Home Blog Page 384

#CaiuNaRede: Banco no Rio foi roubado, não se sabe a quantia em dinheiro levada

0

Post afirma que bandidos teriam levado mais de R$ 1 milhão, mas banco não confirma

Thaís Cavalcante (Maré de Notícias, especial para a Lupa)

Circula nas redes sociais uma publicação sobre um roubo a uma agência do Banco do Brasil em Vila Valqueire, no Rio de Janeiro. Os assaltantes teriam levado mais de R$ 1 milhão, de acordo com a postagem. O conteúdo foi verificado no Caiu na rede: é fake?. Confira:

“Três bandidos armados roubaram mais de R$ 1 milhão da agência do Banco do Brasil (…), na Vila Valqueire, Zona Oeste do Rio. (…) Com máscaras e bonés, os assaltantes roubaram o dinheiro do cofre e do caixa, levando um total de R$1.180.000,00(…)”

Texto publicado no Facebook que, até as 11h do dia 3 de dezembro de 2020, foi compartilhado por 91 pessoas 

VERDADEIRO, MAS

A informação é verdadeira. A agência do Banco do Brasil em Vila Valqueire informou em nota que houve um assalto no local, mas não confirmou o valor que teria sido roubado. O gerente da agência foi rendido quando os funcionários chegavam na agência.

O Banco do Brasil acrescentou que está colaborando com a investigação do caso junto à polícia. A Polícia Civil foi procurada, mas não respondeu.

Nota da redação: o projeto Caiu na rede: é fake? é uma parceria da Agência Lupa com Voz das Comunidades, Favela em Pauta e Maré de Notícias e conta com o apoio da Fundação Heinrich Böll Brasil. 

Maré tem onda de incentivo à leitura durante a pandemia

0

Bibliotecas comunitárias, espaços de leitura e doação de livros se multiplicam no Conjunto de Favelas da Maré

Por Hélio Euclides e Thaís Cavalcante em 03/12/2020 às 15h

Editado por Edu Carvalho

Ninguém liberta ninguém, ninguém se liberta sozinho: as pessoas se libertam em comunhão” é o pensamento do educador Paulo Freire que está na placa da Biblioteca Comunitária Sementes, com sede na Baixa do Sapateiro. Essa e outras iniciativas são práticas de moradores que desejam multiplicar o número de leitores no território. Algumas das ações são ao ar livre, sem catálogo e bibliotecário, mas com o objetivo de que ocorra uma circulação de livros.

O país hoje conta com 52% de leitores, ou seja 100,1 milhões de pessoas, segundo a pesquisa “Retratos da leitura no Brasil”, feita pelo Instituto Pró-Livro em parceria com o Itaú Cultural, em 208 municípios de 26 estados entre outubro de 2019 e janeiro de 2020. Ocorreu uma diminuição de 4%, aproximadamente 4,6 milhões de leitores em relação à edição anterior da pesquisa, de 2015. Já a média de livros inteiros lidos em um ano se manteve o mesmo: 4,2 livros por pessoa.

Para aumentar esse número de livros por pessoa, surgiu em 2018, a Biblioteca Comunitária Semente. O nome é uma homenagem a vereadora Marielle Franco, assassinada no mesmo ano, mas que deixou uma semente plantada: sua luta. Os livros da biblioteca ficam em caixotes presos em uma parede da Rua Joana Nascimento, na Baixa do Sapateiro. A primeira versão era em uma estante. “No passado essa rua não tinha uma boa circulação, as pessoas tinham medo de passar. Hoje, além da biblioteca fizemos a limpeza, grafitamos, colocamos iluminação e com pneus fizemos uma arborização”, conta Mateus Duarte, um dos idealizadores. Além de promover a leitura, a biblioteca veio com a revitalização da rua.

Duarte tinha um trailer no local e sentia a necessidade de trazer vida para a rua, por meio dos livros. “Tinha uma estante para doação em São João do Meriti, então fomos buscar e trouxemos de ônibus. A partir daí cada amigo fazia alguma coisa, trazia livro e são dois anos de construção. O pensamento é que a rua faça a gestão, algo participativo”, comenta Osita da Silva, colaboradora da biblioteca. Ela acredita que pode ser um projeto piloto para o território. “Tinha que ter mais ambientes destes na favela. Falta locais de lazer na Maré, e com alguns caixotes e bancos, sem muitos gastos, iriam surgir alguns espaços de leitura”, expõe. 

