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Maré brilha na Taça das Favelas

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Time da Vila do João segue firme no maior campeonato entre favelas do mundo 

Maré de Notícias #153 – outubro de 2023

A Taça das Favelas, campeonato de futebol idealizado pela Central Única das Favelas (CUFA), chegou este ano à sua 13ª edição, e os 22 jovens jogadores do time da Vila do João seguem como os únicos da Maré no torneio, com chance de chegar à final. É a primeira vez que a equipe participa deste campeonato.

Este ano, um dos diferenciais da Taça das Favelas é a organização em chaves, com a possibilidade de cada equipe jogar pelo menos três partidas. Nos anos anteriores, o “mata-mata” podia eliminar um time já no primeiro jogo. 

Para os participantes, o torneio é uma oportunidade para conhecer outros jovens jogadores, ser visto por olheiros de times profissionais e chegar ao certame nacional, representando o Rio de Janeiro. Acima de tudo, o torneio gera a valorização dos territórios de favelas.

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Portas abertas

“Estamos empolgados em ter a chance de chegar a uma final. O futebol pode ser a oportunidade única para um menino”, diz o coordenador da equipe da Vila do João, Evandro de Menezes,. Segundo ele, é necessário mais portas abertas para as crianças e jovens de favelas.

“A Vila Olímpica da Maré tinha que ter uma pista de atletismo para mais oportunidades no esporte. Não queremos formar só atletas, e sim inserirmos, através do esporte, o respeito e a cidadania. O esporte também significa saúde”, diz ele.

Os treinos da equipe acontecem no campo do Romarinho, na Vila Olímpica, e no campo da Toca, na Vila dos Pinheiros.

Organização da Taça das Favelas

Outro diferencial da competição em 2023 é a abertura pela primeira vez da Série B, o que deu espaço para mais times participarem: ao todo, são 52. Na Série A, a Taça das Favelas selecionou 96 times na categoria masculina e 34 times no feminino, com jovens de 15 a 17 anos. 

As equipes masculinas foram divididas em 24 grupos com quatro times cada um. Passam para a fase eliminatória 32 times: os líderes de cada grupo, e mais os oito com melhor pontuação no segundo lugar. O campeonato começou em 15 de julho e vai até o dia 19 de novembro: a final será jogada na Cufa Arena, em Realengo. 

O objetivo principal do torneio é de promover a integração de diferentes favelas por meio do esporte e também revelar talentos. Além da Vila do João, a Maré teve outras duas favelas na competição: a Nova Holanda e o Parque União, que mesmo não estando mais na competição, mostraram garra e empenho nos jogos.

Força na Série B

Rogério da Costa, coordenador do time da Nova Holanda, já participou de nove edições do campeonato e se diz carimbado: “Pela eliminação precoce, ano que vem vamos disputar a Série B, mas com mais força.”

Segundo ele, o que se faz na arquibancada também conta; por isso, “não levo torcida, pois a euforia pode prejudicar, já que baderna e palavrões penalizam o time. Um dos procedimentos da competição é o respeito mútuo. O segredo é ter um grupo unido como uma família”.

Para Rogério, o desafio é a falta de apoio. “Muitas vezes me sinto só, pois não tenho recurso. O que salva são alguns comerciantes amigos que ajudam com lanches. Seria muito bom oferecer uma cesta básica mensal para cada atleta da equipe, mas muitas vezes não conseguimos nem pagar um refrigerante”, lamenta.

O técnico diz que “outro grande problema é a ausência de um psicólogo. Acabo eu mesmo conversando com os jogadores; minha tristeza é quando um menino se desvia do caminho do bem”.

Rogério sonha alto: ele quer criar um torneio sub-17 na Maré, o que incluiria todas as 16 favelas pelo esporte. Para ele, isso ajudaria a criar uma atmosfera mais pacífica entre os diferentes territórios.

No 5º dia da ‘Operação Maré’ uma morte e policiais sem câmeras corporais

Ações coordenadas pelo governo do estado do RJ afetam direitos de moradores e não garante segurança pública

Nesta segunda-feira (16/10) aconteceu o 5º dia da ‘Operação Maré‘, comandada pelo governo do estado do Rio, que deixou uma pessoa morta, mais de 13 mil alunos sem aula, cancelamento de atendimentos médicos e descumprimentos de determinações da ADPF das Favelas. No total são 13 favelas e mais de 120 mil moradores afetados em 5 dias de ações.

