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Agosto Lilás: mês de conscientização das violências contra as mulheres

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O Agosto Lilás é uma campanha educativa de combate ao feminicídio e outras violências que refletem na desigualdade de gênero

O Agosto Lilás é uma campanha nacional de conscientização pelo fim da violência contra as mulheres. A ação celebra os 17 anos da Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006). Durante o mês, ações de mobilização e educativas refletem sobre a temática. 

Este ano, de acordo com os dados do Instituto de Segurança Pública houve 147 tentativas de feminicídio no Rio de Janeiro e 52 assassinatos motivados pela “condição do sexo feminino”, os chamados feminicídios. Mas esta não é a única violência sofrida pelas mulheres, atitudes violentas acontecem diariamente sem deixar marcas visíveis e são cometidas principalmente nos lares das vítimas. 

Tipos de violência contra a mulher

De acordo com a quarta edição da pesquisa “Visível e Invisível” do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, mais de 18 milhões de mulheres sofreram alguma forma de violência em 2022. Em comparação com as pesquisas anteriores, todas as formas de violência contra a mulher apresentaram crescimento acentuado. A pesquisa ouviu 2017 pessoas, entre homens e mulheres, em 126 municípios brasileiros, no período de 9 a 13 de janeiro de 2023. A mostra ainda revela que 53,8% das mulheres entrevistadas sofreram alguma agressão por parte de ex-companheiros e consideram que o lugar menos seguro é a própria casa.

Há diversos tipos de violência contra as mulheres, desde a discriminação, agressão ou repressão baseada no gênero até danos físicos, emocionais, sexuais, morais e econômicos. A violência de gênero, doméstica e familiar acontece em formas de abuso físico, sexual, psicológico, moral e patrimonial. Além de controle das ações e decisões através de intimidação, humilhação e ameaças. Podendo ir além, como forçar relações sexuais com manipulação, chantagem ou ameaças, anulando a vontade da vítima.

Legítima Defesa da Honra

Em alguns casos de feminicídio o assassino foi inocentado pelo uso da tese de “legítima defesa da honra”, entretanto o Superior Tribunal Federal (STF) decidiu recentemente que este argumento não pode ser usado em nenhum momento do julgamento, por ser contrário aos princípios da dignidade humana de proteção à vida e igualdade de gênero. Esse termo não existe na legislação apesar de ter sido usado em inúmeros julgamentos, como em 1976 no caso da Ângela Diniz, socialite morta pelo companheiro Doca Street.

A advogada Marcela Cardoso, conta que antigamente este argumento era aceito por refletir a estrutura machista da sociedade em que as mulheres eram tratadas como objetos. “A mulher deveria responder a um papel de gênero, em que ela fosse submissa, do lar e que atendesse aos desejos sexuais de seu marido”.

Cardoso explica também, que antes da inconstitucionalidade da legitima defesa da honra, a tese já havia sido contrariada em outros julgamentos, gerando jurisprudência. Segundo a advogada, esta decisão serve como fator educador para a sociedade. “No sentido de mostrar que é inaceitável, antijurídico e antidemocrático se retirar a vida de alguém por conta de ciúmes, posse e contrariedades.” afirma.

Proteção das vítimas

É importante destacar que a proteção às vítimas e lutar contra a violência deve ir além do Agosto Lilás. Para denunciar casos de violência contra a mulher ligue 180, o número funciona 24 horas por dia e atende tanto as vítimas quanto as testemunhas.

A Casa das Mulheres da Maré, também realiza um trabalho de acolhimento e acompanhamento. Nos casos de violência contra a mulher a casa promove acesso a atendimento psicológico e jurídico com apoio do Maré de Direitos. As ações são frutos do trabalho da Redes da Maré.

A Defensoria Pública tem um núcleo de atendimento voltado para a defesa das mulheres o NUDEM – Núcleo Especial de Defesa dos Direitos da Mulher.  O núcleo pode ser acessado pelo e-mail [email protected], ou pelo telefone (21) 25268700. O atendimento presencial é realizado no Endereço Avenida Marechal Câmara, 271, Andar:7º andar, Castelo, Rio de Janeiro.