Mateus Duarte e Osita da Silva, responsáveis pelo Espaço de Leitura na Baixa do Sapateiro, Maré. Foto: Hélio Euclides

Uma geladeira de livros

Já a Biblioteca Comunitária Nélida Piñon começou na casa de Geraldo de Oliveira, morador de Marcílio Dias, velho conhecido do Jornal Maré de Notícias. Depois a biblioteca se mudou por duas vezes, até funcionar no prédio atual, na Travessa Luiz Gonzaga 58, na Maré. Antes de ser biblioteca, o lugar era uma loja de refrigeração, no qual o antigo dono tinha deixado uma geladeira quebrada em frente. Oliveira procurou entregar o eletrodoméstico, mas não conseguiu. “Então veio a ideia de aproveitar a geladeira como ferramenta de saber. A biblioteca tem hora de fechar e as pessoas ficavam sem acesso aos livros, que são cultura e informação. Com a estante improvisada os leitores não ficam limitado ao espaço físico da biblioteca”, diz.

O projeto ”Pegue, Leve e Leia” começou em 2019 e funciona 24 horas, de segunda a segunda. Quem chega perto da geladeira se surpreende com um cartaz colado na porta: pegue e leve. No eletrodoméstico estão separados alguns livros por assunto. “Fazem parte do acervo da geladeira livros didáticos, romances, biografias, religiosos e o Maré de Notícias. Não há burocracia, o leitor leva e depois devolve ou troca, que é algo que fomenta a informação e estimulo ao protagonismo do morador”, conta. O projeto não deseja parar por aí, há o pensamento de criar dois outros pontos estratégicos em Marcílio Dias, mas para isso Geraldo precisa de mais geladeiras. É o lixo virando cultura e educação. 

Geraldo Oliveira: paixão pelos livros faz morador montar biblioteca com recursos próprios | Douglas Lopes

De acordo com a pesquisa “Bibliotecas Comunitárias no Brasil: impacto da formação de leitores” feita com a coordenação do Grupo de Pesquisa Bibliotecas Públicas do Brasil, mais da metade de bibliotecas comunitárias, cerca de 87%, estão localizadas em regiões periféricas com alto índice de pobreza, violência e serviços. Parte delas, foi criada pelos próprios moradores ou grupo de pessoas ligadas aos movimentos sociais locais.

Ainda que o poder público não invista o suficiente na criação de equipamentos culturais, artísticos e educacionais nas favelas e periferias, o poder da mobilização comunitária e da colaboração acontece assim que a população tem a necessidade de vivenciar uma nova iniciativa. Uma luta histórica na busca por soluções. Seja na criação de uma biblioteca, na prática de leitura compartilhada, doação de livros ou até  na participação de feiras livres de leitura. 

Incentivando leitores mirins

Outra iniciativa que vale a pena conhecer é a de Maryzete Farias, moradora do Parque União. Ela teve uma mudança de vida depois que conheceu o projeto Yoga na Maré e isso envolve a leitura dentro do território. Mais conhecida como Mary Roffe, ela voltou aos estudos para ser uma psicóloga e encontrou um novo rumo para sua rotina de dona de casa e mãe: a criação de uma biblioteca infantil. Tudo aconteceu muito rápido: o espaço do projeto foi doado pelo pastor da igreja de sua mãe e a busca por doação de livros continua, diariamente, pelas redes sociais.

Um mês depois da estrutura pronta, a Biblioteca Infantil Maré de Luz já possui o apoio de uma pedagoga, recebeu mais de 200 títulos, entre livros de histórias, livros de colorir e livros didáticos. “Quando veio esse desejo em mim, comecei a pedir doações e rapidamente muitas pessoas começaram a doar caixas de livros infantis, a começar pelos meus vizinhos. Chegou livros até da França”, conta. 

