Policiais não estavam usando câmeras corporais e não havia ambulância presente no local para atendimento em caso de feridos
Nas regiões da Nova Holanda, Parque União e Rubens Vaz o despertador do morador às 4h45 da manhã desta quinta-feira (21) foi o som de tiros, bombas e fogos. Era o começo da oitava operação policial do ano na Maré. Dos 31 dias letivos, os estudantes da Maré já perderam sete dias de aulas por causa das operações. Cerca de 200 atendimentos na clínica da família Jeremias Moraes da Silva foram suspensos e moradores saíram de casa no meio da tensão e do risco.
Desde as primeiras horas do dia circulam pelo bairro, policiais do Batalhão de Operações Policiais Especiais (BOPE), Choque (BPChq), do Batalhão de Ações com Cães (BAC), do Grupamento Aeromóvel (GAM) e do Núcleo de Apoio às Operações Especiais (NAOE). Segundo relatos dos moradores recebidos pela equipe de plantão do Maré de Direitos da Redes da Maré, os agentes não estavam usando câmeras corporais e não havia ambulância presente no local para atendimento em caso de feridos. Essas exigências estão presentes na ADPF das Favelas (ADPF 635), uma iniciativa popular, no judiciário, para enfrentar a violência policial no Rio de Janeiro.
Ao serem questionados sobre as exigências da ADPF, a Polícia Militar se limitou em dizer apenas que a operação segue em andamento no território.
Além do impacto na vida dos estudantes, a oitava operação atinge, mais uma vez, a vida dos moradores que precisam sair de casa para trabalhar, ir a uma consulta médica e para outros compromissos.
Até o fechamento desta matéria, a Polícia Militar confirmou que a operação segue em andamento.
O Maré de Notícias segue acompanhando e recebendo informações pelas redes sociais e WhatsApp (21) 97271-9410. O Ministério Público (MP) realiza um plantão especial para atender a população. O atendimento gratuito é feito no telefone (21) 2215-7003, que também é WhatsApp, ou no e-mail [email protected].
O combate à transfobia além das notas de desculpas
Por Gabriel Horsth*
No pulsar da diversidade no Brasil, onde celebramos a eleição histórica da primeira deputada federal trans eleita somente em 2023, somos confrontados com a persistência da transfobia em locais que deveriam ser espaços de convívio e inclusão social.
O episódio vivenciado pelo casal trans Kley Hudson (24) e Arthur Azevedo (23), moradores da Maré, que vou descrever ao longo deste texto, escancarou a crueldade da transfobia. “Eu, como uma pessoa trans que gosta muito de frequentar espaços gastronômicos, é muito triste para mim essa experiência ter sido uma das piores”, afirma Kley.
Outro recente episódio no Casarão do Firmino, conhecido espaço de samba na Lapa, destaca a urgência de abordar questões de gênero e proteção a todas as mulheres. Três mulheres, sendo duas trans, foram vítimas de tentativa de transfeminicídio* e agressão por 15 homens, incluindo seguranças do local. O primeiro episódio aconteceu na Maré, o segundo na Lapa, mas ambos se encontram na barbárie da transfobia.
Prato principal: intolerância!
A poucas semanas da conclusão da 14ª Parada LGBTQI+ da Maré, que encerrou suas festividades no Parque União, um incidente de discriminação ocorrido no restaurante popular traz à tona a urgência de uma formação contínua para os estabelecimentos comerciais locais. Kley, uma travesti, estava acompanhada de seu parceiro transmasculino* no restaurante quando, ao se dirigir ao banheiro, o atendente a informou que o banheiro feminino estava temporariamente indisponível, sugerindo que ela utilizasse o banheiro masculino. Sem hesitar, Kley seguiu a orientação.
Surpreendentemente, quando chegou a vez de Arthur, o garçom comunicou exatamente o oposto: o banheiro masculino estava interditado, indicando o uso do banheiro feminino. Diante dessa diferença, o casal prontamente questionou a inconsistência e buscou a gerência para registrar sua reclamação. A discussão foi registrada em vídeo pelo casal e compartilhada nas redes sociais, gerando indignação e debates sobre a importância da igualdade de tratamento. No ápice da discussão, o garçom proferiu ofensas ao casal, como narra com tristeza Kley: “Ele nos atacou com palavras de ódio, com gestos obscenos. E começou de fato a nos ofender, a nos envergonhar, a nos deslegitimar enquanto pessoas, enquanto gêneros. E isso nos causou vergonha e chateação”.
Neste cenário, a denúncia corajosa da vítima ecoou nas redes sociais, transcendendo a narrativa além da agressão, revelando a insuficiência das desculpas protocolares, o que destaca a urgência de uma reflexão mais profunda sobre questões de identidade de gênero, empreendedorismo e discriminação.