Dia Nacional do Orgulho Lésbico: Coletiva ‘Resistência Lésbica’ acolhe mulheres na Maré

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Coletiva mareense, tem motivos de orgulho mas ainda muita luta pela frente

Reportagem em parceria com o jornal Voz das Comunidades

O dia 19 de agosto é o Dia Nacional do Orgulho Lésbico. A data é uma celebração pela vida, história e pelos direitos de mulheres lésbicas. Este dia marca o “pequeno Stonewall brasileiro”, uma alusão ao evento que deu inicio as manifestações do orgulho nos Estados Unidos na porta do bar Stonewall inn, em Nova York. Aqui no Brasil, o movimento se manifestou na tomada do Ferro’s Bar na noite de 19 de agosto de 1983 pelo Grupo Ação Lésbica- Feminista (GALF). Elas agiram contra o machismo e opressão sofrida pelas mulheres que frequentavam o estabelecimento. Porém, ela não é a única no Rio de Janeiro que celebra o amor entre mulheres.

Embora lésbicas estejam representadas no início da sigla LGBTQIAPN+, não são as primeiras nas conquistas de oportunidades e visibilidade. Essas são questões levantadas pela Resistência Lésbica, uma organização que atua há cinco anos com acolhimento e apoio para lésbicas e bissexuais. A Casa Resistências, criada há um pouco mais de um ano, é a primeira casa de acolhimento para este público dentro de uma favela. Ela está localizada na Vila do Pinheiro, no Conjunto de Favelas da Maré.

Camilla Fellipe, de 26 anos, uma das lideranças da Resistência Lésbica, considera que o dia 29 de agosto que é o da Visibilidade Lésbica é importante para as mulheres lésbicas por ser um marco da reunião do Seminário Nacional de Lésbicas, que aconteceu aqui no Rio de Janeiro em 1996. No seminário, mulheres debateram sobre as violações dos direitos por causa da sua orientação sexual.

‘Nós por nós

Camila conta que mesmo tendo motivos para comemorar no dia do orgulho lésbico, ainda continuam tendo que ser resistentes para se manter, principalmente dentro da favela. “Primeiro por ser mulher, além de ser lésbica. A favela ainda é muito machista apesar das casas serem chefiadas por mulheres”, detalha. “Nossa luta é o ano inteiro. Passamos por muita invisibilidade. É tudo nós por nós”, completa Camila. Dayana Gusmão, 38 anos, coordenadora da organização, afirma que as lutas das lésbicas do asfalto e da favela são diferentes. “Lésbicas de favela estão lutando para ter um teto”.

Dayana conta que ser forte para poder ser ouvida é cansativo. “Quanto tempo mais vamos ter que falar o óbvio? Entrar em embates é cansativo e sempre que uma mulher negra se manifesta ela é chamada de raivosa” afirma.

Dayana Gusmão (esq.), Camila Felippe e Paloma Marins (Foto: Affonso Dalua )

Modo sementes

Dayana reflete que tem motivos de comemorar. “A gente se organiza em modo de sementes, vamos plantando em cada lugar e nascendo os frutos”. Segundo ela, nos últimos quatro anos “muita sapatão acordou”.

Tanto para Camila, quanto para Paloma Marins, 38 anos, coordenadora de empregabilidade da instituição, Dayana é uma referência na luta pelos direitos das lésbicas de favela. Elas contam que é difícil ter referências porque não se fala muito do amor entre mulheres. Além disso, muitas, principalmente as mais velhas, têm medo de sofrer a lesbofobia, ou seja, o preconceito por serem lésbicas.

Dayana cita algumas referências como Dona Orosina, uma antiga moradora, liderança da favela. Mulher negra, rezadeira, Orosina, que morou no morro do Timbau, denunciou os abusos dos militares do Exército Brasileiro para o Presidente Getúlio Vargas. E Marielle Franco, figura política, ativista e vereadora carioca, cria da Maré.