A biblioteca comunitária era um sonho de Mary há mais de dois anos. Com a inauguração marcada para o dia 12 de dezembro e as parcerias feitas para que a festinha tenha bolo, salgadinhos e brincadeiras para os pequenos, a intenção vai além. Ela pretende levar as crianças para passeios culturais e artísticos dentro e fora da Maré. “O que eu amo de verdade são crianças e livros. Sei que juntando as duas coisas vai dar  futuro, porque sei o poder que a leitura tem. Podem tirar tudo de você, menos o seu conhecimento”.

Biblioteca Infantil Maré de Luz será inaugurada em dezembro, no Parque União, Maré. Foto: Arquivo Pessoal.

O Maré de Notícias mapeou dez bibliotecas populares e comunitárias espalhadas por todo o Conjunto de Favelas Maré, no Rio, sendo elas iniciativas de moradores, instituições sociais ou organizações não governamentais, e a maioria inaugurada nos últimos 10 anos pelos mareenses. É possível pegar o empréstimo do livro gratuitamente ou até mesmo ler no local, caso tenha espaço de leitura disponível.

Conheça as Bibliotecas da Maré, seja para doar livros ou pegá-los emprestado. Faça uma visita depois da pandemia:

Biblioteca Comunitária Nélida Piñon

Travessa Luiz Gonzaga, 58 – Marcílio Dias

Biblioteca Comunitária Infantil Maré de Luz

Rua São Pedro número, 26 – Parque União (3° andar) 

Biblioteca Comunitária Semente

Rua Joana Nascimento, s/n – Baixa do Sapateiro

Biblioteca Popular Escritor Lima Barreto (Redes da Maré)

Rua Sargento Silva Nunes, 1.010 – Nova Holanda

Biblioteca Bela Maré (Galpão Bela Maré)

Rua Bitencourt Sampaio – Nova Holanda

Biblioteca Comunitária Luciana Savaget (Instituto Vida Real)

Rua Teixeira Ribeiro, s/n – Nova Holanda

Biblioteca Paulo Freire (CEASM)

Rua dos Caetés, 7 – Morro do Timbau

Biblioteca Popular Municipal Jorge Amado (Lona Cultural Herbert Vianna)

Rua Ivanildo Alves, s/n – Nova Holanda

Biblioteca Elias José (Museu da Maré)

Avenida Guilherme Maxwell, 26 – Baixa do Sapateiro

 Ônibus-biblioteca Livros nas Praças (Vila Olímpica da Maré)

Rua Tancredo Neves s/n – Nova Holanda

Moradores denunciam falta de água na Maré e no Rio

1

O problema preocupa a população do território com mais casos de covid-19 entre as favelas do Rio

Por Thaís Cavalcante, em 18/11/2020, às 16h30
Editado por Andressa Cabral Botelho e atualizado em 03/12/2020 às 12h35

Falta água dentro da casa do mareense, assunto falado por moradores das várias favelas da Maré, na segunda semana de novembro. Segundo moradores, está faltando água em algumas favelas da Maré; em outras, o fluxo é fraco ou a água vem temporariamente.

Rafael Ferraz, morador da Baixa do Sapateiro e baixista da Banda Agona, já está em alerta desde que viu relatos da falta de água e percebeu, ao abrir a torneira, que a água está com fluxo fraco. “Já não estou lavando roupa na máquina para ver se consigo economizar. Feriado está chegando e quero ter água aqui. Comentei com meus vizinhos aqui da rua”. Uma realidade alarmante para o Conjunto de Favelas da Maré, que é o território popular com mais casos confirmados de covid-19 na cidade do Rio de Janeiro. Neste momento (03/12), são 1.970 pessoas infectadas e 163 mortes pela doença, segundo levantamento do Painel Unificador COVID-19 Nas Favelas. 

Ana Freire, moradora do Salsa e Merengue, pós-graduanda em Gestão em Saúde, sente a água mais fraca desde domingo. Ela conta que  há  moradores que sofrem mais por conviverem com esgoto a céu aberto. “Aqui temos o privilégio de ter caixa d’água e água da rua, mas esses dias ela não chegava nem no chuveiro, só à noite começou a ficar mais forte”. Ana completa, ainda: “A gente sabe que lavar as mãos e os alimentos são ações preventivas que a Organização Mundial da Saúde orientou contra a covid-19, mas muitas pessoas não têm esse privilégio”. 