Nota de esclarecimento
O restaurante emitiu uma nota de esclarecimento em resposta ao incidente, levantando questões sobre a necessidade de uma revisão interna das práticas e protocolos para garantir um ambiente mais inclusivo e respeitoso, além de comunicar o afastamento de um dos funcionários envolvidos. Entretanto, Kley relata que, poucos dias após o incidente, visitou novamente o estabelecimento e testemunhou o mesmo funcionário desempenhando suas funções normalmente.
Este episódio destaca a importância de abordar questões de gênero de maneira sensível, respeitando a diversidade da clientela.
Denúncia online, silêncio offline
Em uma cidade dividida ao meio, testemunhamos inumeros epsisódios de discriminação em restaurantes, supermercados, shoppings e comércios de maneira geral. Na internet se exala uma sensação de indignação, mas no cotidiano a sensação é diluída com o famoso “isso não é da minha conta”.
Mas e você? Em uma situação como essa, agiria de que forma? Acha justa a posição tomada pelo estabelecimento? Infelizmente, muitas pessoas estão pagando um preço alto pelo acesso a informações distorcidas e falsas na internet. Confira a matériaBanheiros sem estigma sobre o uso por pessoas trans e fique por dentro do que diz a lei.
*Gabriel Horsth é jornalista e artista LGBTQIAPN+ do Complexo da Maré, colaborador do Maré de Notícias e integrante do Centro de Teatro do Oprimido
*Transmasculinos são pessoas designadas como mulher ao nascerem — que se identificam com o gênero masculino.
*Transfeminicídio se refere à violência específica contra pessoas transexuais, especialmente mulheres trans. Ele é usado para descrever os assassinatos de pessoas transgênero motivados pelo ódio, preconceito ou discriminação de gênero.
Evento realizado pelo Grupo Conexão G recebe a deputada estadual Renata Souza, a vereadora Benny Briolly e outras autoridades políticas no Centro de Artes da Maré
O Seminário Nacional da Escola de Formação Crítica Majorie Marchi começa hoje (19), no Centro de Artes da Maré, a partir das 16h30. O evento conta com duas mesas que pensam novos caminhos para o futuro e o fortalecimento de alianças.
A iniciativa é fruto de parcerias do Conexão G, uma organização com objetivo de minimizar preconceitos vividos pelas pessoas LGBTQIA+ nas favelas, e o resultado é a formação de 60 mulheres trans e travestis oriundas de favelas do Rio de Janeiro, São Paulo, Salvador e Recife. Além das mesas de conversa, também terão apresentações artísticas com a Drag Desiree e a performance teatral “Em Nome de Deise”.
“É uma ocasião para celebrar e reconhecer os frutos de nossa luta diária, fortalecendo-nos para os desafios futuros.”
afirma a organização
Entre as presenças confirmadas estão a deputada estadual mareense Renata Souza (PSOL), a vereadora Benny Briolly (PSOL) e o superintendente do programa Rio Sem LGBTfobia, Ernani Alexandre. O evento também terá microfone aberto para participação das pessoas presentes participarem do debate.
Para participar do seminário é necessário se inscrever. O Centro de Artes da Maré fica localizado na Rua Bittencourt Sampaio, nº 181.
Majorie Marchi, que nomeia a escola de formação crítica, foi uma travesti negra ativista, e uma das primeiras lideranças do movimento LGBTQIA+ do Rio de Janeiro.
Ação da Light interrompe fornecimento de energia até 12h
A Light realiza, nesta terça-feira (19), serviços de manutenção na rede elétrica da comunidade Nova Holanda. Em consequência, o fornecimento da rede elétrica ficará interrompido de 9h às 12h em algumas ruas da comunidade. Segundo informações da Associação de Moradores da Nova Holanda, são elas:
Com mais de 40 milhões de streams em ‘Sarra nos Menor’, DJ Renan Valle conquista prêmio
Por Affonso Dalua
O funk carioca, com suas batidas envolventes e letras que retratam a realidade das favelas, é muito mais do que apenas um gênero musical. Para os mareenses, o funk representa uma cultura vibrante de festa, resistência e uma fonte de renda para muitos moradores que trabalham. Recentemente, DJ Renan Valle, morador da favela Nova Holanda, uma das 16 favelas da Maré, conquistou o disco de platina com a música “Sarra nos Menor”, mostrando que os artistas favelados são potência e podem competir no mercado musical.
A trajetória do DJ Renan Valle no funk começou aos 13 anos, produzindo músicas que logo explodiram nas favelas. Hoje, aos 29 anos, ele acumula mais de 16 hits ao redor do mundo e alcançou a marca de 100 milhões de streams em sua carreira. Renan Valle é um exemplo de como o funk pode proporcionar oportunidades de sucesso mesmo em meio a falta de investimentos públicos na cultura nos territórios de favelas e periferias.