A Coletiva

Resistência Lésbica existe há 5 anos e segue acolhendo mulheres lésbicas e bissexuais com apoio emocional, psicológico e jurídico. Além do atendimento, as mulheres podem utilizar a Casa Resistência como lar temporário. No espaço, muitas mulheres encontram o apoio que não tem em suas famílias.

Cerca de 38 mulheres passaram pela Casa Resistencia, espaço da coletiva. (Foto: Affonso Dalua)

Dayana afirma que elas são “mortas em vida” quando são abandonadas pelos parentes que não procuram mais saber das filhas. Paloma, a coordenadora de empregabilidade, lamenta que as mulheres não encontrem oportunidades de emprego, pelo fato de muitas meninas que chegam à casa, não possuem o Ensino Médio completo.

Para ajudar a semear, promovendo cidadania e direitos humanos, a Casa Resistência está fazendo uma vaquinha para arrecadar o valor necessário para a compra do espaço. Elas já têm R$ 40 mil, mas falta a outra metade, para chegar aos R$ 80 mil. A ideia é ter a sede para poder fazer reformas e deixar cada vez mais acolhedor o espaço para a população lésbica, bissexual, travesti e transexual (LBT).

A fotografia popular na construção de novas narrativas sobre as favelas e periferias

Em um mundo onde as imagens têm o poder de moldar percepções e histórias, a fotografia popular desafia estereótipos

Por Affonso Dalua

Foto: Arthur Vianna

À medida que celebramos o Dia Mundial da Fotografia em 19 de agosto, é importante reconhecer como essas imagens estão moldando uma nova narrativa para as favelas e periferias brasileiras. Um movimento fotográfico vem ganhando força nas favelas e periferias, desafiando as narrativas tradicionais e permitindo que os moradores desses territórios construam suas próprias narrativas imagéticas. O Imagens do Povo, projeto do Observatório de Favelas, tem se tornado uma plataforma essencial para a produção e preservação de imagens que refletem a vida, a cultura e os desafios desses territórios do Rio de Janeiro.

Ao investigar essas narrativas, conversamos com Ratão Diniz e Francisco Valdean fotógrafos importantes no cenário da fotografia popular. Valdean é idealizador do Museu MIIM (Museu de Itinerante de Imagens da Maré).

Foto: Douglas Lopes

Reconstruindo narrativas

Valdean, um dos primeiros alunos da Escola de Fotografia Popular (Turma de 2004), compartilhou suas reflexões sobre o impacto do Imagens do Povo na produção de novas narrativas imagéticas: “O projeto Imagens do Povo é fundamental e muito necessário na produção de novas narrativas sobre as favelas. Ele materializou um modo de imagens que os movimentos sociais das favelas reivindicavam desde os anos 80, quando não se reconheciam as imagens que se produziam sobre as favelas.” Valdean destacou como o projeto ajudou a visibilizar a voz dos próprios moradores, rompendo com o olhar de fotógrafos de fora das favelas e periferias.

Novas formas de expressão visual

“Essas novas formas, como as pipas do Arthur Vianna, as bandeiras do Affonso Dalua e o Museu MIIM, se encaixam perfeitamente na arte contemporânea e oferecem abordagens frescas e relevantes para exibir e falar sobre as imagens da Maré. Então eu acho que é por aí”, ressaltou Valdean. Arthur Vianna, conhecido por suas criações visuais em pipas, expandiu o horizonte das formas de expressão visual nas favelas. Suas pipas, elevadas nos céus da Maré, são verdadeiras instalações imagéticas, compartilhando histórias e experiências de maneira inovadora. 

Mulheres faveladas na fotografia

A voz feminina também encontra seu espaço nesse movimento. Kamila Camillo, uma jovem talentosa, emergiu como uma força influente, capturando a essência das mulheres faveladas em suas fotos, já ganhou diversos prêmios e moções do estado do Rio de Janeiro. Ela exemplifica a crescente produção de dentro para fora da favela, como defendido por Valdean em seu livro sobre essa temática.