Os coletivos de favelas Maré Vive, Maré 0800, Palafita 174, Papo Reto e Coletivo Marginal criaram um formulário online para que os mareenses preencham e informem em quais localidades está faltando água nos territórios . Após o mapeamento, pretendem entrar em contato com os órgãos públicos do Rio de Janeiro e fazer uma denúncia coletiva. Para preencher, clique aqui.

A falta de água tem impactado outras localidades da cidade do Rio. No Morro da Baiana, no Complexo do Alemão, moradores estão há quase um mês sem água. Com a pressão da sociedade, a Companhia Estadual de Água e Esgoto (CEDAE) criou a página “Economize água” em seu site para atualizar, diariamente, quais serão os bairros mais afetados pela falta de água.

Em comunicado da Cedae, a falta de água acontece devido ao reparo emergencial em um dos motores que bombeiam água na Elevatória Lameirão, que abastece os municípios do Rio e Nilópolis. O abastecimento de água foi reduzido em 25%. A normalização estava prevista para 17 de novembro, mas não aconteceu. Para minimizar o problema, foi criado um Plano Emergencial de Operação. A concessionária fez uma nossa promessa de que o serviço deve ser restabelecido entre os dias 15 e 20 de dezembro de 2020. 

Uma pandemia sem água

Vale lembrar que em setembro, durante a manutenção anual na Estação de Tratamento de Água (ETA) Guandu, foi identificado um vazamento no conjunto de equipamentos responsáveis pelo bombeamento de água na mesma Elevatória. Na época, a manutenção anual que duraria cerca de 12h, se tornou um reparo de dias, fazendo com que moradores da região de Campo Grande, Zona Oeste da cidade, ficassem mais de 72h sem abastecimento de água.

Para aqueles moradores que possuem cisterna ou caixa d’água, a orientação da Cedae é que usem a água armazenada e economizem água. Um pedido que não alcança a população que tem a torneira seca e já está buscando alternativas com amigos e parentes para realizar os serviços básicos do dia a dia, como tomar banho e se alimentar.

O desafio de garantir o direito à água é travado pelos moradores de favelas e áreas mais vulneráveis desde o início da pandemia global de covid-19. Em março deste ano, o Complexo do Alemão, Morro do Borel – Tijuca, Morro da Babilônia – Copacabana, Conjunto de Favelas da Maré e outras 140 localidades da cidade carioca ficaram com a torneira seca.

Como medida para minimizar o impacto do problema, as ouvidorias da Defensoria Pública e do Ministério Público criaram um formulário para mapear as localidades que estão sem água. 

Está sem água? Preencha o formulário da Defensoria Pública: http://survey123.arcgis.com/share/1c52f06ec5784460a30ebe14a0c3a574

Informe a falta d’água para a Cedae ou solicite carro-pipa, ligue: 0800-282-1195

Eduardo Paes define secretários para nova prefeitura; cria da Cidade de Deus faz parte do time

0

Até o término da semana, prefeito eleito pretende definir cargos de sua nova gestão

Edu Carvalho em 03/12/2020 às 10h

Editado por Dani Moura

Nesta semana o prefeito eleito Eduardo Paes começou a formar seu governo, que toma posse para mandato de quatro anos a partir do dia 1º de janeiro de 2021. 

O primeiro nome anunciado como oficial foi o médico sanitarista Daniel Soranz, personagem que passou por gestões anteriores de Paes. 

Logo depois convidou Anna Laura Secco para atuar como chefe da pasta de Conservação. Outros cargos estão definidos, como o da nova Secretaria de Integridade e Governo, que ficará sob os cuidados de Marcelo Calero, e da Secretaria de Fazenda, pelo deputado federal Pedro Paulo (DEM). Ao vereador Luiz Carlos Ramos Filho, foi designada a  Secretaria Municipal de Proteção Animal.

Com Paes também estarão a vereadora eleita Laura Carneiro, que assume a Secretaria de Assistência Social; a assistente social Ana Ribeiro (Subprefeitura da Zona Sul) e a professora da rede municipal Marli Peçanha (Ação Comunitária). 

