Lau, um furacão da dança, solidariedade e resiliência na Maré

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Transformando vidas na Maré com amor e voluntariado no ‘Beco da Lau

“Eu sou voluntária de ONGs” responde aos risos Lauane Silva, 35 anos, quando perguntamos sobre sua profissão. Responsável pela bicibiblioteca na Maré, ela gosta de fazer voluntariado pelo prazer em ajudar.  Mais conhecida como Lau Furação, ela é moradora da Vila do João, cristã e mãe de três filhos — Luiz André, Sara Cristina e Sabrina Vitória —  filha de Vânia Teodoro e Luíz Cláudio (em memória). 

Moradora da Maré desde os dez anos, Lau Furacão conta que sempre chegava nos lugares e marcava a presença com seu jeito extrovertido, e daí surgiu o apelido que foi dado pelas amigas, “mas ao mesmo tempo que eu sou furacão, também sou calmaria” afirma. Há cinco anos, ela vem se dedicando a cuidar e ajudar os outros, sonha em fazer faculdade de serviço social, e para isso está concluindo o ensino médio.

“Sempre gostei de ajudar, minhas amigas me chamavam para fazer quentinhas para pessoas em situação de rua e eu ia. […] porque eu sou assim, Se você falar bora eu boro.” brinca. 

A artista usa ainda a comunicação como forma de expressão, mesmo não se definindo como escritora, seus textos refletem sobre situações da sua vida. Os textos de Lau lembram a “escrevivência”, conceito de Conceição Evaristo para a prática literária de escrita principalmente quando a autoria é negra, feminina e pobre. Um trecho de “Por Trás da Barricada” pode ser lido no final desta matéria. 

/Já leu essas?

A junção da escrita com a oralidade, a forma ancestral de transmissão de conhecimentos, levou Lau Furacão a participar de rodas de conversa com o Slam das Minas.

‘Beco da Lau’

Além das quentinhas, Lau arrecada doações de cestas básicas, roupas e móveis para famílias em vulnerabilidade e inspira outras mulheres por meio de rodas de conversa. Ao redescobrir sua autoestima, a artista resolveu compartilhar a experiência da vida como uma mulher periférica. Um dos temas da roda de conversa é a relação do corpo e a favela. Entre as situações que Lau viveu, ela lembra da gordofobia, o preconceito por ela ser gorda: “por eu ser gorda nem todos os moto-táxi querem me levar.” desabafa.

Os encontros começaram online durante a pandemia, mas agora “O Beco da Lau”, como ficou sendo chamada as reuniões de partilha, acontecem mensalmente na Travessa do Amor (antiga travessa 3) na Vila do João, onde ela mora. 

Lau conta que é muito conhecida pela Vila dos Pinheiros e Vila do João, por conta da dança, ela foi dançarina do programa de humor “Os Suburbanos” apresentado pelo ator e humorista Rodrigo Sant’Anna durante as temporadas 5 e 6. “Eu amo dançar, tenho a minha fé, mas a dança é parte de mim”. 

Fã de Gabriel Pensador, Lau se inspira nas letras dele porque cada uma traz uma reflexão sobre a vida. Em entrevista para o Maré de Notícias recita “Astronauta” de Gabriel Pensador e Lulu Santos (1999), “como é grande a nossa ignorância e como nossa vida é mesquinha” diz um trecho da canção. Lau Furacão ressalta que é importante valorizar e trazer mais recursos para a favela: “nossa favela é rica e a gente não pode só ficar dando nosso dinheiro para quem vem de fora.” Pensando em formas de apoiar ainda mais a Maré, futuramente a artista pretende abrir uma ONG que vai se chamar “Por trás da Barricada”. 

[…] Atrás da barricada
Existe cidadão do bem, só queremos saúde emprego e educação que não tem.
Na favela, fomos ensinados bem cedo a correr quando a polícia entra, tendo os valores invertidos e a nossa vida correndo risco!
O bem e o mal e o mal é o bem.
Atrás da barricada
Mais um dia de tensão
Nossas crianças sem escola, como vamos ter a tal educação?
Atrás da barricada
A mãe tenta desviar dos tiros pois tem que trabalhar para poder alimentar os filhos
Até quando essa guerra vai nos atrapalhar? […]

Trecho de ‘Atrás da barricada’ de Lau Furacão
Lucas Feitoza
Lucas Feitoza
Jornalista

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