Kamila Camillo assim como outras fotógrafas faveladas e periféricas, vem construindo caminhos para uma narrativa feminina que rompe as barreiras do machismo e da misoginia que estão encruadas na estrutura da nossa sociedade. 

Preservação da Memória

Ratão Diniz, fotógrafo que testemunhou a evolução da fotografia nas favelas, enfatizou o papel do Imagens do Povo na preservação da memória: “O Imagens do Povo, além de um espaço de formação, é um lugar também de acervo, de preservação dessas memórias, do que a gente tem produzido.” Ratão destacou como a fotografia tem sido uma ferramenta para preservar a história dos territórios, especialmente quando se trata de eventos como “A Noite das Estrelas”, onde as imagens desempenharam um papel crucial em documentar a memória coletiva.

Encontros e Trocas

Além de ser um espaço de formação, o Imagens do Povo se destaca como um local de encontro e troca de ideias entre os fotógrafos e moradores das favelas e periferias do Rio de Janeiro. Ratão observou que esse espaço comum é essencial para fortalecer o movimento fotográfico nas favelas e garantir que as histórias sejam compartilhadas e preservadas de maneira colaborativa. Hoje além do Imagens do Povo há outros espaços de formação fotográfica na Maré, como a escola Transformando Olhares da Maré do Instituto Vida Real, e também o Laboratório de Imagem e Narrativa do Maré de Notícias. 

Em um mundo onde as imagens têm o poder de moldar percepções e histórias, a fotografia popular desafia estereótipos, rompe barreiras e capacita os próprios favelados a contar suas próprias histórias.

Negação do direito à cidadania: impacto da falta de saúde no Cárcere

Egressos não têm garantido seu direito a atendimento médico dentro do sistema prisional

Por Samara Oliveira e Teresa Santos

“Não tratam a gente como ser humano e sim como objeto que pode ser descartado”. Esta fala é de Marco Antônio, 56 anos, morador da Pavuna, na Zona Norte. Marco Antônio é artista plástico e colaborador do Instituto Social Encontro Das Artes. O grupo tem sede na Nova Holanda e foi fundado por Odir dos Santos.

Marco esteve privado de liberdade por 26 anos e conta que foi dentro do sistema prisional que perdeu a visão do olho esquerdo. Até ter a vista totalmente comprometida, ele sofreu por anos com fortes dores na cabeça, ardência nos olhos, alta sensibilidade à luz do sol e chegou a perder as forças para se alimentar. Segundo ele, a situação poderia não ter chegado ao extremo, se tivesse acesso à cidadania com um atendimento digno de saúde. 

“Os companheiros de cela é que colocavam a comida na minha boca porque eu não conseguia. Eu sentia dor 24h por dia”, relembra. 

Durante esse tempo, a situação ficou ainda mais grave quando a ferida no olho esquerdo se tornou uma laceração aberta exposta e ainda assim, o máximo que Marco conseguiu como atendimento foi tomar quatro injeções em uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA). O paliativo servia apenas para a dor, mas neste tempo não houve nenhum diagnóstico ou acompanhamento.

Marco narra que o problema no olho começou ainda em 2008; apesar de nunca ter recebido um diagnóstico, acredita que foi uma infecção contraída dentro dos presídios por onde passou. “Eles jogavam os doentes todos em uma cela que mais parecia uma catacumba. Uns gemiam de dor, outros vomitavam, ficávamos todos juntos e espremidos.”

Cenário alarmante

A pneumologista Alexandra Sánchez é pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP) da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e coordenadora de estudos sobre saúde nas prisões — lugar onde as doenças infecciosas são um grave problema. “Sabemos que a chance de uma pessoa presa morrer por uma doença infecciosa é cerca de três vezes maior do que a de uma pessoa em liberdade, da mesma faixa etária”, diz ela.   

Em se tratando de tuberculose, as chances de se morrer dentro de um presídio sobem 11 vezes, em comparação com quem está fora dele. A doença é a principal causa de morte no sistema penitenciário, segundo dados de 2021 do Grupo de Pesquisa em Saúde Prisional (GPESP), da ENSP/Fiocruz/CNPq, coordenado por Alexandra. De acordo com a especialista, análises de 2022 do GPESP mostraram que 20% dos casos de tuberculose registrados no município do Rio de Janeiro são oriundos das prisões. 

“A tuberculose é 65 vezes mais frequente dentro do sistema penitenciário do Rio de Janeiro do que em todo o estado, e dez vezes mais frequente nas prisões do que nos territórios com maiores taxas de contaminação, como a favela da Rocinha e o Complexo do Alemão”, ressalta a pesquisadora.

Coceira que mata

Cabe lembrar que a tuberculose também é um problema na Maré. Dos 9.476 casos registrados em 2022 no município, 214 ocorreram nos territórios, segundo o Observatório Epidemiológico da Cidade do Rio de Janeiro (EpiRio).

Sendo do tipo respiratória (como a tuberculose) ou de pele (como a sarna e o impetigo, consideradas comuns), qualquer infecção não tratada adequadamente pode evoluir para a septicemia, a forma grave da doença que se espalha por todo o corpo e que pode causar queda drástica da pressão arterial e falência dos órgãos. 

Na lista de doenças com maior letalidade no sistema prisional estão ainda a diabetes, a aids e a covid-19 — esta última foi responsável por 20% das mortes nos presídios em 2020 e 2021.

O ambiente superlotado, confinado, sem ventilação e iluminação adequadas, o convívio forçado com pessoas doentes, o pouco acesso à água, a falta de produtos de higiene e de locais apropriados para lavagem e secagem de roupas são partes de um cenário alarmante. Ainda segundo a médica e pesquisadora da Fiocruz, outro ponto é a falta de ações de prevenção e informação em saúde para os presos.

Livre, mas doente

Se dentro do sistema prisional lhes é negado o acesso à saúde, a situação não muda para aqueles que são libertados. Segundo o Grupo de Pesquisa em Saúde Prisional, eles se tornam vulneráveis socialmente, convivendo com o preconceito inclusive por parte de alguns profissionais de saúde.  

O grupo da Fiocruz relata que há também alguns egressos que saem do sistema sem documentos como RG e CPF, e muitos não conseguem endereço fixo — o que lhes daria o comprovante de residência. Tudo isso se torna uma barreira para conseguir atendimento médico nas unidades de atenção básica de saúde. 

O medo do preconceito está sempre presente, o que faz com que o egresso demore a procurar ajuda médica. “Muitas vezes a pessoa não diz ou demonstra que está doente para a família ou a comunidade. Seria preferível que ela fosse atendida por um médico longe do lugar onde mora, o que frequentemente não é possível”, diz Alexandra.

A questão financeira também pode influenciar no atendimento. No caso de Marco Antônio, ele procurou a clínica da família do seu território e recebeu da médica um encaminhamento para um neurologista. Aguardou semanas na fila do Sistema de Regulação (SISREG) e, quando finalmente foi chamado para a consulta, não tinha o dinheiro para ir até o hospital. Isso fez com que ele tivesse que repetir todo o procedimento, voltando para a fila do SISREG.

Direito, não privilégio

Uma pessoa privada de liberdade continua sendo um cidadão brasileiro. Segundo o artigo n° 196 da Constituição Federal, “a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”. 

Já a Lei de Execução Penal nº 7210/1984 diz, em seu artigo n° 14, que “a assistência à saúde do preso e do internado de caráter preventivo e curativo compreenderá atendimento  médico, farmacêutico e odontológico”.

Segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) o Brasil é o país da América Latina com maior população carcerária e o terceiro do mundo, atrás apenas dos EUA e da China. Em 2022, o número de presos chegou a 909.061, que ficam sob a tutela do Estado. É dele, portanto, a responsabilidade de garantir o acesso à saúde a todos os privados de liberdade (inclusive os menores de 18 anos). 

Para Alexandra, é inaceitável que as pessoas continuem morrendo por doenças que são tratáveis. Segundo ela, alguns passos importantes estão sendo dados para melhorar o cenário no estado. Desde o segundo semestre de 2022, as equipes municipais de saúde já estão atuando dentro das prisões do Rio de Janeiro, embora com restrições. 

A medida já era prevista pela Política Nacional de Atenção Integral à Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade no Sistema Prisional (PNAISP), publicada em 2014, porém só passou a ser posta em prática no estado do Rio no ano passado.

Lei de Execução Penal garante atendimento médico, farmacêutico e odontológico ao preso – Foto: Gabi Lino

Você conhece a identidade cultural da Maré?

Pesquisa da UFRJ ajuda a valorizar a música brasileira e a identidade mareense.

O projeto Musicultura, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, valoriza o potencial da música brasileira por meio de uma pesquisa colaborativa com o conjunto de favelas da Maré. O grupo já foi composto por cerca de 100 estudantes e voluntários que moram ou moravam na Maré, além da equipe do Laboratório de Etnomusicologia, liderada pelo professor Samuel Araújo e formada por alunos de graduação e pós-graduação da Escola de Música da UFRJ.

Musica é cultura

Por aproximadamente duas décadas, o grupo Musicultura demonstrou ser mais do que apenas um projeto. Ele evoluiu para um programa contínuo de pesquisas sobre a realidade social e musical da Maré. Mais de 15 artigos já foram premiados e vários são reconhecidos internacionalmente. A iniciativa nasceu no laboratório de Etnomusicologia da UFRJ e teve início em 2002, com o nome Samba e Coexistência. 

“Questões como violência, restrições ao ir e vir no espaço da Maré, ligadas à educação, à pouca presença do Estado em regiões de favela, a questão da favelização e como é que essas questões eram atravessadas pela música”.

Samuel Araújo, coordenador do projeto e professor da Escola de Música (EM) da UFRJ.

O objetivo era selecionar uma área da cidade com atividades dedicadas ao samba e uma escola de samba menos conhecida pelo público. Ao longo do tempo, o projeto expandiu-se para se tornar um estudo abrangente sobre a música e cultura brasileiras, destacando a diversidade musical presente na Maré.

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A Maré como campo de pesquisa

O “Musicultura” alcançou resultados significativos em sua pesquisa sobre música e a região da Maré. Uma das descobertas foi a memória do samba na Maré, que rompeu estereótipos associados às favelas e levou à criação do bloco de carnaval “Se benze que dá”. As letras das músicas abordam o direito de ir e vir dos moradores.

A Maré foi escolhida pela rica diversidade cultural, histórica e social. Segundo o coordenador do projeto e professor da Escola de Música (EM) da UFRJ, Samuel Araújo, “a escolha da Maré como área de pesquisa decorre da abundância musical e cultural presente ali, além da relevância como espaço de resistência e manifestação cultural do povo brasileiro”.

Mariluci Nascimento, que cresceu na Maré e tem ascendência nordestina, é uma das pesquisadoras do projeto no estilo forró. “A pesquisa também explorou o mercado do forró e a importância da Maré na cena desse gênero musical no Rio de Janeiro. Estudar sobre a minha origem teve um impacto pessoal relevante.”

História e Memória

Ao longo do tempo, o Musicultura desenvolveu uma dinâmica de trabalho autônoma, tanto em relação aos temas e discussões quanto à organização das tarefas do grupo. Embora a equipe da UFRJ ainda coordenasse o projeto e compartilhasse propostas de atividades, publicações e participações em congressos, é o coletivo do Musicultura que estabelece sua própria agenda e regras de funcionamento. Periodicamente, o grupo realiza avaliações de desempenho tanto do grupo como um todo quanto de cada membro individualmente.

A metodologia adotada envolveu a utilização de duas ferramentas de ação defendidas por Paulo Freire. Em primeiro lugar, a gestão do “silêncio significativo”, que foi gradualmente superado por meio de intervenções verbais curtas e discussões acaloradas que reduziram a dependência de mediadores externos. Em segundo lugar, houve a identificação de “temas geradores”, nos quais os próprios membros do grupo começaram a propor tópicos de discussão.

“Começamos a fazer esse experimento de trabalhar a partir de questões colocadas pela população local, questões em que os próprios moradores percebessem que eram atravessadas pela música. Elas atravessavam a música”.

Samuel Araújo, coordenador do projeto e professor da Escola de Música (EM) da UFRJ.

Com o intuito de ampliar o alcance das pesquisas, o Musicultura empenha-se agora em digitalizar e organizar um acervo físico e virtual, para lançá-lo como recurso de acesso público no próximo ano. Essa iniciativa, financiada pela Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj), possibilitará que o material seja utilizado em aulas de música, trabalhos de iniciação científica e atividades educacionais nas escolas da Maré e regiões próximas. O professor Samuel conta: “Nós vamos percorrer escolas da Maré e instituições próximas dedicadas às artes, à educação, à cultura para difundir esse novo recurso”.

 “Esperamos que escolas locais possam dar continuidade ao trabalho iniciado e enriquecer ainda mais esse acervo público com outros desdobramentos dessa presença fortíssima e muito significativa da música na vida social da Maré como um todo. A música produz oportunidades econômicas, produz um senso de pertencimento, produz reflexões agudas sobre a situação dessa área da cidade”

Samuel Araújo, coordenador do projeto e professor da Escola de Música (EM) da UFRJ.

A inciativa deseja também formar jovens pesquisadores ligados à bairro da Maré, realizando trabalho de campo para pesquisas locais e documentando as práticas musicais presentes. O projeto que originou a criação do grupo de pesquisa, com objetivos específicos de documentar a diversidade e as memórias musicais das comunidades e construir um arquivo local, acabou por gerar uma discussão que se estendeu além do próprio projeto.

Reconhecimento

Cerca de 15 artigos, escritos em colaboração ou individualmente, foram publicados em periódicos e livros acadêmicos no Brasil e no exterior. Além disso, dezenas de trabalhos foram apresentados oralmente em eventos científicos na área da música e disciplinas relacionadas, incluindo algumas premiações em Jornadas de Iniciação Científica da UFRJ. Aproximadamente sete trabalhos monográficos, tanto de graduação quanto de pós-graduação, com alguma conexão com o trabalho coletivo, foram aprovados.

Em 2018, o projeto recebeu reconhecimento da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro como sendo relevante para o interesse público.

https://musiculturamare.wixsite.com/musicultura
https://revistas.ufrj.br/index.php/rbm/article/view/26284
https://www.brasildefato.com.br/2022/07/23/projeto-da-ufrj-com-moradores-da-mare-pesquisa-a-diversidade-musical-em-favelas-no-rj

Se liga no edital: confira lista de concursos abertos para projetos culturais e de favela

Órgãos públicos e privados lançaram editais para alavancar a cultura e realizar projetos artísticos e de impacto social

Tem um projeto legal, é artista, produtor cultural ou colabora com iniciativas periféricas? Então essa matéria é para você. Órgãos públicos e privados lançaram editais para alavancar a cultura e realizar projetos artísticos e de impacto social. O Maré de Notícias preparou uma lista para você acompanhar. Mas corre que alguns já estão encerrando. Não perca essa chance!

Editais da Secretaria Municipal de Cultura – Edição Paulo Gustavo

Ações Locais – R$40 mil a 80 mil

Inscrições até 18/08

São três categorias: Continuidade (R$ 50 mil cada; práticas, atividades e projetos já existentes), Projetos (R$ 40 mil; agentes culturais, artistas, grupos e coletivos atuantes nos diversos territórios e em comunidades periféricas da cidade na proposição de projetos pontuais, inéditos ou não) e Organizações/Empreendimentos (R$ 80 mil; coletivos, organizações e empreendimentos formalizados que comprovem sua atividade nos campos da arte, da cultura, da comunicação e ou conhecimento).