Ontem, quarta-feira, houve o anúncio de três novos subprefeitos: o empresário Diego Vaz, para a Zona Norte, Leonardo Pavão, para o Centro, e Edson Menezes, para a Zona Oeste.

Cria da Cidade de Deus será responsável 

Ainda sem ser criada, a nova Secretaria da Juventude já está sob o comando do líder comunitário Salvino Oliveira, morador de 22 anos da Cidade de Deus. 

O jovem desenvolve projetos sociais e artísticos onde nasceu e vive e é recém-formado na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) em Gestão Pública. Ele hoje ocupa a função de assessor da Defensoria Pública do Estado do Rio.

Festa Literária das Periferias, FLUP, celebra as Feministas Negras Brasileiras

0

Este artigo foi escrito por Pilar Boyero, especialmente para o Rioonwatch Publicado em 03/12/2020 às 9h42

No Mês da Consciência Negra, esta matéria cobre um evento da FLUP sobre as autoras negras brasileiras pioneiras, Carolina Maria de Jesus e Lélia Gonzalez, e é parte de nossa parceria com o The Rio Times. Para a matéria publicada no The Rio Times, em inglês, clique aqui.

A Festa Literária das Periferias (FLUP), que ocorre desde 2012 em favelas e espaços públicos da cidade, elaborou sua edição de 2020 em homenagem a duas “autoras brasileiras negras pioneiras”, Carolina Maria de Jesus e Lélia Gonzalez. Em seu livro Quarto de Despejo de 1960, Carolina Maria de Jesus narra a sua vida cotidiana em uma favela de São Paulo, ao passo que Lélia Gonzalez foi uma antropóloga influente, professora da PUC-Rio, ativista política e teórica dos anos 1960 aos anos 1990. Ela é considerada uma das principais—senão a maior—feminista negra no Brasil.

Embora Carolina Maria de Jesus tenha se tornado famosa internacionalmente, ela nunca foi rica, nem foi capaz de publicar a maior parte de sua obra. Apenas quatro de seus livros chegaram ao público em geral e geraram renda para ela enquanto viva, a partir de pilhas de cadernos nos quais ela havia escrito. A maior parte de seu trabalho foi publicada apenas décadas após sua morte e alguns textos ainda estão sendo publicados. Alguns de seus cadernos estão espalhados pelo Brasil. Serão organizados por sua filha Vera Eunice de Jesus e pela escritora Conceição Evaristo, na esperança de fazer justiça ao seu legado.

Carolina Maria de Jesus, autora de “Quarto de Despejo” na Favela do Canindé em 1960
Foto: Acervo UH/Folhapress

Da mesma forma, a voz e as teorias de Lélia Gonzalez ecoaram pela América Latina—e além—por mais de 50 anos, mas apenas dois de seus livros foram publicados na década de 1980, enquanto ela estava viva. Até agora, nunca houve uma editora disposta a trabalhar com seus extensos escritos sobre a condição das mulheres negras e das populações negras e indígenas na América Latina. Uma de suas obras seminais, “Por um Feminismo Afro Latino Americano”, só recentemente se tornou um livro, uma coleção de ensaios recém-publicada reunindo seus escritos de três décadas.

Duas vozes proeminentes do feminismo negro brasileiro de hoje, a filósofa Djamila Ribeiro e a estudiosa feminista Carla Akotirene, discutiram o trabalho de Lélia em um recente evento digital  da FLUP 2020 moderado pela jornalista do O Globo Flávia Oliveira.

Lélia atuou internacionalmente ao longo de décadas e influenciou gerações de intelectuais negros, incluindo pensadores como Angela Davis—que disse a uma multidão de fãs brasileiros no ano passado: “Aprendo mais com Lélia Gonzalez do que vocês poderiam aprender comigo”. Lélia cunhou o termo “amefricanidade” para designar experiências tanto de negros quanto de povos indígenas colonizados nas Américas.

Lélia Gonzalez e Angela Davis nos EUA em 1984

No evento virtual, Djamila disse, que ao ler Lélia pela primeira vez “o mundo se abriu para mim” por meio da compreensão de que “era possível pensar e se afirmar a partir da própria perspectiva das mulheres negras”.