Apesar do sucesso, Renan conta que nem sempre viu seu talento como meio de trabalho “Bom, eu nunca pensei que isso ia dar certo, sabe? Eu comecei me divertindo porque pra mim era uma brincadeira. E por ser uma brincadeira, que eu achava que era produzir, fazer música, funk, que eu sentia a batida, né? Eu me divertia, eu fazia música pra mim e eu me imaginava no baile, mano. Sabe?”, relembra.
Para Renan Valle, o funk é essencial para as favelas, pois além de ser uma forma de entretenimento e distração para os moradores, também representa uma oportunidade de empreendedorismo “O funk é importante para o comércio, quando tem seus bailes, salões de beleza, lanchonetes e restaurantes ficam lotados”, afirma o DJ.
A conquista do disco de platina por DJ Renan Valle é mais do que um marco pessoal, é um símbolo de resistência e luta contra a marginalização do funk. Renan acredita que é importante que artistas das favelas alcancem espaços e reconhecimento, como o disco de platina, para mostrar que são capazes de competir no mercado e que suas vozes merecem ser ouvidas e valorizadas.
Por isso, o DJ afirma que entre seus projetos futuros está a de passar o conhecimento que adquiriu para outros artistas independente de favela como MCs, DJs e produtores musicais do funk “Quero ensinar para eles sobre direitos autorais, dar uma aula também sobre história da periferia, de construção, de como tudo aconteceu, e de referências negras, né? Porque tudo isso foi tirado da gente. E como é que alguns jovens da favela vai querer ser um escritor? Se os escritores e referências foram apagadas e embranquecidas? Então, eu tô querendo resgatar isso, esse é o meu projeto.”
A trajetória do DJ até o disco de platina é inspiração para os jovens das favelas, ao mostrar que é possível alcançar sucesso e a realização pessoal através da música. O funk, além de ser um ritmo contagiante, é também uma ferramenta de incidência política, empoderamento e transformação social, lutando contra a criminalização e os estereótipos que ainda cercam esse movimento cultural tão importante para as favelas do Rio de Janeiro.
Como faz para ganhar o Disco de Platina?
Os artistas recebem discos de ouro, platina e diamante com base no desempenho das suas músicas ou álbuns. Isso quer dizer que é necessário ter uma boa aceitação do público para que o artista conquiste a premiação.
Diferente das premiações musicais, onde um grupo de críticos especializados determina os vencedores, nos casos dos discos de ouro, platina e diamante o reconhecimento está diretamente ligado ao público em geral. Para cada categoria de disco é necessário atingir um número mínimo que confirme o sucesso alcançado.
Para receber disco de platina, o artista precisa alcançar, no mínimo, 40 milhões de streams* — 20 milhões a mais do que o de ouro —. Feito esse, conquistado por DJ Renan Valle. São contabilizados os números das plataformas de áudio, como Spotify, Deezer e Apple Music, por exemplo, assim como as visualizações em vídeo, como o YouTube.
*Neste contexto, significa o número de vezes que a música foi reproduzida.
Desde o início de 2024, já foram registrados mais de 500 mil casos prováveis de dengue no Brasil, de acordo com o painel de monitoramento de arboviroses do Ministério da Saúde. A cidade do Rio de Janeiro, por sua vez, soma mais de 23 mil casos da doença, segundo dados do Observatório Epidemiológico da Cidade do Rio de Janeiro (EpiRio). O total de casos computados entre janeiro e fevereiro de 2024 já ultrapassou o registrado em todo o ano de 2023. O conjunto de favelas da Maré já registrava, até meados de fevereiro, 178 casos.
Um deles foi André Luiz dos Santos, de 53 anos. O morador relata que diante dos sintomas, resolveu procurar a Clínica da Família e já suspeitava que fosse a doença. “Tive febre, dor no corpo, diarreia, cansaço e muita dor de cabeça. Ainda tô sentindo os sintomas e essa semana estou sentindo muita dor no lado direito do abdômen”, conta. André Luiz é motorista autônomo e diz que a doença mexeu com a sua rotina: “Impactou muito meu trabalho e acho que pode ter afetado outra área do corpo, como o meu fígado”.
Nova aliada
Diante deste cenário preocupante, a boa notícia é que, agora, temos uma aliada importante: a vacina contra a dengue. Ela se junta aos mais de 30 imunizantes oferecidos de forma gratuita pelo Programa Nacional de Imunizações (PNI) no Sistema Único de Saúde (SUS).
A vacina da dengue, conhecida como Qdenga, será aplicada primeiro nas crianças de 10 a 11 anos, avançando a faixa etária progressivamente (por enquanto, até 14 anos), assim que novos lotes forem entregues pelo laboratório fabricante.
