ONG Maré Sem Preconceito e desenvolvendo ações em parceria com o Grupo Pela Vidda. Segundo Beto (como ele é mais conhecido), informar sobre o HIV e a aids é uma estratégia de proteção dos direitos humanos, frequentemente violados na Maré.

“As informações à disposição são quase inexistentes, e o pouco que circula não chega à maioria da população mareense. Muitas vezes, vejo que no nosso território falta não só diálogo sobre este assunto como também oportunidades de realizar o exame de testagem”, lamenta.

Editorial: o desgaste de 29 dias de operações policiais na vida de quem mora na Maré 

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29ª operação policial foi a segunda na mesma semana que antecede as festas natalinas 

A cronista Marina Colasanti escreveu em 1972 para o Jornal do Brasil: “A gente se acostuma a coisas demais, para não sofrer. Em doses pequenas, tentando não perceber, vai afastando uma dor aqui, um ressentimento ali, uma revolta acolá” esse trecho faz parte da crônica “Eu sei, mas não devia” onde ela narra que a gente se acostuma com o cotidiano, com notícias de guerra e da violência. Mas os moradores da Maré não se acostumam com a violência. Eles afastam a revolta e tentam seguir. E nós do Maré de Notícias também tentamos seguir levando notícias de empreendedorismo, cultura, meio ambiente. Mas hoje (15/12), mais uma vez a Maré foi cenário de uma operação policial, a 29ª em 2023.

Nesta sexta-feira muitas casas da Maré já estão enfeitadas e preparadas para as festas e celebrações de fim de ano. Um concurso é realizado na região, para escolha e premiação da casa mais enfeitada. O último dia foi de festa em muitas escolas, no mesmo espírito de confraternização que ocupa os grupos e comunidades neste período. E em outras tantas escolas aconteceriam também festas nesta sexta. Porém, por mais um dia, a vida de milhares de pessoas que moram ou circulam na Maré foi atravessada pela presença armada e uso da força do Estado, por meio de uma operação policial. 

A 29ª operação policial na Maré aconteceu nesta manhã na região do Parque União, Nova Holanda, Rubens Vaz e Parque Maré, com atuação do BOPE, Batalhão de Ação com Cães e Grupamento Aeromóvel. Os moradores relatam a presença dos agentes policiais desde às 5h da manhã. A assessoria de imprensa da Secretaria de Estado da Polícia Militar não informou até o momento do fechamento deste texto, a motivação da operação.

Apesar de, em meados de outubro, o governo do estado do Rio de Janeiro ter anunciado a “Operação Maré” e suas estratégias de asfixiamento dos grupos armados do território para retomada e controle do território, a comunicação sobre operações policiais vem sendo realizada pela própria polícia militar.

Em descumprimento às determinações federais na execução de operações policiais, nesta sexta-feira, não foi identificada ambulância para socorro a possíveis vítimas de confrontos armados na Maré. Muitos agentes policiais também atuaram sem câmeras de monitoramento acopladas em seus uniformes. Algumas invasões de domicílio por parte dos agentes de segurança foram mapeadas durante a operação de hoje. 

Por mais um dia, pelo menos 22 unidades escolares não funcionaram na Maré. 7365 alunos da rede municipal de ensino foram impactados com a suspensão das aulas. Esse ano foram 27 dias sem aulas na Maré. Em que outra parte da cidade, estado ou país isso poderia ser naturalizado como efeito de uma política pública? 

No entanto, para além do evidente desrespeito indiscriminado a diversos direitos dos moradores da Maré, um intenso sentimento de cansaço é o que resulta de um ano que o Estado se fez presente de forma tão violenta por meio da política de segurança pública.

“Operação todo dia? Como pode? Chegamos a um ponto que isso não nos assusta mais”, comentou o DJ, produtor, compositor e morador da Maré, Renan Valle, no post de alerta no instagram do Maré de Notícias, logo pela manhã. 

O cansaço quase faz confundir o sentimento das pessoas que moram na Maré. Não é sobre naturalizar ou acostumar-se com situações de violência. Porém até mesmo a barbárie no cotidiano passa a não ser surpresa. E lamentamos que inclusive às nossas narrativas passam a ser repetitivas ao darmos visibilidade às recorrentes operações policiais que são realizadas na Maré. 

Em 2024 o Conjunto de Favelas da Maré completa 30 anos como bairro e queremos comemorar esse número. Não queremos ter que contar a 30ª operação policial que tira direitos dos moradores e que parecem rotina dos noticiários. Por aqui seguimos na contramão, levando informações necessárias para que a Maré continue sendo a morada de tanta gente guerreira, criativa, corajosa e dedicada.