A operação começou por volta das 5h30 com tiros, circulação de veículos blindados e forte presença de agentes policiais das polícias militar e civil, na região das favelas Baixa do Sapateiro, Morro do Timbau, Vila do Pinheiro, Conjunto Bento Ribeiro Dantas, Vila do João e  Conjunto Esperança

Foram registradas invasões de domicílios, danos ao patrimônio, subtração de pertences, agressões físicas, verbais e psicológicas à moradores. Cometidas por agentes policiais nesta segunda-feira e também nos demais dias de operação policial. 

Em descumprimento às determinações da ADPF das Favelas, nos 5 dias de operação foram identificados agentes policiais sem câmeras acopladas aos uniformes; só houve ambulância para socorro à vítimas em 2 dois 5 dias e não foi realizada perícia e preservação dos locais das mortes.  

20 dias sem aulas em 2023

Direito à educação negado em cinco dias sem aula na Maré. (Foto: Voz das Comunidades)

Sem direito à educação: 13.799 alunos de 41 escolas municipais tiveram aulas canceladas nesta segunda-feira, recebendo atendimento remoto, de acordo com a Secretaria Municipal de Educação. 

São mais de 17 mil alunos sem aula na última semana.

  • Segunda-feira (09/10) 44 unidades escolares municipais fecharam;
  • Terça-feira (10/10) 41 escolas não funcionaram;
  • Quarta-feira (11/10) 37. Duas escolas estaduais que têm turmas no horário da manhã também suspenderam as atividades.

Não foi possível contabilizarmos o número de alunos das escolas privadas, ou que frequentam unidades em outros bairros, que foram impossibilitados de estudar.

16 dias sem atendimento médico em 2023

Mais de 3 mil atendimentos médicos suspensos. Desde o primeiro dia de operação as unidades de saúde da Maré têm seu funcionamento interrompido ou afetado pelas operações policiais.

  • Segunda-feira (09/10): 5 unidades fecharam, com uma média de 990 atendimentos suspensos,
  • Terça-feira (10/10): 4 unidades fecharam, com a média de 770 atendimentos não realizados;
  • Quarta-feira (11/10): 3 unidades foram impactadas, com 610 atendimentos suspensos;
  • Segunda-feira (16/10): mais uma vez a as clínicas da família Augusto Boal, Adib Jatene; Jeremias Moraes da Silva, e o Centro Municipal de Saúde Vila do João suspenderam o funcionamento.

Acesso à justiça:

“Todas as famílias que foram violadas, de alguma maneira, podem buscar atendimento jurídico da Defensoria para busca de reparação e as que sofreram violência de Estado podem buscar também o atendimento psicossocial através da Rede de Atenção a Pessoas Afetadas pela Violência de Estado, que atua junto com a Defensoria Pública e com 13 grupos clínicos de atendimento psicológico e psicanalítico”, orienta Guilherme Pimentel, Ouvidor da Defensoria Pública do Rio de Janeiro e presidente do Conselho das Ouvidorias. O ouvidor também destaca que a defensoria está atenta às violações de direitos coletivas, como no caso da saúde e da educação.  

As violações de direitos nestes últimos cinco dias de operações policiais na Maré reforçam o lugar de insegurança vivida pelos moradores que  iniciaram mais uma semana com o sentimento de medo e a impossibilidade de seguir com o cotidiano. A Redes da Maré publicou uma nota pública sobre os impactos já percebidos da ‘Operação Maré’ no conjunto de favelas. 

O Maré de Direitos, projeto do eixo Direito à Segurança Pública e Acesso à Justiça, da Redes da Maré, acolhendo situações de violações de direitos no WhatsApp (21) 99924-6462. E o Ministério Público (MP) realiza um plantão especial para atender a população. O atendimento gratuito é feito no telefone (21) 2215-7003 ou no e-mail [email protected].

O Maré de Notícias segue acompanhando e recebendo informações pelas redes sociais e WhatsApp (21) 97271-9410.

Exposição CRIA chega na Galeria 535

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Fotografias do acervo do Imagens do Povo falam sobre crianças faveladas

Maré de Notícias #153 – outubro de 2023

Crias são aqueles que têm raízes profundas em um determinado lugar, que nasceram, cresceram e testemunharam as mudanças e evoluções desse ambiente ao longo do tempo. Ser cria envolve mais do que apenas habitar um espaço físico; também abrange um senso de pertencimento, identidade e familiaridade com a cultura, as pessoas e as tradições que constituem a comunidade.

As fotografias aqui expostas foram realizadas por fotógrafas e fotógrafos do Acervo Imagens do Povo e revelam as crianças como mestres da improvisação, transformando os objetos mais simples em brinquedos imaginativos. Nestes meses de celebração das crianças os fotógrafos convidam a contemplar não apenas as imagens, mas também as vivências dos crias e os territórios onde habitam cada um.

A exposição está aberta à visitação de segunda a sexta, de 10h às 18h na Galeria 535:
Rua Teixeira Ribeiro 535. As visitas mediadas acontecem às terças-feiras (10h e 11h) e
às sextas-feiras (14h e 15h) e podem ser marcadas de através do email: [email protected].

A arte de educar

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Em homenagem ao Dia dos Professor, três educadores mostram trabalhos que fazem diferença nas escolas da Maré

Adriana Pavlova e Hélio Euclides 

Maré de Notícias #153 – outubro de 2023

Nas 50 escolas públicas da Maré, há cerca de 1.100 educadores que trabalham duro para que diferentes gerações tenham garantido o direito à educação. Muitos deles são moradores ou ex-moradores, que reafirmam em sala de aula seu amor pela Maré. Em homenagem ao Dia do Mestre, o Maré de Notícias traz o perfil de três professores que fazem muita diferença nas nossas favelas.

Ser livre

Com seu sorriso largo e gingado de capoeirista, o professor Lucas Henrique Ferreira, de 29 anos, caminha pelos corredores da Escola Municipal Olimpíadas Rio 2016, no Campus Maré I, arrancando sorrisos e cumprimentos dos alunos e alunas que passam. E não é para menos: cria da Maré, ele engrossou o time de professores de educação física que desde 2021 traz para as aulas a pedagogia do corpo como agente de transformação.

“A escola me encanta, porque é um espaço de disputa de narrativas e desenvolvimento do potencial dos adolescentes. O corpo é objeto do meu trabalho, por isso uso a brincadeira para engajar os alunos e despertar interesse pelo conteúdo em si. A ideia é se conhecerem para terem a liberdade de ser quem quiserem ser”.

O currículo de educação física da escola conta hoje com amostras das culturas corporais africanas e indígenas, como capoeira, maculelê, jongo e a luta ritual dos jovens indígenas huka-huka.

Foto: Gabi Lino

Educação antirracista

Ele conta que o objetivo é oferecer ferramentas para a autonomia dos alunos, reafirmando a Maré como território de luta. Lucas diz ainda que a inspiração vem das brincadeiras de sua infância na Nova Holanda e dos ensinamentos da capoeira, praticada desde os 10 anos na Vila Olímpica da Maré. “A capoeira me moldou como homem negro e profissional da educação.” 

Da prática, Lucas chega à teoria, levando para as salas e quadras questões ligadas ao racismo, à intolerância religiosa e à decolonialidade, temas do seu mestrado em Educação na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ): educação antirracista na dimensão do corpo. 

Primeiro da família a se graduar, ele reconhece que sua trajetória está ligada ao encontro com mestres. Não à toa, nunca teve dúvida em se tornar professor e trabalhar na Maré. 

“A escola me formou e a capoeira me ensinou a fazer perguntas. Meus professores acreditaram em mim, me ajudaram a pensar grande”, diz ele, que foi aluno do CIEP Samora Machel, passou pelo pré-vestibular da Redes da Maré e se graduou na Escola de Educação Física da UFRJ.

Guardiã da magia

A escola na Baixa do Sapateiro tem apenas oito turmas, e tudo ali parece funcionar como se deve: a sala repleta de estantes de livros e cartazes com desenhos de crianças, na Escola Municipal IV Centenário, é um oásis dentro de outro oásis. 

É na sala de leitura com o nome da professora Verônica da Silva dos Santos que se abre um portal para a imaginação para quem a frequenta. Guardiã do espaço mágico de aprendizagem há 27 anos, a mestra que dá nome ao lugar parece saída de um conto de fadas: fala doce, gestos delicados e olhar apaixonado por seu ofício. 

Verônica é um patrimônio da escola, aonde chegou há 37 anos. Já se aposentou como professora, e pretende ficar mais um ano como bibliotecária, antes de se despedir de vez. 

Já perdeu as contas de quantos alunos foram incentivados por ela a descobrir novos mundos: “Espero que cada um viva um momento lúdico, que aqui eles desliguem o botãozinho da realidade, consigam entrar nos personagens ou descobrir a melodia da poesia.”

Verônica é considerada um patrimônio da Escola Municipal IV Centenário, onde trabalha há 37 anos. | Foto: Gabi Lino

Aldeias africanas

Além das rodas de leitura, a professora também lança mão das artes visuais e do teatro na rotina da biblioteca. Os cartazes produzidos em abundância fazem parte do piquenique que encerra cada bimestre, com encenação e declamação de trechos de livros. Este ano, os alunos já trabalharam poemas de Cecília Meireles e Contos africanos, de Rogério Andrade Barbosa.

“Gosto de evocar a figura do contador de histórias das aldeias africanas. Todo mundo se sentava em volta de uma fogueira para ouvir histórias. Peço para as crianças imaginarem o céu estrelado, a fogueira e aí começamos a ler”, conta.

Com 59 anos, Verônica nasceu na Maré; quando criança, viveu numa palafita com os pais nordestinos e dois irmãos. Apesar das dificuldades, a família sempre deu valorizou a educação dos filhos, apreço que Verônica transmite aos estudantes: “A educação modificou a minha vida. E é isso que sigo buscando com meus alunos.”

Mestre de gerações

Geraldo Martins, de 59 anos, é professor de português e literatura na Escola Estadual Professor João Borges de Moraes, na Nova Holanda. Nascido na Paraíba, em 1968 veio para o Rio. Seu primeiro endereço foi na favela Macedo Sobrinho; dois anos depois, sua família seria removida para a Nova Holanda. 

Ex-aluno da Escola Municipal Nova Holanda, em 1983, Geraldo passou a colaborar com o posto comunitário de saúde da região. A vocação para mestre surgiu no trabalho da associação de moradores (no período histórico da Chapa Rosa), participando da creche comunitária e da Cooperativa Mista dos Moradores da Nova Holanda. 

Martins também trabalhou como office boy na Rio Vivenda, construtora das casas da Vila dos Pinheiros e do Conjunto Pinheiros.

Prof. Geraldo Martins | Foto: Gabi Lino

Vocação 

“Sou técnico em contabilidade, mas depois de trabalhar com crianças vi que queria ser professor. Fiz um curso de complemento pedagógico e trabalhei na pré-escola e alfabetização por dez anos”, conta. 

Em 1995, concluiu a Faculdade de Letras. Em 2003, deixou de morar na Maré, mas em 2009 fez o concurso para professor estadual, assumindo a vaga cinco anos depois. 

“Primeiro fui lecionar em Saracuruna, mas em 2017 o diretor Marcelo Belford me chamou para a Maré. Sempre quis voltar para meu lugar de origem; me sinto satisfeito em contribuir com a Nova Holanda: é uma troca de conhecimento”, diz.

Para os alunos que pretendem seguir na profissão, ele deixa um recado: “O país não pensa na educação nem valoriza os professores através de melhores condições de trabalho e de salários, mas é muito interessante ser testemunha das mudanças do mundo que nos cerca.”

Geraldo diz que se emociona “ao lecionar para as crianças de uma família, crianças que foram meus alunos da creche que hoje são adultos, cujos filhos e sobrinhos estão na minha sala de aula. Essa é a nossa gratificação”.

Funk Esquenta: Dj Renan Valle lança álbum com faixas exclusivas

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DJ Renan toca nos bailes da Nova Holanda e Parque União, compõe e dá aulas sobre a história do funk

O Funk é o ritmo musical que agita a favela e vem ganhando espaço em nível internacional. Com a chegada do TikTok foram criados novos passos e formas de dançar. Mas nos bailes de favelas cariocas não é segredo: precisa ter um esquenta.

O esquenta é aquela sequência sagaz de músicas que preparam a galera para o agito do baile, um exemplo de funk aquecimento é o “Movimento da Sanfoninha” da cantora Anitta. E foi pensando nisso que o DJ Renan Valle, cria da Rubens Vaz, uma das favelas da Maré, lançou o “Aquecimento do Baile do Valle”, seu novo álbum, com 9 faixas de “funk esquenta”. A ideia é destacar este subgênero do funk que segundo o artista ficou “um pouco de lado”.

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“O álbum foi criado para a galera que faz seus passinhos e manda aquele gingado brabo, com a vinda dos APP’s vizinhos a galera do passinho foi muito prejudicada, então fiz este álbum para podermos voltar as nossas raízes fazendo com que seu corpo se liberte, dance do seu jeito” explica DJ Renan em uma publicação do Instagram.

Capa do álbum “Aquecimentos do Baile do Valle” Imagem: Divulgação

O músico conta que o aquecimento antecede as músicas curtidas pela galera nas redes sociais. E que volta a tocar próximo ao final do baile. Segundo Renan, a diferença esta na velocidade da batida. O funk aquecimento tem um ritmo mais agitado enquanto o “funk de tiktok” é mais devagar.