Nem sempre é fácil lembrar de manter a caderneta de vacina em dia. Mas agora é possível acompanhar e manter as doses atualizadas através do calendário digital de vacinação, onde qualquer pessoa pode checar e pesquisar todas as doses atualmente disponíveis no PNI. A plataforma digital ainda oferece informações sobre doenças que podem ser prevenidas, público-alvo, faixa etária e, dentro de cada público, os imunizantes recomendados. A iniciativa é do Movimento Nacional pela Vacinação, lançado em fevereiro de 2023 pelo Governo Federal, a fim de retomar as altas coberturas vacinais no país.
Outra novidade é a vacina contra Covid-19 que, em 2024, também passa a fazer parte do calendário anual de vacinação para grupos prioritários (crianças de 6 meses a menores de 5 anos, idosos, imunocomprometidos, gestantes e puérperas, bem como demais pessoas em maior risco de desenvolver formas graves da doença).
José Fernando Verani é pesquisador do departamento de Epidemiologia da Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP-Fiocruz). Ele explica que não existe nenhuma outra intervenção que tenha um impacto tão grande na saúde pública quanto à vacinação.
“Hoje nós temos recursos, que são as vacinas, aprovadas e já disponíveis no SUS para combater uma série de infecções, principalmente virais e bacterianas, e até mesmo em algumas doenças crônicas. A vacina contra o HPV, por exemplo, teve um impacto tremendo sobre a ocorrência e a prevalência de câncer de colo de útero”, destaca.
Caderneta em dia
Desde 2016, os índices de cobertura vacinais no Brasil enfrentam queda. Porém, em 2023, o governo conseguiu reverter a tendencia e oito imunizantes do calendário infantil registraram alta.
Para o pesquisador da ENSP-Fiocruz, é necessária atenção especial às vacinas contra poliomielite e contra o sarampo em todo o Brasil. Segundo ele, é importante manter altas coberturas vacinais, ou seja, vacinar 95% ou mais do público-alvo para evitar que esses vírus voltem a circular no país.
Vale lembrar que, no caso da poliomielite, a vacina VIP, que é injetável, deve ser administrada aos dois, quatro e seis meses de idade. E a VOPb, que é um reforço via oral, aos 15 meses e aos quatro anos. Com relação ao sarampo, a proteção vem a partir da vacina tríplice viral, que também protege contra caxumba e rubéola, e da tetra viral, que protege contra essas três doenças e mais a varicela (catapora).
A tríplice viral está disponível para pessoas de 12 meses a 59 anos de idade, sendo recomendadas duas doses até 29 anos e uma dose de 30 a 50 anos, em pessoas não vacinadas. Quanto à tetra viral, a recomendação é uma dose aos 15 meses de idade em crianças que receberam a primeira dose da tríplice viral.
Alerta para adultos
José Fernando ressalta que: “é importante mantermos as cadernetas de vacinação em dia das crianças, mas não só delas. Hoje, o Programa Nacional de Imunizações (PNI) tem como clientela crianças, mas também adolescentes, adultos e idosos. Temos praticamente a população inteira, em termos de grupos de idade, como alvo do PNI”.
Segundo dados do EpiRio, foram aplicadas quase 7 milhões de vacinas em crianças no município do Rio, em 2023. No entanto, a cidade só atingiu a meta de cobertura vacinal em menores de dois anos com a vacina BCG (que protege contra formas graves da tuberculose). Todos os outros imunizantes ficaram abaixo dos índices considerados ideais.
O cenário, entretanto, foi diferente na Área de Planejamento 3.1, na qual a Maré está inserida. Por aqui, o número de crianças menores de dois anos vacinadas superou a meta para as vacinas BCG, Rotavírus, pentavalente (que protege contra difteria, tétano, coqueluche, hepatite B e meningite por Haemophilus influenzae tipo B – Hib) e poliomielite.
Além disso, os índices de cobertura vacinal ficaram acima de 90% e próximos do ideal (95%) para as vacinas contra hepatite A, meningocócica C e pneumocócica 10. Já as vacinas da febre amarela e da tríplice viral (2ª dose) foram as que ficaram mais distantes da meta em 2023 na Área de Planejamento 3.1, com taxas de vacinação de 68,10% e 75,8%, respectivamente.
A situação ainda é desafiadora para outros grupos etários, além das crianças. Em 2023, a campanha de vacinação contra a gripe no município do Rio de Janeiro, por exemplo, só vacinou 53% dos idosos, bem longe da meta de 90%. E, na região da Maré e adjacências, os índices também ficaram aquém do desejado, com apenas 60% dos idosos vacinados.
Para acessar o Calendário Digital de Vacinaçao acesse www.gov.br/saude ou o QRcode abaixo: