Maré de Notícias lança caderno cultural no jornal impresso

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As próximas 10 edições do jornal serão uma jornada pelas manifestações artísticas e culturais que moldam a diversidade da Maré

Ana Paula Lisboa

Edição #159 – Jornal Impresso do Maré de Notícias

Ter um caderno dedicado à cultura no Maré de Notícias era um sonho antigo, e não é à toa que o maior número das nossas matérias em 2023 estiveram relacionadas à editoria de arte e à cultura. A Maré é um território diverso, rico em manifestações culturais e com uma potente história de formação. 

Os dados do Censo Maré apontam que praticamente 62% dos atuais moradores nasceram no território, mas indica também o grande fluxo migratório nordestino, 25,8%, e até mesmo estrangeiro, com 0,2% dos moradores. Essa diversidade contribui para uma explosão de produção artística e cultural. 

Em 2024, vamos realizar este desejo, produzindo o Caderno de Cultura nas próximas 10 edições do jornal impresso, que se desdobrará também em matérias para nossa edição online.

Cultura e arte

Seria praticamente impossível abarcar, nestas edições, a cultura do povo da Maré de forma total, pois é uma palavra ampla, que abrange o conjunto de valores, crenças, costumes, arte, expressões e práticas de uma sociedade ou grupo social específico. Engloba uma gama de elementos, como arte visual, música, dança, literatura, gastronomia, teatro, fotografia, arquitetura, tradições religiosas, festivais, e muito mais.

A cultura é uma parte fundamental da identidade de um povo e influencia nossa maneira de pensar, agir e se relacionar com o mundo ao nosso redor. Além disso, a cultura é dinâmica e está em constante evolução, sendo moldada pela interação entre diferentes grupos sociais, mudanças históricas e influências externas.

Nosso desejo não é sintetizar, encerrar o assunto ou dar respostas fechadas, mas fazer ainda mais perguntas que contribuam na construção da cultura mareense.

Cultura e memória

A cultura e o território estão tão entrelaçados que é difícil separar um do outro, pois ambos desempenham papéis fundamentais na forma como as pessoas e as sociedades se entendem e interagem com o mundo em nosso cotidiano.

O território também impacta na diversidade linguística. As línguas muitas vezes se desenvolvem de maneira única em diferentes regiões, isso vai desde as gírias de diferentes favelas, dos sotaques, até a forma como falamos português no Brasil, o nosso Pretuguês, como definiu a intelectual Lélia Gonzalez.

As favelas, periferias já foram considerados territórios sem conhecimento, onde viviam pessoas desprovidas de cultura. Isso porque “ter cultura” equivalia a ser escolarizado ou ter acesso a erudição. Os aspectos culturais da população não europeia (geralmente negra e indígena) não eram considerados, e chegavam a ser criminalizados, como é o caso da capoeira, do samba e do funk.

Hoje, apesar dos avanços, as manifestações culturais das periferias (slam, roda de samba, bailes funk, passinho, peças teatrais, grafite) ainda sofrem com o preconceito, a falta de financiamento e de espaços para atuação.

Cultura e identidade

O que pode parecer entretenimento, na verdade, é fundamental na construção e manutenção dos direitos humanos. Por isso, o Artigo 215 da Constituição Federal Brasileira e o Artigo 27 dos Direitos Humanos estabelecem  que, o Estado, deve garantir a todos o pleno exercício da sua cultura, incentivando a produção cultural e o direito do povo desfrutar das artes. Portanto, a relação entre arte, educação, cultura e movimentos por direitos são profundas. 

Mulheres, negros e a comunidade LGBTQIAP+ frequentemente usam a arte para compartilhar suas experiências, desafiar normas sociais e políticas discriminatórias e racistas, e dar voz às  lutas por igualdade. Muitas vezes foi pelas artes visuais, música, dança, literatura, teatro, fotografia e outras formas de expressão artística, que esses movimentos encontraram maneiras de transmitir mensagens importantes e inspirar mudanças.

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A arte e a cultura também desempenham um papel fundamental na construção de narrativas e de identidades. Representações positivas e inclusivas na mídia, na literatura, no cinema, na música e nas artes visuais são essenciais para desafiar estereótipos e promover a igualdade.

Geração de renda

No Brasil, um país rico em diversidade cultural, seria ainda mais complexo falar de cultura de forma hegemônica. Por isso, nosso recorte é a cultura como território, onde as expressões culturais das periferias e favelas assumem um papel central. Em particular, o território do conjunto de favelas da Maré, com todas as 16 comunidades, como ponto de referência fundamental.

Não é apenas na subjetividade que a cultura é importante. Ela é também essencial para a economia do Brasil. Segundo o Ministério da Cultura (MINC), mais de 3% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro é gerado pela cultura e economias criativas. Em 2024, o Carnaval na cidade do Rio movimentou cerca de R$5 bilhões, e nas comunidades, os eventos ligados ao funk, samba e pagode sustentam famílias inteiras.

Outro aspecto importante que o leitor e leitora verá neste caderno, é a cultura como fazer artístico-estético, tendo os artistas favelados como protagonistas, seja em perfis, entrevistas ou investigando essas produções.  

De acordo com a pesquisa Marégrafia, feita com 70 artistas da Maré, os artistas do território são,  na maioria, negros, com menos de 30 anos e sem renda individual ou limitada a menos de dois salários mínimos. Menos de 3% desses trabalhadores conseguem manter as despesas familiares somente com o subsídio dos trabalhos artísticos e precisam de outras fontes para complementar a renda. E,  mais da metade dos entrevistados pela pesquisa se declararam LGBTQIAP+. Uma das missões deste caderno é trabalhar em conjunto com os artistas e instituições na atualização da pesquisa.

Cultura e lazer

Cultura e lazer são conceitos distintos, mas relacionados e estão frequentemente interconectados nas favelas.

O lazer refere-se ao tempo livre e às atividades recreativas que as pessoas escolhem realizar para descansar, relaxar e se divertir. Pode incluir uma ampla variedade de atividades, desde esportes e exercícios físicos até hobbies, passeios ao ar livre, viagens, assistir a filmes, leitura, socialização com amigos e família.

Nas favelas, muitos espaços culturais (públicos e privados) também oferecem atividades de lazer. Esta é uma forma de criar novos públicos, gerar bem-estar físico, mental e emocional das pessoas, além de promover o desenvolvimento pessoal, a criatividade e o senso de comunidade.

A música, em particular, desempenha um papel fundamental na vida das favelas. O funk, com suas letras muitas vezes politicamente carregadas, serve como um meio de contar as histórias das comunidades e de protestar contra as injustiças. Na Maré outros ritmos também se conectam, como o forró, o rock, a música clássica e o reggae.

Além disso, a gastronomia das favelas da Maré reflete a diversidade cultural do Brasil, combinando influências indígenas, africanas e europeias para criar pratos saborosos. Os restaurantes e barracas de comida não apenas alimentam os moradores, mas também atraem visitantes.

Outra meta deste caderno é compartilhar as agendas de eventos de cultura, lazer e gastronômicas do território, tanto no jornal físico quanto na edição online e nas redes sociais. 

E você, o que espera ler e ver no Caderno de Cultura do Maré de Notícias?

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