Pró Carioca Diversidade

Inscrições até 20/08

Projetos culturais que contemplem a promoção e difusão das expressões culturais com temáticas relacionadas Cultura Antirracista, Cultura LGBTI+, Cultura sem Limites e tantas outras que coloquem em pauta a diversidade e inclusão.

É necessário ser Pessoa Jurídica para participar.

Prêmio Periferia Viva

Inscrições até 03/09

O Ministério das Cidades vai premiar 54 iniciativas que melhoram a qualidade de vida nas periferias. O prêmio: 50 mil reais!

Para mais informações, acesse o site gov.br/cidades. Para se inscrever na iniciativa clique aqui.

Edital Rumos 2023-2024 do Itaú Cultural

Inscrições até 22/09

Projetos podem ter um teto de até R$ 100 mil e as pessoas terão 18 meses para execução. Nesta edição, o programa contempla projetos de criação artística, inclusive nas linguagens de literatura e HQ, entre outras. Podem se inscrever pessoas físicas e jurídicas através do site rumositaucultural.org.br

Programa Funarte Retomada

Os programas de fomento do Ministério da Cultura (MinC) e da Fundação Nacional de Artes – Funarte seguem com inscrições abertas. Juntos, esses mecanismos totalizam mais de R$ 100 milhões investidos na implementação da Política Nacional das Artes. 

Podem se inscrever: pessoa física ou jurídica, MEI, coletivos e grupos artísticos.

📍Prêmio Funarte Mestras e Mestres das Artes 2023 – https://l1nk.dev/MestraseMestres

Inscrições abertas até 18/08/2023

📍Bolsa Funarte de Mobilidade Artística 2023 – https://acesse.one/Mobilidade

As Inscrições ficam abertas até 18/08/2023, para viagens de janeiro a março de 2024 e até 08/09/2023, para viagens de abril a junho de 2024

📍Funarte Retomada 2023 – Artes Visuais – https://acesse.one/RetomadaArtesVisuais

📍Funarte Retomada 2023 – Circo – https://acesse.one/RetomadaCirco

📍Funarte Retomada 2023 – Dança – https://acesse.one/RetomadaDanca

📍Funarte Retomada 2023 – Teatro – https://l1nk.dev/RetomadaTeatro

📍Funarte Retomada 2023 – Música – https://l1nk.dev/RetomadaMusicaa

Inscrições abertas até 28/08/23

📍Programa Funarte de Apoio a Ações Continuadas 2023 – Grupos e Coletivos Artísticos – https://acesse.one/ContinuadasGrupos

📍Programa Funarte de Apoio a Ações Continuadas 2023 – Espaços Artísticos – https://l1nk.dev/ContinuadasEspacos

📍Programa Funarte de Apoio a Ações Continuadas 2023 – Eventos Artísticos Calendarizados – https://l1nk.dev/ContinuadasEventos

Inscrições abertas até 13/9/2023

Edital Rio Do Rock (FUNARJ)

Áreas: Música do gênero Rock´n roll

Inscrições até 21/08

Premiação: R$20 para o 1° colocado. 

Podem se inscrever: pessoa física, pessoa jurídica, MEI, atuantes na área de música há pelo menos 1 ano, domiciliado ou com sede no Estado do Rio de Janeiro

Link bit.ly/44rmwa4

Prêmio Luiz Melodia de canções afro-brasileiras

Áreas: Música – canções inéditas

Inscrições até 23 de Agosto

Premiação: R$ 50 mil

Podem se inscrever: pessoa física.

Link: https://bit.ly/44rQtq8

INTERNACIONAL – COLABORAÇÃO IBERMÚSICAS-MID ATLANTIC ARTS 2023

Áreas: Música – ajudas à circulação de artistas ibero-americanos e ibero-americanos nos Estados Unidos

Premiação: até 15.000 USD

Podem se inscrever: pessoa física.

Inscrição: até 01 de setembro

Link: bit.ly/3PP23HQ