A escrita de Lélia, lembra Djamila, reforça uma perspectiva interseccional sobre o feminismo: o reconhecimento de que “as mulheres negras vivem em um gênero racializado”, diz ela. É parte de uma “luta contra todas as formas de segregação… Um movimento revolucionário não é uma forma de lutar por algo que nos interessa, mas por um projeto alternativo da sociedade”.

Cada vez mais, as ideias do feminismo negro brasileiro estão ganhando força na sociedade em geral—evidenciado não apenas pelas escolhas das escritoras homenageadas na FLUP este ano, mas também pelas eleições de 2020, onde mulheres negras ficaram entre as candidatas a vereadores mais votadas em numerosas capitais do Brasil.

Lélia, que morreu em 1994, foi enfática ao dizer que o feminismo transformador não deveria ser escrito apenas por meio de uma linguagem acadêmica complicada. Ela escreveu muitas vezes sobre a importância da gramática informal que chamou de pretuguês. Djamila descreveu isso como “coragem epistemológica” e um passo essencial para o processo de descolonização, ao reconhecer “o legado linguístico dos povos africanos”, inclusive para o papel central que a oralidade desempenha na produção de conhecimento de raiz africana. Algumas amigas falavam que “Lélia era uma griot, falava muito”, distanciando Lélia e sua produção de um ideal eurocêntrico. Griots eram os poetas viajantes da África Ocidental.

Lélia Gonzalez com Benedita da Silva em Dakar em 1986

Carla Akotirene vê o trabalho de Lélia como parte de um projeto maior de reconhecimento das contribuições inovadoras de brasileiros negros que muitas vezes não são creditados por suas ideias. É importante, ela argumenta, enfatizar que essa anulação e invisibilização da capacidade intelectual dos oprimidos permite a consagração de sua criminalização.

Lélia, doutora em antropologia, atuou muito além da esfera acadêmica, que Djamila e Carla descreveram como uma lição para pensadores políticos e ativistas de hoje. Em particular, elas falaram da importância das mídias sociais. Djamila disse que ser ridicularizada como uma “blogueirinha”, no passado, não mudou sua convicção de que “as redes sociais permitem a comunicação com as pessoas indiscriminadamente. Em um mundo onde o conhecimento é para poucos, devemos democratizar o saber”. Carla disse que isso cria possibilidades para que uma “trabalhadora doméstica tenha acesso à informação”.

Os palestrantes destacaram que tanto Lélia Gonzalez quanto Carolina Maria de Jesus são exemplos do que a escritora Conceição Evaristo chamou de escrevivência. Este é um método negro de escrever sobre seu próprio povo, feito de três elementos: corpo, condição e experiência. A escrevivência une a dimensão subjetiva do ser negro, sua representação e seu corpo.

Assista à Festa Literária das Periferias 2020 (FLUP) aqui.

Dia Mundial de Luta contra AIDS marca redução de vírus no país; SUS é responsável pelo tratamento

0

Por Edu Carvalho, em 01/12/2020, às 17h30

Editado por Andressa Cabral Botelho

Neste 1º de dezembro é celebrado o Dia Mundial de Luta contra a Aids. No Brasil, o Ministério da Saúde apresentou, pela manhã, o Boletim Epidemiológico HIV/Aids 2020, trazendo dados de diagnósticos e infectados ao longo do ano de 2019, além de uma análise dos casos dos últimos anos no país.

Segundo o órgão, cerca de 920 mil pessoas vivem com HIV no Brasil: 89% delas foram diagnosticadas, 77% fazem tratamento com antirretroviral e 94% das pessoas em tratamento não transmitem o HIV por via sexual, por terem atingido carga viral indetectável. Até outubro de 2020, 642 mil pessoas estavam em tratamento com antirretroviral, enquanto em 2018, eram 593.594 pessoas em tratamento.

Em relação aos jovens, o Ministério da Saúde estima que 10 mil casos de Aids foram evitados no país em um período que vai de 2015 a 2019. Concentram o maior número de casos pessoas de 25 a 39 anos, de ambos sexos, com 492,8 mil registros. Nessa faixa etária, 52,4% são homens e 48,4% são mulheres.