DJ Renan toca nos bailes da Nova Holanda e Parque União. Atualmente além de compositor das próprias músicas ele também produz e distribui nas plataformas e cuida de toda a parte administrativa do seu trabalho. Renan soma mais de 400 mil ouvintes mensais na Spotify, uma das principais plataformas de música. No Youtube tem mais de 10 mil inscritos e 130 mil visualizações mensais . Segundo ele, somando chega a aproximadamente 700 mil ouvintes por mês. Além da carreira musical Renan também dá aulas sobre a história do funk e suas variações.

Nova Holanda: a favela que nunca dorme

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Remoções e lutas por reconhecimento marcaram as seis décadas de vida da Nova Holanda

Maré de Notícias #152 – setembro de 2023

A favela da Nova Holanda nasceu em 1962, agregando moradores de vários lugares da cidade. Uma população diversificada que formou uma favela única, como uma colcha de retalhos. A população foi fundamentalmente formada por moradores removidos de outros territórios como as favelas Macedo Sobrinho, Praia do Pinto, Morro da Formiga, Morro do Querosene e Morro do Esqueleto. Os moradores sofriam com a perseguição à população mais pobre e com as políticas de erradicação de favelas levadas a cabo pela gestão do governador Carlos Lacerda (1960-1965), do então Estado da Guanabara.

A Nova Holanda foi concebida como um Centro de Habitação Provisória (CHP).  Era um local de triagem, construído dentro de um programa que visava muito mais retirar favelados de áreas nobres da cidade do que resolver o problema habitacional.

As unidades eram erguidas em madeira, segundo dois projetos: simples e em dois pavimentos (conhecidos como duplex), hoje chamada de Tijolinho. Os alojamentos deveriam ser temporários; no entanto, as casas transitórias de madeira acabaram por se tornar definitivas.

Madeira de obra

Arides Menezes, de 72 anos, é famoso na Nova Holanda graças à sua trajetória no futebol no Campo da Paty. Ele chegou à Maré em 1955: “A favela não foi criada de uma só vez. Antes de morar na Nova Holanda, meus pais eram do Parque Maré, que crescia com as madeiras que eram levadas da obra de construção do CHP.”

Segundo ele, “nesse período o número de palafitas aumentava. Esse crescimento só parou com a construção da Linha Vermelha, em função da ECO 92. Depois, foi criada uma equipe de apoio, que não permitia novas construções no local”.

Alguns moradores foram transferidos para a Cidade de Deus e Vila Kennedy, mas retornaram para a Nova Holanda, pois a favela tinha ônibus para todo lugar e ficava mais perto do trabalho. 

“A Nova Holanda é a Torre de Babel e, ao mesmo tempo, o começo de muitas comunidades. Quando a Vila do João nasceu, parte dos moradores das palafitas da Nova Holanda foi para lá. Depois, com a construção da Vila dos Pinheiros, o restante foi removido”, lembra Arides. 

Seu amigo Hélio Vieira, de 73 anos, chegou à Maré em 1953 e recorda com carinho do passado. “A Rua Teixeira Ribeiro era famosa, tinha poucos barracos, mas muito movimento por causa do comércio. Ela era a nossa Rua da Alfândega. Existiam muitos campos, como o do Ouro Negro e o do Oriente. O futebol mandava e a vida da criançada era a escola e o campo”, conta.

Associação de moradores

Em 1984, Arides trabalhou em uma quermesse e chamou a atenção de Eliana Sousa Silva, fundadora e hoje diretora da Redes da Maré, que o chamou para compor a Chapa Rosa para a eleição da associação de moradores. 

“Ela era conhecida como Eliana do Armarinho e venceu a eleição concorrida contra o Totonho, da Chapa Azul. Naquele tempo era mais difícil, não tínhamos salários e poucos moradores pagavam mensalidade. Um dos nossos avanços foi colocar nomes nas ruas, que antes tinham letra e número”, conta. 

Para Arides, “foi um mandado bom. Quando víamos os pontos críticos, ou nos mobilizávamos em mutirão para resolver o problema ou fazíamos ofícios ao poder público”.

A mobilização da associação conseguiu muitas vitórias e melhorias, como a construção de casas de alvenaria por meio de financiamento de material, a reforma de casas atingidas por incêndios e a canalização do valão que passava por onde hoje está a praça da Nova Holanda. 

No nosso próximo encontro descobriremos como nasceu a Praia de Ramos. Até lá!