Apesar da luta, há o que se comemorar. O Brasil registrou queda no número de casos de infecção por Aids nos últimos anos. Em 2012, as taxas registram 21,9 casos por 100 mil habitantes. Em 2019, foram 17,8 casos por 100 mil habitantes em 2019. A taxa de mortalidade por Aids também apresentou queda, registrando o patamar de 17,1% nos últimos cinco anos. Na avaliação do Ministério da Saúde, ações como a testagem para a doença e o início imediato do tratamento, em caso de diagnóstico positivo, são fundamentais para a redução do número de casos e óbitos por Aids.

Um desses tratamentos é inovador e pioneiro no país, chamado de Profilaxia Pré-Exposição (PrEP).  Ele consiste na tomada diária de um comprimido que impede que o vírus causador da aids infecte o organismo, antes de a pessoa ter contato com o vírus. Todos os medicamentos são gratuitos. Conheça o programa aqui. Outro ponto importante no combate à doença foi o compromisso mundial assinado pelo  Brasil para  eliminar a transmissão vertical do HIV – que pode acontecer durante a gestação, parto ou amamentação. O país optou por adotar uma estratégia gradativa de certificação de municípios. A erradicação da transmissão vertical do HIV, assim como a redução da sífilis e da hepatite B, é uma das seis prioridades do Departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis (DCCI) da Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde.

O lugar onde o tratamento começa – O SUS

Resistindo para existir, há 32 anos o Sistema Único de Saúde, o SUS, é a porta de entrada para o tratamento não só de HIV/Aids, mas também de tuberculose e demais enfermidades. Do cidadão com menos recursos até aqueles que têm mais acesso à rede privada de saúde, o sistema se torna ponto de acolhimento para quem deseja ser cuidado.

Sua estrutura robusta é a melhor carta que o Brasil tem em mãos no combate às tantas pandemias existentes. Sua importância social, econômica e cultural ficaram ainda mais evidentes com a pandemia do novo coronavírus, que desde março assola o mundo inteiro, e que, por sua vez, fez reconhecer a importância do órgão.  

O SUS contempla desde a aferição da qualidade da água, até o fornecimento de medicamentos e realização de transplantes. Em uma gestão feita por Município-Estado-Governo Federal, acaba restando ao município executar todas as ações e serviços de saúde. 

Desde sua criação, quando se compara as curvas da participação percentual das três instâncias, percebe-se que a do Governo Federal diminuiu, enquanto a sobrecarga nos cofres públicos municipais aumentou. Em 2019, os municípios foram responsáveis por colocar 31 bilhões de reais a mais do que o mínimo constitucional.

Mesmo com o subfinanciamento histórico, o Sistema Único de Saúde tem números expressivos. De acordo com dados do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde, o CONASEMS, o Brasil conta com 45 mil equipes de saúde da família que atuam em 40 mil Unidades Básicas de Saúde, 4.700 hospitais públicos ou conveniados e 32 mil leitos de UTI via SUS. No ano passado, foram realizadas 330 milhões de visitas domiciliares e 3,7 bilhões de atendimentos ambulatoriais.

Atingindo todas essas proporções, o mérito se dá graças, também, à entrega diária dos profissionais de saúde. Colocar em prática os princípios da equidade, integralidade e universalidade esbarra, muitas vezes, na falta de recursos suficientes. Mas, mesmo assim, existem inúmeros projetos Brasil afora que mostram a potência do sistema público considerado um dos maiores do mundo. A pandemia foi apenas um desses exemplos.

Você sabia?

O dia 1º de dezembro foi instituído em 1987 pela Assembleia Geral da ONU e a Organização Mundial de Saúde, cinco anos após a descoberta do HIV, vírus causador da doença. Com base na data e com o objetivo de conscientizar a população sobre prevenção e tratamento do HIV, Aids e outras Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST), o Ministério da Saúde estipulou desde 2017 o dezembro vermelho, para que a população possa se lembrar e se prevenir das IST.

A cor é referente ao laço vermelho já utilizado na campanha da Aids. O símbolo foi criado em 1991 pelo coletivo Visual Aids, comporto por artistas visuais de Nova Iorque.